
POLO ATIVO: CECILIA DE LARA MAIA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: GUSTAVO MICHELOTTI FLECK - DF21243-A
POLO PASSIVO:Ministério Público Federal (Procuradoria)
RELATOR(A):MARIA DO CARMO CARDOSO

Gab. 08 - DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO
Processo Judicial Eletrônico
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO (RELATORA):
Trata-se de recurso de apelação interposto por CECÍLIA DE LARA MAIA contra sentença prolatada pelo Juízo da 15ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal, que julgou procedente a pretensão punitiva estatal, para condenar a apelante pela prática do crime tipificado no art. 171, §3º, combinado com o art. 29 do Código Penal.
A sentença fixou a pena definitiva da acusada em 2 (dois) anos de reclusão, a ser cumprida em regime aberto, e l6 (dezesseis) dias-multa, à razão de 1/30 do salário mínimo vigente à época do fato. Substituiu a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviço à comunidade e prestação pecuniária no valor de 3 salários mínimos à entidade pública ou privada com destinação social (doc. 263880868).
Nos termos da sentença, narrou a denúncia que extrai-se dos autos do Inquérito Policial n. 1126/2016 – SR/PF/DF que o benefício n. 42/154.384.381-3 (aposentadoria por tempo de contribuição) foi concedido à primeira denunciada, a beneficiária Cecília de Lara Maia, mediante a inserção de dados fictícios nos sistemas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que foi efetuada pela segunda denunciada Lazara Aparecida Ferreira dos Santos. As irregularidades foram constatadas a partir da confecção do Relatório Individual constante às fls. 93/95, no qual foi “verificado no detalhamento do vínculo no CNIS, que houve apresentação de RAIS e GFIP informada somente em 10/2009” sendo que o vínculo informado na CTPS teria sido de 3/12/1996 a 31/3/2000. Assim, foi realizada pesquisa junto à empresa MINAS BRASÍLIA TÊNIS CLUBE, tendo sido informado pela Gerente de Pessoal que “não consta documentos em nome de Cecília de Lara Maia” (doc. 263880868).
A denúncia foi recebida em 12/6/2019 (doc. 263880760).
Em suas razões recursais, a apelante alega alternativamente que seja absolvida, em razão da ausência de provas; em caso de condenação, que a reprimenda seja mantida no mínimo legal, e, por último, que seja concedida a justiça gratuita (doc. 263880873).
Contrarrazões do Ministério Público Federal (doc. 263880885).
Parecer da Procuradoria Regional da República da 1ª Região opina pelo não provimento do recurso de apelação (doc. 265478554).
É o relatório.
Encaminhem-se os autos ao revisor.

Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 08 - DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO (RELATOR(A):
A apelante foi condenada pela prática do crime de estelionato previdenciário (art. 171, § 3º, CP), com o seguinte fundamento, no que interessa ao apelo:
Após análise dos documentos acima mencionados, não restam dúvidas de que o benefício previdenciário (NB 42/154.384.381-3) foi concedido indevidamente a Cecília de Lara Maia, mediante o induzimento e manutenção em erro da Autarquia Previdenciária, pela apresentação de documentação com informações falsas que instruíram o pedido de aposentadoria. Informações lançadas pela Empresa STECON, que tem como responsável pela informação a denunciada Lazara (id 67193599 – pág. 120).
De igual modo, em que pese as rés negarem a autoria, reputo que a autoria delitiva recai indubitavelmente sobre as duas denunciadas (Cecília de Lara Maia e Lazara Aparecida Ferreira dos Santos).
(...)
Diante disso, é evidente que as acusadas são autoras do delito de estelionato, pois, juntas, instruíram e formularam o pedido administrativo perante o INSS, com as alterações na carteira de trabalho, da então beneficiária, que resultou na concessão fraudulenta de aposentadoria.
É de se ressaltar que excluído o período de trabalho comprovadamente fictício, a beneficiária não teria tempo de contribuição mínimo para a aposentadoria concedida.
E ainda, durante o interrogatório das rés não foi possível vislumbrar nenhum elemento que pudesse afastar as suas responsabilidades pela fraude realizada para o recebimento indevido do benefício previdenciário.
