
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:YISKARLYS GENESIS DIAZ MARCANO e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A
RELATOR(A):CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1006287-64.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: Y. G. D. M.
REPRESENTANTE: CARLOS ENRIQUEZ DIAZ JAIME
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL em face da sentença que julgou procedente o pedido de concessão de benefício de amparo assistencial à pessoa com deficiência (LOAS), a partir da data da denúncia à ouvidoria do INSS, ocorrida em 27/07/2020.
Nas razões recursais (ID 303039545, fls. 96 a 104), a parte apelante pede inicialmente a extinção do processo sem resolução de mérito, ante a ausência de interesse de agir da parte autora e, subsidiariamente, pede a fixação do termo inicial na data da citação.
As contrarrazões foram apresentadas (ID 303039545, fls. 106 e 107).
Parecer ministerial pelo desprovimento da apelação (ID 303970558).
É o relatório.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1006287-64.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: Y. G. D. M.
REPRESENTANTE: CARLOS ENRIQUEZ DIAZ JAIME
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Inicialmente, assente-se a dispensa de remessa necessária no presente caso concreto, em face do teor da norma do inciso I do § 3º do art. 496 do Código de Processo Civil, nos termos dos recentes precedentes do Superior Tribunal de Justiça (a propósito: REsp. 1735097/RS e REsp. 1844937/PR).
Consigno, ainda, que a prescrição atinge as prestações vencidas anteriormente ao quinquênio que antecede o ajuizamento da ação, nos termos da Súmula nº 85/STJ.
A pretensão formulada pela parte autora na inicial é de concessão de benefício de amparo assistencial à pessoa com deficiência previsto na Lei nº 8.742/93.
O INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL pede inicialmente a extinção do processo sem resolução de mérito, ante a ausência de interesse de agir da parte autora e, subsidiariamente, pede a fixação do termo inicial na citação.
Como a controvérsia recursal cinge-se ao interesse de agir e ao termo inicial do benefício, limito-me a analisar as referidas questões e não procedo ao exame dos requisitos para a concessão do benefício, já reconhecidos pela sentença.
Pois bem.
Quanto ao interesse de agir em ações sobre a concessão de benefícios, o STF, no julgamento do Tema nº 350 (RE nº 631.240), concluiu que ele surge, em regra, com o indeferimento administrativo ou com a demora na análise do pedido administrativo.
Com efeito, é necessária na via administrativa a resistência do INSS à pretensão da parte autora, para que fique configurada a necessidade de atuação do Poder Judiciário, elemento que compõe o interesse processual. Vejamos o entendimento do STF:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.
1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.
2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.
3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.
4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo – salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração –, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.
[...]
(RE 631240, Relator: ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, pub. 10/11/2014 – grifei)
Contudo, conforme se verifica no inteiro teor do acórdão que julgou o Tema nº 350, é possível a dispensa do requerimento administrativo e o reconhecimento excepcional do interesse de agir numa situação em que o ônus de o requerente buscar o atendimento do INSS se torne excessivo. Vejamos o entendimento do STF fixado no RE 631.240/MG:
57. Deste modo, apesar de certamente haver carências ainda a serem sanadas, a estruturação da rede de atendimento hoje existente não justifica a fixação de um parâmetro espacial abstrato para permitir o ingresso diretamente em juízo (inexistência de agência da Previdência Social na cidade ou a uma certa distância do domicílio do segurado), o que não cuidaria adequadamente de múltiplos casos concretos. Porém, verificada uma situação específica em que o ônus de comparecer a um posto de atendimento da Previdência Social seja demasiadamente superior ao de ingressar em juízo, poderá o magistrado, motivadamente e no caso concreto, justificar a dispensa da exigência de prévio requerimento administrativo. Isto porque a excessiva onerosidade para o segurado ser atendido pelo INSS é, em si mesma, uma lesão a direito.
Ademais, o enunciado nº 79 do FONAJEF dispõe o seguinte sobre o tema:
A comprovação de denúncia da negativa de protocolo de pedido de concessão de benefício, feita perante a ouvidoria da Previdência Social, supre a exigência de comprovação de prévio requerimento administrativo nas ações de benefícios da seguridade social.
No caso dos autos, a parte autora alega na petição inicial que, tendo comparecido à agência do INSS de Presidente Figueiredo/AM, foi informada que não existia previsão de atendimento para os serviços referentes ao benefício assistencial devido à pessoa com deficiência. Apresenta ainda o comprovante da denúncia perante a ouvidoria com o código nº CCLV32324, cadastrada em 27/07/2020 (ID 303039545, fl. 5).
Cumpre esclarecer que o INSS, na contestação, apresenta apenas argumentação genérica sobre a ausência de requerimento administrativo, sem questionar os fatos apresentados pela parte autora (fls. 80 a 84).
Dessa forma, não havendo atendimento para o benefício pretendido pela parte autora na agência da cidade em que reside, a situação se torna equivalente à inexistência da agência no município e se enquadra na distinção sinalizada pelo próprio precedente do STF (RE 631.240/MG, inteiro teor, item 57).
Com efeito, entendo que, de forma geral, estando ausente a estrutura autárquica no município ou o atendimento de um benefício específico, não é possível exigir do interessado que compareça na agência mais próxima, o que implicaria custos que muitas vezes o segurado não poderá arcar. Exigir esse deslocamento seria atribuir “excessiva onerosidade para o segurado ser atendido pelo INSS” (RE 631.240/MG), o que, conforme o STF, já constitui lesão ao direito.
Portanto, considerando as circunstâncias excepcionais do caso, o entendimento do STF e o enunciado nº 79 do FONAJEF, entendo que a parte autora deve ser dispensada da exigência de prévio requerimento administrativo para que tenha o mérito analisado pelo Poder Judiciário.
Quanto ao termo inicial do benefício, o STJ entende que deve ser fixado na data da citação quando não houver requerimento administrativo. Vejamos:
[...]
Nessa linha de raciocínio, prevalece, no STJ, a orientação segundo a qual, provada a incapacidade laborativa temporária do segurado, o termo inicial do pagamento do auxílio-doença é a data da cessação do benefício anteriormente deferido, mas, inexistente a prévia concessão de auxílio-doença, o início do benefício deverá corresponder à data do requerimento administrativo. Inexistentes anterior auxílio-doença e o requerimento administrativo, o termo inicial do auxílio-doença será a data da citação.
A propósito, merecem ser destacados, entre muitos outros, os seguintes precedentes da Primeira e da Segunda Turmas do STJ, competentes para o julgamento da matéria: [...] (STJ, AgInt no AREsp 1.961.174/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 29/06/2022); [...] (STJ, REsp 1.475.373/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, DJe de 08/05/2018).
[...]
(REsp n. 1.910.344/GO, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 4/10/2022, DJe de 10/10/2022)
Ademais, em que pese a denúncia ser suficiente para caracterizar o interesse de agir no caso dos autos, ela não equivale ao requerimento administrativo para fins de caracterização da resistência do INSS quanto ao preenchimento dos requisitos, tendo em vista que a autarquia não teve acesso aos documentos necessários à analise do pedido.
Dessa forma, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação, cujo mandado foi expedido em 30/03/2021 (ID 303039545, fl. 79), primeiro momento em que o INSS teve acesso ao contexto fático e aos documentos apresentados pela parte autora.
Impõe-se, portanto, o provimento parcial da apelação do INSS, a fim de alterar-se o termo inicial do benefício.
Por fim, a correção monetária e os juros de mora, como consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados de ofício pelos magistrados. Vejamos o entendimento do STJ:
PROCESSUAL CIVIL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. QUESTÕES DE ORDEM PÚBLICA. ALTERAÇÃO. POSSIBILIDADE. 1. Consoante o entendimento do STJ, a correção monetária e os juros de mora, como consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados pelas instâncias ordinárias até mesmo de ofício, o que afasta suposta violação do princípio do non reformatio in pejus. 2. Agravo interno não provido. (AGINT NO RESP N. 1.663.981/RJ, RELATOR MINISTRO GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, JULGADO EM 14/10/2019, DJE DE 17/10/2019)
Dessa forma, sobre o montante da condenação incidirão correção monetária e juros de mora nos termos estabelecidos pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal atualizado, observados os parâmetros estabelecidos no RE 870.947 (Tema 810/STF) e no REsp 1.492.221 (Tema 905/STJ), respeitada a prescrição quinquenal.
Mantenho a verba honorária fixada na sentença. Deixo de majorar os honorários advocatícios, em face do entendimento firmado pelo STJ no Tema 1.059 (Resp. n. 1865663/PR), segundo o qual a aplicação da norma inserta no art. 85, §11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal.
