
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:NEUSA CARVALHO DE SOUSA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: FERNANDO DESTACIO BUONO - GO33756-A
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1009547-52.2023.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 5180566-45.2020.8.09.0125
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social-INSS em face de sentença que julgou procedente o pedido e condenou-o a conceder o benefício de aposentadoria por invalidez à parte autora, na condição de segurada especial.
O apelante alega que a recorrida seria diarista sem filiação ao RGPS, residiria no meio urbano e que o marido teria se aposentando como pedreiro. Ainda, não teria sido realizada a audiência de instrução para avaliar a qualidade de segurado.
Requer também a devolução dos valores recebidos.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1009547-52.2023.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 5180566-45.2020.8.09.0125
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
V O T O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Concessão de auxílio-doença – trabalhador rural
Conforme disposto nos arts. 59 e 60, § 1º da Lei 8.213/91, o auxílio-doença será devido ao segurado que ficar incapacitado temporariamente para o trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos.
A concessão de benefício por invalidez ao segurado especial, quando a qualidade de segurado não for demonstrada por prova plena (art. 39, inc. I c/c art. 55, § 3º da Lei 8.213/91), exige-se início de prova material corroborada por prova testemunhal idônea.
Nesses termos, a prova testemunhal é condição sine qua non para a concessão de benefício previdenciário na condição de segurada especial da autora, porquanto os documentos apresentados (escritura pública de compra e venda) não são suficientes para demonstrar o exercício da atividade rural alegada pela autora. Assim, é imperativa a produção de tal prova para o deslinde do caso. Precedente desta Turma:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. TRABALHADOR RURAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. SENTENÇA ANULADA DE OFÍCIO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PREJUDICADA.
1. A parte autora, ANELCINA GOMES DE ARRUDA, em razões recursais, pretende a anulação da sentença com consequente retorno dos autos à origem, para a devida instrução e julgamento do feito, uma vez que não foi realizada a audiência para oitiva de testemunhas, conforme requerida na inicial.
2. O juízo a quo julgou improcedente o pedido inicial, por entender que não há prova documental hábil a demonstrar a prova material.
3. Mesmo que inadmissível a prova exclusivamente testemunhal, nos termos da Súmula 149 do STJ, é desnecessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser utilizada para complementação de período anterior ou posterior ao que especificado, desde que contemporânea à época dos fatos a provar, Súmula 34 da TNU.
4. A prova testemunhal não foi produzida em razão do julgamento da lide sem a completa instrução processual que se mostrou precipitado, antes da oitiva das testemunhas, pois o deferimento da prestação requerida pela parte autora desafia prova testemunhal que pode vir a corroborar o teor probatório dos documentos trazidos pela autora na instrução do processo.
5. A falta de designação da audiência de instrução e julgamento para produção de prova testemunhal enseja a nulidade dos atos praticados a partir da ausência verificada, tendo em vista a inobservância aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, bem como o previsto nos arts. 343, §1º, e 412 do CPC, acarretando, assim, cerceamento de defesa à parte autora.
6. Sentença anulada, de ofício, determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem para o regular processamento da ação. Apelação da parte autora prejudicada.
(AC 1023356-80.2021.4.01.9999, Des. Fed. CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM, Segunda Turma, PJe 16/08/2023).
O prejuízo do INSS está demonstrado, o que configura cerceamento de defesa, porquanto a sentença julgou procedente a pretensão.
Desse modo, deve ser decretada a nulidade da sentença, para oportunizar a parte autora a produção da prova testemunhal, para fins de comprovação do requisito legal da qualidade de segurada, na condição de trabalhadora rural.
Devolução dos valores recebidos a título de antecipação de tutela
Em revisão do Tema 692, sobre a possibilidade de devolução de valores de benefícios previdenciários pagos a título de tutela de urgência posteriormente revogada, o e. Superior Tribunal de Justiça reafirmou a orientação anterior, nestes termos:
PROCESSUAL CIVIL. PROPOSTA DE REVISÃO DO ENTENDIMENTO FIRMADO NO TEMA REPETITIVO 692/STJ (RESP N. 1.401.560/MT). ART. 927, § 4º, DO CPC/2015. ARTS. 256-S, 256-T, 256-U E 256-V DO RISTJ. DEVOLUÇÃO DE VALORES DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS RECEBIDOS POR FORÇA DE DECISÃO LIMINAR POSTERIORMENTE REVOGADA. ADVENTO DE NOVA LEGISLAÇÃO. ART. 115, INC. II, DA LEI N. 8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI N. 13.846/2019. TEMA N. 799/STF (ARE 722.421/MG): POSSIBILIDADE DA DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS EM VIRTUDE DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. NATUREZA INFRACONSTITUCIONAL. QUESTÃO DE ORDEM JULGADA NO SENTIDO DA REAFIRMAÇÃO, COM AJUSTES REDACIONAIS, DO PRECEDENTE FIRMADO NO TEMA REPETITIVO N. 692/STJ.
1. A presente questão de ordem foi proposta com a finalidade de definir se o entendimento firmado no Tema Repetitivo 692/STJ (REsp n. 1.401.560/MT) deve ser reafirmado, alterado ou cancelado, diante da variedade de situações que ensejam dúvidas quanto à persistência da orientação firmada pela tese repetitiva referida, bem como à jurisprudência do STF, estabelecida em sentido contrário, mesmo que não tendo sido com repercussão geral ou em controle concentrado de constitucionalidade.
(...)
20. Por fim, não há que se falar em modulação dos efeitos do julgado no caso em tela, uma vez que não se encontra presente o requisito do art. 927, § 3º, do CPC. Isso porque, no caso sob exame, não houve alteração, mas sim reafirmação da jurisprudência dominante do STJ.
21. Questão de ordem julgada no sentido da reafirmação da tese jurídica, com acréscimo redacional para ajuste à nova legislação de regência, nos termos a seguir: "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago".
(Pet 12.482/DF, relator Ministro Og Fernandes, Primeira Seção, DJe de 24/5/2022).
A despeito do entendimento da Corte Superior, em recurso repetitivo, mantenho a tutela antecipada concedida, em razão do laudo médico pericial em que atestada incapacidade total e permanente (ID 312539619, pág. 139), bem como do indício de prova material da qualidade de segurada especial.
Conclusão
Ante o exposto, de ofício, decretar a nulidade da sentença, em razão da ausência de prova material suficiente para o reconhecimento da qualidade de segurada especial da autora e determinar o retorno dos autos à origem para produção da prova testemunhal faltante e prosseguimento regular do feito; apelação do INSS prejudicada.
É como voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1009547-52.2023.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 5180566-45.2020.8.09.0125
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NEUSA CARVALHO DE SOUSA
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. TRABALHADORA RURAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADA. AUSÊNCIA DE AUDIÊNCIA PARA PRODUÇÃO DA PROVA ORAL. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS A TÍTULO DE TUTELA ANTECIPADA. TEMA 692/STJ. NULIDADE DA SENTENÇA.
1. A concessão de benefício por invalidez ao trabalhador rural, quando a qualidade de segurado não for demonstrada por prova plena (art. 39, inc. I c/c art. 55, § 3º da Lei 8.213/91), exige-se início de prova material corroborada por prova testemunhal idônea.
2. No caso, o juízo da origem julgou procedente a ação e condenou o INSS a conceder à parte autora o benefício de auxílio-doença, considerando comprovada a qualidade de segurada especial da autora com base nos documentos apresentados, sem confirmação por prova testemunhal.
3. A prova testemunhal é condição para a concessão de benefício previdenciário na condição de segurada especial da autora, porquanto inexistente prova plena de tal situação nos autos, o que configura o cerceamento de defesa do INSS tendo em vista o pedido ter sido julgado procedente e, por consequência, deve ser decretada a nulidade da sentença.
4. Decretada a nulidade da sentença, de ofício, em razão da ausência de início de prova material suficiente para o reconhecimento da qualidade de segurada especial da autora; apelação do INSS prejudicada.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, de ofício, decretar a nulidade da sentença, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da assinatura eletrônica.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
