
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:GEORGINA LOBATO FILHA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: EDILTON LOBATO GAMA - DF21029-A
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

PROCESSO: 1049073-40.2020.4.01.3400 PROCESSO REFERÊNCIA: 1049073-40.2020.4.01.3400
CLASSE: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:GEORGINA LOBATO FILHA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: EDILTON LOBATO GAMA - DF21029-A
RELATOR: Juiz Federal PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA
RELATÓRIO
O EXMO. JUIZ FEDERAL PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA (relator convocado):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS em mandado de segurança contra sentença que pronunciou a decadência do direito da Autarquia Previdenciária proceder à revisão dos benefícios previdenciários da autora, recebidos cumulativamente de modo indevido.
Nas razões de recurso, o INSS sustenta, em síntese, que o julgado ofende ao entendimento sumulado do STF. Sustenta, ademais, que a cumulação dos benefícios pela autora se dá de modo indevido, violando regramento legal condito no art. 86 da Lei 8.213/91, razão pela qual não poderia se falar em boa-fé, porquanto é regra geral do direito a inescusabilidade do conhecimento da lei.
Ao final, requereu o provimento do recurso para, reformando a sentença, seja declarado o direito da Autarquia Previdenciária proceder com o cancelamento do benefício acumulado indevidamente, em especial o auxílio-acidente, bem como prosseguir com a cobrança dos valores pagos a maior.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte Regional.
Com vistas dos autos, o Ministério Público Federal deixou de manifestar-se quanto ao mérito por não vislumbrar a presença de interesse que justifique a sua intervenção.
É o relatório.

PROCESSO: 1049073-40.2020.4.01.3400 PROCESSO REFERÊNCIA: 1049073-40.2020.4.01.3400
CLASSE: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:GEORGINA LOBATO FILHA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: EDILTON LOBATO GAMA - DF21029-A
RELATOR: Juiz Federal PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA
V O T O
O EXMO. JUIZ FEDERAL PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA (relator convocado):
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Diante da inexistência de preliminares ou/e defesa indireta de mérito, mister a depuração, de pronto, do cerne da pretensão, ora vertida em base recursal, lembrando que se trata de conflito de interesses condizente a mandado de segurança no bojo do qual o julgador de Primeiro Grau pronunciou a decadência do direito do INSS em proceder com a revisão dos benefícios previdenciários concedidos em favor da impetrante e mantidos de modo irregular por expressa previsão legal de impossibilidade de cumulação dos benefícios.
Nos termos do que dispõe o artigo 1º da Lei 12.016/2009, “conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça”.
Necessário, portanto, que exista direito líquido e certo a ser protegido pela via mandamental.
Registre-se, por oportuno, que “quando a lei alude a direito líquido e certo, está exigindo que esse direito se apresente com todos os requisitos para o seu reconhecimento e exercício no momento da impetração. Em última análise, direito líquido e certo é direito comprovado de plano. Se depender de comprovação posterior não é líquido nem certo para fins de segurança”. (Meirelles, Hely Lopes, Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Injunção e "Habeas Data", São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 13ª ed., p. 3).
Na hipótese dos autos, vislumbra-se que a parte impetrante objetiva o reconhecimento judicial da decadência do direito do INSS de proceder com a revisão de seus benefícios de auxílio-acidente, concedido em seu favor em 8/2/1990, bem como de aposentadoria por tempo de contribuição, concedida em seu favor em 26/6/2001.
Sustenta que houve o decurso de mais de 18 anos de recebimento cumulativo dos benefícios, de modo que o direto da Previdência Social anular/revisar os benefícios decaiu. A impetrante sustenta, ainda, nulidade do processo administrativo e da cobrança quanto ao valor apurado em seu bojo.
Após trâmite regular, sobreveio sentença pronunciando a decadência, em face da qual o INSS interpôs o presente recurso sustentando que a revisão do benefício encontra amparo na Súmula 473 do STF.
O apelante sustenta, ademais, que tratando-se de relação de trato sucessivo, constatado erro da administração no pagamento de vantagens indevidas, o prazo decadencial se renova mês a mês. Asseverou, ademais, que a cumulação dos benefícios é indevida por expressa vedação legal.
Com razão o INSS, pois ao teor do entendimento firmado pelo STJ, ocorrendo à concessão de benefício previdenciário já sob a vigência da norma contida no §1º do art. 86 da Lei 8.213/91, que estabelece que o auxílio-acidente será devido somente até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou óbito do segurado, não há que se falar em decadência do direito do INSS em revisar o benefício. (AgRg nos EDcl no REsp 1.559.561/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 23/6/2016, DJe de 8/8/2016)
O entendimento supramencionado foi reiterado pela Corte da Cidadania em julgamento recente sobre a matéria. Nesse sentido, pertinente se mostra a transcrição do julgamento havido no bojo do Recurso Especial 1.893.109/SP que se amolda ao caso sob análise:
Argumenta a parte agravante, em síntese, que "em 03/12/2004 o recorrido requereu e obteve da Previdência Social aposentadoria por tempo de contribuição (fl. 11). Ocorre que SOMENTE em 11/12/2016, ou seja, após mais de doze anos de percepção cumulativa de ambos os benefícios que o obreiro foi comunicado pelo órgão segurador estatal (fls. 12/13) da impossibilidade de recebimento de ambos os benefícios (aposentadoria com auxílio-acidente), quando foi cessado o benefício acidentário. Portanto, estreme de dúvidas, consumou-se o prazo decadencial de 10 anos para a Autarquia Previdenciária rever o seu ato, consoante estabelece o artigo 103-A, da Lei n. 8.213/91" (e-STJ, fl. 282).
(...)
No caso em análise, observa-se do acórdão recorrido que, embora o termo inicial do auxílio-acidente seja anterior à edição da Lei 9.528/1997, a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição ocorreu apenas em 03/12/2004, após a vigência da citada lei, inexistindo, assim, direito à cumulação pretendida.
Registre-se que, na forma da jurisprudência do STJ, "não há falar em decadência do direito de a autarquia revisar o benefício, uma vez que a concessão da aposentadoria, já sob a vigência da norma atual, pressupõe a observância do § 1º do art. 86 da Lei n. 8.213/1991, segundo o qual o auxílio-acidente mensal será devido até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou até a data do óbito do segurado". (AgInt no REsp 1.893.109/SP, relator Ministro AFRÂNIO VILELA, Segunda Turma, julgado em 19/3/2024).
Com efeito, o Tema Repetitivo sob o número 555 estabeleceu que “A acumulação do auxílio-acidente com proventos de aposentadoria pressupõe que a eclosão da lesão incapacitante, apta a gerar o direito ao auxílio-acidente, e a concessão da aposentadoria sejam anteriores à alteração do art. 86, §§ 2º e 3º, da Lei 8.213/1991, promovida em 11.11.1997 pela Medida Provisória 1.596-14/1997, posteriormente convertida na Lei 9.528/1997.”
No mesmo sentido é a Súmula 507/STJ, segundo a qual "a acumulação de auxílio-acidente com aposentadoria pressupõe que a lesão incapacitante e a aposentadoria sejam anteriores a 11/11/1997, observado o critério do art. 23 da Lei n. 8.213/1991 para definição do momento da lesão nos casos de doença profissional ou do trabalho".
Desse modo, não há que se falar em direito líquido e certo a manutenção do recebimento dos benefícios de modo cumulados.
Por outro lado, tratando-se de hipótese de interpretação errônea ou má aplicação da lei, pode-se concluir que a segurada recebeu os benefícios cumulativamente de boa-fé, o que lhe assegura o direito de não devolvê-los.
Tratando-se de erro material ou operacional imputado exclusivamente ao INSS, que tinha conhecimento de que a autora já gozava de outro benefício inacumulável, detinha a obrigação de suspensão do benefício de auxílio-acidente quando concedeu, em favor da impetrante, o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, deixou de observar o regramento legal sob a matéria e, portanto, não há que se falar em recebimento indevido por culpa imputada à impetrante.
Em tempo, quando a alegada nulidade do processo administrativo de revisão do benefício, verifica-se que razão não assiste à impetrante, posto que observou-se o contraditório e a ampla defesa, nada havendo nos autos capaz de demonstrar qualquer vício que o macule.
Posto isso, dou parcial provimento à apelação do INSS e a remessa necessária tida por interposta para, reformando integralmente a sentença recorrida, afastar a decadência pronunciada sob o direito do INSS proceder com a revisão/suspensão do benefício mantido indevidamente, CONCEDENDO PARCIALMENTE a segurança vindicada, apenas no que tange a impossibilidade de cobrança dos valores a título de ressarcimento ao erário, nos termos da fundamentação supra.
Sem honorários advocatícios recursais, posto que incabível em ação mandamental.
É como voto.
Juiz Federal PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA
Relator convocado

PROCESSO: 1049073-40.2020.4.01.3400 PROCESSO REFERÊNCIA: 1049073-40.2020.4.01.3400
CLASSE: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:GEORGINA LOBATO FILHA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: EDILTON LOBATO GAMA - DF21029-A
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA. VIOLAÇÃO DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. INOCORRÊNCIA. CUMULAÇÃO DE BENEFÍCIOS. AUXÍLIO-ACIDENTE COM APOSENTADORIA. IMPOSSIBILIDADE. DECADÊNCIA DO DIREITO DE REVISÃO ADMINISTRATIVA. INOCORRÊNCIA. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. IMPOSSIBILDADE. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ NA PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Nos termos do que dispõe o artigo 1º da Lei 12.016/2009, “conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça”.
2. Na hipótese dos autos, vislumbra-se que a parte impetrante objetiva o reconhecimento judicial da decadência do direito do INSS proceder com a revisão de seus benefícios de auxílio-acidente, concedido em seu favor em 8/2/1990, bem como de aposentadoria por tempo de contribuição, concedida em seu favor em 26/06/2001. Sustenta que houve o decurso de mais de 18 anos de recebimento cumulativo dos benefícios, de modo que o direto da Previdência Social anular/revisar os benefícios decaiu. A impetrante sustenta, ainda, nulidade do processo administrativo e da cobrança quanto ao valor apurado em seu bojo.
3. Após trâmite regular, sobreveio sentença pronunciando a decadência, em face da qual o INSS interpôs o presente recurso sustentando que a revisão do benefício encontra amparo na Súmula 473 do STF. Sustenta, ademais, que tratando-se de relação de trato sucessivo, constatado erro da administração no pagamento de vantagens indevidas, o prazo decadencial se renova mês a mês. Asseverou, ademais, que a cumulação dos benefícios é indevida por expressa vedação legal.
4. Com razão o INSS, pois ao teor do entendimento firmado pelo STJ, ocorrendo à concessão de benefício previdenciário já sob a vigência da norma contida no §1º do art. 86 da Lei 8.213/91, que estabelece que o auxílio-acidente será devido somente até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou óbito do segurado, não há que se falar em decadência do direito do INSS em revisar o benefício. (AgRg nos EDcl no REsp 1.559.561/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 23/6/2016, DJe de 8/8/2016)
5. Com efeito, o Tema Repetitivo sob o número 555 estabeleceu que “A acumulação do auxílio-acidente com proventos de aposentadoria pressupõe que a eclosão da lesão incapacitante, apta a gerar o direito ao auxílio-acidente, e a concessão da aposentadoria sejam anteriores à alteração do art. 86, §§ 2º e 3º, da Lei 8.213/1991, promovida em 11.11.1997 pela Medida Provisória 1.596-14/1997, posteriormente convertida na Lei 9.528/1997.” No mesmo sentido é a Súmula 507/STJ, segundo a qual "a acumulação de auxílio-acidente com aposentadoria pressupõe que a lesão incapacitante e a aposentadoria sejam anteriores a 11/11/1997, observado o critério do art. 23 da Lei n. 8.213/1991 para definição do momento da lesão nos casos de doença profissional ou do trabalho". Desse modo, não há que se falar em direito líquido e certo.
6. Por outro lado, tratando-se de hipótese de interpretação errônea ou má aplicação da lei, pode-se concluir que a segurada recebeu os benefícios cumulativamente de boa-fé, o que lhe assegura o direito de não devolvê-los. Tratando-se de erro material ou operacional imputado exclusivamente ao INSS, que tinha conhecimento de que a autora já gozava de outro benefício inacumulável, detinha a obrigação de suspensão do benefício de auxílio-acidente quando concedeu, em favor da impetrante, o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, tendo deixado de observar o regramento legal sob a matéria e, portanto, não há que se falar em recebimento indevido por culpa imputada à impetrante. Em tempo, quando a alegada nulidade do processo administrativo de revisão do benefício, verifica-se que razão não assiste à impetrante, posto que observou-se o contraditório e a ampla defesa, nada havendo nos autos capaz de demonstrar qualquer vício que o macule.
7. Apelação e remessa necessária a que se dá parcial provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação e a remessa oficial tida por interposta, nos termos do voto do Relator.
Juiz Federal PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA
Relator convocado
