
POLO ATIVO: ELAINE DIAS DA MATA OLIVEIRA
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

PROCESSO: 1024826-49.2021.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001921-14.2014.8.18.0135
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: ELAINE DIAS DA MATA OLIVEIRA
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
O Excelentíssimo Desembargador Federal Urbano Leal Berquó Neto (Relator):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face da sentença que julgou improcedente a pretensão de inexigibilidade de débito constituído pela autarquia previdenciária em decorrência da apuração administrativa de recebimento indevido de benefício de salário-maternidade de segurada especial, trabalhadora rural, decorrente da concessão administrativa mediante omissão da autora de informações quanto a relação de trabalho desempenhado perante o ente publico municipal no período de carência do benefício.
Em suas razões recursais, a autora sustenta o recebimento de boa-fé dos valores, imputando ao INSS a responsabilidade exclusiva no ato administrativo de concessão, tendo em vista que ao tempo da concessão o INSS já contava nos seus cadastros com a informação relativa ao vínculo empregatício alegado.
Historiou que todas as parcelas do benefício já foram sacadas e utilizadas na subsistência da apelante e da sua família, em especial com os gastos advindos com o nascimento do filho, não podendo o INSS beneficiar-se de seu próprio erro ao ignorar um dado constante no cadastro da segurada quando da concessão do benefício.
Sustentado, ainda, que imputar a recorrente o crime de fraude por fornecer informações verídicas sob sua atividade laboral é uma gritante injustiça, pois sempre exerceu atividade rurícola e nunca perdeu a sua condição de trabalhadora rural. Asseverou, ademais, que o trabalho desempenhado para a Prefeitura se dava apenas pelo turno da manhã, das 8h as 12h, em horário que não impedia a apelante de exercer suas atividade rurícolas.
Asseverou que os documentos dos autos comprovam sua condição de segurada especial, de modo que o cargo exercido, de auxiliar de serviços gerais, por curto espaço de tempo, se deu somente para complementar a renda da família, o que não afasta sua qualidade de segurada especial.
Ao final, requereu o conhecimento e provimento do recurso para, reformando a sentença, julgar totalmente procedente o pedido deduzido na inicial, com determinação da suspensão de cobranças de valores pleiteados pelo INSS.
Oportunizado o contraditório, o INSS deixou de apresentar contrarrazões ao recurso.
É o relatório.

PROCESSO: 1024826-49.2021.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001921-14.2014.8.18.0135
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: ELAINE DIAS DA MATA OLIVEIRA
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
O Excelentíssimo Desembargador Federal Urbano Leal Berquó Neto (Relator):
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Mister a depuração, de pronto, do cerne da pretensão, ora vertida em base recursal, lembrando que se trata de conflito de interesses condizente a obrigação da beneficiária de salário-maternidade na condição de segurada especial, trabalhadora rural, em ressarcir ao Erário Público dos valores que recebeu, indevidamente, tendo em vista que a concessão do benefício se deu mediante erro administrativo.
No caso em discussão, trata-se de ação intentada pela apelante objetivando a declaração da inexigibilidade do débito constituído pelo INSS.
Conforme se extrai dos autos, a autarquia previdenciária, em processo administrativo submetido ao crivo do contraditório e da ampla defesa, apurou que a apelante gozou de benefício de salário-maternidade de trabalhadora rural, segurada especial, cuja concessão se deu por omissão intencional da autora da existência de vínculo laboral com o Município, tendo afirmado perante o INSS que tratava-se de trabalhadora rural, cujo sustento era extraído integralmente/exclusivamente do labor rural de subsistência, o que possibilitou a concessão do benefício, que é destinado às pessoas que desempenham a atividade rural como única fonte de subsistência.
Após o trâmite regular, sobreveio sentença de improcedência da ação declaratória de inexigibilidade do débito perante à autarquia previdenciária, ao fundamento de que constatou-se que a autora/apelante figurou como contratada do município de Campo Alegre do Fidalgo no período de 1°/6/2006 a 1º/1/2013, razão pela qual ao tempo do recebimento do benefício de salário-maternidade (5/12/2007 a 8/3/2008) a autora não ostentava a qualidade de segurada especial, o que teria configurado fraude perante o INSS para obtenção do benefício previdenciário, cujo ato administrativo de revisão que impôs o dever de devolução/ressarcimento é revestido de legalidade.
Irresignada, a autora recorre sustentando a ilegalidade da cobrança, ao argumento de que os documentos dos autos comprovam sua condição de segurada especial, fazendo jus ao benefício em razão do exercício de atividades agrícolas e pecuaristas, tendo agido de boa-fé no recebimento do benefício, tendo em vista que, a despeito de manter vínculo com o ente público local, em condições juridicamente anuláveis, teria exercido atividade laborativa perante à Prefeitura apenas pela manhã, das 8h as 12h, o que não impedia de exercer suas atividades rurícolas de subsistência.
Sem razão a recorrente.
É cediço que ao teor do entendimento firmado pela jurisprudência do STJ, considera-se imprescindível, para a não devolução dos valores pagos indevidamente pela Previdência Social, que além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, esteja presente a boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração (REsp 1674457/RJ, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/08/2017, DJe 09/08/2017; REsp 1651556/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/03/2017, DJe 27/04/2017; REsp 1.661.656/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 4/5/2017, DJe 17/5/2017).
Conforme assentado pela jurisprudência dos Tribunais, diferentemente das hipóteses de interpretação errônea e má aplicação da lei, em que se pode concluir que o segurado recebeu o benefício de boa-fé, o que lhe assegura o direito de não devolvê-lo, as hipóteses de erro material ou operacional devem ser analisadas caso a caso, pois é preciso verificar se o beneficiário tinha condições de compreender que o valor não era devido e se seria possível exigir dele comportamento diverso, diante do seu dever de lealdade para com a administração previdenciária.
Desse modo, conclui-se que de fato a autora não logrou desconstituir a decisão administrativa que lhe impôs o dever de restituição ao erário do valor recebido a título de salário-maternidade de trabalhadora rural, segurada especial, mediante apresentação de declaração perante a Administração Pública contendo informações inverídicas, consistente em afirmação de que desde 2004 exerce atividade rural, nunca tendo se afastado da atividade no campo, tendo afirmado, ainda, não possuir qualquer outra fonte de renda, o que demonstra a omissão dolosa do seu vínculo de trabalho com o Município de Campo Alegre do Fidalgo e ilide a presunção de boa-fé, configurando-se uma omissão voluntária da beneficiária que induziu a erro o INSS, o que impõe o dever de devolução dos valores pagos indevidamente pela Previdência Social.
A despeito da autora asseverar que desempenhava labor junto ao Município apenas na parte da manhã, trata-se de afirmação que não encontra eco nas provas amealhadas aos autos, pois verifica-se que o INSS juntou aos autos cópia da reclamatória trabalhista ajuizada pela autora em face do Município, no bojo da qual a autora afirma que desempenhava sua atividade laborativa perante o município tanto pela manhã quanto no período da tarde, cujas atividades diárias se encerravam apenas após as 17h..
Por oportuno, vale ressaltar que à luz do §9º, inciso III, do art. 11 da Lei 8.213/91 a descaracterização da qualidade de segurada especial pelo exercício de atividades urbanas é a regra, sendo exceção quando o exercício destas atividades se dê em período de entressafra e em intervalo inferior a 120 dias, corridos ou alternados, por ano civil, o que não é o caso dos autos em que a autora apresenta, dentro de todo o período de carência do benefício recebido, vínculo urbano de longa duração com o ente público municipal, o que comprova que durante a relação de trabalho havida entre a autora e o município o seu sustento não era retirado do alegado desempenho de labor rural de subsistência.
Assim, verifica-se que a autora não se desincumbido do ônus de provar o recebimento de boa-fé do benefício, havendo, por outro lado, comprovação de que a autora firmou afirmações falsas perante o INSS e omissão dolosa quanto ao recebimento de verba salarial proveniente de vínculo com o ente público municipal, o que impõe o dever de devolução dos valores recebidos indevidamente na condição de trabalhadora rural de subsistência.
Por tudo isso, NEGO PROVIMENTO à apelação da autora, nos termos da fundamentação supra.
Diante da sucumbência, condeno a autora em honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa. Consigno, todavia, que a exigibilidade permanecerá suspensa, por ser a apelante beneficiária da gratuidade de Justiça.
É como voto.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator

PROCESSO: 1024826-49.2021.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001921-14.2014.8.18.0135
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: ELAINE DIAS DA MATA OLIVEIRA
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. BENEFÍCIO DE SALÁRIO-MATERNIDADE DE SEGURADA ESPECIAL. CONCESSÃO MEDIANTE OMISSÃO DE INFORMAÇÃO A ADMINISTRAÇÃO. DECLARAÇÃO FIRMADA COM INFORMAÇÃO INVERÍDICA. VÍNCULO TRABALHISTA COM O ENTE PÚBLICO MUNICIPAL. MÁ-FÉ CONFIGURADA. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO CABÍVEL. RECURSO IMPROVIDO.
1. No caso em discussão, após o trâmite regular do feito, sobreveio sentença de improcedência da ação declaratória de inexigibilidade do débito perante à autarquia previdenciária, ao fundamento de que constatou-se que a autora/apelante figurou como contratada do município de Campo Alegre do Fidalgo no período de 1º/6/2006 a 1º/1/2013, razão pela qual ao tempo do recebimento do benefício de salário-maternidade (5/12/2007 a 8/3/2008) a autora não ostentava a qualidade de segurada especial, o que teria configurado fraude perante o INSS para obtenção do benefício previdenciário, cujo ato administrativo de revisão que impôs o dever de devolução/ressarcimento é revestido de legalidade.
2. Irresignada, a autora recorre sustentando a ilegalidade da cobrança, ao argumento de que os documentos dos autos comprovam sua condição de segurada especial, fazendo jus ao benefício em razão do exercício de atividades agrícolas e pecuaristas, tendo agido de boa-fé no recebimento do benefício, tendo em vista que, a despeito de manter vínculo com o ente público local, em condições juridicamente anuláveis, teria exercido atividade laborativa perante à Prefeitura apenas pela manhã, das 8h as 12h, o que não impedia de exercer suas atividades rurícolas de subsistência.
3. Sem razão a recorrente. É cediço que, ao teor do entendimento firmado pela jurisprudência do STJ, considera-se imprescindível, para a não devolução dos valores pagos indevidamente pela Previdência Social, que além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, esteja presente a boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração. Conforme assentado pela jurisprudência dos Tribunais, diferentemente das hipóteses de interpretação errônea e má aplicação da lei, em que se pode concluir que o segurado recebeu o benefício de boa-fé, o que lhe assegura o direito de não devolvê-lo, as hipóteses de erro material ou operacional devem ser analisadas caso a caso, pois é preciso verificar se o beneficiário tinha condições de compreender que o valor não era devido e se seria possível exigir dele comportamento diverso, diante do seu dever de lealdade para com a administração previdenciária.
4. Desse modo, conclui-se que a autora não logrou desconstituir a decisão administrativa que lhe impôs o dever de restituição ao erário do valor recebido a título de salário-maternidade de trabalhadora rural, segurada especial, mediante apresentação de declaração perante a Administração Pública contendo informações inverídicas, consistente em afirmação de que desde 2004 exerce atividade rural, nunca tendo se afastado da atividade no campo, tendo afirmado, ainda, não possuir qualquer outra fonte de renda, o que demonstra a omissão dolosa do seu vínculo de trabalho com o município de Campo Alegre do Fidalgo e ilide a presunção de boa-fé, configurando-se uma omissão voluntária da beneficiária que induziu a erro o INSS, o que impõe o dever de devolução dos valores pagos indevidamente pela Previdência Social.
5. A despeito da autora asseverar que desempenhava labor junto ao município apenas na parte da manhã, verifica-se que o INSS juntou aos autos cópia da reclamatória trabalhista ajuizada pela autora em face do município, no bojo da qual a autora afirma que desempenhava sua atividade laborativa perante o município tanto pela manhã quanto no período da tarde, cujas atividades diárias se encerravam apenas após as 17h.. Assim, verifica-se que a autora não se desincumbido do ônus de provar o recebimento de boa-fé, havendo, por outro lado, comprovação de que a autora firmou afirmações falsas perante o INSS e omissão dolosa quanto ao recebimento de verba salarial proveniente de vínculo com o ente público municipal, o que impõe o dever de devolução dos valores recebidos indevidamente na condição de trabalhadora rural de subsistência.
6. Apelação a que se nega provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação interposta pela autora, nos termos do voto do Relator.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator
