
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ZELIA SIMOES DA SILVA e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MARCONDES ALEXANDRE PINTO JUNIOR - GO22409-A
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1028430-86.2019.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 0327474-62.2015.8.09.0116
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
A parte autora, RONALDO SIMÕES DAS VIRGENS propôs ação ordinária em face do INSS objetivando a concessão do benefício de amparo ao deficiente-Loas.
A sentença (Id 35227535 - Pág. 157) julgou procedente o pedido da inicial para condenar o INSS ao pagamento mensal de 1 (um) salário-mínimo à parte autora a título de amparo assistencial, com efeitos retroativos à data do requerimento administrativo.
EM sua apelação (Id 35227535 - Pág. 169), o INSS alega falta de interesse de agir do autor, visto que o pedido de requerimento administrativo foi apresentado em nome da mãe do autor. Em caso de condenação, requer a fixação da DIB na data da citação, devido à ausência de requerimento administrativo em nome do autor.
A parte autora, ora apelada, apresentou contrarrazões à apelação (Id 35227535 - Pág. 197).
O Ministério Público apresentou parecer favorável à concessão do benefício de amparo assistencial ao autor (Id 44296522 - Pág. 1).
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1028430-86.2019.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 0327474-62.2015.8.09.0116
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
V O T O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
O juízo a quo deferiu à parte autora o benefício de auxílio-doença.
Falta de interesse de agir
Afasto a preliminar de falta de interesse arguida pelo INSS, uma vez que o requerimento administrativo foi apresentado em nome da genitora do autor, que atua como sua representante legal. Essa representação é válida, considerando as limitações do autor e seu status de menor impúbere. Ademais, embora o requerimento administrativo esteja em nome da genitora, os documentos apresentados para a perícia estão devidamente registrados em nome do autor.
Mérito
A questão em apreço trata da verificação da existência do direito da parte autora à percepção do benefício de prestação continuada estabelecido pelo art. 203 da Constituição Federal de 1988.
A Lei 8.742/93 trouxe, em seu art. 20, os critérios para a concessão do citado benefício, nos seguintes termos:
“Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 3o Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
(...)”
Conforme se observa do § 4o do art. 20 da Lei 8.742/93, o benefício de amparo assistencial não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória.
Quanto à incapacidade
Nesse ponto, destaco que, "a incapacidade para a vida independente deve ser entendida não como falta de condições para as atividades mínimas do dia a dia, mas como a ausência de meios de subsistência, visto sob um aspecto econômico, refletindo na possibilidade de acesso a uma fonte de renda." (AC 0005666-45.2000.4.01.4000 / PI, Rel. JUIZ FEDERAL JOSÉ ALEXANDRE FRANCO, 2ª TURMA SUPLEMENTAR, e-DJF1 p.254 de 04/10/2012.)
Assim, está incapacitada a pessoa que não tem condições de se auto determinar completamente ou que depende de algum auxílio, acompanhamento, vigilância ou atenção de terceiros para viver com dignidade.
Deve ser consignado, por importante, que a incapacidade há ser aferida considerando-se as condições pessoais da parte autora e as atividades que poderiam ser por ela desempenhadas, sendo que, no caso dos trabalhadores campesinos, o labor rural exige, para o seu exercício, esforço físico intenso, não sendo de se lhe exigir, para obtenção de uma fonte de renda, a realização de atividade dissociada da sua realidade sociocultural.
De mais a mais, caso a parte autora seja criança, já que não pode trabalhar, deve desfalcar a família da força de trabalho com o seu cuidado ou despender maiores despesas para seu tratamento e/ou cuidados (AC 0027149-10.2007.4.01.9199/MG, Rel. Juiz Federal CLEBERSON JOSÉ ROCHA [CONV.], T2/TRF1, e-DJF1 de 28/06/2012).
Ressalte-se, ainda, que na hipótese de se tratar de curatela/interdição judicial, a realização de laudo pericial poderá ser dispensada, eis que satisfatoriamente demonstrado o preenchimento do requisito da invalidez/incapacidade da parte autora.
Renda per capita e aferição da condição de miserabilidade
No julgamento dos RE 567985 e 580963, e da Reclamação nº 4374, o STF declarou a inconstitucionalidade do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93, no que se refere à sobredita renda per capita.
Deveras, diante da constatação de que uma nova realidade normativo-social alterou a realidade objetiva verificada à época do julgamento da ADI nº 1.232-1/DF, a Corte Suprema fixou a compreensão de que o parâmetro previsto pelo prefalado art. 20, § 3º, da LOAS, não é mais servil à aferição da situação de hipossuficiência do idoso ou do deficiente, para fins de percepção da prestação em questão, daí porque não pode ser ele invocado como argumento para o seu indeferimento.
Segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal, o patamar legal de um quarto do salário-mínimo corresponde a padrão mínimo para reconhecimento da miserabilidade, sendo que a carência econômica pode ser aferida no caso concreto por critérios diversos, ainda que superado tal patamar:
CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. QUESTÃO DE ORDEM. ANULAÇÃO DO ACÓRDÃO ANTERIOR. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LOAS. ART. 203, V, DA CF/88. LEI 8.742/93. PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA FÍSICA E/OU MENTAL. PERÍCIA MÉDICA. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E PARA A VIDA INDEPENDENTE. ESTUDO SOCIOECONÔMICO. HIPOSSUFICIÊNCIA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. INCAPACIDADE POSTERIOR AO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. CITAÇÃO. 1. Questão de ordem acolhida para anular o julgamento proferido por esta Segunda Turma (fls. 218/219), eis que, naquela oportunidade, foram julgados apenas o recurso de apelação e a remessa oficial, tendo em conta que o recurso adesivo, tempestivamente protocolado no juízo de origem, foi juntado posteriormente aos autos (fls. 247/249). 2. A Constituição Federal, em seu artigo 203, inciso V, e a Lei n. 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social) garantem um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, independentemente de contribuição à seguridade social. 3. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada estão estabelecidos no art. 20 da Lei n. 8.742/93. São eles: i) o requerente deve ser portador de deficiência ou ser idoso com 65 anos ou mais; ii) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e iii) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade). 4. O Col. STF, ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.232-1/DF, declarou que a regra constante do art. 20, § 3º, da LOAS não contempla a única hipótese de concessão do benefício, e sim presunção objetiva de miserabilidade, de forma a admitir a análise da necessidade assistencial em cada caso concreto, mesmo que o "quantum" da renda "per capita" ultrapasse o valor de ¼ do salário mínimo, cabendo ao julgador avaliar a vulnerabilidade social de acordo com o caso concreto. 5. Também o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, consagrou a possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade do beneficiário por outros meios de prova, quando a renda per capita do núcleo familiar for superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo. Nesse sentido, cf. REsp 1.112.557/MG, Terceira Seção, Relator Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe de 20/11/2009. 6. Firmou-se o entendimento jurisprudencial de que, para fins de cálculo da renda familiar mensal, não deve ser considerado o benefício (mesmo que de natureza previdenciária) que já venha sendo pago a algum membro da família, desde que seja de apenas 1 (um) salário mínimo, forte na aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso). Precedentes. 7. Considera-se deficiente aquela pessoa que apresenta impedimentos (físico, mental, intelectual ou sensorial) de longo prazo (mínimo de 2 anos) que podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Tal deficiência e o grau de impedimento devem ser aferidos mediante avaliação médica e avaliação social, consoante o § 6º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social. 8. Na hipótese, a incapacidade laborativa da parte autora para prover o seu sustento restou comprovada pelo laudo médico acostado; já a condição de miserabilidade, nos termos alinhavados acima, encontra-se escudada no estudo socioeconômico e documentos catalogados ao feito, autorizando, assim, a concessão do benefício vindicado. 9. Na hipótese de o perito não fixar a data de início da incapacidade laborativa, o termo inicial do benefício será a data do requerimento administrativo. Não havendo requerimento, será a data da citação do INSS. In casu, tendo o laudo judicial destacado que o início da incapacidade remonta a setembro de 2006 (quesito 09 - fls. 90), incabível a concessão de benefício por invalidez à data do requerimento administrativo (16.09.2003), como pretende o recorrente, por ser data anterior à fixada pelo expert, não havendo conjunto probatório suficiente para afastar a conclusão pericial acerca do início da incapacidade. Acertada a sentença ao fixar a data da citação como termo inicial do benefício, por ser este o momento em que o INSS teve ciência da incapacidade do recorrente. 10. Correção monetária e juros de mora nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal. 11. Acórdão de fls. 218/219 anulado. Apelação, remessa oficial, tida por interposta, e recurso adesivo desprovidos. (AC 0014219-47.2013.4.01.9199, DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, e-DJF1 27/05/2019 PAG.)
Nos termos do art. 20, § 1o, da Lei nº 8.742/93, com redação dada pela Lei nº 12.435/2011, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Caso dos autos
A deficiência restou comprovada por meio da perícia médica (Id 35227535 - Pág. 133) a qual atesta que o autor é portador de retardo mental moderado (CID 79.1) que lhe causa sequela permanente, sem capacidade intelectual de gerir à própria vida, necessitando de assistência de terceiros em atividades cotidianas, como higiene, alimentação e vestuário.
Quanto à carência econômica, o estudo socioeconômico (Id 35227535 - Pág. 103) demonstrou a hipossuficiência da família.
Diante desses resultados, o caso em análise justifica o deferimento do benefício de amparo social ao deficiente, tendo em vista que tanto a deficiência do autor quanto a situação econômica da família foram devidamente comprovadas.
Data de início do benefício- DIB
O termo inicial do benefício, bem como os efeitos financeiros da condenação deve ser fixado a partir da data do requerimento administrativo, quando houver, conforme tema decidido pelo e STJ. Assim o benefício é devido a partir da DER em 15.12.2009 (Id 35227535 - Pág. 19).
Juros e correção monetária, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
Honorários
Nos termos do julgamento do REsp 1.864.633/RS, que tramitou sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.059 do STJ), a majoração dos honorários de sucumbência pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido, como no caso dos autos, desse modo, conforme disposição o art. 85, § 11, do CPC/2015, os honorários devem ser majorados em dois pontos percentuais.
Conclusão
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS. Julgo procedente o pedido da inicial para que seja concedido à parte autora o benefício de amparo social ao deficiente.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1028430-86.2019.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 0327474-62.2015.8.09.0116
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RONALDO SIMÕES DAS VIRGENS
TERCEIRO INTERESSADO: ZELIA SIMOES DA SILVA
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, CF/88. LEI 8.742/93. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. INTERESSE DE AGIR. REQUISITOS CUMPRIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. APELAÇÃO DO INSS NÃO PROVIDA.
1. Afasto a preliminar de falta de interesse arguida pelo INSS, uma vez que o requerimento administrativo foi apresentado em nome da genitora do autor, que atua como sua representante legal. Essa representação é válida, considerando as limitações do autor e seu status de menor impúbere. Ademais, embora o requerimento administrativo esteja em nome da genitora, os documentos apresentados para a perícia estão devidamente registrados em nome do autor.
2. A Lei 8.742/93 trouxe, em seu art. 20, os critérios para a concessão do benefício assistencial/LOAS, nos seguintes termos: “O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
3. A deficiência restou comprovada por meio da perícia médica a qual atesta que o autor é portador de retardo mental moderado (CID 79.1) que lhe causa sequela permanente, sem capacidade intelectual de gerir à própria vida, necessitando de assistência de terceiros em atividades cotidianas, como higiene, alimentação e vestuário.
3. Quanto à carência econômica, o estudo socioeconômico demonstrou a hipossuficiência da família.
4. Diante desses resultados, o caso em análise justifica o deferimento do benefício de amparo social ao deficiente, tendo em vista que tanto a deficiência do autor quanto a situação econômica da família foram devidamente comprovadas.
5. O termo inicial do benefício, bem como os efeitos financeiros da condenação deve ser fixado a partir da data do requerimento administrativo, quando houver, conforme tema decidido pelo e STJ. Assim o benefício é devido a partir da DER em 15.12.2009.
6. Honorários de advogado majorados em dois pontos percentuais, nos termos do art. 85, §11, do CPC/2015 e da tese fixada no Tema 1.059/STJ.
7. Apelação do INSS não provida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
