
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ANTONIO JOSE DOS SANTOS
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: CEZAR AUGUSTO PACIFICO DE PAULA MAUX - MA9187-A
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1033356-42.2021.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 0803872-26.2019.8.10.0048
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR JUIZ FEDERAL WENDELSON PEREIRA PESSOA (RELATOR CONVOCADO):
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSS em face da sentença que julgou procedente o pedido da inicial e concedeu a parte autora o benefício de auxílio-doença a partir da data em que o benefício foi indeferido.
O apelante alega ausência de qualidade de segurada especial da autora, visto que os documentos apresentados pela autora para comprovar o exercício da atividade rural não foram corroborados por prova testemunhal. Além de constar vínculo urbano em aberto no CNIS do autor. Por fim, requer, caso mantida a sentença, que seja reformada a sentença para concessão do benefício de auxílio-doença tendo em vista a incapacidade parcial e permanente constada no laudo e a pouca idade da requerente (44 anos).
A parte apelada, ANTÔNIO JOSÉ DOS SANTOS, apresentou contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1033356-42.2021.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 0803872-26.2019.8.10.0048
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
V O T O
O EXMO. SENHOR JUIZ FEDERAL WENDELSON PEREIRA PESSOA (RELATOR CONVOCADO):
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Auxílio-doença e aposentadoria por invalidez
Conforme disposto no art. 59 e 60, § 1º, da Lei 8.213/91, o auxílio-doença será devido ao segurado que ficar incapacitado temporariamente para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos. Será devido ao segurado empregado desde o início da incapacidade e, ao segurado que estiver afastado da atividade por mais de trinta dias, a partir da entrada do requerimento.
A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que estiver ou não em gozo de auxílio-doença e comprovar, por exame médico-pericial, a incapacidade total e definitiva para o trabalho e for considerado insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo devida a partir do dia imediato ao da cessação do auxílio-doença, nos termos do art. 42 e 43 da Lei 8.213/91.
Requisitos
A concessão de benefício previdenciário por invalidez requer o preenchimento de dos requisitos: qualidade de segurado, cumprimento de carência (segurado urbano) e incapacidade para o trabalho ou para a atividade habitual por mais de quinze dias.
A qualidade de segurado é a condição atribuída aos filiados do INSS que contribuem para a Previdência Social na forma de empregado, trabalhador avulso, contribuinte individual ou facultativo, empregado doméstico e segurado especial.
Qualidade de Segurado Rural
Diante das dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores rurais para comprovar o exercício de atividade rurícola, em razão das peculiaridades inerentes ao meio campestre, a jurisprudência do e. STJ tem adotado a solução pro misero, em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de agricultor, desde que acompanhada de início de prova material.” (AR 4041/SP, relator Ministro Jorge Mussi, revisor Ministro Sebastião Reis Junior, Terceira Seção, DJe 05/10/2018).
Conquanto inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª. Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34). Ressalte-se o teor da Súmula 577 do STJ: “É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob contraditório.”
É pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
São idôneos, portanto, dentre outros: a ficha de alistamento militar, o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado; a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições; o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF); certidão de casamento, de nascimento de filho e de óbito, que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público/INSS.
Igualmente aceitáveis documentos tais como certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que indiciem a vinculação da parte autora com o trabalho e a vida no meio rural.
Situação tratada
A concessão de benefício previdenciário requer o cumprimento de ambos os requisitos, qualidade de segurado e incapacidade laboral. A ausência de um deles prejudica a análise do outro.
No caso dos autos, o juízo da origem julgou procedente a ação e condenou o INSS a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por invalidez, comprovada a qualidade de segurada especial do autor com base nos documentos apresentados, sem confirmação por prova testemunhal, o que configura cerceamento de defesa, vez que, ao ser julgado o exame interposto, a sentença de primeiro grau pode ser mantida ou reformada, nesta segunda hipótese inclusive por insuficiência de prova.
O requerente apresentou requerimento administrativo em 03.07.2017 (fl. 65).
Conforme laudo médico pericial (fl. 35) o autor (44 anos, ensino fundamental incompleto, lavrador) é portador de sequela de traumatismos do membro superior (CID T92), teve amputação da falange distal e medial do 2º quirodáctilo direito. Apresenta incapacidade definitiva para atividade profissional atual e parcial, ou seja, é suscetível de reabilitação ou readaptação para outra atividade profissional. Por fim, anotou o médico perito que a incapacidade teve início em 14.02.2020.
Com objetivo de demonstrar o exercício da atividade rural a autora anexou aos autos os seguintes documentos: certidão eleitoral, emitida em 09.05.2014, em que consta a ocupação de agricultor do autor; certidão de casamento, porém não consta a profissão; recibo de pagamento, data de 28.05.2014, do sindicato rural em que consta a filiação em 20.06.1998. No entanto, não foi apresentada provas testemunhais.
Portanto, tais documentos são insuficientes para o início de prova material da condição do autor de segurado especial, é essencial a produção de prova testemunhal para o deslinde do caso, conforme entendimento jurisprudencial deste Tribunal. Precedente no mesmo sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. INSURGÊNCIA DE MÉRITO DO INSS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ROL DE TESTEMUNHAS INTEMPESTIVO. COMPARECIMENTO EM AUDIÊNCIA. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. INADMISSIBILIDADE. SENTENÇA ANULADA. 1. A comprovação da qualidade de trabalhador rural ocorre mediante início de prova material devidamente corroborado pela prova testemunhal produzida em juízo, bem assim a implementação do requisito etário exigido. 2. Na hipótese, o rol de testemunhas foi apresentado na data designada para a realização audiência, razão pela qual deixaram de ser inquiridas pelo juízo a quo. 3. Todavia, as testemunhas compareceram espontaneamente à audiência, independentemente de intimação, suprindo, portanto, a necessidade de cumprimento do prazo estabelecido pelo art. 357, § 4º, do NCPC. 4. A oitiva de testemunhas constitui prova imprescindível para a solução da lide. Assim, a não apresentação do rol de testemunhas no prazo legal não implica na preclusão de sua produção, uma vez que podem ser produzidas em audiência de instrução e julgamento, se comparecem junto à parte autora no dia de sua realização (AC 0033205-20.2011.4.01.9199/MG, Rel. Des. Federal Mônica Sifuentes, 2ª TURMA, e-DJF1 p.658 de 15/08/2012). 5. A sentença de improcedência do pedido fundada na ausência de prova oral deve ser anulada, eis que a oitiva de testemunhas em juízo é necessária ao julgamento de ação previdenciária de aposentadoria rural por idade, quando presente apenas início de prova material da condição rurícola, caracterizando, dessa forma, cerceamento de defesa. 6. Apelação provida para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem para regular produção de prova oral e processamento do feito.
(AC 1000869-87.2019.4.01.9999, Des. Fed. CÉSAR JATAHY, Segunda Turma, PJe 01/03/2021)
Desse modo, deve ser anulada a sentença, para oportunizar a parte autora a produção da prova testemunhal, para fins de comprovação do requisito legal da qualidade de segurada, na condição alegada de trabalhador rural.
Conclusão
Ante o exposto, dou provimento à apelação do INSS para anular a sentença com o retorno dos autos à origem para a produção de prova testemunhal.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1033356-42.2021.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 0803872-26.2019.8.10.0048
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO JOSE DOS SANTOS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. TRABALHADOR RURAL. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO. AUSÊNCIA DE PRODUÇÃO DA PROVA ORAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE DA SENTENÇA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM.
1. A concessão de benefício por invalidez ao trabalhador rural, quando a qualidade de segurado não for demonstrada por prova plena (art. 39, inc. I c/c art. 55, § 3º da Lei 8.213/91), exige-se início de prova material corroborada por prova testemunhal idônea.
2. No caso, o juízo da origem julgou procedente a ação e condenou o INSS a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por invalidez, considerando comprovada a qualidade de segurada especial da autora com base nos documentos apresentados, sem confirmação por prova testemunhal.
3. Como prova da qualidade de segurada, a parte autora juntou aos autos certidão eleitoral, emitida em 09.05.2014, em que consta a ocupação de agricultor do autor; certidão de casamento, porém não consta a profissão; recibo de pagamento, data de 28.05.2014, do sindicato rural em que consta a filiação em 20.06.1998. Tais documentos não são provas irrefutáveis do alegado trabalhado rural, carecendo de prova testemunhal a corroborar os fatos alegados.
4. A prova testemunhal é condição para a concessão de benefício previdenciário na condição de segurada especial da parte autora, porquanto inexistente prova plena de tal situação nos autos, o que configura o cerceamento de defesa e, por consequência, deve ser anulada a sentença.
5. Apelação do INSS provida, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para produção da prova testemunhal faltante e prosseguimento regular do feito.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da assinatura eletrônica.
Juiz Federal WENDELSON PEREIRA PESSOA
Relator convocado