Ante o exposto, CONHEÇO do recurso e, no mérito, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INSS para, reformando parcialmente a sentença, fixar o termo inicial do benefício na data da citação. ALTERO, de ofício, os índices de correção monetária e dos juros de mora, nos termos da fundamentação.
É como voto.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1006287-64.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: Y. G. D. M.
REPRESENTANTE: CARLOS ENRIQUEZ DIAZ JAIME
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL AO IDOSO E À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, CF/88. LEI 8.742/93. INTERESSE DE AGIR CONFIGURADO. TERMO INICIAL. DATA DA CITAÇÃO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. ÍNDICES DE JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA ALTERADOS DE OFÍCIO.
1. A controvérsia recursal cinge-se ao interesse de agir e ao termo inicial do benefício.
2. Quanto ao interesse de agir em ações sobre a concessão de benefícios, o STF, no julgamento do Tema nº 350 (RE nº 631.240), concluiu que ele surge, em regra, com o indeferimento administrativo ou com a demora na análise do pedido administrativo. Com efeito, é necessária na via administrativa a resistência do INSS à pretensão da parte autora para que fique configurada a necessidade de atuação do Poder Judiciário, elemento que compõe o interesse processual.
3. Contudo, conforme se verifica no inteiro teor do acórdão que julgou o Tema nº 350, é possível a dispensa do requerimento administrativo e o reconhecimento excepcional do interesse de agir numa situação em que o ônus de o requerente buscar o atendimento do INSS se torne excessivo (RE 631.240/MG, inteiro teor, item 57).
4. No caso dos autos, a parte autora alega na petição inicial que, tendo comparecido à agência do INSS de Presidente Figueiredo/AM, foi informada que não existia previsão de atendimento para os serviços referentes ao benefício assistencial devido à pessoa com deficiência. Apresenta o comprovante da denúncia perante a ouvidoria com o código nº CCLV32324, cadastrada em 27/07/2020. O INSS, na contestação, apresenta apenas argumentação genérica sobre a ausência de requerimento administrativo, sem questionar os fatos apresentados pela parte autora.
5. Entende-se que, de forma geral, estando ausente a estrutura autárquica no município ou o atendimento de um benefício específico, não é possível exigir do interessado que compareça à agência mais próxima, o que implicaria custos que muitas vezes o segurado não poderá arcar. Exigir esse deslocamento seria atribuir “excessiva onerosidade para o segurado ser atendido pelo INSS” (RE 631.240/MG), o que, conforme o STF, já constitui lesão ao direito.
6. Portanto, considerando as circunstâncias excepcionais do caso, o entendimento do STF e o enunciado nº 79 do FONAJEF, entende-se que a parte autora deve ser dispensada da exigência de prévio requerimento administrativo para que tenha o mérito analisado pelo Poder Judiciário. Dessa forma, fica reconhecido o interesse de agir.
7. Quanto ao termo inicial do benefício, o STJ entende que deve ser fixado na data da citação quando não houver requerimento administrativo. Precedente. Ademais, em que pese a denúncia ser suficiente para caracterizar o interesse de agir no caso dos autos, ela não equivale ao requerimento administrativo para fins de caracterização da resistência do INSS quanto ao preenchimento dos requisitos, tendo em vista que a autarquia não teve acesso aos documentos necessários à análise do pedido.
8. Dessa forma, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação, cujo mandado foi expedido em 30/03/2021, primeiro momento em que o INSS teve acesso ao contexto fático e aos documentos apresentados pela parte autora. Impõe-se, portanto, a reforma parcial da sentença a fim de alterar-se o termo inicial do benefício.
9. A correção monetária e os juros de mora, como consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados de ofício pelos magistrados, conforme entendimento do STJ (AGINT NO RESP N. 1.663.981/RJ, RELATOR MINISTRO GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, JULGADO EM 14/10/2019, DJE DE 17/10/2019). Dessa forma, sobre o montante da condenação incidirão correção monetária e juros de mora nos termos estabelecidos pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal atualizado, observados os parâmetros estabelecidos no RE 870.947 (Tema 810/STF) e no REsp 1.492.221 (Tema 905/STJ), respeitada a prescrição quinquenal. Sentença reformada também neste ponto.
10. Apelação do INSS parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação e ALTERAR, de ofício, os índices de juros e correção monetária, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, na data lançada na certidão do julgamento.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora
