
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e outros
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: MARA CAMILLA DE SOUZA NASCIMENTO - GO39471-A
POLO PASSIVO:MARIA ROSA LEITE e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MARA CAMILLA DE SOUZA NASCIMENTO - GO39471-A
RELATOR(A):CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1025951-08.2023.4.01.0000
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARIA ROSA LEITE
APELADO: MARIA ROSA LEITE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Trata-se de recursos de apelação interpostos pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL e pela parte autora em face da sentença que julgou procedente o pedido de concessão de benefício de amparo assistencial à pessoa com deficiência (LOAS), a partir da data do requerimento administrativo, efetuado em 27/10/2021, com data de cessação em 27/09/2024.
Nas razões recursais (ID 321774656, fls. 84 a 92), o INSS alega não estar presente a condição de miserabilidade da parte autora, como exigido pelo art. 20, §3º, da Lei nº 8.742/93. Subsidiariamente, pede a alteração do termo inicial e dos índices de correção monetária e juros de mora.
A parte autora, por sua vez, nas razões recursais (ID 321774659, fls. 2 a 11), pede a exclusão do termo final fixado para o benefício concedido.
As contrarrazões não foram apresentadas.
É o relatório.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1025951-08.2023.4.01.0000
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARIA ROSA LEITE
APELADO: MARIA ROSA LEITE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Inicialmente, assente-se a dispensa de remessa necessária no presente caso concreto, em face do teor da norma do inciso I do § 3º do art. 496 do Código de Processo Civil, nos termos dos recentes precedentes do Superior Tribunal de Justiça (a propósito: REsp. 1735097/RS; REsp. 1844937/PR).
Consigno, ainda, que a prescrição atinge as prestações vencidas anteriormente ao quinquênio que antecede o ajuizamento da ação, nos termos da Súmula nº 85/STJ.
Enquanto a parte autora busca na inicial a concessão de benefício de amparo assistencial à pessoa com deficiência previsto na Lei nº 8.742/93, a pretensão recursal do INSS consiste na reforma da sentença por entender que inexistem provas relativas à miserabilidade da parte autora, requisito exigido pelo art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
Como a questão inicial submetida a exame em sede de apelação cinge-se à demonstração da hipossuficiência financeira da parte autora, limito-me a analisar a referida questão e não procedo ao exame da comprovação de ser a parte autora portadora de deficiência que acarreta impedimento de longo prazo, já reconhecida pela sentença.
A respeito da miserabilidade, assim dispõe o art. 20 da Lei nº 8.742/93:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
(...)
§ 3º Observados os demais critérios de elegibilidade definidos nesta Lei, terão direito ao benefício financeiro de que trata o caput deste artigo a pessoa com deficiência ou a pessoa idosa com renda familiar mensal per capita igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 14.176, de 2021)
(...)
§ 8º A renda familiar mensal a que se refere o § 3º deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 1998)
§9º Os rendimentos decorrentes de estágio supervisionado e de aprendizagem não serão computados para os fins de cálculo da renda familiar per capita a que se refere o § 3o deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)
(...)
§11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015)
§11-A. O regulamento de que trata o § 11 deste artigo poderá ampliar o limite de renda mensal familiar per capita previsto no § 3º deste artigo para até 1/2 (meio) salário-mínimo, observado o disposto no art. 20-B desta Lei. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021)
(...)
§ 14. O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
Relativamente à transcrita norma do art. 20, §3º, da Lei nº 8.742/93, o Eg. STJ, quando do julgamento do REsp n. 1.112.557/MG, sob o regime de recursos repetitivos, firmou o entendimento de que “a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade” (REsp n. 1.112.557/MG, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, julgado em 28/10/2009, DJe de 20/11/2009).
A referida norma também passou pelo crivo do Plenário do STF quando do julgamento dos RE 567985 e 580963, e da Reclamação nº 4374, oportunidade em que foi declarada a inconstitucionalidade parcial da norma, sem declaração de nulidade.
Diante da constatação de que uma nova realidade normativo-social alterou a realidade objetiva verificada à época do julgamento da ADI nº 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal assentou que o parâmetro previsto pelo mencionado art. 20, §3º, não mais atende à aferição da situação de hipossuficiência do idoso ou do deficiente, para fins de percepção do benefício, daí porque não pode ser ele invocado como fundamento exclusivo para o seu indeferimento.
Em outras palavras, a Corte Suprema estabeleceu que a hipossuficiência financeira do requerente do benefício assistencial deve ser avaliada pelo julgador considerando todo o conjunto probatório apresentado no bojo dos autos, e não apenas a renda per capita.
No caso dos autos, o laudo socioeconômico, realizado em 11/09/2022 (ID 321774656, fls. 28 a 30), informa que a parte autora reside em casa própria com seu filho. A renda familiar consiste em salário recebido pelo filho da parte autora, no valor de R$ 1.300,00.
Em que pese os argumentos do INSS, verifica-se que na data do requerimento administrativo, em 27/10/2021, não consta vínculo trabalhista no CNIS do filho, conforme consulta ao sistema de atendimentos do INSS. Portanto, na data do requerimento a renda per capita era inferior ao critério legal de 1/4 do salário mínimo.
Com efeito, o salário informado na perícia social decorre de atividade iniciada em 01/07/2022, com remuneração de R$ 1.300,00 no primeiro mês e de aproximadamente R$ 1.600,00 nos demais meses de 2022.
Considerando apenas o valor bruto sem deduzir as despesas, a renda per capita nesse período seria de R$ 650,00 e depois de aproximadamente R$ 800,00, sendo o salário mínimo vigente no valor de R$ 1.212,00, o que ultrapassaria o limite per capita legal. Contudo, é necessário considerar também que a família possui despesas que somam aproximadamente R$ 1.267,14, sendo R$ 300,00 com medicamentos. Dessa forma, verifica-se que a renda per capita efetiva não supera o critério de 1/2 salário mínimo.
Portanto, considerando as circunstâncias do caso, a flexibilização do requisito legal relativo à renda per capita, conforme entendimento do STF e do STJ, e os gastos elevados da família, verifico que foi comprovada a condição de miserabilidade, nos termos do art. 203, V, da Constituição Federal e do art. 20 da Lei nº 8.742/93.
Impõe-se, portanto, a manutenção da sentença quanto à concessão do benefício.
Quanto ao termo inicial do benefício, não assiste razão ao INSS quando pede a sua fixação na data de prolação da sentença, tendo em vista que os requisitos podem ser observados à época do requerimento administrativo, observada a prescrição qüinqüenal.
Quanto ao termo final fixado na sentença (27/09/2024), assiste razão à parte autora. Com efeito, não há previsão legal para a concessão do benefício assistencial por prazo determinado, devendo ser suspenso a qualquer tempo; porém, apenas quando os requisitos de sua concessão não estiverem mais presentes e desde que observado o devido processo administrativo.
Impõe-se, portanto, o provimento da apelação da parte autora, a fim de excluir-se o prazo final estabelecido pela sentença.
Quanto ao índice de correção monetária, assiste razão ao INSS quando argumenta ter sido aplicada equivocadamente a EC nº 113/2021 em período anterior à sua vigência, devendo ser corrigido também o índice dos juros moratórios, nos termos dos pedidos eventuais do INSS.
Dessa forma, sobre o montante da condenação incidirão correção monetária e juros de mora nos termos estabelecidos pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal atualizado, observados os parâmetros estabelecidos no RE 870.947 (Tema 810/STF) e no REsp 1.492.221 (Tema 905/STJ), respeitada a prescrição quinquenal.
Fica reformada, portanto, a sentença também neste ponto.
Mantenho a verba honorária fixada na sentença. Deixo de majorar os honorários advocatícios, em face do entendimento firmado pelo STJ no Tema 1.059 (Resp. n. 1865663/PR), segundo o qual a aplicação da norma inserta no art. 85, §11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal.
Ante o exposto, CONHEÇO dos recursos e, no mérito, DOU PROVIMENTO à apelação da parte autora para excluir o termo final do benefício, concedendo-o por prazo indeterminado, e DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INSS para alterar os índices de correção monetária e juros moratórios, nos termos da fundamentação.
É como voto.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1025951-08.2023.4.01.0000
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARIA ROSA LEITE
APELADO: MARIA ROSA LEITE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL À PESSOA IDOSA OU COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, CF/88. ART. 20, § 3º, DA LEI Nº 8.742/93. MISERABILIDADE CONFIGURADA. TERMO INICIAL. TERMO FINAL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA.
