
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
POLO PASSIVO:EDVALDO CICERO DOS SANTOS
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MOISES SANTANA BARRETO - BA35256-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1003625-58.2017.4.01.3300
ASSISTENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
ASSISTENTE: EDVALDO CICERO DOS SANTOS
Advogado do(a) ASSISTENTE: MOISES SANTANA BARRETO - BA35256-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
A parte autora, Sr. EDVALDO CICERO DOS SANTOS, ajuizou a presente ação contra o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, requerendo, in verbis:
“ e) Julgamento, totalmente PROCENDENTE da presente ação, para confirmar a medida liminar e condenar o INSS, ao pagamento do valor relativo a benefícios e suas diferença não pagas referente a aposentadoria especial a contar desde a data do requerimento/benefício nº 163.773.366-3 formulado em 27/02/2013, com R.M.I atualizado de R$1.975,67, devendo dos reajustado e atualizado até a data efetiva da concessão/averbação do benefício, reconhecendo e AVERBANDO a atividade especial do período de 08/04/1981 a 27/02/2013, RESPECTIVOS ao exercício dos cargos de cargo de agente de limpeza I, III (coletor) e agente de limpeza urbana coletor, expostos a micro-organismo, toxinas e ruído, considerados agentes biológicos e físicos prejudiciais a saúde e a integridade física.”.
Sobreveio sentença, julgando procedentes os pedidos autorais, nos seguintes termos:
“Diante do exposto, JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC, para condenar o INSS a:
a) a averbar o tempo de serviço prestado pelo autor sob condições especiais em relação ao período de 08/04/1981 a 27/02/2013;
b) a converter o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, desde a data da implantação do benefício anterior (22/07/2013);”.
O INSS interpôs apelação requerendo, em síntese, o afastamento do reconhecimento da especialidade do labor nos períodos de 08/04/1981 a 28/02/1990, 06/03/1997 a 18/11/2003 e 01/2013 a 27/02/2013, sob a alegação de que não há comprovação para caracterizar a especialidade das atividades exercidas.
Adicionalmente, na hipótese de manutenção da sentença, o INSS solicita que a atualização monetária das parcelas vencidas, incluindo correção monetária e juros de mora, seja realizada conforme o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com as alterações introduzidas pela Lei nº 11.960/09, afastando-se a aplicação do INPC, por entender que este índice está em desacordo com a legislação mencionada.
A parte autora não apresentou contrarrazões.
O Ministério Público Federal não se manifestou acerca do mérito da controvérsia.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1003625-58.2017.4.01.3300
ASSISTENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
ASSISTENTE: EDVALDO CICERO DOS SANTOS
Advogado do(a) ASSISTENTE: MOISES SANTANA BARRETO - BA35256-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
Remessa necessária
No presente caso, eventual condenação imposta à Fazenda Pública resulta em quantia inferior ao limite legal (art. 496, §3º, CPC/2015).
Não se sujeita à remessa necessária a sentença – proferida na vigência do CPC/2015 – que condena a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público em quantia inferior a mil salários mínimos (CPC, art. 496, § 3º, I).
Efeito suspensivo
Diante do julgamento da apelação nesta oportunidade, resta prejudicado o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso.
DO MÉRITO
Hipótese em que se controverte acerca do preenchimento de requisitos para o reconhecimento da especialidade do tempo trabalhado e para a concessão da aposentadoria especial.
A matéria tratada nos presentes autos desafia a análise de diversas questões acerca do panorama legislativo que dá lastro à aposentadoria especial, como passo a expor.
Linhas gerais da legislação de regência
Dispondo o art. 201 da Constituição da República sobre a organização do Regime Geral de Previdência Social – RGPS, ressalvou, em seu parágrafo primeiro, a possibilidade de critérios distintos da regra geral para a concessão da aposentadoria, em favor dos segurados que exerçam suas atividades com exposição a agentes prejudiciais à saúde, conforme o extrato:
§ 1º É vedada a adoção de requisitos ou critérios diferenciados para concessão de benefícios, ressalvada, nos termos de lei complementar, a possibilidade de previsão de idade e tempo de contribuição distintos da regra geral para concessão de aposentadoria exclusivamente em favor dos segurados:
I - com deficiência, previamente submetidos a avaliação biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar;
II - cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação.
Inicialmente, a aposentadoria especial foi instituída pela Lei Orgânica da Previdência Social, Lei n. 3.807, de 26 de agosto de 1960, a qual previu uma presunção legal, de qualidade de labor especial, para algumas categorias profissionais, cujas atividades expusessem os trabalhadores a condições prejudiciais à saúde ou à integridade física, bastando, para tal qualificação, apenas que o trabalhador pertencesse às mencionadas categorias.
Na esteira dessa previsão legal, os Decretos n. 53.831/1964 e n. 83.080/1979 arrolaram atividades profissionais, contempladas com a presunção legal de qualificação como especiais, em vista da exposição a agentes químicos, físicos e biológicos, que poderia acarretar prejuízos à saúde do trabalhador.
Por sua vez, o art. 57 da Lei n. 8.213/91, definiu que "a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta lei, ao segurado que tiver trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física."
Assim, calha observar que o art. 57, caput e § 3º, da Lei nº 8.213/91, dispõem que a aposentadoria especial será devida ao segurado que tenha trabalhado em condições especiais que lhe prejudiquem a saúde ou a integridade física, desde que, também, seja cumprida a carência exigida, consoante o excerto:
Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.
(...)
§ 3º A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Social–INSS, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado.
Relevante observar que, diante do contexto das diversas alterações feitas na legislação previdenciária, mormente no que se refere à atividade especial e suas formas de enquadramento, deve ser considerada a norma vigente à época da prestação da atividade, à luz do princípio tempus regit actum.
Com esteio nessas premissas, assinalo, em resumo, a linha cronológica com base na qual devem as condições legais ser demonstradas para o enquadramento como atividade especial:
a) até 28/04/1995 (data da entrada em vigor da Lei 9.032, de 28 de abril de 1995), pelo mero enquadramento da atividade profissional, nos termos dos Decretos 53.831/1964 e 83.080/1979, ou pela demonstração pela própria empresa mediante os formulários próprios;
b) a partir de 28/04/1995, mediante identificação em formulários próprios (SB-40 e DSS-8030, padronizados pelo INSS), preenchidos pela própria empresa, ou mediante laudo, exigindo-se a comprovação, pelo segurado, do exercício da atividade em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física, demonstrando a exposição a agentes químicos, físicos, biológicos ou a associação desses agentes (Lei 8.213/1991, art. 57, §§ 3º e 4º, e art. 58, § 1º);
c) a partir da edição do Decreto 2.172/1997, que regulamentou a MP 1523/1996 (MP 1.596/1997), convertida na Lei 9.528, de 10/12/1997, por Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT), expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, nos termos da legislação trabalhista, devendo as empresas, desde então, elaborar e manter Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) das atividades desenvolvidas pelos trabalhadores.
Diante desse histórico legislativo, releva destacar que a qualificação da atividade como especial deve ser feita de acordo com a legislação contemporânea à prestação do serviço, de maneira que as normas mais restritivas veiculadas pelas Leis nº 9.032/95, 9.528/97 e 3.048/99 não sejam aplicáveis ao tempo de serviço prestado anteriormente às respectivas datas de edição.
DO AGENTE NOCIVO “BIOLÓGICO”
A atividade profissional com exposição a agentes biológicos (contato direto com germes infecciosos ou suas toxinas, animais ou pessoas doentes ou materiais infecto-contagiantes) é considerada nociva, conforme códigos 1.3.1 e 1.3.2 do Anexo do Decreto 53.831/1964; códigos 1.3.1 a 1.3.5 do Anexo I do Decreto 83.080/1979; código 3.0.1 do Anexo IV do Decreto 2.172/1997; e código 3.0.1 do Anexo IV do Decreto 3.048/1999.
Para o agente nocivo biológico não há estabelecimento de nível máximo de tolerância pela legislação de regência, bastando a simples constatação de sua presença (análise qualitativa) para ser caracterizada a nocividade, bem assim a exposição não precisa ocorrer durante toda a jornada de trabalho, uma vez que suficiente o contato de forma eventual para que haja risco de contração de doenças. Precedente: TRF1, AC 0033166-94.2006.4.01.3800/MG, Rel. JUIZ FEDERAL RODRIGO RIGAMONTE FONSECA, 1ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DE MINAS GERAIS, e-DJF1 p.844 de 02/06/2015.
Conforme definido na Tese 211 firmada pela TNU, a exposição a agentes biológicos não precisa ser permanente para caracterizar a insalubridade do labor, sendo possível o cômputo do tempo de serviço especial diante do risco de contágio sempre presente, conforme as características do cargo: "Para aplicação do artigo 57, §3.º, da Lei n.º 8.213/91 a agentes biológicos, exige-se a probabilidade da exposição ocupacional, avaliando-se, de acordo com a profissiografia, o seu caráter indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, independente de tempo mínimo de exposição durante a jornada".
DO AGENTE NOCIVO "RUÍDO"
O tempo de trabalho laborado com exposição a ruído é considerado especial nos seguintes níveis: antes do Decreto n. 2.171/97 (até 05/03/1997) acima de 80 decibéis, depois do Decreto n. 2.171/97 e antes do Decreto n. 4.882/2003 (de 06/03/1997 a 18/11/2003) - acima de 90 decibéis e, a partir do Decreto n. 4.882/2003 (de 19/11/2003) acima de 85 decibéis.
O entendimento adotado pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça, em julgamento realizado sob o regime dos recursos especiais repetitivos, é pela impossibilidade de aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003 no que se refere ao agente ruído (REsp 1398260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
Acerca da metodologia utilizada na medição do nível de ruído, a jurisprudência desta Corte tem entendido que, “No PPP não contém informação exata sobre a metodologia empregada na medição do nível de ruído a que estava exposto o segurado, utilizando a simples designação de "dosimetria", mas atesta claramente que o uso de EPI se deu ao longo do tempo, demonstrando que a exposição ao ruído era ininterrupta e não pontual, de forma que não há necessidade de realização de perícia técnica para a comprovação da habitualidade e a permanência”.”(EDAC n. 0054843-34.2016.4.01.3800, Juiz Federal MURILO FERNANDES DE ALMEIDA, 1ª Câmara Regional Previdenciária de Minas Gerais, e-DJF1 07/03/2022).
Também, no julgamento do Tema 1083, em 18/11/2021, a Corte da Legalidade firmou a seguinte tese: "O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço”.
CASO DOS AUTOS
A sentença recorrida julgou procedente o pedido da parte autora, reconhecendo a especialidade das atividades laborais exercidas no período de 08/04/1981 a 27/02/2013, em razão da exposição a agentes biológicos durante o desempenho das funções de coleta de lixo e limpeza pública.
Ao analisar os documentos apresentados, verifica-se que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), emitido pela Limpurb - Empresa de Limpeza Urbana de Salvador (fls. 133/135, rolagem única), comprova que o autor trabalhou na empresa desde 08/04/1981 até 27/02/2013, desempenhando as seguintes funções:
a) “agente de limpeza I” (08/04/1981 a 28/02/1990): executar serviços de coleta de lixo, varrição de ruas, passeios públicos, desentupimentos de boca de lobo, recolhimento de animais mortos, limpeza e lavagem de feiras, praias, avenidas, passeios etc;
b) “agente de limpeza III (01/03/1990 a 31/10/1995): Executar serviços de coleta de lixo, domiciliar, comercial, público e hospitalar em veículos compactadores;
c) “agente de limpeza urbana coletor” (01/11/1995 a 27/02/2013): Executar serviços de coleta de lixo, domiciliar, comercial, público em veículos pesados (caçamba, caminhão etc).
O PPP indica, ainda, que no período de 08/04/1981 e 28/02/1990 o autor esteve exposto a microorganismos e toxinas, enquanto de 01/03/1990 até 31/12/2012 esteve submetido ao agente nocivo ruído com intensidade de 88 decibéis e de 01/01/2013 a emissão do laudo (30/04/2013) esteve submetido ao agente nocivo ruído com intensidade de 85 decibéis.
O INSS reconheceu como especiais os períodos de 01/03/1990 a 05/03/1997 e de 19/11/2003 a 31/12/2012, devido à exposição a níveis de ruído superiores aos limites de tolerância legalmente estabelecidos.
Assim, a controvérsia restringe-se à discussão sobre a especialidade dos períodos de 08/04/1981 a 28/02/1990, 06/03/1997 a 18/11/2003, e 01/2013 a 27/02/2013.
Período: 08/04/1981 a 28/02/1990
Embora a atividade de coletor de lixo não esteja mencionada nos anexos dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79 como especial, pode-se concluir pela existência de insalubridade, periculosidade ou penosidade no trabalho desenvolvido por outros elementos probatórios acostados aos autos, já que o rol das atividades insalubres, perigosas ou penosas é meramente exemplificativo e tendo em vista a notoriedade da insalubridade das atividades exercidas pelo coletor de lixo, por subsunção ao item 1.3.2 do Decreto n. 53.831/64 e ao item 1.3.2 do Anexo I do Decreto n. 83.080/79. Assim, reconhece-se a atividade especial do autor, por enquadramento profissional, até 28/02/1990.
Período: 06/03/1997 a 18/11/2003
O PPP informa que o autor esteve exposto ao agente nocivo ruído em intensidade de 88 dB (NEN) de 01/03/1990 até 31/12/2012. Diante desse cenário, não deve ser reconhecida a especialidade do labor de 06/03/1997 a 18/11/2003 (quando o limite de tolerância do agente físico ruído era de até 90 dB).
Período: 01/2013 a 27/02/2013
O PPP informa que o autor esteve exposto ao agente nocivo ruído em intensidade de 85 dB de 01/01/2013 até 27/02/2013. Diante desse cenário, não deve ser reconhecida a especialidade do labor nesse período (quando o limite de tolerância do agente físico ruído era de até 85 dB).
No caso em questão, ao somar os períodos reconhecidos como laborados em atividade especial (08/04/1981 a 28/02/1990, 01/03/1990 a 05/03/1997 e 19/11/2003 a 31/12/2012), constata-se que o autor totalizou mais de 25 anos de contribuição (25 anos, 0 meses e 10 dias).
Portanto, mesmo que se excluam determinados períodos, permanece o fato de que o autor preenche os requisitos para a concessão da aposentadoria especial desde a Data de Entrada do Requerimento (DER), devendo, assim, ser mantida a sentença recorrida.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral (Tema 810), e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905). “Nos termos do art. 3° da Emenda Constitucional nº113/2021, após 8/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação de mora até o efetivo pagamento” (AC 1017905-06.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS, TRF1 - NONA TURMA, PJe 26/03/2024).
Dessa forma, não merece reparo a sentença que determinou a incidência de consectários nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal.
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, NÃO CONHEÇO da remessa necessária e NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS, nos termos acima explicitados.
Honorários advocatícios majorados na fase recursal em R$2.000,00 (dois mil reais), além do montante já fixado pelo Juízo de origem (art. 85, §11, CPC).
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1003625-58.2017.4.01.3300
ASSISTENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
ASSISTENTE: EDVALDO CICERO DOS SANTOS
Advogado do(a) ASSISTENTE: MOISES SANTANA BARRETO - BA35256-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA. APOSENTADORIA ESPECIAL. EXPOSIÇÃO AOS AGENTES NOCIVOS BIOLÓGICOS E RUÍDO. ENCARGOS MORATÓRIOS. APELAÇÃO DO INSS NÃO PROVIDA
1. Não se sujeita à remessa necessária a sentença – proferida na vigência do CPC/2015 – que condena a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público em quantia inferior a mil salários mínimos (CPC, art. 496, § 3º, I).
2. A atividade profissional com exposição a agentes biológicos (contato direto com germes infecciosos ou suas toxinas, animais ou pessoas doentes ou materiais infecto-contagiantes) é considerada nociva, conforme códigos 1.3.1 e 1.3.2 do Anexo do Decreto 53.831/1964; códigos 1.3.1 a 1.3.5 do Anexo I do Decreto 83.080/1979; código 3.0.1 do Anexo IV do Decreto 2.172/1997; e código 3.0.1 do Anexo IV do Decreto 3.048/1999.
3. Para o agente nocivo biológico não há estabelecimento de nível máximo de tolerância pela legislação de regência, bastando a simples constatação de sua presença (análise qualitativa) para ser caracterizada a nocividade, bem assim a exposição não precisa ocorrer durante toda a jornada de trabalho, uma vez que suficiente o contato de forma eventual para que haja risco de contração de doenças. Precedente: TRF1, AC 0033166-94.2006.4.01.3800/MG, Rel. JUIZ FEDERAL RODRIGO RIGAMONTE FONSECA, 1ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DE MINAS GERAIS, e-DJF1 p.844 de 02/06/2015.
4. Conforme definido na Tese 211 firmada pela TNU, a exposição a agentes biológicos não precisa ser permanente para caracterizar a insalubridade do labor, sendo possível o cômputo do tempo de serviço especial diante do risco de contágio sempre presente, conforme as características do cargo: "Para aplicação do artigo 57, §3.º, da Lei n.º 8.213/91 a agentes biológicos, exige-se a probabilidade da exposição ocupacional, avaliando-se, de acordo com a profissiografia, o seu caráter indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, independente de tempo mínimo de exposição durante a jornada".
5. O tempo de trabalho laborado com exposição a ruído é considerado especial nos seguintes níveis: antes do Decreto n. 2.171/97 (até 05/03/1997) acima de 80 decibéis, depois do Decreto n. 2.171/97 e antes do Decreto n. 4.882/2003 (de 06/03/1997 a 18/11/2003) - acima de 90 decibéis e, a partir do Decreto n. 4.882/2003 (de 19/11/2003) acima de 85 decibéis.
6. Caso em que a sentença recorrida julgou procedente o pedido da parte autora, reconhecendo a especialidade das atividades laborais exercidas no período de 08/04/1981 a 27/02/2013, em razão da exposição a agentes biológicos durante o desempenho das funções de coleta de lixo e limpeza pública.
7. Ao analisar os documentos apresentados, verifica-se que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), emitido pela Limpurb - Empresa de Limpeza Urbana de Salvador (fls. 133/135, rolagem única), comprova que o autor trabalhou na empresa desde 08/04/1981 até 30/04/2013, desempenhando as seguintes funções: a) “agente de limpeza I” (08/04/1981 a 28/02/1990); b) “agente de limpeza III (01/03/1990 a 31/10/1995); c) “agente de limpeza urbana coletor” (01/11/1995 a 27/02/2013).
8. O INSS reconheceu como especiais os períodos de 01/03/1990 a 05/03/1997 e de 19/11/2003 a 31/12/2012, devido à exposição a níveis de ruído superiores aos limites de tolerância legalmente estabelecidos. Assim, a controvérsia restringe-se à discussão sobre a especialidade dos períodos de 08/04/1981 a 28/02/1990, 06/03/1997 a 18/11/2003, e 01/2013 a 27/02/2013.
9. Período: 08/04/1981 a 28/02/1990: embora a atividade de coletor de lixo não esteja mencionada nos anexos dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79 como especial, pode-se concluir pela existência de insalubridade, periculosidade ou penosidade no trabalho desenvolvido por outros elementos probatórios acostados aos autos, já que o rol das atividades insalubres, perigosas ou penosas é meramente exemplificativo e tendo em vista a notoriedade da insalubridade das atividades exercidas pelo coletor de lixo, por subsunção ao item 1.3.2 do Decreto n. 53.831/64 e ao item 1.3.2 do Anexo I do Decreto n. 83.080/79. Assim, reconhece-se a atividade especial do autor, por enquadramento profissional, até 28/02/1990.
10. Período: 06/03/1997 a 18/11/2003: o PPP informa que o autor esteve exposto ao agente nocivo ruído em intensidade de 88 dB (NEN) de 01/03/1990 até 31/12/2012. Diante desse cenário, não deve ser reconhecida a especialidade do labor de 06/03/1997 a 18/11/2003 (quando o limite de tolerância do agente físico ruído era de até 90 dB).
11. Período: 01/2013 a 27/02/2013: o PPP informa que o autor esteve exposto ao agente nocivo ruído em intensidade de 85 dB de 01/01/2013 até 27/02/2013. Diante desse cenário, não deve ser reconhecida a especialidade do labor nesse período (quando o limite de tolerância do agente físico ruído era de até 85 dB).
12. Ao somar os períodos reconhecidos como laborados em atividade especial (08/04/1981 a 28/02/1990, 01/03/1990 a 05/03/1997 e 19/11/2003 a 31/12/2012), constata-se que o autor totalizou mais de 25 anos de contribuição (25 anos, 0 meses e 10 dias). Portanto, mesmo que se excluam determinados períodos, permanece o fato de que o autor preenche os requisitos para a concessão da aposentadoria especial desde a Data de Entrada do Requerimento (DER), devendo, assim, ser mantida a sentença recorrida.
13. As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral (Tema 810), e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905). “Nos termos do art. 3° da Emenda Constitucional nº113/2021, após 8/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação de mora até o efetivo pagamento” (AC 1017905-06.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS, TRF1 - NONA TURMA, PJe 26/03/2024).
14. Remessa necessária não conhecida. Apelação não provida.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
