
POLO ATIVO: JOAQUIM AMARAL DA FRANCA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: DELIO CARVALHO GUEDES - BA52745-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1000072-57.2018.4.01.3303
APELANTE: JOAQUIM AMARAL DA FRANCA
Advogado do(a) APELANTE: DELIO CARVALHO GUEDES - BA52745-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por Joaquim Amaral da França contra sentença na qual foi indeferida a petição inicial, por inadequação da via processual eleita, e extinto o feito sem resolução do mérito.
Em suas razões, a parte autora sustenta que “os requisitos [para a impetração do mandado de segurança] estão cumpridos e o direito líquido e certo do Apelante é cristalino, qual seja de não sofrer descontos em seu outro benefício previdenciário por conta de estas verbas serem indiscutivelmente alimentares”, razão pela qual requer a reforma da sentença, com a concessão da segurança para que o INSS se abstenha de efetuar qualquer tipo de desconto nos benefícios previdenciários em nome do autor.
Apresentadas contrarrazões, o INSS pugna pela manutenção da sentença.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1000072-57.2018.4.01.3303
APELANTE: JOAQUIM AMARAL DA FRANCA
Advogado do(a) APELANTE: DELIO CARVALHO GUEDES - BA52745-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA
Embora o juízo de primeiro grau tenha indeferido a petição inicial, por inadequação da via processual eleita, e extinguido o feito sem resolução do mérito, considero que, na petição inicial, foram apresentadas todas as provas necessárias para o deslinde da controvérsia, não tendo havido dilação probatória. Assim, não há falar em inadequação da via eleita.
Outrossim, diante da apresentação de contrarrazões pelo INSS, o processo está suficientemente instruído para apreciação do mérito da causa.
DO MÉRITO
A matéria controvertida versa sobre a inexigibilidade de reposição ao erário de valores pagos, tidos como indevidos, a título de benefício previdenciário.
Na espécie, o impetrante, em 25/8/1983, passou a receber o benefício de aposentadoria por idade rural. No entanto, em 19/9/2017, foi informado que, quando foi requerer o benefício de pensão por morte, havia sido constatada possível irregularidade em sua aposentadoria rural, “uma vez que na época o beneficiário estava vinculado à Secretaria Pública do Estado da Bahia” e, assim, não fazia jus ao benefício rural (ID 3806612, fl. 2).
Em 4/12/2017, foi informado que a sua defesa havia sido julgada improcedente e que ainda lhe restava o prazo de 30 dias para recorrer da decisão ou negociar o ressarcimento, que, de acordo com a documentação constante dos autos, totalizava R$ 175.262,26 (ID 3806614, fl. 3). Em seguida, o autor informa que o benefício foi cancelado, sendo notificado a devolver os valores recebidos a tal titulo, razão pela qual impetrou mandado de segurança requerendo que a autoridade coatora se abstenha de exigir do impetrante a devolução dos valores que lhe foram pagos em face do benefício de aposentadoria rural e de efetuar os descontos em qualquer outro benefício.
Ressalta-se que a boa-fé é presumida, enquanto a má-fé necessita de comprovação. Em outras palavras, é essencial demonstrar a má-fé do beneficiário ou, inversamente, refutar a boa-fé da pessoa que alegadamente recebeu de forma indevida determinado benefício previdenciário.
A jurisprudência tem manifestado a orientação de que seria preciso avaliar a aptidão do segurado "para compreender, de forma inequívoca, a irregularidade do pagamento", tal como decidiu o Ministro Benedito Gonçalves, no julgamento do REsp 1381734/RN, Rel. Primeira Seção, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021.
Sobre a matéria, o Superior Tribunal de Justiça, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema n. 979 - REsp 1.381.734 - Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, Julgado em 10/03/2021, DJE 23/04/2021), decidiu que, nos casos de valores pagos indevidamente pela Previdência Social em decorrência de erro administrativo (material ou operacional), sem que a hipótese seja de interpretação errônea ou equivocada de lei pela Administração, é devido o ressarcimento ao erário de tais verbas percebidas pelo segurado/beneficiário, salvo quando comprovada a sua boa-fé com a demonstração de que não lhe era possível constatar que o pagamento era indevido.
No julgamento do REsp n. 1.381.734 (Tema 979/STJ) foi firmada a seguinte tese:
Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
No mesmo julgamento foi decidida a modulação dos efeitos da decisão, nos seguintes termos:
Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão.
Ante a modulação dos efeitos, apenas os processos distribuídos na primeira instância, a partir da data da publicação do acórdão, estarão sujeitos à devolução em caso de erro da administração (material ou operacional), ressalvada a comprovação de boa-fé do beneficiário. Tal não é a situação dos autos, uma vez que a ação foi proposta antes da publicação do acórdão em referência.
Considerando a restrição de eficácia temporal estabelecida pelo Superior Tribunal de Justiça, não se mostra relevante eventual discussão sobre a ausência, ou não, de boa-fé da parte segurada na percepção das verbas tidas por indevidas.
Outrossim, o ato administrativo questionado não afirmou a má-fé do impetrante na obtenção do benefício previdenciário, o que, nas circunstâncias do caso concreto, seria necessário para o reconhecimento de eventual direito à restituição dos valores pagos. Incide, na espécie, a teoria dos motivos determinantes, de modo que o ato administrativo não pode ser convalidado nesta via judicial mediante acréscimo de fundamentos que não constaram de sua motivação.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação da parte autora para afastar a extinção do processo sem resolução do mérito e conceder a segurança para que o INSS se abstenha de exigir do impetrante a devolução dos valores que lhe foram pagos em face do benefício de aposentadoria rural e de efetuar descontos, a esse título, em qualquer outro benefício.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1000072-57.2018.4.01.3303
APELANTE: JOAQUIM AMARAL DA FRANCA
Advogado do(a) APELANTE: DELIO CARVALHO GUEDES - BA52745-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
EMENTA
MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. DEVOLUÇÃO AO ERÁRIO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. TESE DEFINIDA NO TEMA 979. MODULAÇÃO: APLICAÇÃO DOS EFEITOS DA TESE APENAS AOS PROCESSOS DISTRIBUÍDOS A PARTIR DE SUA PUBLICAÇÃO, OCORRIDA EM 23/04/2021. HIPÓTESE DOS AUTOS. AÇÃO DISTRIBUÍDA ANTES DE 23/04/2021. INAPLICABILIDADE DO ENTENDIMENTO FIRMADO NO RESP 1381734/RN. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES PAGOS PELO INSS. APELAÇÃO PROVIDA.
1. A matéria controvertida versa sobre a inexigibilidade de reposição ao erário de valores pagos, tidos como indevidos, a título de benefício previdenciário.
2. Na espécie, o impetrante, em 25/8/1983, passou a receber o benefício de aposentadoria por idade rural. Em 19/9/2017, foi informado que, quando foi requerer o benefício de pensão por morte, foi constatada possível irregularidade em sua aposentadoria rural, “uma vez que na época o beneficiário estava vinculado à Secretaria Pública do Estado da Bahia” e, assim, não fazia jus ao benefício rural (ID 3806612, fl. 2). Em 4/12/2017, foi informado que a sua defesa havia sido julgada improcedente e que ainda lhe restava o prazo de 30 dias para recorrer da decisão ou negociar o ressarcimento, que, de acordo com a documentação constante dos autos, totalizava R$ 175.262,26 (ID 3806614, fl. 3). Em seguida, o autor informa que o benefício foi cancelado, sendo notificado a devolver os valores recebidos a tal título, razão pela qual impetrou mandado de segurança requerendo que a autoridade coatora se abstenha de exigir do impetrante a devolução dos valores que lhe foram pagos em face do benefício de aposentadoria rural e de efetuar os descontos em qualquer outro benefício.
3. O Superior Tribunal de Justiça, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema n. 979 - REsp 1.381.734), decidiu que, nos casos de valores pagos indevidamente pela Previdência Social em decorrência de erro administrativo (material ou operacional), sem que a hipótese seja de interpretação errônea ou equivocada de lei pela Administração, é devido o ressarcimento ao erário de tais verbas percebidas pelo segurado/beneficiário, salvo quando comprovada a sua boa-fé com a demonstração de que não lhe era possível constatar que o pagamento era indevido.
4. Ante a modulação dos efeitos, apenas os processos distribuídos na primeira instância, a partir da data da publicação do acórdão, estarão sujeitos à devolução em caso de erro da administração (material ou operacional), ressalvada a comprovação de boa-fé do beneficiário. Contudo, tal não é a situação dos autos, uma vez que a ação foi proposta antes da publicação do acórdão em referência.
5. Considerando a restrição de eficácia temporal estabelecida pelo Superior Tribunal de Justiça, não se mostra relevante eventual discussão sobre a ausência, ou não, de boa-fé da parte segurada na percepção das verbas tidas por indevidas.
6. Apelação da parte autora provida para conceder a segurança, a fim de que o INSS se abstenha de exigir do impetrante a devolução dos valores que lhe foram pagos em face do benefício de aposentadoria rural e de efetuar descontos em qualquer outro benefício.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
