
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
POLO PASSIVO:FRANCIS DALVA CANTAO DE MIRANDA e outros
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: LILIANE FRANCISCA COSTA DOS SANTOS - PA13510-A e WELBER AKSACKI DE SANTANA - PA19367-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1002737-35.2017.4.01.3900
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: FRANCIS DALVA CANTAO DE MIRANDA, OSEIAS DE MIRANDA CANTAO, ADRIELE DE MIRANDA CANTAO
Advogados do(a) APELADO: LILIANE FRANCISCA COSTA DOS SANTOS - PA13510-A, WELBER AKSACKI DE SANTANA - PA19367-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS contra sentença que julgou procedente o pedido de pensão por morte rural.
Em suas razões, o INSS sustenta, preliminarmente, a falta de interesse processual, uma vez que inexiste pretensão resistida da autarquia em face do pleito das partes autoras, já que o pedido não pode ser sequer apreciado em razão da total ausência de documentos do falecido para instruí-lo. Aduz, ademais, a prescrição de fundo do direito, alegando que o falecimento do instituidor se deu em 8/11/2002 e a presente ação só foi proposta em 13/11/2017, mais de 15 anos após o óbito.
No mérito, a autarquia sustenta que não há, nos autos, documentos que demonstrem a qualidade de segurado especial do instituidor e que não há prova da união estável entre o falecido e Francis Dalva à época do óbito. Assim, requer a reforma da sentença, com a improcedência do pedido.
Apresentadas contrarrazões, os autores pugnam pela manutenção da sentença.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1002737-35.2017.4.01.3900
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: FRANCIS DALVA CANTAO DE MIRANDA, OSEIAS DE MIRANDA CANTAO, ADRIELE DE MIRANDA CANTAO
Advogados do(a) APELADO: LILIANE FRANCISCA COSTA DOS SANTOS - PA13510-A, WELBER AKSACKI DE SANTANA - PA19367-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DO INTERESSE DE AGIR
Na espécie, embora o INSS alegue que o pleito não foi apreciado na esfera administrativa, não existindo, assim, pretensão resistida, tal ausência não pode ser imputada aos autores, já que, conforme documento emitido pelo próprio INSS (ID 353676313, fl. 4), o benefício de pensão por morte para os autores não foi protocolado sob a justificativa de que “os sistemas corporativos [da autarquia] não permitem habilitar benefício sem o NIT (Número de Identificação do Trabalhador), como também não se consegue gerar NIT, administrativamente, quando o CPF está cancelado por óbito, situação na qual se encontra o instituidor RAIMUNDO MOREIRA CANTÃO, [...], que também não tem documento de identificação para criar NIT”.
Dessa forma, não há falar em falta de interesse de agir, já que a ausência de requerimento administrativo deve ser imputada ao próprio INSS.
DA PRESCRIÇÃO
Consoante o entendimento pacífico deste Tribunal, não há prescrição de fundo do direito em relação à concessão de benefício previdenciário, por ser este um direito fundamental, em razão de sua natureza alimentar. Assim, a prescrição atinge apenas as parcelas vencidas antes do quinquênio que precede o ajuizamento da ação.
Nesse sentido, confira-se o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE CONCESSÃO DE AUXÍLIO-ACIDENTE. OS PLEITOS PREVIDENCIÁRIOS ENVOLVEM RELAÇÕES DE TRATO SUCESSIVO E ATENDEM NECESSIDADES DE CARÁTER ALIMENTAR, RAZÃO PELA QUAL A PRETENSÃO À OBTENÇÃO DE UM BENEFÍCIO É IMPRESCRITÍVEL. NÃO OCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO. RECURSO ESPECIAL DO SEGURADO PROVIDO.
1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 626.489/SE, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, DJe 23.9.2014, com repercussão geral reconhecida, firmou entendimento de que o direito fundamental ao benefício previdenciário pode ser exercido a qualquer tempo, sem que se atribua consequência negativa à inércia do beneficiário, reconhecendo que inexiste prazo decadencial para a concessão inicial de benefício previdenciário.
2. De fato, o benefício previdenciário constitui direito fundamental da pessoa humana, dada a sua natureza alimentar, vinculada à preservação da vida. Por essa razão, não é admissível considerar extinto o direito à concessão do benefício pelo seu não exercício em tempo que se julga oportuno. A compreensão axiológica dos Direitos Fundamentais não cabe na estreiteza das regras do processo clássico, demandando largueza intelectual que lhes possa reconhecer a máxima efetividade possível. Portanto, no caso dos autos, afasta-se a prescrição de fundo de direito e aplica-se a quinquenal, exclusivamente em relação às prestações vencidas antes do ajuizamento da ação. 3. Não se pode admitir que o decurso do tempo legitime a violação de um direito fundamental. O reconhecimento da prescrição de fundo de direito à concessão de um benefício de caráter previdenciário excluirá seu beneficiário da proteção social, retirando-lhe o direito fundamental à previdência social, ferindo o princípio da dignidade da pessoa humana e da garantia constitucional do mínimo existencial.
4. Recurso Especial do Segurado provido.
(REsp n. 1.576.543/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 26/2/2019, DJe de 12/3/2019.) (destaquei)
Dessa forma, embora o óbito tenha ocorrido em 8/11/2002 e a ação tenha sido ajuizada apenas em 13/11/2017, não há falar em prescrição do direito dos autores de pleitearem o benefício de pensão por morte.
Nos termos da Súmula 85 do STJ, a prescrição, no presente caso, incidirá apenas sobre as parcelas vencidas antes do quinquênio que antecede a propositura da ação.
DO MÉRITO
A pensão por morte é o benefício previdenciário previsto aos dependentes dos segurados, cuja regulamentação consta do art. 201, V, da Constituição Federal, e dos arts. 74 a 79 da Lei nº 8.213/91 e 105/115 do Decreto nº 3.048/99.
Para que os dependentes do segurado tenham direito à percepção do benefício de pensão por morte é necessária a presença de alguns requisitos para a sua concessão, quais sejam: o óbito do segurado; a condição de dependente; e a qualidade de segurado do falecido.
No que se refere ao óbito do segurado, este restou comprovado pela certidão de óbito, ocorrido em 3/11/2002 (ID 353676313, fl. 1).
Em relação à condição de dependente, destaca-se que os beneficiários previstos no art. 16, I, da Lei nº 8.213/91, possuem presunção absoluta de dependência econômica.
Na espécie, a condição de dependente dos filhos restou comprovada pelas certidões de nascimento, ocorridos em 25/5/1999 e 25/2/2001 (ID 353678116, fls. 2 e 3), que demonstram que eram menores de 21 anos na data do óbito.
Já a condição de dependência da companheira foi comprovada pela sentença que reconheceu a união estável entre Francis Dalva Cantão de Miranda e o falecido, durante 7 anos, até a data de seu falecimento (ID 353676315, fl. 3), bem como pelas certidões de nascimento dos filhos em comum.
Quanto à qualidade de segurado especial, a sua comprovação pode ser realizada através de prova plena ou início de prova material corroborada por prova testemunhal idônea.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Por fim, convém registrar que documentos tais como declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar não são aptos a demonstrar o início de prova material na medida em que não se revestem de mairoes formalidades.
No que se refere ao presente caso, a parte autora trouxe aos autos os seguintes documentos: certidão de óbito, em que consta que a profissão do falecido como braçal; laudo de exame de corpo de delito, em que consta a profissão do falecido como braçal; declaração da EMATER, datada de 28/12/2016, em que se afirma que a autora é agricultora familiar (IDs 353676313; 353676315
Da análise das provas apresentadas, verifica-se que a certidão de óbito, em que consta que a profissão do falecido como braçal, constitui início de prova material do labor rural alegado.
Ademais, o início de prova material foi corroborado pela prova testemunhal colhida, que confirmou o trabalho rural exercido pelo falecido no período anterior ao óbito.
Assim, comprovada a qualidade de segurado do instituidor da pensão.
Logo, restam comprovados os requisitos para obtenção do benefício: o óbito, a qualidade de dependente econômica da parte autora e a qualidade de segurado da falecida.
Dessa forma, nos termos da sentença, os autores fazem jus ao benefício da pensão por morte.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral (Tema 810), e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905).
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E CUSTAS PROCESSUAIS
Honorários advocatícios majorados na fase recursal em R$2.000,00 (dois mil reais), além do montante já fixado pelo Juízo de origem (art. 85, §11, CPC).
"Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, como ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso, Bahia, Acre, Tocantins e Piauí (AC 0024564-48.2008.4.01.9199, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Segunda Turma, e-DJF1 28/05/2020)" (AC 1026342-07.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 26/07/2023).
CONCLUSÃO
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS, nos termos explicitados acima.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1002737-35.2017.4.01.3900
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: FRANCIS DALVA CANTAO DE MIRANDA, OSEIAS DE MIRANDA CANTAO, ADRIELE DE MIRANDA CANTAO
Advogados do(a) APELADO: LILIANE FRANCISCA COSTA DOS SANTOS - PA13510-A, WELBER AKSACKI DE SANTANA - PA19367-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. INTERESSE DE AGIR PRESENTE. PRESCRIÇÃO DE FUNDO. NÃO OCORRÊNCIA. PENSÃO POR MORTE RURAL. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL DO INSTITUIDOR DA PENSÃO COMPROVADA. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Na espécie, embora o INSS alegue que o pleito não foi apreciado na esfera administrativa, não existindo, assim, pretensão resistida, tal ausência não pode ser imputada aos autores, já que, conforme documento emitido pelo próprio INSS (ID 353676313, fl. 4), o benefício de pensão por morte para os autores não foi protocolado sob a justificativa de que “os sistemas corporativos [da autarquia] não permitem habilitar benefício sem o NIT (Número de Identificação do Trabalhador), como também não se consegue gerar NIT, administrativamente, quando o CPF está cancelado por óbito, situação na qual se encontra o instituidor RAIMUNDO MOREIRA CANTÃO, [...], que também não tem documento de identificação para criar NIT”. Dessa forma, não há falar em falta de interesse de agir, já que a ausência de requerimento administrativo deve ser imputada ao próprio INSS.
2. Consoante o entendimento pacífico deste Tribunal, não há prescrição de fundo do direito em relação à concessão de benefício previdenciário, por ser este um direito fundamental, em razão de sua natureza alimentar. Assim, a prescrição atinge apenas as parcelas vencidas antes do quinquênio que precede o ajuizamento da ação. Dessa forma, embora o óbito tenha ocorrido em 8/11/2002 e a ação tenha sido ajuizada apenas em 13/11/2017, não há falar em prescrição do direito dos autores de pleitearem o benefício de pensão por morte.
3. A pensão por morte é o benefício previdenciário previsto aos dependentes dos segurados, regulamentado no art. 201, V, da Constituição Federal, e nos arts. 74 a 79 da Lei nº 8.213/91 e 105/115 do Decreto nº 3.048/99, e cujos requisitos para a sua concessão são o óbito do segurado; a condição de dependente; e a qualidade de segurado do falecido.
4. No que se refere ao óbito do segurado, este restou comprovado pela certidão de óbito, ocorrido em ocorrido em 3/11/2002 (ID 353676313, fl. 1).
5. Em relação à condição de dependente, destaca-se que os beneficiários previstos no art. 16, I, da Lei nº 8.213/91, possuem presunção absoluta de dependência econômica. Na espécie, a condição de dependente dos filhos restou comprovada pelas certidões de nascimento, ocorridos em 25/5/1999 e 25/2/2001 (ID 353678116, fls. 2 e 3), que demonstram que eram menores de 21 anos na data do óbito. Já a condição de dependência da companheira foi comprovada pela sentença que reconheceu a união estável entre Francis Dalva Cantão de Miranda e o falecido, durante 7 anos, até a data de seu falecimento (ID 353676315, fl. 3), bem como pelas certidões de nascimento dos filhos em comum.
6. Quanto à condição de segurado especial, verifica-se que a certidão de óbito, em que consta a profissão do falecido como braçal, constitui início de prova material do labor rural alegado.
7. Ademais, o início de prova material foi corroborado pela prova testemunhal colhida, que confirmou o trabalho rural exercido pelo falecido no período anterior ao óbito. Assim, comprovada a qualidade de segurado do instituidor da pensão.
8. Comprovados os requisitos para obtenção do benefício: o óbito, a qualidade de dependente econômica da parte autora e a qualidade de segurado da falecida.
9. Apelação do INSS não provida.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
