
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARIA IZABEL TORRES DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: CLEBER ROBSON DA SILVA - GO21337-A
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

Gab. 25 - DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO
PROCESSO: 1032232-87.2022.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000501-10.2022.8.27.2732
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARIA IZABEL TORRES DA SILVA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: CLEBER ROBSON DA SILVA - GO21337-A
RELATOR: URBANO LEAL BERQUO NETO
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS em face de sentença que julgou procedente a pretensão para concessão de benefício de salário-maternidade de trabalhadora rural.
Em suas razões, requer a reforma da sentença para que seja julgado improcedente o pedido, ao argumento de que a apelada não se enquadra na categoria de segurada especial. Discorre que a apelada possui empresa cadastrada em seu nome (empresário individual - ME), descaracterizando o regime de economia familiar. Sustenta, ainda, ausência de prova material válida.
A apelada apresentou contrarrazões.
Com vistas dos autos, o Ministério Público Federal manifestou-se pelo desprovimento da apelação.
É o relatório.

Gab. 25 - DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO
PROCESSO: 1032232-87.2022.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000501-10.2022.8.27.2732
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARIA IZABEL TORRES DA SILVA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: CLEBER ROBSON DA SILVA - GO21337-A
RELATOR: URBANO LEAL BERQUO NETO
V O T O
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Diante da inexistência de preliminares ou/e defesa indireta de mérito, mister a depuração, de pronto, do cerne da pretensão, ora vertida em base recursal, lembrando que se trata de conflito de interesses condizente ao salário maternidade.
O benefício de salário-maternidade é devido à segurada especial que atender aos requisitos estabelecidos na Lei 8.213/91 (art. 25, III) e no § 2º do art. 93 do Regulamento aprovado pelo Decreto 3.048/99: exercício de atividade rural nos últimos dez meses imediatamente anteriores à data do parto ou do requerimento do benefício, quando requerido antes do parto, mesmo que de forma descontínua.
A concessão do benefício pleiteado pela parte autora, portanto, exige a demonstração do trabalho rural no prazo mínimo de 10 (dez) meses, ainda que descontínuos, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena, inadmissível a prova exclusivamente testemunhal.
No que tange à caracterização da condição de segurada especial, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Jurisprudência, firmou o entendimento de que para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalho rural, apesar de não haver exigência legal de que o documento apresentado como início de prova material abranja todo o período que se busca comprovar, é preciso que tal prova seja contemporânea ao menos por uma fração do lapso de trabalho rural pretendido (Pet 7.475/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 09/11/2016, DJe 29/11/2016).
É pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
São idôneos, portanto, dentre outros, a ficha de alistamento militar, o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado (STJ, AgRG no REsp 939191/SC); a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF); certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR 1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR 3202/CE).
Igualmente aceitáveis documentos tais como certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que indiciem a ligação da parte autora com o trabalho e a vida no meio rural, bem como a CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora, que é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (REsp 310.264/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves da Silva, Segunda Turma, e-DJF1 p.33 de 17/07/2008, AC 0004262-35.2004.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal Miguel Ângelo de Alvarenga Lopes, 3ª Turma Suplementar, e-DJF1 p.191 de 02/03/2011).
No caso dos autos, argumenta o INSS que a autora não faz jus ao benefício do salário maternidade ao argumento de que esta não se enquadra na qualidade de segurada especial.
No entanto, verifico que a autora juntou como início de prova material diversos documentos que demonstram que sempre laborou no meio rural: certidão de nascimento de sua filha M. A. T. M, em virtude da qual se postula o benefício, lavrada em 30/11/2020, onde consta a qualificação dos genitores como lavradores e indicação do endereço rural, a certidão de nascimento dos seus filhos Y. S. T. e M. D. T. M., nascidos em 2014 e 2016, com a qualificação dos genitores como lavradores.
Registre-se, por oportuno, que em consonância com entendimento do STJ, os dados constantes nas certidões de vida civil são hábeis a comprovação da condição de rurícola para fins previdenciários, em especial quando inexiste qualquer indicativo de fraude que macule o seu conteúdo.
Com efeito, diante das dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores rurais para comprovar o exercício de atividade rurícola, em razão das peculiaridades inerentes ao meio campestre, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem adotado a solução pro mísero em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de segurada, desde que acompanhada de início de prova material, situação externada, neste particular.
Dessa forma, não há que se falar em ausência de prova material válida, pois a certidão de nascimento constando o endereço rural comum e a qualificação rural dos genitores como lavradores, é amplamente aceita pela jurisprudência como início de prova material válida, revestido de formalidades e segurança jurídica, e contemporânea ao período de carência pretendido.
Quanto à tese aventada de que a apelada possui empresa cadastrada em seu nome (empresário individual - ME), o que seria suficiente a descaracterizar a alegada condição de segurada especial, tal tese, não pode ser levada em consideração no julgamento do presente recurso, pois, referida informação não foi levada a conhecimento do Juízo "a quo", ou seja, não houve juntada da prova durante a instrução processual. Nos termos do art. 1.014 do CPC, “as questões de fato não propostas no juízo inferior poderão ser suscitadas na apelação, se a parte provar que deixou de fazê-lo por motivo de força maior”.
A inovação em sede recursal caracteriza-se, portanto, como supressão de instância, motivo pelo qual a matéria, que não foi submetida ao crivo do juízo primevo, não tendo sido decidida na sentença, não pode ser analisada pelo Tribunal, sob pena de ofensa aos princípios constitucionais do devido processo legal, do duplo grau de jurisdição, do contraditório e da ampla defesa.
Posto isto, CONHEÇO EM PARTE DO RECURSO E, NO QUE FOI CONHECIDO, NEGO PROVIMENTO.
Majoro os honorários sucumbenciais para 11% do valor da condenação, eis que aumento o percentual antes fixado na sentença em um ponto percentual.
É o voto.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator

Gab. 25 - DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO
PROCESSO: 1032232-87.2022.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000501-10.2022.8.27.2732
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARIA IZABEL TORRES DA SILVA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: CLEBER ROBSON DA SILVA - GO21337-A
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. SALÁRIO-MATERNIDADE. INOVAÇÃO PROCESSUAL EM FASE RECURSAL. VEDAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO DE MATÉRIA NÃO LEVADA AO JUÍZO A QUO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL VÁLIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.
1. Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSS em face de sentença que julgou procedentes os pedidos para, reconhecendo a qualidade de segurada especial da autora, assegurar-lhe a percepção do salário maternidade. Em suas razões, a Autarquia sustenta a existência de empresa cadastrada em nome da apelada (empresário individual - ME), o que seria suficiente a descaracterizar a alegada condição de segurada especial.
2. A juntada à apelação de documentos não anexados na fase de conhecimento infringe diretamente o disposto no art. 1.014 do CPC, já que não levado a conhecimento do magistrado a quo, tampouco se tratando de fato superveniente à sentença. Recurso não conhecido no que se refere à suposta existência de empresa em nome da apelada.
3. O benefício de salário-maternidade é devido à segurada especial que atender aos requisitos estabelecidos na Lei 8.213/91 (art. 25, III) e no § 2º do art. 93 do Decreto 3.048/99. A demonstração do trabalho rural no prazo mínimo de 10 (dez) meses, ainda que descontínuos, deve ser comprovado mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena, inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF/1ª Região, Súmula 27).
4. O rol de documentos do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos, tais como, na forma dos autos, a certidão de nascimento da filha Maria Alice Torres Monteiro, com a qualificação dos genitores como lavradores e indicação do endereço rural, lavrada em 30/11/2020.
5. Em consonância com entendimento do STJ os dados constantes nas certidões de vida civil são hábeis a comprovação da condição de rurícola para fins previdenciários, em especial quando inexiste qualquer indicativo de fraude que macule o seu conteúdo. Com efeito, diante das dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores rurais para comprovar o exercício de atividade rural, em razão das peculiaridades inerentes ao meio campestre, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem adotado a solução "pro misero", em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de segurada, desde que acompanhada de início de prova material, situação externada, neste particular.
6. Considerando que o referido documento não aponta inconsistência com relação à prova testemunhal e demais elementos de prova dos autos, deve ser considerado documento apto a constituir o início de prova material.
7. Apelação conhecida em parte e, no que foi conhecida, improvida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, CONHECER EM PARTE DA APELAÇÃO E, NO QUE FOI CONHECIDA, NEGAR PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator
