
POLO ATIVO: MARIA DA PAZ PEREIRA DE ANDRADE
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: JOSE ARY DE SOUZA GOMES - GO32108-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1006584-13.2019.4.01.9999
APELANTE: MARIA DA PAZ PEREIRA DE ANDRADE
Advogado do(a) APELANTE: JOSE ARY DE SOUZA GOMES - GO32108-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
A parte autora, Sra. MARIA DA PAZ PEREIRA DE ANDRADE, propôs a presente ação contra o INSS, a fim de obter benefício previdenciário de pensão por morte rural.
A sentença proferida pelo MM. Juiz a quo indeferiu a petição inicial, considerando que a parte autora não emendou a inicial, deixando de apresentar documentos que comprovassem sua hipossuficiência financeira, além da guia de custas iniciais e comprovante de endereço atualizado em seu nome ou contrato de aluguel.
Em sede de apelação, a parte autora argumenta que a inicial foi acompanhada dos documentos necessários, conforme preveem os artigos 319 e 320 do Código de Processo Civil, não havendo que se falar em descumprimento de diligência ou na ausência de juntada dos documentos dentro do prazo estabelecido.
Não houve apresentação de contrarrazões.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1006584-13.2019.4.01.9999
APELANTE: MARIA DA PAZ PEREIRA DE ANDRADE
Advogado do(a) APELANTE: JOSE ARY DE SOUZA GOMES - GO32108-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra sentença que extinguiu o processo, sem resolução de mérito, em razão da ausência de juntada aos autos do espelho da guia de custas e comprovante de endereço atualizado em seu nome ou contrato de aluguel.
O instituto da assistência judiciária gratuita é direito fundamental previsto no art. 5º, LXXIV, da Constituição Federal, e visa resguardar o acesso ao judiciário àqueles que comprovarem insuficiência de recursos.
A disciplina da matéria no âmbito infralegal, por sua vez, está definida nos arts. 98 a 102 do Código de Processo Civil. Dessa forma, foi previsto o direito à gratuidade de justiça, na forma da lei, à pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios.
Conforme disciplina do CPC, a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural é presumida verdadeira, de forma que o magistrado somente poderá indeferir o pedido se existirem nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais exigidos para a concessão do benefício.
Na oportunidade, registra-se que, mesmo nos casos de dúvida ou de insuficiência de elementos, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça orienta que o julgador deve proceder à intimação da parte com o objetivo de permitir a adequada comprovação do cumprimento dos requisitos para a concessão da assistência judiciária gratuita.
Por sua vez, a decisão que defere, ou não, o benefício, deve levar em consideração a situação concreta verificada nos autos, não sendo admitida a adoção de critérios objetivos tais quais a fixação de uma renda mensal mínima/máxima. Nesse sentido:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO MONITÓRIA. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. DOCUMENTOS APRESENTADOS NO ATO DO REQUERIMENTO INSUFICIENTES À COMPROVAÇÃO DO PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS. INTIMAÇÃO PRÉVIA AO INDEFERIMENTO. NECESSIDADE. 1. Ação monitória ajuizada em 19/02/2019, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 03/03/2021 e concluso ao gabinete em 21/03/2022. 2. O propósito recursal é decidir sobre a necessidade de intimação da pessoa jurídica, previamente ao indeferimento de gratuidade da justiça, quando os elementos apresentados na formulação do pedido são tidos pelo julgador como suficientes para evidenciar a falta dos respectivos pressupostos legais. 3. É importante diferenciar as hipóteses em que o julgador entende serem suficientes os elementos trazidos aos autos para indeferir o pedido de concessão da gratuidade de justiça, daquelas em que os elementos apresentados pelo requerente deixam dúvida ou são insuficientes para comprovar o preenchimento dos respectivos pressupostos. 4. A melhor interpretação do § 2º do art. 99 do CPC/2015 é no sentido de que deve o juiz, apenas diante da dúvida ou da insuficiência dos elementos apresentados pelo requerente, intimá-lo antes de indeferir o pedido, a fim de possibilitar a devida comprovação do preenchimento dos pressupostos para a concessão da gratuidade de justiça. 5. Recurso especial conhecido e provido. (REsp n. 2.001.930/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 28/2/2023, DJe de 10/3/2023) (Destacado).
PROCESSUAL CIVIL. JUSTIÇA GRATUITA. FAIXA DE RENDA MENSAL. CRITÉRIO ABSTRATO. INADMISSIBILIDADE.1. É assente na jurisprudência do STJ que a simples declaração de hipossuficiência da pessoa natural, ainda que dotada de presunção iuris tantum, é suficiente ao deferimento do pedido de gratuidade de justiça quando não ilidida por outros elementos dos autos.2. Esta Corte Superior rechaça a adoção única de critérios abstratos, como faixa de renda mensal isoladamente considerada, uma vez que eles não representam fundadas razões para denegação da justiça gratuita.3. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp n. 1.836.136/PR, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 4/4/2022, DJe de 12/4/2022) (Destacado).
Nos autos, consta a declaração de pobreza da parte requerente, indicando a impossibilidade de arcar com os custos do processo (fl. 13, rolagem única), bem como a CTPS sem registros de vínculos empregatícios (fls. 47/49, rolagem única). Ademais, a parte autora pleiteia benefício decorrente de sua condição de dependente de trabalhador rural. Essas circunstâncias indicam seu enquadramento na condição de hipossuficiente.
Assim, uma vez que restou verificada a condição de vulnerabilidade no caso concreto que justifique a concessão do benefício, o pedido de gratuidade de justiça deve ser deferido.
No que se refere ao comprovante de endereço em seu nome, é incabível a exigência de juntada de comprovante de residência na petição inicial por ausência de disposição legal. O artigo 319 do CPC/2015 estabelece apenas que, na petição inicial, a parte indicará “o domicílio e a residência do autor e do réu”. Portanto, não cabe ao juízo compelir a parte autora a apresentar outros documentos, senão no tocante aos indispensáveis à propositura da ação.
Nos termos da jurisprudência desse Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL. AUSÊNCIA DE COMPROVANTE DE ENDEREÇO E PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. EXTINÇÃO DO FEITO. DOCUMENTAÇÃO NÃO EXIGIDA POR LEI. . SENTENÇA ANULADA. 1. Os artigos 319 e 320, do CPC/2015, estabelecem requisitos que devem ser observados pela parte autora ao apresentar em juízo sua petição inicial. Caso tal requisito não seja preenchido pela parte autora, o juiz deve conceder a possibilidade de emendar a petição inicial e, uma vez não cumprida tal determinação, a petição será indeferida, nos termos do artigo 321, parágrafo único. 2. No caso, o autor foi intimado para emendar a inicial e anexar aos autos início de prova material, cópia integral do procedimento administrativo, comprovante de endereço em nome próprio e descrever os lugares onde trabalhou como rurícola, bem como as atividades exercidas. No prazo fixado, o apelante cumpriu a intimação, demonstrando o início de prova material e a descrição de suas atividades e locais de trabalho, justificando a impossibilidade de cumprimento da juntada de comprovante de endereço, bem como do procedimento administrativo. 3. De acordo com jurisprudência desta Corte, é inexigível a apresentação de comprovante de endereço por ausência de previsão legal. 4. No Recurso Extraordinário 631.240/MG, com repercussão geral reconhecida, julgado em 03/09/2014, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. Quanto ao processo administrativo, este não é documento indispensável para a comprovação do indeferimento administrativo. No caso dos autos, a parte justifica a ausência do indeferimento, pela mora administrativa em fornecer a resposta. 5. Apelação provida para anular a sentença. (AC 1003272-58.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 12/01/2023 PAG) (Destacado).
Na situação em análise, não é aplicável o disposto no art. 1.013, § 3º, do Código de Processo Civil (causa madura) à espécie, uma vez que o processo não está em condições de ser julgado, devendo os autos retornar à origem para o seu regular processamento.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem para regular processamento e julgamento do feito.
É o voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1006584-13.2019.4.01.9999
APELANTE: MARIA DA PAZ PEREIRA DE ANDRADE
Advogado do(a) APELANTE: JOSE ARY DE SOUZA GOMES - GO32108-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PENSÃO POR MORTE. INDEFERIMENTO DA INICIAL. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. EXIGÊNCIA DE COMPROVANTE DE RESIDÊNCIA. APELAÇÃO PROVIDA.
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Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra sentença que extinguiu o processo, sem resolução de mérito, em razão da ausência de juntada aos autos do espelho da guia de custas e comprovante de endereço atualizado em seu nome ou contrato de aluguel.
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Conforme disciplina do CPC, a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural é presumida verdadeira, de forma que o magistrado somente poderá indeferir o pedido se existirem nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais exigidos para a concessão do benefício.
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Nos autos, consta a declaração de pobreza da parte requerente, indicando a impossibilidade de arcar com os custos do processo (fl. 13, rolagem única), bem como a CTPS sem registros de vínculos empregatícios (fls. 47/49, rolagem única). Ademais, a parte autora pleiteia benefício decorrente de sua condição de dependente de trabalhador rural. Essas circunstâncias indicam seu enquadramento na condição de hipossuficiente. Assim, uma vez que restou verificada a condição de vulnerabilidade no caso concreto que justifique a concessão do benefício, o pedido de gratuidade de justiça deve ser deferido.
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No que se refere ao comprovante de endereço em seu nome, é incabível a exigência de juntada de comprovante de residência na petição inicial por ausência de disposição legal. O artigo 319 do CPC/2015 estabelece apenas que, na petição inicial, a parte indicará “o domicílio e a residência do autor e do réu”. Portanto, não cabe ao juízo compelir a parte autora a apresentar outros documentos, senão no tocante aos indispensáveis à propositura da ação.
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Não é aplicável o disposto no art. 1.013, § 3º, do Código de Processo Civil (causa madura) à espécie, uma vez que o processo não está em condições de ser julgado, devendo os autos retornar à origem para o seu regular processamento.
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Apelação da parte autora provida. Sentença anulada para determinar o retorno dos autos à vara de origem para regular processamento e julgamento do feito.
Tese de julgamento:
“1. A presunção de veracidade da declaração de hipossuficiência deve ser mantida na ausência de elementos contrários.
2. A exigência de comprovante de residência em nome próprio não encontra previsão legal e não pode ser imposta à parte autora.”
Legislação relevante citada:
CF/1988, art. 5º, LXXIV;
CPC/2015, arts. 319 e 320.
Jurisprudência relevante citada:
STJ, REsp 2.001.930/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 10/03/2023;
STJ, AgInt no REsp 1.836.136/PR, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 12/04/2022.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
