
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARIA DA CONCEICAO RODRIGUES ROCHA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: GRACIELA PARREIRA COSTA REZENDE - GO57170-A
RELATOR(A):ANTONIO OSWALDO SCARPA

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1044601-74.2021.4.01.0000
CLASSE: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA DA CONCEICAO RODRIGUES ROCHA
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
Trata-se de embargos de declaração opostos pelo INSS em face de acórdão (ID 338949623) que negou provimento à sua apelação.
Em suas razões, com fundamento no art. 1022, I e II, do CPC, o embargante suscita a existência de omissão no acórdão recorrido, alegando ausência de início de prova material em nome da autora, necessário para a concessão de aposentadoria rural, além da falta de manifestação sobre o pedido de afastamento da multa prévia exorbitante fixada pelo juízo sentenciante, no valor de R$ 1.000,00 ao dia, em caso de atraso na implantação do benefício.
Ao final, requer, para fins de prequestionamento, a manifestação expressa acerca de dispositivos infraconstitucionais (ID 344952624).
Intimada, o embargada apresentou contrarrazões (ID 358478647).
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1044601-74.2021.4.01.0000
CLASSE: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA DA CONCEICAO RODRIGUES ROCHA
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
Os embargos de declaração constituem recurso com fundamentação restrita aos casos de obscuridade, contradição, omissão e erro material do julgado (CPC, art. 1.022), sendo certo que, embora possam excepcionalmente ostentar caráter infringente, não são vocacionados à alteração substancial do julgamento.
A contradição que autoriza o cabimento de embargos de declaração é interna, ou seja, aquela que existe entre a fundamentação e a conclusão do acórdão, não se referindo às teses defendidas pelas partes no processo.
Quanto à omissão, o Superior Tribunal de Justiça tem decidido que os embargos de declaração devem ser rejeitados quando o tribunal se manifesta clara e fundamentada sobre os pontos indispensáveis para o exame da controvérsia, não estando o julgador obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão (EDcl no MS 21.315/DF, Rel. Min. Diva Malerbi (Desembargadora Convocada do TRF3), julgado em 08/06/2016; REsp 1832148/RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 26/02/2020).
Também a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal se firmou no sentido de que a Constituição exige que o juiz ou tribunal exponham as razões do seu convencimento, não estando o magistrado obrigado a responder a todas as alegações dos réus, mas tão somente àquelas que julgar necessárias para fundamentar sua decisão (STF, Primeira Turma, AI 242.237 - AgR/GO, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; RE 181.039-AgR/SP, Rel. Ministra Ellen Gracie).
No caso, alega o INSS que o acórdão dessa Corte padece de omissão, na medida em que deixou de observar que o marido da autora é segurado urbano, possuindo vínculos empregatícios, o que impediria a utilização de documentos em nome dele como prova de atividade rural em favor da autora. Além disso, sustenta que a Corte não se manifestou sobre o pedido de afastamento da multa prévia exorbitante fixada pelo juízo sentenciante, no valor de R$ 1.000,00 ao dia, justificando a interposição do presente recurso de embargos de declaração.
A decisão embargada encontra-se assim ementada:
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO INSS. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. RECEBIMENTO DO RECURSO NO DUPLO EFEITO NEGADO. ENDEREÇO E VÍNCULOS URBANOS. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADO ESPECIAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR COMPROVADO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. BENEFÍCIO DEVIDO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONSECTÁRIOS LEGAIS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.
1. O pleito de atribuição de efeito suspensivo à apelação do INSS não merece acolhimento, pois o CPC/73, em seu artigo 520, inciso VII, e o NCPC/2015,em seu artigo 1012, par. 1o, V, estabelecem que, em se tratando de sentença na qual restou confirmado o deferimento do pedido de antecipação da tutela, a apelação interposta deve ser recebida, tão somente, no efeito devolutivo.
2. Nas relações previdenciárias progressivas a incidência do prazo prescricional não fulmina o fundo do direito, mas tão somente as prestações não reclamadas no lapso de cinco anos, nos termos do artigo 103, parágrafo único, da Lei 8.213/91. Nesse sentido a Súmula n.º 85 do STJ.
3. São requisitos para aposentadoria do trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovação de efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição (180 contribuições mensais) correspondentes à carência do benefício pretendido a teor do art. 48, §§ 1º e 2º, c/c art. 142 da Lei 8.213/91.
4. O trabalho rural, observado o período de carência, deve estar demonstrado por início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, ou prova documental plena.
5. Considerando a dificuldade do trabalhador rural em comprovar o exercício da atividade no campo, vez que não possui vínculo empregatício e trabalha, na maioria das vezes, na informalidade, admite-se como início de prova material, outros documentos além daqueles constantes do art. 106 da Lei 8.213/91 (rol meramente exemplificativo).
6. Ressalte-se, ainda, que “... para efeito de reconhecimento do labor agrícola, mostra-se desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exigido, desde que a eficácia daquele seja ampliada por prova testemunhal idônea.” (AgInt no AREsp n. 852.494/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 16/11/2021, DJe de 9/12/2021).
7. Cumpre destacar que o exercício de atividade rural intercalado com curtos períodos de atividade urbana da parte autora, não descaracteriza a condição de segurado especial, ou seja, não se tornam empecilhos para seu reconhecimento. Nesse sentido: “...eventuais registros no CNIS de vínculos urbanos esparsos e exíguos não infirmam a condição de trabalhador rural do segurado nessa condição, na hipótese em que o acervo probante presente nos autos aponte para essa direção”. (TRF 1ª R.; AC 0033317-76.2017.4.01.9199; Câmara Regional Previdenciária da Bahia; Rel. Juiz Fed. Conv. Saulo José Casali Bahia; DJF1 29/01/2020).
8. O fato de a parte autora possuir endereço urbano não descaracteriza a sua qualidade de segurada especial, uma vez que a própria redação do inciso VII do art. 11 da Lei n. 8.213/91 prevê expressamente que o trabalhador rural pode residir tanto em imóvel rural quanto em aglomerado urbano, próximo a área rural.
9. No presente caso, a parte autora trouxe aos autos documentos, a exemplo de: certidão de casamento com a profissão do marido como lavrador (2007); contrato de locação de imóvel rural em nome da parte autora (2016); certidão de nascimento do filho com a profissão do marido de lavrador, entre outros que, aliados à prova testemunhal colhida em juízo, demonstram a atividade rurícola, cumprindo-se a carência prevista no art. 142 da Lei n. 8.213/91.
10. Importante ressaltar que os vínculos urbanos em nome do marido da parte autora não descaracterizam sua condição de rural, ante a existência de documentos comprobatórios de sua condição de trabalhadora rural.
11. Correção monetária e juros de mora nos termos do disposto no Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros se harmonizam com a orientação que se extrai do julgamento do Tema 905 STJ e Tema 810 STF, observada a prescrição quinquenal.
12. Manutenção dos honorários advocatícios arbitrados na sentença, acrescidos de 1% (um por cento), nos termos do art. 85, §11, do CPC, a incidirem sobre as prestações vencidas até a sentença (súmula 111 do STJ).
13. Apelação do INSS a que se nega provimento.
Da simples leitura do voto condutor do julgado e da respectiva ementa, verifica-se que a questões sobre os vínculos urbanos do marido da autora foram integralmente resolvidas no acórdão embargado, concluindo-se que “não descaracterizam sua condição de rural, ante a existência de documentos comprobatórios de sua condição de trabalhadora rural” (tais como o contrato de locação em nome da autora, qualificada como trabalhadora rural, notas fiscais de compra de produtos agrícolas em seu nome, etc), a configurar o caráter manifestamente infringente das pretensões recursais em referência, o que não se admite na via eleita.
Nesse ponto, são incabíveis os presentes embargos de declaração utilizados, indevidamente, com a finalidade de reabrir nova discussão sobre o tema jurídico já apreciado pelo julgador (RTJ 132/1020 – RTJ 158/993 – RTJ 164/793), pois, decidida a questão posta em juízo, ainda que por fundamentos distintos daqueles deduzidos pelas partes, não há que se falar em omissão, obscuridade ou contradição, não se prestando os embargos de declaração para fins de discussão da fundamentação em que se amparou o julgado.
Quanto à aplicação da multa diária para o caso de descumprimento de antecipação de tutela, razão assiste ao embargante.
Observo que a sentença de origem, ao conceder antecipação dos efeitos da tutela, fixou previamente multa diária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), caso haja descumprimento da obrigação imposta ao INSS. Apesar de haver sido devidamente impugnada por ocasião da apelação, a questão não foi enfrentada na decisão ora embargada, incorrendo em omissão portanto.
Embora não exista óbice à imposição de multa cominatória (astreintes) contra a Fazenda Pública, a jurisprudência do TRF/1ª Região firmou-se no sentido de que descabe a fixação prévia da penalidade, somente sendo possível a aplicação posterior quando, consideradas as peculiaridades do caso concreto, restar configurada a recalcitrância no cumprimento da obrigação estabelecida judicialmente. Nesse sentido, os seguintes julgados:
“(...)
12. É indevida a imposição prévia de multa à Fazenda Pública, sanção que somente é aplicável na hipótese de efetivo descumprimento da determinação relativa à implantação/restabelecimento do benefício previdenciário.”
(AC 0033231-42.2016.4.01.9199/MA, rel. Desembargador Federal Carlos Augusto Pires Brandão, Primeira Turma, e-DJF1 de 07/12/2016).
“(...)
2. Quanto à imposição prévia de multa à Fazenda Pública para o caso de descumprimento de antecipação de tutela, a posição desta casa é no sentido de que a cominação antecipada de multa pelo juízo a quo em caso de descumprimento da decisão que determinou a implantação do benefício é incompatível com os preceitos legais da Administração Pública.”
(AG 0001826-71.2015.4.01.0000/PA, rel. Desembargador Federal João Luiz de Sousa, Segunda Turma, e-DJF1 de 28/11/2016).
Portanto, “não é devida a fixação prévia de multa diária na decisão que defere a antecipação dos efeitos da tutela contra o INSS” (Precedentes do TRF1, Segunda Turma: AC 0067989-91.2009.4.01.9199/GO, rel. Desembargadora Federal Monica Sifuentes, e-DJF1 de 02/12/2010, p. 125; AC 2007.01.99.047649-3/MG, rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, e-DJF1 de 02/06/2008, p.139; e AC 2007.01.99.005461-8/MT, rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves da Silva, DJ de 31/05/2007, p. 24).
A penalidade discutida, além de esbarrar na jurisprudência desta Corte contrária à possibilidade de estipulação prévia de multa em desfavor da Fazenda Pública, sua imposição, no caso, carece de respaldo, dada a ausência de comprovação de recalcitrância da autarquia no cumprimento de ordem judicial, devendo ser afastada a multa diária aplicada.
Ante o exposto, acolho parcialmente os embargos de declaração para, sanando a omissão apontada, afastar a multa cominatória previamente imposta na sentença.
É como voto.
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
Relator

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1044601-74.2021.4.01.0000
CLASSE: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA DA CONCEICAO RODRIGUES ROCHA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ASTREINTES. TUTELA ANTECIPADA. MULTA INDEVIDA. OMISSÃO CONFIGURADA. ACOLHIMENTO PARCIAL.
1. Os embargos de declaração somente são cabíveis, na forma do art. 1.022 do Código de Processo Civil, quando incorrer o acórdão em omissão, contradição ou obscuridade, ou, ainda, para corrigir erro material.
2. Desnecessária a manifestação expressa do colegiado, para fins de prequestionamento quanto aos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais debatidos e supostamente violados, sendo plenamente suficiente a apreciação da matéria por eles tratada.
3. Observa-se que a sentença de origem, ao conceder antecipação dos efeitos da tutela, fixou previamente multa diária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), em caso de descumprimento da obrigação imposta ao INSS. Apesar de haver sido devidamente impugnada por ocasião da apelação, a questão não foi enfrentada na decisão ora embargada, incorrendo, assim, em omissão.
4. Embora não exista óbice à imposição de multa cominatória (astreintes) contra a Fazenda Pública, a jurisprudência desta Corte Regional firmou-se no sentido de que descabe a fixação prévia da penalidade, somente sendo possível a aplicação posterior quando, consideradas as peculiaridades do caso concreto, restar configurada a recalcitrância no cumprimento da obrigação estabelecida judicialmente. Precedentes desta Corte.
5. A penalidade discutida, além de esbarrar na jurisprudência desta Corte contrária à possibilidade de estipulação prévia de multa em desfavor da Fazenda Pública, sua imposição, no caso, carece de respaldo, dada a ausência de comprovação de recalcitrância da autarquia no cumprimento de ordem judicial, devendo ser afastada a multa diária aplicada.
6. Embargos de declaração parcialmente acolhidos.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, acolher parcialmente os embargos de declaração para, sanando a omissão apontada, afastar a multa cominatória previamente imposta na sentença, nos termos do voto do Relator.
Brasília (DF), (data da Sessão).
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