1. A questão inicial submetida a exame em sede de apelação cinge-se à demonstração da hipossuficiência financeira da parte autora, conforme exigido pelo art. 20, §3º, da Lei nº 8.742/93, para fins de concessão ou restabelecimento do benefício de prestação continuada. Subsidiariamente, o INSS pede a alteração do termo inicial e dos índices de correção monetária e juros de mora. Por sua vez, a parte autora pede a exclusão do termo final fixado para o benefício concedido.
2. Relativamente à norma do art. 20, §3º, da Lei nº 8.742/93, o Eg. STJ, quando do julgamento do REsp n. 1.112.557/MG, sob o regime de recursos repetitivos, firmou o entendimento de que “a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade” (REsp n. 1.112.557/MG, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, julgado em 28/10/2009, DJe de 20/11/2009).
3. O Plenário do STF quando do julgamento dos RE’s 567.985 e 580.963 e da Reclamação nº 4.374, declarou a inconstitucionalidade parcial da norma, sem declaração de nulidade, e assentou que o parâmetro previsto pelo mencionado art. 20, §3º não mais atende à aferição da situação de hipossuficiência do idoso ou do deficiente, para fins de percepção do benefício, daí porque não pode ser ele invocado como fundamento exclusivo para o seu indeferimento, circunstância que permite ao juiz analisar o requisito da hipossuficiência financeira de acordo com o conjunto probatório presente nos autos, e não apenas em relação à renda per capita.
4. No caso dos autos, o laudo socioeconômico, realizado em 11/09/2022, informa que a parte autora reside em casa própria com seu filho. A renda familiar consiste em salário recebido pelo filho da parte autora, no valor de R$ 1.300,00. Em que pese os argumentos do INSS, verifica-se que na data do requerimento administrativo, em 27/10/2021, não consta vínculo trabalhista no CNIS do filho, conforme consulta ao sistema de atendimentos do INSS. Portanto, na data do requerimento a renda per capita era inferior ao critério legal de 1/4 do salário mínimo.
5. O salário informado na perícia social decorre de atividade iniciada em 01/07/2022, com remuneração de R$ 1.300,00 no primeiro mês e de aproximadamente R$ 1.600,00 nos demais meses de 2022. Considerando apenas o valor bruto sem deduzir as despesas, a renda per capita nesse período seria de R$ 700,00 e depois de aproximadamente R$ 800,00, sendo o salário mínimo vigente no valor de R$ 1.212,00, o que ultrapassaria o limite per capita legal. Contudo, é necessário considerar também que a família possui despesas que somam aproximadamente R$ 1.267,14, sendo R$ 300,00 com medicamentos. Dessa forma, verifica-se que a renda per capita efetiva não supera o critério de 1/2 salário mínimo.
6. Considerando as circunstâncias do caso, a flexibilização do requisito legal relativo à renda per capita, conforme entendimento do STF e do STJ, e os gastos elevados da família, verifica-se que foi comprovada a condição de miserabilidade, nos termos do art. 203, V, da Constituição Federal e do arts. 20 e 20-B da Lei nº 8.742/93.Impõe-se, portanto, a manutenção da sentença quanto à concessão do benefício.
7. Quanto ao termo inicial do benefício, não assiste razão ao INSS quando pede a sua fixação na data de prolação da sentença, tendo em vista que os requisitos podem ser observados à época do requerimento administrativo.
8. Quanto ao termo final fixado na sentença (27/09/2024), assiste razão à parte autora. Com efeito, não há previsão legal para a concessão do benefício assistencial por prazo determinado, devendo ser suspenso a qualquer tempo; porém, apenas quando os requisitos de sua concessão não estiverem mais presentes e desde que observado o devido processo administrativo. Impõe-se, portanto, o provimento da apelação da parte autora, a fim de excluir-se o prazo final estabelecido pela sentença.
9. Quanto ao índice de correção monetária, assiste razão ao INSS quando argumenta ter sido aplicada equivocadamente a EC nº 113/2021 em período anterior à sua vigência, devendo ser corrigido também o índice dos juros moratórios, nos termos dos pedidos eventuais do INSS. Dessa forma, sobre o montante da condenação incidirão correção monetária e juros de mora nos termos estabelecidos pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal atualizado, observados os parâmetros estabelecidos no RE 870.947 (Tema 810/STF) e no REsp 1.492.221 (Tema 905/STJ), respeitada a prescrição quinquenal. Sentença reformada também neste ponto.
10. Apelação da parte autora provida. Apelação do INSS parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO ao recurso de apelação da parte autora e DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação do INSS, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, na data lançada na certidão do julgamento.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora
