
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:DALVA FIDELES DA SILVA CAMARGO
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: GUIDO REZENDE CAMARGO FIDELIS - GO52019-A
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1002628-18.2021.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 5280950-85.2019.8.09.0081
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR JUIZ FEDERAL RODRIGO GASIGLIA DE SOUZA (RELATOR CONVOCADO):
A autora, DALVA FIDELES DA SILVA CAMARGO, ajuizou a presente ação, em face do INSS, objetivando o benefício previdenciário de auxílio-doença com pedido liminar.
Em sentença proferida, o Magistrado de primeiro grau julgou procedente o pedido da inicial e concedeu a parte autora o benefício de auxílio-doença na qualidade de segurado especial a partir da data do requerimento administrativo.
O apelante/INSS alegar ausência da qualidade de segurado especial, visto que inexiste nos autos prova material da atividade rural em regime de economia familiar na data de início da incapacidade, que deverá ser considerada a data de elaboração do laudo, devido a não fixação da data de início da incapacidade no laudo médico pericial.
A parte apelada apresentou contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1002628-18.2021.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 5280950-85.2019.8.09.0081
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
V O T O
O EXMO. SENHOR JUIZ FEDERAL RODRIGO GASIGLIA DE SOUZA (RELATOR CONVOCADO):
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Concessão de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez
Conforme disposto nos arts. 59 e 60, § 1º, da Lei 8.213/91, o auxílio-doença será devido ao segurado que ficar incapacitado temporariamente para o trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos. Será devido ao segurado empregado desde o início da incapacidade e, ao segurado que estiver afastado da atividade por mais de trinta dias, a partir da entrada do requerimento.
A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que estiver ou não em gozo de auxílio-doença e comprovar, por exame médico-pericial, a incapacidade total e definitiva para o trabalho e for considerado insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência. Será devida a partir do dia imediato ao da cessação do auxílio-doença, nos termos do art. 42 e 43 da Lei de Regência.
Requisitos – trabalhador rural
A concessão de benefício previdenciário por invalidez requer o preenchimento de requisitos: qualidade de segurado e incapacidade para o trabalho ou para a atividade habitual por mais de quinze dias.
A qualidade de segurado é a condição atribuída aos filiados do INSS que contribuem para a Previdência Social na forma de empregado, trabalhador avulso, contribuinte individual ou facultativo, empregado doméstico e segurado especial.
Consoante disposto no art. 26, III, da Lei 8.213/91, a concessão auxílio-doença e aposentadoria por invalidez ao segurado especial não dependem do cumprimento de carência. Porém, quando a qualidade de segurado não for demonstrada por prova plena (arts. 26, III; 39, inc. I c/c art. 55, § 3º da Lei 8.213/91), exige-se início de prova material corroborada por prova testemunhal idônea.
A jurisprudência se consolidou no sentido de que a concessão de benefício por incapacidade anterior comprova a qualidade de segurado do requerente, salvo se ilidida por prova contrária.
Qualidade de Segurado Rural
Diante das dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores rurais para comprovar o exercício de atividade rurícola, em razão das peculiaridades inerentes ao meio campestre, a jurisprudência do e. STJ tem adotado a solução pro misero, em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de agricultor, desde que acompanhada de início de prova material. (AR 4041/SP, relator Ministro Jorge Mussi, revisor Ministro Sebastião Reis Junior, Terceira Seção, DJe 05/10/2018).
Conquanto inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª. Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34). Ressalte-se o teor da Súmula 577 do STJ: “É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob contraditório.”
É pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
São idôneos, portanto, dentre outros: a ficha de alistamento militar, o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado; a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições; o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF); certidão de casamento, de nascimento de filho e de óbito, que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público/INSS.
Igualmente aceitáveis documentos tais como certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que indiciem a vinculação da parte autora com o trabalho e a vida no meio rural.
Situação apresentada
Incapacidade não contestada no recurso, há controvérsia quanto à ausência da qualidade de segurado especial.
A autora apresentou requerimento administrativo em 27.03.2019 (fl. 17).
O laudo pericial (fl. 105), realizado em 10.09.2019, atestou que a autora (55 anos, ensino fundamental incompleto, lavradora) apresenta incapacidade temporária e total para o labor, desde março de 2019, por 18 meses, em razão de bursite no ombro direito moderado.
Com objetivo de demonstrar o exercício da atividade rural, a autora anexou aos autos (fl. 18) escritura Pública de Inventário e Partilha, registrada em 08.08.2016, na qual demonstrou-se que a autora recebeu em pagamento de seu quinhão, correspondente a sua legítima e acrescido da parte que comprou, o seguinte imóvel: um imóvel rural denominado Rancho Grande (gleba 2), no município de Jaraguá/GO, com área de 14,52 hectares; certidão de casamento, realizado em 12.09.1985, em que consta a profissão do cônjuge de agropecuarista e da autora estudante; as certidões de nascimento de Felipe Resende de Camargo e Jesus Gabriel Fidelis de Camargo, datadas de 20.12.1985 e 03.06.1987, demonstram a profissão do cônjuge de agropecuarista e da autora do lar. Além disso, anexou aos autos (fl. 70) declaração de aptidão ao Pronaf, emitida pela Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento –SEAGRO- em 10.05.2010, a qual consta atividade principal de agricultor/pecuarista da família e filiação ao Sindicato Rural de Contag e, por fim, a parte autora demonstrou que foi concedido benefício de Aposentadoria por idade Rural nos autos de nº 1597-48.2019.4.01.3500 (com trânsito em julgado em 05/06/2019) ao seu esposo Wellington Rezende Camargo.
Desse modo, não assiste razão o INSS em sua apelação, pois restou comprovado que na data de início da incapacidade (03.2019) atestada no laudo pericial, a parte autora detinha a qualidade de segurada especial, de modo que restou configurada por meio dos mencionados documentos, corroborados por prova testemunhal produzida em juízo (ID 95605016).
Convém ressaltar que, conforme construção jurisprudencial desta Corte, são aceitos, como início de prova material, os documentos em nome de outros membros da família, inclusive cônjuge ou genitor, que o qualificam como lavrador, desde que acompanhados de robusta prova testemunhal (AgRg no AREsp 188.0591MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, DJe 11/09/2012).
Assim, comprovada a qualidade de segurado especial da autora e a sua incapacidade temporária, deve ser mantida a sentença que lhe concedeu o benefício de auxílio-doença.
Honorários recursais
Nos termos do julgamento do REsp 1.864.633/RS, que tramitou sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.059 do STJ), a majoração dos honorários de sucumbência pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido, como no caso dos autos, desse modo, conforme disposição o art. 85, § 11, do CPC/2015, os honorários devem ser majorados em dois pontos percentuais.
Conclusão
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1002628-18.2021.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 5280950-85.2019.8.09.0081
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DALVA FIDELES DA SILVA CAMARGO
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. TRABALHADOR RURAL. AUXÍLIO-DOENÇA. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL COMPROVADA. PROVA DOCUMENTAL CORROBORADA POR PROVA ORAL. PROVA TÉCNICA. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. APELAÇÃO DO INSS NÃO PROVIDA.
1. Incapacidade não contestada no recurso, há controvérsia quanto à ausência da qualidade de segurado especial.
2. Conforme disposto nos arts. 59 e 60, § 1º, da Lei 8.213/91, o auxílio-doença será devido ao segurado que ficar incapacitado temporariamente para o trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos. Será devido ao segurado empregado desde o início da incapacidade e, ao segurado que estiver afastado da atividade por mais de trinta dias, a partir da entrada do requerimento.
3. Consoante disposto no art. 26, III, da Lei 8.213/91, a concessão auxílio-doença e aposentadoria por invalidez ao segurado especial não dependem do cumprimento de carência. Porém, quando a qualidade de segurado não for demonstrada por prova plena (arts. 26, III; 39, inc. I c/c art. 55, § 3º da Lei 8.213/91), exige-se início de prova material corroborada por prova testemunhal idônea.
4. É pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos. São idôneos, portanto, dentre outros: a ficha de alistamento militar, o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado; a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições; o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF); certidão de casamento, de nascimento de filho e de óbito, que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público/INSS. Igualmente aceitáveis documentos tais como certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que indiciem a vinculação da parte autora com o trabalho e a vida no meio rural.
5. O laudo pericial realizado em 10.09.2019, atestou que a autora (55 anos, ensino fundamental incompleto, lavradora) apresenta incapacidade temporária e total para o labor, desde março de 2019, por 18 meses, em razão de bursite no ombro direito moderado.
6. Com objetivo de demonstrar o exercício da atividade rural, a autora anexou aos autos escritura Pública de Inventário e Partilha, registrada em 08.08.2016, na qual demonstrou-se que a autora recebeu em pagamento de seu quinhão, correspondente a sua legítima e acrescido da parte que comprou, o seguinte imóvel: um imóvel rural denominado Rancho Grande (gleba 2), no município de Jaraguá/GO, com área de 14,52 hectares; certidão de casamento, realizado em 12.09.1985, em que consta a profissão do cônjuge de agropecuarista e da autora estudante; as certidões de nascimento de Felipe Resende de Camargo e Jesus Gabriel Fidelis de Camargo, datadas de 20.12.1985 e 03.06.1987, demonstram a profissão do cônjuge de agropecuarista e da autora do lar. Além disso, anexou aos autos declaração de aptidão ao Pronaf, emitida pela Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento –SEAGRO- em 10.05.2010, a qual consta atividade principal de agricultor/pecuarista da família e filiação ao Sindicato Rural de Contag e, por fim, a parte autora demonstrou que foi concedido benefício de Aposentadoria por idade Rural, em 05/06/2019, ao seu esposo Wellington Rezende Camargo.
7. Não assiste razão o INSS em sua apelação, pois restou comprovado que na data de início da incapacidade (03.2019) atestada no laudo pericial, a parte autora detinha a qualidade de segurada especial, de modo que restou configurada por meio dos mencionados documentos, corroborados por prova testemunhal produzida em juízo.
8. Comprovada a qualidade de segurado especial da autora e a sua incapacidade temporária, deve ser mantida a sentença que lhe concedeu o benefício de auxílio-doença.
9. Honorários de advogado majorados em dois pontos percentuais, nos termos do art. 85, §11, do CPC/2015 e da tese fixada no Tema 1.059/STJ.
10. Apelação do INSS não provida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Juiz Federal RODRIGO GASIGLIA DE SOUZA
Relator Convocado
