
POLO ATIVO: LUCINEIA FERNANDES
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: IVAIR BUENO LANZARIN - MT8029-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1024588-64.2020.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 1003512-88.2019.8.11.0013
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR JUIZ FEDERAL RODRIGO GASIGLIA DE SOUZA (RELATOR CONVOCADO):
Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora, LUCINEIA FERNANDES, em face da sentença que julgou improcedente o pedido da inicial do benefício de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
O apelante alega que é devido a concessão do benefício de auxílio-doença, porquanto o laudo pericial atestou sua incapacidade parcial e permanente. Bem como, sustenta que restou configurada a qualidade de segurado especial do autor, tendo em vista as provas anexadas aos autos que evidenciam o efetivo exercício da atividade rural. Requer o restabelecimento do auxílio-doença com sua conversão em aposentadoria por invalidez ou, caso necessário, a anulação da sentença para produção de prova testemunhal.
A parte apelada/INSS não apresentou contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1024588-64.2020.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 1003512-88.2019.8.11.0013
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
V O T O
O EXMO. SENHOR JUIZ FEDERAL RODRIGO GASIGLIA DE SOUZA (RELATOR CONVOCADO):
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Concessão de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez
Conforme disposto no art. 59 e 60, § 1º, da Lei 8.213/91, o auxílio-doença será devido ao segurado que ficar incapacitado temporariamente para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos. Será devido ao segurado empregado desde o início da incapacidade e, ao segurado que estiver afastado da atividade por mais de trinta dias, a partir da entrada do requerimento.
A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que estiver ou não em gozo de auxílio-doença e comprovar, por exame médico-pericial, a incapacidade total e definitiva para o trabalho e for considerado insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo devida a partir do dia imediato ao da cessação do auxílio-doença, nos termos do art. 42 e 43 da Lei 8.213/91.
Requisitos – trabalhador rural
A concessão de benefício previdenciário por invalidez requer o preenchimento de dos requisitos: qualidade de segurado e incapacidade para o trabalho ou para a atividade habitual por mais de quinze dias.
A qualidade de segurado é a condição atribuída aos filiados do INSS que contribuem para a Previdência Social na forma de empregado, trabalhador avulso, contribuinte individual ou facultativo, empregado doméstico e segurado especial.
Consoante disposto no art. 26, III, da Lei 8.213/91, a concessão auxílio-doença e aposentadoria por invalidez ao segurado especial não dependem do cumprimento de carência. Porém, quando a qualidade de segurado não for demonstrada por prova plena (arts. 26, III; 39, inc. I c/c art. 55, § 3º da Lei 8.213/91), exige-se início de prova material corroborada por prova testemunhal idônea.
Qualidade de Segurado Rural
Diante das dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores rurais para comprovar o exercício de atividade rurícola, em razão das peculiaridades inerentes ao meio campestre, a jurisprudência do e. STJ tem adotado a solução pro misero, em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de agricultor, desde que acompanhada de início de prova material.” (AR 4041/SP, relator Ministro Jorge Mussi, revisor Ministro Sebastião Reis Junior, Terceira Seção, DJe 05/10/2018).
Conquanto inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª. Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34). Ressalte-se o teor da Súmula 577 do STJ: “É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob contraditório.”
É pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
São idôneos, portanto, dentre outros: a ficha de alistamento militar, o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado; a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições; o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF); certidão de casamento, de nascimento de filho e de óbito, que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público/INSS.
Igualmente aceitáveis documentos tais como certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que indiciem a vinculação da parte autora com o trabalho e a vida no meio rural.
Situação apresentada
A concessão de benefício previdenciário requer o cumprimento de ambos os requisitos, qualidade de segurado e incapacidade laboral. A ausência de um deles prejudica a análise do outro.
A requerente apresentou requerimento administrativo em 25.04.2016, fundamentado em ausência de incapacidade laborativa (fl. 114).
Com objetivo de demonstrar o exercício da atividade rural a autora anexou aos autos (fls. 68- 84) os seguintes documentos: nota fiscal de compra de 2013 com endereço rural da autora; declaração de exercício de atividade rural, início em 05.01.2005, expedido pelo sindicato de trabalhadores rurais em 23.05.2016; contrato de comodato de imóvel rural (registrado em 21.07.2015) pelo prazo de 10 anos, tendo início em 02.07.2015; certificado de cadastro de imóvel rural –CCIR- referente aos exercícios de 2010 a 2014; certidão de nascimentos dos filhos constando a profissão de lavrador dos genitores; Escritura pública (ano 2005) de declaração de união estável em que consta a profissão da autora como sendo lavradora; contribuição sindical rural.
Desse modo, tais documentos servem de início material da alegada atividade rural, pois configuram prova plena da qualidade de segurado especial da autora na data do requerimento administrativo.
Quanto à incapacidade, o laudo pericial (fl. 48) atestou que “a Autora é portadora de uma dor crônica na coluna devido alterações degenerativas e uma hérnia de disco sem indicação cirúrgica. São alterações não graves, irreversíveis e certamente progressiva. A autora poderá exercer atividade no trabalho, evitando esforço físico intenso. A fibromialgia não impede a autora de exercer atividade no trabalho. Incapacidade parcial permanente”.
Diante de resultado, o laudo pericial mostra-se inconclusivo, pois em resposta ao quesito 2, se a doença de que é portadora a autora a torna incapaz de desenvolver atividade remunerada, o médico perito somente respondeu que “autora devera evitar apenas atividade com esforço físico intenso”. No entanto, não respondeu se de fato a autora está incapaz ou não para o desempenho de suas atividades rurais.