Nesse contexto, embora a denunciada CECÍLIA DE LARA MAIA tenha aduzido nos autos que restou reconhecido o seu direito ao recebimento da aposentadoria por tempo de contribuição nos autos do processo nº 0036475- 13.2016.4.01.3400, com sentença transitada em julgado, tal fato não tem o condão de descaracterizar a tipicidade da conduta, uma vez que referida sentença reconheceu o direito à aposentadoria por tempo de contribuição, ante a presunção juris tantum de veracidade dos dados contidos na CTPS da beneficiária, a qual é relativa e, portanto, admite-se prova em contrário.
Portanto, a tese da defesa de ausência de provas para a condenação não merece acolhimento.
Diante do contexto dos autos, reputo evidenciado o elemento subjetivo do tipo, consistente no dolo de obter vantagem indevida, através da anotação de dados falsos em carteira de trabalho induzindo em erro da Autarquia Previdenciária.
(...)
CECÍLIA DE LARA MAIA
CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS
a) culpabilidade: normal à espécie.
b) antecedentes: favoráveis, considerando que não consta registro anterior (id 698276461 – pág. 426).
c) conduta social: sem informações abonatórias ou desabonatórias.
d) personalidade: não há nos autos elementos relevantes para a aferição.
e) motivos do crime: nada a acrescentar além da motivação ínsita ao próprio crime.
f) circunstâncias do crime: nada a acrescentar, pois os elementos fáticos compõem o próprio tipo penal.
g) consequências do crime: interpretadas como o mal causado pelo crime, devem ser valoradas desfavoravelmente, na medida em que a conduta da sentenciada acarretou prejuízo ao erário no importe de R$ 189.662,50 (valor não atualizado – id 67193600 - pág. 148).
h) comportamento da vítima: não se aplica.
Atento às circunstâncias mencionadas e considerando que apenas um vetor foi negativamente valorado (1/8 do intervalo entre a pena mínima e máxima), fixo a pena-base em 1 (um) ano, 6 (seis) meses de reclusão e 12 (doze) dias multa.
ATENUANTES E AGRAVANTES
Não concorrem circunstâncias atenuantes ou agravantes.
CAUSAS DE DIMINUIÇÃO E AUMENTO DE PENA
Inexiste causa de diminuição de pena.
Em face da configuração da causa de aumento de pena prevista no §3º do art. 171 do Código Penal, exacerbo a pena em 1/3 (um terço), totalizando, assim, 2 (dois) anos de reclusão e 16 (dezesseis) dias multa, reprimenda que torno definitiva ante a ausência de outras circunstâncias a considerar.
MULTA
Ausentes elementos que indiquem a sua situação econômica, estabeleço como valor do dia-multa 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato, devidamente corrigido. Nos termos do art. 50, CP, o pagamento deverá ocorrer no prazo de 10 dias, contados do trânsito em julgado desta sentença.
REGIME INICIAL
A Condenada deverá iniciar o cumprimento da pena privativa de liberdade em regime aberto, com fundamento no art. 33, §2º, c, do Código Penal.
SUBSTITUIÇÃO DA PENA
Substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistente na prestação de serviços comunitários, à razão de uma hora por dia de condenação, e prestação pecuniária, no valor de 3 salários mínimos em favor de entidade beneficente, tudo a ser definido em audiência admonitória (art. 44, § 2º, CP).
Autoria e materialidade
A autoria e a materialidade foram devidamente comprovadas durante a instrução processual, uma vez que ficou comprovado que a acusada não tinha tempo de contribuição suficiente para a concessão da aposentadoria, bem como se verificou que não existiu vínculo trabalhista entre a ré e a empresa Minas Brasília Tênis Clube.
Nos autos, houve a comprovação do recebimento do benefício previdenciário em favor da acusada, como última data em 24/11/2010 (doc. 263880757, fl. 5), bem como cópia da Carteira de Trabalho da acusada, em que houve registro laboral na empresa Minas Brasília Tênis Clube, com data de admissão em 3/12/1996 e saída em 31/3/2000 (doc. 263880757, fl. 14).
Em diligência para conferir a autenticidade do período trabalhado pela acusada na referida empresa, concluiu-se que, embora houvesse registro na CTPS, a empresa Minas Brasília Tênis Clube juntou documentos (RAIS) dos seus arquivos, os quais mostraram que a acusada não fez parte dos empregados na mencionada empresa, no período de 1996 a 2000.
No Relatório Conclusivo da Apuração de Benefício, o INSS concluiu que: O benefício irregular foi mantido desde 24/11/2010, sendo que a última competência paga refere-se ao mês de março/2016, com renda mensal no valor de R$2.860,18. Com a concessão irregular, a interessada recebeu a quantia de R$189.662,50, valor calculado através do Sistema Integrado de benefícios – SIBE, com atualização monetária, até 18/3/2016 (doc. 263880758, fls. 15-18).
Em depoimento judicial, o senhor Natal, Presidente da empresa Minas Brasília Tênis Clube, afirmou que não consta nos arquivos do clube que a acusada trabalhava na mencionada empresa, bem como relatou que não a conhece (doc. 263877728).
Em depoimento judicial, a acusada Cecília não soube afirmar com clareza o trabalho desenvolvido no clube, sob o argumento de que não se recorda, em razão de que, à época, a ré possuía vários empregos ao mesmo tempo (doc. 263886023).
Verifica-se que as provas que constam dos autos e os termos de declaração nos depoimentos judiciais estão em consonância com a conclusão de que Cecília de Lara Maia atuou de forma consciente e livre pela prática delitiva, com o intuito de auferir benefício previdenciário que sabia não ser devido.
A sentença, portanto, não merece reparos.
Dosimetria da pena
A dosimetria da pena deve ser revista. Na fixação da pena-base, o Juízo valorou negativamente as circunstâncias do crime em razão do valor de R$ 189.662,50 ter acarretado prejuízo ao erário (doc. 263880758, fl. 18).
As consequências do crime denotam o dano produzido pela prática criminosa em relação à vítima, constituindo parte do tipo penal, razão pela qual não pode ser utilizada para exasperação da pena.
Reduzo, dessa forma, a pena-base para 1 ano de reclusão e 10 dias-multa, por não vislumbrar circunstâncias judiciais que sejam valoradas negativamente (art. 59 do CP).
Na segunda fase, estão ausentes as circunstâncias agravantes e atenuantes.
Deve ser mantido o aumento de 1/3 na terceira fase, referente ao §3° do art. 171 do CP, porque o delito foi cometido em detrimento de entidade de direito público. Assim, fixo a pena em 1 ano, 4 meses de reclusão e 13 dias-multa.
Mantenho o valor arbitrado para o dia-multa em 1/30 do salário mínimo no tempo do fato.
Diante da pena ora aplicada, e nos termos do art. 43 e seguintes do Código Penal, aplico a substituição da pena privativa de liberdade por uma restritiva de direito, consistente na prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo prazo da condenação, na forma dos artigos 46 e 55 do CP, em instituição a ser designada pelo juízo da execução.
Fixo o regime inicial aberto para cumprimento da pena (art. 33, § 1º, c, e § 2º, c, do CP).
Dispositivo
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação para reduzir a pena aplicada.
É como voto.

Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 07 - DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA
VOTO REVISOR
Aprovo o relatório e acompanho o voto da Relatora.
Juíza Federal Convocada OLÍVIA MÉRLIN SILVA
Relatora

Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 08 - DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1018310-90.2019.4.01.3400 PROCESSO REFERÊNCIA: 1018310-90.2019.4.01.3400
CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417)
POLO ATIVO: CECILIA DE LARA MAIA
REPRESENTANTES POLO ATIVO: GUSTAVO MICHELOTTI FLECK - DF21243-A
POLO PASSIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria)
EMENTA
PENAL E PROCESSUAL PENAL. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. ART. 171, § 3º, DO CP. OBTENÇÃO FRAUDULENTA DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. DOSIMETRIA. PENA REDUZIDA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
- Materialidade, autoria e dolo demonstrados no acervo probatório.
- Dosimetria. Penas reduzidas com afastamento da valoração negativa da consequências do crime.
- Mantido o aumento na terceira fase, referente ao §3° do art. 171 do CP, porque o delito foi cometido em detrimento de entidade de direito público.
- Apelação a que se dá parcial provimento.
ACÓRDÃO
Decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso de apelação, nos termos do voto da relatora.
Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso
Relatora
