
POLO ATIVO: NILZA MELO DE SOUZA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: AMANDA ALBERTINI COLET - MT20262-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por NILZA MELO DE SOUZA em face de sentença que julgou improcedente seu pedido de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, ao fundamento de perda da qualidade de segurada da autora.
A apelante alega ter comprovado o início da incapacidade dentro do período de graça previsto no art. 15, § 1º da Lei 8.213/91, tendo em vista contribuir para a previdência há mais de 10 anos, portanto, alega ter mantido a qualidade de segurada. Assim, tendo demonstrado o cumprimento dos requisitos legais, requer a reforma da sentença para que lhe seja concedido o benefício de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
Sem contrarrazões.
É o relatório.

Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Pressupostos e recebimento da apelação
Presente os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação em seu duplo efeito, nos termos dos arts. 1.011 e 1.012, ambos do CPC.
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Concessão ou restabelecimento de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez
Conforme disposto nos arts. 59 e 60, § 1º, da Lei 8.213/91, o auxílio-doença será devido ao segurado que ficar incapacitado temporariamente para o trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos. Será devido ao segurado empregado desde o início da incapacidade e, ao segurado que estiver afastado da atividade por mais de trinta dias, a partir da entrada do requerimento.
A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que estiver ou não em gozo de auxílio-doença e comprovar, por exame médico-pericial, a incapacidade total e definitiva para o trabalho e for considerado insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência. Será devida a partir do dia imediato ao da cessação do auxílio-doença, nos termos do art. 42 e 43 da Lei de Regência.
A ausência de um dos requisitos legais para a concessão de benefício por incapacidade, qualidade de segurado ou incapacidade, prejudica a análise do outro. Na situação, a análise do presente recurso está restrita à qualidade de segurada da parte autora, eis que única alvo de controvérsia.
Manutenção da qualidade de segurada
O art. 15, § 4º da Lei 8.213/91 dispõe que “a perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao final dos prazos fixados neste artigo”. No caso do segurado facultativo, seis meses após a cessação das contribuições (inc. VI).
A qualidade de segurado será mantida por tempo indeterminado para aquele que estiver em gozo de benefício previdenciário (p.ex. auxílio-doença) e por até 12 meses para o que deixar de exercer atividade remunerada, podendo ser prorrogado para até 24 meses se já tiverem sido recolhidas mais de 120 contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado (incisos, I, II e § 1º).
Esses prazos serão acrescidos de 12 meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social (§ 2º), podendo ser provado por outros meios admitidos em Direito (Súmula 27 da TNU).
A jurisprudência se consolidou no sentido de que a concessão de benefício por incapacidade anterior comprova a qualidade de segurado do requerente, salvo se ilidida por prova contrária.
De acordo com o CNIS (rolagem única PJe/TRF-1, p. 70/75), a autora, vinculada ao RGPS como contribuinte individual, efetuou recolhimentos de modo intermitente no período de 7/12/2005 a 31/10/2014 (rolagem única PJe/TRF-1, p. 70/75) e esteve em gozo de benefício previdenciário por incapacidade entre 28/8/2014 e 9/2/2015 e 17/4/2015 e 5/52017, tendo voltado a recolher como contribuinte individual entre 1/6/2019 e 31/1/2020.
Ainda, verifica-se a anotação no laudo de que a incapacidade teve início em 18/3/2014 (rolagem única PJe/TRF-1, p. 98).
A autora, por sua vez, requereu o benefício administrativamente em 1/4//2019 (rolagem única PJe/TRF-1, p. 38).
A jurisprudência se consolidou no sentido de que não perde a qualidade de segurado aquele que deixa de exercer suas atividades laborais em decorrência de agravamento de patologia incapacitante.
Desse modo, tendo sido demonstrado nos autos que a incapacidade da autora teve início antes da perda da qualidade de segurada e comprovada a incapacidade parcial e temporária, a segurada tem direito ao benefício de auxílio-doença.
Não obstante, nos termos da Súmula 47 da TNU, as condições pessoais do autor devem ser relevadas para análise acerca da possibilidade ou não de retorno laboral. Nesse sentido:
Súmula 47 da TNU: As condições pessoais podem e devem ser relevadas para fins de convencimento do magistrado sobre a impossibilidade de o segurado reintegrar-se no mercado de trabalho, na mesma atividade ou de reabilitar-se para o exercício de outra profissão quando a conclusão do laudo é pela incapacidade parcial.
Na situação, a autora, nascida em 1/10/1961 (rolagem única PJe/TRF-1, p. 13), exercia a atividade de varejista e, tendo em mente sua idade avançada, bem como a constatação de sua incapacidade para o desempenho da atividade habitual em razão de dificuldade para deambular, verifica-se extremamente improvável sua reinserção no mercado de trabalho, configurando-se então hipótese de aplicação da Súmula 47 da TNU, afastando-se, portanto, a possibilidade de reabilitação.
Assim, ainda que a constatação da perícia seja pela incapacidade parcial e temporária, deve ser considerada a situação pessoal da autora, que exercia atividade que depende das pernas para locomoção e apresenta idade avançada. Nesse sentido, precedentes do STJ e deste Tribunal:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE PARCIAL ALIADA ÀS CONDIÇÕES PESSOAIS. ANÁLISE. POSSIBILIDADE.
1. "Ainda que o laudo pericial tenha concluído pela incapacidade parcial para o trabalho, pode o magistrado considerar outros aspectos relevantes, tais como, a condição socioeconômica, profissional e cultural do segurado, para a concessão da aposentadoria por invalidez" (AgRg no AREsp 308.378/RS, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/05/2013, DJe 21/05/2013).
2. "Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida". Súmula 83 do STJ.
3. Agravo interno desprovido.
(AgInt no AREsp n. 2.036.962/GO, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 5/9/2022, DJe de 9/9/2022.)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. NÃO OCORRÊNCIA. REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. CONSIDERAÇÃO DOS ASPECTOS SOCIOECONÔMICOS, PROFISSIONAIS E CULTURAIS DO SEGURADO. DESNECESSIDADE DE VINCULAÇÃO DO MAGISTRADO À PROVA PERICIAL. PRECEDENTES. REVISÃO DO ACÓRDÃO. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME DE FATOS E DAS PROVAS. SÚMULA N. 7/STJ.
I - Na origem, cuida-se de ação ajuizada em desfavor do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS objetivando a concessão de benefício por incapacidade. II - Impõe-se o afastamento de alegada violação ao art. 1.022, do CPC/2015, quando a questão apontada como omitida pelo recorrente foi examinada no acórdão recorrido, caracterizando o intuito revisional dos embargos de declaração. III - No caso dos autos, o Tribunal de origem determinou a implementação do benefício da aposentadoria por invalidez por entender que a condição de saúde da segurada, seus aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais a tornam incapaz para o exercício do trabalho habitual e inviabilizam seu retorno ao mercado de trabalho. IV - Verifica-se que o acórdão regional está em conformidade com o entendimento jurisprudencial desta Corte no sentido de que "a concessão da aposentadoria por invalidez deve considerar, além dos elementos previstos no art. 42 da Lei 8.213/91, os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais da segurada, ainda que o laudo pericial apenas tenha concluído pela sua incapacidade parcial para o trabalho" (REsp n. 1.568.259/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 24/11/2015, DJe 1/12/2015). Outros julgados: AgRg no AREsp n. 712.011/SP, Rel. Min. Assusete Magalhães, DJe 4.9.2015; AgRg no AREsp n. 35.668/SP, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 5/2/2015, DJe 20/2/2015 e AgRg no AREsp n. 497.383/SP, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 18/11/2014, DJe 28/11/2014.V - Assim, havendo o Tribunal de origem concluído pela incapacidade laborativa da segurada, o acolhimento da tese recursal de modo a inverter o julgado demandaria necessariamente o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos, o que é inviável na instância especial diante do enunciado n. 7 da Súmula do STJ. VI - Recurso especial improvido.
(STJ, AREsp 1.348.227/PR, Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 14/12/2018).
Diante do caso concreto e comprovados os requisitos legais, deve ser reformada a sentença que julgou procedente o pedido inicial e concedido o auxílio-doença desde a data do requerimento administrativo, e convertido o benefício em aposentadoria por invalidez.
Consectários
O valor deve ser pago com acréscimo de correção monetária pelos índices indicados no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com incidência a partir do vencimento de cada parcela (Súmulas n. 148 do STJ).
Da modificação do quadro sucumbencial
Considerando a modificação do quadro sucumbencial fixado na primeira instância, devem ser invertidos os honorários sucumbenciais fixados na origem, nos termos do art. 85, do CPC.
Honorários Recursais
Nos termos do julgamento do REsp n. 1865663/PR, que tramitou sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.059 do STJ), a majoração dos honorários de sucumbência pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, desse modo, não se aplica o art. 85, § 11, do CPC ao caso dos autos.
Conclusão
Ante o exposto, dou provimento à apelação da autora, para reformar a sentença e determinar ao INSS a concessão de auxílio-doença à autora, com posterior conversão em aposentadoria por invalidez, nos termos desta fundamentação.
É o voto

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1015108-57.2023.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 1001941-67.2019.8.11.0018
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: NILZA MELO DE SOUZA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. TRABALHADOR URBANO. AUXÍILIO DOENÇA COM CONVERSÃO EM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS COMPROVADOS. INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE. CONSIDERAÇÃO DOS ASPECTOS SOCIOECONÔMICOS. POSSIBILIDADE. CONSECTÁRIOS. SENTENÇA REFORMADA.
1. A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que estiver ou não em gozo de auxílio-doença e comprovar, por exame médico-pericial, a incapacidade total e definitiva para o trabalho e for considerado insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo devida a partir do dia imediato ao da cessação do auxílio-doença, nos termos do art. 42 e 43 da Lei 8.213/91.
2. A jurisprudência se consolidou no sentido de que não perde a qualidade de segurado aquele que deixa de exercer suas atividades laborais em decorrência de agravamento de patologia incapacitante.
3. Consoante entendimento jurisprudencial do STJ, “a concessão da aposentadoria por invalidez deve considerar, além dos elementos previstos no art. 42 da Lei 8.213/91, os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado, ainda que o laudo pericial apenas tenha concluído pela sua incapacidade parcial para o trabalho”. (AREsp 1.348.227/PR, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 14/12/2018).
4. Comprovados os requisitos legais, deve ser reformada a sentença que julgou improcedente a pretensão autoral para que seja concedido auxílio-doença e, ato contínuo, convertido em aposentadoria por invalidez.
5. Considerando a modificação do quadro sucumbencial fixado na primeira instância, devem ser invertidos os honorários sucumbenciais fixados na origem, nos termos do art. 85, do CPC. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC ao caso dos autos, tendo em vista o que foi decidido no Tema 1.059/STJ.
6. Dado provimento à apelação da autora.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