Além disso, o perito atestou que a incapacidade é parcial e permanente, porém, não esclareceu qual o início da incapacidade e da patologia que causa a incapacidade. Portanto, impõe-se a complementação do laudo ou realização de nova perícia. Precedentes deste Tribunal em casos análogos:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO PERICIAL INCONCLUSIVO. INADMISSIBILIDADE. SENTENÇA ANULADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROCESSAMENTO E JULGAMENTO DO FEITO. 1. Sentença proferida na vigência do NCPC/2016: remessa necessária inaplicável. 2. Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez são: a) a qualidade de segurado; b) a carência de 12 (doze) contribuições mensais; c) a incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou permanente e total (aposentadoria por invalidez) para atividade laboral. 3. Como início de prova material, há CNIS de fl. 53 comprovando contribuições individuais entre 09/2012 a 10/2006, intercaladas por gozo de auxílio-doença, com DCB em 04.2016. 4. O laudo pericial (fls. 88), todavia, não se mostrou conclusivo quanto à extensão da incapacidade da qual a autora padece - hipertensão arterial e diabetes (se total ou parcial). A perícia médica judicial não poderá ser realizada de forma incompleta, na medida em que se trata de requisito legal indispensável à concessão do benefício previdenciário por incapacidade. 5. Patente que a instrução dos autos, na espécie, encontra-se incompleta, fato que, por si só, enseja a anulação da sentença. Com efeito, o julgamento antecipado da lide cerceia o direito do INSS, tendo em vista que o pedido foi julgado procedente. 6. Presentes os requisitos autorizadores da medida cautelar, deve ser o benefício mantido, cautelarmente, até a prolação da sentença. 7. Apelação provida para anular a sentença, com retorno dos autos ao Juízo de origem para complementação do laudo médico pericial.
(AC 0010667-98.2018.4.01.9199, Juiz Fed. (conv.) CÉSAR CINTRA JATAHY FONSECA, Segunda Turma, e-DJF1 07/08/2018).
Ante a insuficiência das informações contidas no laudo pericial judicial, devem os autos retornar à origem para que se determine sua complementação ou que outra perícia seja realizada, devendo as partes ser intimadas sobre a formulação dos quesitos e para apresentação de provas, se for o caso, que possam subsidiar o juízo na conclusão sobre o pedido formulado na inicial.
Conclusão
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para complementação do laudo ou realização de nova perícia.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1024588-64.2020.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 1003512-88.2019.8.11.0013
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: LUCINEIA FERNANDES
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. TRABALHADOR RURAL. RESTABELECIMENTO DE AUXÍILIO-DOENÇA. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL CONFIGURADA. LAUDO INCONCLUSIVO. INADMISSIBILIDADE. RETORNO À ORIGEM PARA COMPLEMETAÇÃO OU REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA SENTENÇA ANULADA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
1. A concessão de benefício previdenciário requer o cumprimento de ambos os requisitos, qualidade de segurado e incapacidade laboral. A ausência de um deles prejudica a análise do outro.
2. A concessão de benefício previdenciário por invalidez requer o preenchimento dos requisitos: qualidade de segurado, cumprimento de carência (segurado urbano) e incapacidade para o trabalho ou para a atividade habitual por mais de quinze dias.
3. Consoante disposto no art. 26, III, da Lei 8.213/91, a concessão auxílio-doença e aposentadoria por invalidez ao segurado especial não dependem do cumprimento de carência. Porém, quando a qualidade de segurado não for demonstrada por prova plena (arts. 26, III; 39, inc. I c/c art. 55, § 3º da Lei 8.213/91), exige-se início de prova material corroborada por prova testemunhal idônea.
4. São idôneos, portanto, dentre outros: a ficha de alistamento militar, o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado; a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições; o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF); certidão de casamento, de nascimento de filho e de óbito, que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público/INSS.
5. Com objetivo de demonstrar o exercício da atividade rural a autora anexou aos autos os seguintes documentos: nota fiscal de compra de 2013 com endereço rural da autora; declaração de exercício de atividade rural, início em 05.01.2005, expedido pelo sindicato de trabalhadores rurais em 23.05.2016; contrato de comodato de imóvel rural (registrado em 21.07.2015) pelo prazo de 10 anos, tendo início em 02.07.2015; certificado de cadastro de imóvel rural –CCIR- referente aos exercícios de 2010 a 2014; certidão de nascimentos dos filhos constando a profissão de lavrador dos genitores; Escritura pública (ano 2005) de declaração de união estável em que consta a profissão da autora como sendo lavradora; contribuição sindical rural.
6. Tais documentos servem de início material da alegada atividade rural, pois configuram prova plena da qualidade de segurado especial da autora na data do requerimento administrativo.
7. Em relação à incapacidade, o laudo pericial mostra-se inconclusivo, pois em resposta ao quesito 2, se a doença de que é portadora a autora a torna incapaz de desenvolver atividade remunerada, o médico perito somente respondeu que “autora devera evitar apenas atividade com esforço físico intenso”. No entanto, não respondeu se de fato a autora está incapaz ou não para o desempenho de suas atividades rurais. Além disso, o perito atestou que a incapacidade é parcial e permanente, porém, não esclareceu qual o início da incapacidade e da patologia que causa a incapacidade.
8. Ante a insuficiência das informações contidas no laudo pericial judicial, devem os autos retornar à origem para que se determine sua complementação ou que outra perícia seja realizada, devendo as partes ser intimadas sobre a formulação dos quesitos e para apresentação de provas, se for o caso, que possam subsidiar o juízo na conclusão sobre o pedido formulado na inicia.
9. Apelação da parte autora provida em parte, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem, para complementação do laudo ou realização de nova perícia, devendo ser mantida a tutela de urgência deferida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Juiz Federal RODRIGO GASIGLIA DE SOUZA
Relator Convocado
