
POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) e outros
POLO PASSIVO:KARLA ETERNA MARTINS SILVA e outros
RELATOR(A):NEY DE BARROS BELLO FILHO

Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NEY BELLO
Processo Judicial Eletrônico
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de apelação interposta por Karla Eterna Martins Silva contra sentença prolatada pelo Juízo Federal da 1ª Vara da Subseção Judiciária de Aparecida de Goiânia/GO, que condenou a ré, ora apelante, às penas de 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão e 40 (quarenta) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, pela prática do crime previsto no art. 171, § 3º, c/c art. 71, ambos do Código Penal.
Segundo os termos da denúncia:
“No período compreendido entre 01/04/2012 e 01/04/2016, a denunciada KARLA ETERNA MARTINS SILVA, com vontade livre e consciente, obteve para si, mediante uso de cartão magnético de terceira pessoa, vantagem ilícita no valor atualizado de R$ 42.523,73 (quarenta e dois mil quinhentos e vinte e três reais e setenta e três centavos), em prejuízo do INSS – Instituto Nacional da Seguridade Social, por ter recebido, indevidamente, valores referentes ao benefício previdenciário pós óbito (NB 88/131810188-4) de Francisca Martins da Rocha, sua mãe, após o falecimento ocorrido em 21/04/2012.”
O Ministério Público Federal interpôs recurso de apelação. Requer a reforma da sentença apenas para majorar a fração de aumento pela continuidade delitiva para 2/3 (dois terços), uma vez que foram 48 (quarenta e oito) saques fraudulentos de benefício previdenciário perpetrados pela ré.
A acusada também apelou da sentença. Requer a absolvição da imputação que lhe pesa ao argumento de que: a) a conduta é atípica por ausência de fraude, pois ela não tinha obrigação de informar o óbito de sua genitora ao INSS; b) não há provas do dolo em sua conduta, uma vez que o óbito de sua mãe foi, efetivamente, comunicado ao Cartório de Registro Civil; e c) a situação dos autos implica no reconhecimento da excludente de culpabilidade, por inexigibilidade de conduta diversa, pois ela precisou arcar com o seu sustento e de seus filhos menores. Subsidiariamente, requer a desclassificação da conduta para o tipo do art. 169 do CP (apropriação de coisa havida por erro), pois não existiu de sua parte artifício ou dolo específico de obter vantagem ilícita. Alternativamente, pede a revisão da dosimetria da pena para afastar a avaliação negativa relativa à culpabilidade e às consequências do crime, afastar o aumento pela continuidade delitiva (art. 71 do CP), reduzir a pena de multa e, também, afastar a condenação no pagamento de indenização dos danos sofridos pelo INSS.
Com as contrarrazões da acusada e do Ministério Público Federal, subiram os autos a este Tribunal.
Nesta Instância, a Procuradoria Regional da República da 1ª Região opina pelo parcial provimento do recurso da acusada, apenas para afastar a valoração negativa relativa à circunstância da culpabilidade e pelo provimento do recurso de apelação do MPF e
É o relatório.
Encaminhe-se à eminente Revisora.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NEY BELLO
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CRIMINAL (417)0006840-29.2017.4.01.3504
Processo referência: 0006840-29.2017.4.01.3504
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL NEY BELLO (Relator):
Como relatado, cuida-se de apelação interposta por Karla Eterna Martins Silva contra sentença prolatada pelo Juízo Federal da 1ª Vara da Subseção Judiciária de Aparecida de Goiânia/GO, que condenou a ré, ora apelante, às penas de 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão e 40 (quarenta) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, pela prática do crime previsto no art. 171, § 3º, c/c art. 71, ambos do Código Penal.
Preceitua o artigo 171, § 3º, do CP do Código Penal:
Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.
(...)
§ 3º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.
No estelionato é necessário que esteja presente o elemento subjetivo do tipo, consistente na vontade do agente de se apropriar de vantagem ilícita pertencente a outrem, causando prejuízo, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento.
Nesse sentido, leciona Cezar Roberto Bitencourt, in Código Penal Comentado. 4ª ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 765:
“o elemento subjetivo geral do estelionato é o dolo, representado pela vontade livre e consciente de ludibriar alguém, por qualquer meio fraudulento. Faz-se necessário, ainda, o elemento subjetivo especial do tipo, constituído pelo especial fim de obter vantagem patrimonial ilícita, para si ou para outrem. A simples finalidade de produzir dano patrimonial ou prejuízo a outrem, sem visar à obtenção de vantagem, não caracteriza o estelionato”.
Segundo os termos da denúncia, no período compreendido entre 01/04/2012 e 01/04/2016, a ré, com vontade livre e consciente, obteve para si, mediante uso de cartão magnético de sua genitora Francisca Martins da Rocha, vantagem ilícita no valor de R$ 42.523,73 (quarenta e dois mil, quinhentos e vinte e três reais e setenta e três centavos), em prejuízo do INSS, na medida em que recebeu valores referentes ao benefício previdenciário (NB 88/131810188-4), mesmo após o óbito de sua mãe, ocorrido em 21/04/2012.
A materialidade e autoria delitivas são indenes de dúvidas. Nesse sentido, a documentação que instrui o Inquérito Policial nº 0636/2017-4-SR/DPF/GO, em especial a cópia da Processo Administrativo NF 88/131810188-4, do INSS (fls. 07/55). Ainda, corrobora o acerto da imputação delitiva a própria confissão da apelante, no sentido de ter sacado as parcelas do benefício previdenciário.
Embora tenha alegado a ausência de dolo de sua parte, em juízo a ré reconheceu os fatos que lhes foram imputados na denúncia.
Os elementos de provas que instruem o feito são incompatíveis com as alegações de ausência de conduta com finalidade enganosa e apropriação de coisa havida por erro.
No caso, as provas dos autos não deixam dúvidas de que a acusada praticou o delito imputado na denúncia, bem como tinha potencial consciência da ilicitude sobre o fato praticado, já que não comunicou à Autarquia Previdenciária, em tempo oportuno, o óbito de sua genitora, da qual era procuradora junto ao INSS.
Demais, a ré não só deixou de comunicar o óbito de sua mãe como, também, não devolveu o cartão magnético da conta da falecida à agência bancária, o que lhe permitiu efetivar as retiradas ao longo de 4 (quatro) anos, ou seja, no período de 01/04/2012 e 01/04/2016.
O contexto dos autos aponta que a acusada sabia perfeitamente o que estava fazendo e, embora seja de conhecimento notório que se trata de benefício destinado à sua mãe, agiu ela ativamente e efetuou o saque, durante 4 (quatro) anos, do benefício previdenciário.
Destarte, nada me convence da falta de consciência da ré acerca do ato contrário ao direito. Não há falar em erro de proibição inevitável quando o agente tem potencial consciência da ilicitude de sua conduta e agiu com dolo.
Para que fique configurado o erro de proibição sobre a ilicitude do fato é necessário que seja demonstrado que o agente não tinha, de forma alguma, conhecimento ou noção de sua conduta ilícita, proibida pelo Direito Penal. Erra-se quanto ao caráter proibido da conduta ao se acreditar, fundamentadamente, lícita uma ação ilícita. O agente carece do conhecimento potencial da proibição que recai sobre um fato típico e ilícito.
No caso, inexiste erro de proibição a dar supedâneo à tese da defesa.
Não configurado o erro de proibição no presente caso, não há que se falar em causa de exclusão da culpabilidade. Nesse sentido:
PENAL. PROCESSUAL PENAL. ARTIGO 171, §3º, DO CÓDIGO PENAL. SAQUES FRAUDULENTOS DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. ÓBITO DA GENITORA. ESTELIONATO MAJORADO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. ERRO DE PROIBIÇÃO E INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. NÃO CONFIGURADOS. PRINCÍPIOS DO FAVOR REI E IN DUBIO PRO REO. INAPLICABILIDADE. VANTAGEM ILÍCITA. DOSIMETRIA. AJUSTE.
1. O crime de estelionato previdenciário, previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, ficou configurado. Aplica-se a causa de aumento do parágrafo 3º, quando o crime é cometido contra entidade de direito público. 2. No estelionato é necessário que esteja presente o elemento subjetivo do tipo, consistente na vontade do agente de se apropriar de vantagem ilícita pertencente a outrem, causando prejuízo, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento. Aplica-se a causa de aumento do parágrafo 3º quando o crime é cometido contra entidade de direito público. 3. Para que fique configurado o erro de proibição sobre a ilicitude do fato é necessário que seja demonstrado que o acusado não tinha, de forma alguma, conhecimento ou noção de sua conduta ilícita, proibida pelo Direito Penal. Erra-se quanto ao caráter proibido da conduta ao se acreditar, fundamentadamente, lícita uma ação ilícita. O agente carece do conhecimento potencial da proibição que recai sobre um fato típico e ilícito. Não configurado o erro de proibição no presente caso, não há que se falar em causa de exclusão da culpabilidade.
4. Não há falar em inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal de exclusão da culpabilidade quando o acusado não comprova nos autos que não poderia agir de modo diferente. O ônus de provar inexigibilidade de conduta diversa é da defesa, nos termos do art. 156 do CPP, o que não foi feito, in casu.
5. Não cabe, na espécie, a aplicação dos princípios do favor rei e in dubio pro reo. Dolo específico caracterizado pela intenção de obter vantagem ilícita. Materialidade e autoria do delito de estelionato comprovadas pelos documentos acostados aos autos.
6. Aplicada na sentença a hipótese do §1º do art. 171 do Código Penal. Redução da pena de multa.
7. Apelação a que se dá parcial provimento.
(ACR 0002560-34.2011.4.01.3307 / BA, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NEY BELLO, Rel.Conv. JUIZ FEDERAL MARCIO SÁ ARAÚJO (CONV.), TERCEIRA TURMA, e-DJF1 de 17/02/2017)
Ora, possíveis falhas no repasse de informação ao INSS, pelos Registros de Pessoas Naturais, em relação ao óbito de segurado, não justifica a conduta criminosa da ré. A ela, na condição de filha da segurada junto ao INSS, cabia a obrigação de comunicar o óbito de sua genitora à autarquia previdenciária ou, quando menos, deixar de proceder os saques. Também não merece acolhida a tese defensiva, no sentido de atipicidade da conduta, argumento de que cabia ao INSS conhecer do óbito e não ela, a apelante, passar essa informação.
Nada disso ela fez. Ao contrário, maliciosamente sacou os valores do benefício por 4 (quatro) anos e, em várias oportunidades, renovou a senha junto à agência bancária.
A alegação da ré, no sentido de que precisou fazer frente às despesas suas e de suas filhas menores, não afastam o elemento subjetivo do tipo penal. A acusada não fez prova de que estivesse passando por problemas financeiros que lhe impusessem a prática delituosa como única forma de ter seu sustento provido, o que impede seja afastada sua culpabilidade, por inexigibilidade conduta diversa. A esse respeito, os precedentes deste Tribunal:
PENAL. PROCESSO PENAL. ART. 171, § 3º, DO CP. RECEBIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA MEDIANTE FRAUDE. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. ESTADO DE NECESSIDADE E INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. NÃO CONFIGURAÇÃO. AUSÊNCIA DE CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORAVEIS. FIXAÇÃO DA PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL. APLICAÇÃO DA ATENUANTE DE CONFISSÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 231/STJ. SENTENÇA MANTIDA.
1. Comprovadas a materialidade e a autoria do crime, bem como o elemento subjetivo consistente no dolo, a condenação do acusado pelo cometimento do crime de estelionato majorado (art. 171, § 3º, do CP) deve ser mantida.2. A excludente de ilicitude do estado de necessidade ocorre nas situações previstas no art. 24 do CP, ou seja, quando o agente comete o delito para "salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se".3. Não demonstrado o alegado estado de necessidade, ou inexigibilidade de conduta diversa. Dificuldades financeiras que supostamente estariam sendo enfrentadas pelo acusado, não justificam a prática do crime de estelionato previdenciário.4. A pena-base não pode ser reduzida aquém do mínimo legal, ainda que o réu tenha confessado espontaneamente a prática do delito, em respeito à súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça.5. Apelação desprovida.
(ACR 0041338-94.2011.4.01.3300 / BA, Rel. JUIZ FEDERAL KLAUS KUSCHEL, TERCEIRA TURMA, e-DJF1 de 28/10/2016)
PENAL. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. SAQUES FRAUDULENTOS DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS APÓS O ÓBITO DA BENEFICIÁRIA. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. ESTADO DE NECESSIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. A materialidade e a autoria do delito de estelionato estão comprovadas pelos documentos acostados aos autos e, da mesma forma, o dolo específico caracterizado pela intenção de obter vantagem ilícita por meio dos 25 (vinte e cinco) saques da pensão previdenciária, entre julho/2006 e agosto/2008, sendo a real beneficiária falecida.2. O ônus de provar inexigibilidade de conduta diversa, por estado de necessidade, é da defesa, nos termos do art. 156 do CPP, hipótese não verificada no presente caso.3. Para que fique configurado o erro de proibição sobre a ilicitude do fato é necessário que seja demonstrado que o acusado não tinha, de nenhuma forma, conhecimento ou noção de sua conduta ilícita. Erra o agente quanto ao caráter proibido da conduta quando acredita, fundamentadamente, ser lícita uma ação ilícita, hipótese não ocorrendo na espécie.4. Apelação desprovida.
(ACR 0006933-18.2010.4.01.3801 / MG, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL OLINDO MENEZES, QUARTA TURMA, e-DJF1 de 15/12/2016)
As provas dos autos não deixam dúvidas de que a ré praticou o delito imputado na denúncia. Tais fatos amoldam-se perfeitamente ao tipo penal imputado na inicial acusatória.
Por conseguinte, rejeito a pretensão da recorrente, no sentido de proceder à desclassificação da conduta para o crime de apropriação de coisa havida por erro. Referido tipo penal tem previsão no art. 169, do Código Penal, que assim dispõe:
Art. 169. Apropriar-se alguém de coisa alheia móvel, vinda ao seu poder por erro, caso fortuito ou força da natureza:
Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, ou multa.
Como se vê, na apropriação de coisa havida por erro, a posse é transferida ao agente sem que tenha havido uma prévia intenção maliciosa, ou seja, não deve ocorrer a menor participação dolosa de quem recebe a coisa. Diversamente, é a hipótese do estelionato, em que a obtenção da vantagem ilícita ocorre mediante uma conduta dolosa antecedente, onde o agente provoca ou concorre para manter a vítima em erro, mediante ardil.
O contexto probatório dos autos aponta pela ausência dos componentes estruturais do delito previsto no artigo 169 do CP, pois houve fraude no recebimento do benefício, sendo que a ré, voluntária e conscientemente, obteve para si vantagem indevida, consistente no saque indevido de parcelas de benefício previdenciário de titularidade de sua genitora, já falecida. Sobre a matéria, os precedentes resumidos nas ementas a seguir transcritas:
PENAL. PROCESSUAL PENAL. ARTIGO 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL. RECEBIMENTO INDEVIDO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SAQUE DE PARCELAS DO BENEFÍCIO APÓS ÓBITO DA SEGURADA. ESTELIONATO MAJORADO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS NOS AUTOS. DOLO CONFIGURADO. PROVAS SUFICIENTES NOS AUTOS. DOSIMETRIA DA PENA INALTERADA. 1. No estelionato é necessário que esteja presente o elemento subjetivo do tipo, consistente na vontade do agente de se apropriar de vantagem ilícita pertencente a outrem, causando prejuízo, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento. Aplica-se a causa de aumento do parágrafo 3º quando o crime é cometido contra entidade de direito público. 2. Inaplicável o princípio da insignificância, uma vez no crime de estelionato contra a Previdência Social o bem jurídico tutelado não se resume ao valor percebido, mas ao sistema previdenciário como um todo, abrangendo o patrimônio da coletividade de trabalhadores. Diferentemente dos crimes fiscais, em que se protege apenas a integração do erário, neste delito há a preocupação com a confiança mútua e o interesse público em impedir o emprego do logro que causa prejuízo à sociedade. 3. Crime de estelionato previdenciário, previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, suficientemente provado nos autos. Provas documentais e testemunhais quanto à prática delitiva. Dolo específico caracterizado pela intenção de obter vantagem ilícita. 4. Na apropriação de coisa havida por erro, nos termos do art. 169 do CP, a posse é transferida ao agente sem que tenha havido uma prévia intenção maliciosa, ou seja, não deve ocorrer a menor participação dolosa de quem recebe a coisa. Diversamente, é a hipótese do estelionato em que a obtenção da vantagem ilícita ocorre mediante uma conduta dolosa antecedente, onde o agente provoca ou concorre para manter a vítima em erro, mediante ardil. 5. Contexto dos autos que aponta pela ausência dos componentes estruturais do delito previsto no artigo 169 do CP, pois houve fraude no recebimento do benefício, sendo que o réu, voluntária e conscientemente, obteve para si vantagem indevida, consistente no saque indevido de parcela de benefício previdenciário após o falecimento da segurada. Impossibilidade de desclassificação da conduta para o crime de apropriação de coisa havida por erro, caso fortuito ou força da natureza (art. 169, caput, do Código Penal). 6. Contexto probatório firme quanto à materialidade e autoria delitivas. 7. Para que fique configurado o erro de proibição sobre a ilicitude do fato é necessário que seja demonstrado que o acusado não tinha, de forma alguma, conhecimento ou noção de sua conduta ilícita, proibida pelo Direito Penal. Erra-se quanto ao caráter proibido da conduta ao se acreditar, fundamentadamente, lícita uma ação ilícita. O agente carece do conhecimento potencial da proibição que recai sobre um fato típico e ilícito. Não configurado o erro de proibição no presente caso, não há que se falar em causa de exclusão da culpabilidade. 8. Não demonstrado o alegado estado de necessidade, ou inexigibilidade de conduta diversa. Dificuldades financeiras que supostamente estariam sendo enfrentadas pelo acusado, não justificam a prática do crime de estelionato previdenciário. 9. Dosimetria da pena em conformidade com os ditames do art. 59 e 68 do Código Penal. A pena imposta ao acusado guardou a proporcionalidade entre o ato delitivo praticado e a sanção imposta, sendo respeitado o binômio necessidade-suficiência. 10. Incabível a aplicação do benefício da suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei nº 9.099/95), uma vez que o réu foi denunciado pela prática de crimes cujas penas somadas ultrapassam o patamar de competência do Juizado Especial Criminal, que é de, no máximo, 2 (dois) anos, nos termos do art. 61 da Lei nº 9.099/95. 11. Apelação do réu não provida. (ACR 0008257-02.2016.4.01.3100, DESEMBARGADOR FEDERAL NEY BELLO, TRF1 - TERCEIRA TURMA, e-DJF1 11/02/2019 PAG.)
Apelação criminal. imputação pela prática de estelionato contra o instituto nacional do seguro social - inss (art. 171, § 3º, do cp). insurgência ministerial contra absolvição fundada em que as acusadas não concorreram para a infração penal. comportamento comissivo de substituir-se ao beneficiário do inss e utilizar seu cartão para sacar indevidamente o benefício, mantendo a autarquia previdenciária em erro. apelação do ministério público federal provida. 01. Trata-se de Apelação Criminal interposta pelo Ministério Público Federal, originada de ação penal pela suposta prática do crime de estelionato contra o INSS (art. 171, § 3º, do CP), interposta em face da r. sentença que julgou improcedente a pretensão punitiva nos termos do art. 386, IV, do Código de Processo Penal, sob o fundamento de que os fatos narrados caracterizam apropriação havida por erro (art. 169 do CP) e que, não havendo retificação por parte do Parquet federal nos termos do art. 384 do Código de Processo Penal, não se divisou os elementos do estelionato previdenciário referido na peça acusatória, impondo-se a absolvição das acusadas. 02. Caso concreto em que é imputada às acusadas a conduta de sacar fraudulentamente prestações oriundas de benefício previdenciário titularizado por sua genitora, após o seu falecimento, em prejuízo do INSS, a caracterizar o delito de estelionato previdenciário, por uma única vez. 03, A materialidade e a autoria delitiva são patentes, comprovadas por prova material corroborada pela confissão das acusadas, evidenciando que as acusadas se apropriaram dolosamente dos proventos previdenciários em nome de sua genitora posteriormente ao falecimento desta, calando-se eloquentemente no período em que o INSS manteve o benefício em manutenção. 04. Assiste razão ao Parquet federal ao sustentar que "malgrado não houvesse a exigência de agir de modo diverso quanto à comunicação ao INSS sobre o óbito da mãe, o mesmo não pode ser dito em relação aos saques dos benefícios, já que as denunciadas tinham plena consciência do caráter ilícito de seu comportamento, sendo-lhes exigido, naquelas circunstâncias, agir de maneira diversa". 05. Condenação que se impõe.
(APELAÇÃO CRIMINAL ..SIGLA_CLASSE: ApCrim 0004953-35.2016.4.03.6108 ..PROCESSO_ANTIGO: ..PROCESSO_ANTIGO_FORMATADO:, ..RELATOR C:, TRF3 - 11ª Turma, Intimação via sistema DATA: 08/06/2021 ..FONTE_PUBLICACAO1: ..FONTE_PUBLICACAO2: ..FONTE_PUBLICACAO3:.)
PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO DE APELAÇÃO. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO (ART. 171, PARÁGRAFO 3º, CP). ERRO DE TIPO E ERRO DE PROIBIÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. DOLO PRESENTE. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DO ART. 169 DO CP. IMPOSSIBILIDADE. DOSIMETRIA DA PENA. REDUÇÃO DA PENA-BASE. CONTINUIDADE DELITIVA. AFASTAMENTO. OCORRÊNCIA DE CRIME ÚNICO PERMANENTE.
1. Não há que se falar em ignorância sobre qualquer dos elementos constitutivos do tipo penal ou sobre a ilicitude do comportamento, porquanto o recorrente tinha conhecimento da existência do benefício previdenciário de seu falecido pai e movimentava constantemente a conta bancária, não sendo crível que desconhecesse a procedência daquele numerário, no montante aproximado de R$ 2.000,00 (dois mil reais), que mensalmente era depositado em uma conta que movimentava cerca de R$ 5.000,00 por mês.
2. Nenhuma credibilidade se empresta ao argumento de que o apelante desconhecia a obrigação de se informar o falecimento ao cartório do registro civil. Como restou consignado na sentença, o réu possui o 2º grau completo, é Presidente da Fundação Casa da Cultura de Serra Talhada, entidade vinculada à administração municipal, e é comerciante, possuindo discernimento suficiente para proceder de outra forma. Dolo comprovado.
3. Não prospera o pedido de desclassificação do delito de estelionato para o crime de apropriação de coisa havida por erro, caso fortuito ou força maior, com previsão no artigo 169 do Código Penal, porque os pagamentos indevidos do benefício, isto é, aqueles realizados após o óbito do genitor do recorrente, decorreram do ardil do réu em omitir a informação do óbito ao registro civil, e não de mero erro do INSS.
4. A magistrada valeu-se de argumentação quanto à culpabilidade e motivação do delito que apenas reproduz elementos do tipo penal e, dessa forma, não serve à exacerbação da pena-base.
5. O respeito à cláusula constitucional da presunção de inocência (art. 5º, LVII, CF/88) impede que inquéritos policiais ou processos ainda em curso sejam tomados à conta de maus antecedentes, personalidade voltada para o crime ou má conduta social, para fins de aumento da pena-base.
6. Pena-base fixada no mínimo e aumentada de um terço, em razão da causa de aumento prevista no parágrafo 3º, do artigo 171 do CP.
7. O saque mensal do benefício previdenciário não configura novos estelionatos, para fins de reconhecimento da continuidade delitiva. Hipótese em que fraudado um único benefício previdenciário de prestação continuada, sendo beneficiado o próprio agente fraudador, (crime permanente - STF, HC 99112/AM, 1ª Turma, Ministro Marco Aurélio, 20/04/2010), e não vários benefícios, em semelhantes condições de tempo, espaço e modus operandi.
8. Provimento, em parte, do apelo para diminuir a pena-base e afastar a continuidade delitiva, fixando a pena definitiva em 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão. (PROCESSO: 00005880220104058303, ACR9429/PE, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO WILDO, Segunda Turma, JULGAMENTO: 04/12/2012, PUBLICAÇÃO: DJE 13/12/2012 - Página 277)
Assim, não pode subsistir a desclassificação pretendida, porquanto não configurado o erro.
Comprovada a responsabilidade da acusada pela prática do delito tipificado no art. 171, § 3º, do Código Penal, deve ser mantida a condenação.
Passo ao exame da dosimetria.
O Magistrado de primeiro grau, após o exame das circunstâncias do art. 59 do CP, fixou a pena-base em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão e 30 (trinta) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, por considerar que a culpabilidade e as consequências do delito pesam em desfavor da ré.
Em que pese a aferição feita pelo Juízo a quo, compreendo que a dosimetria deve ser parcialmente revisada, a fim de se compatibilizar com as regras do art. 59 e 68 do Código Penal, dentro dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.
No exame da culpabilidade, para a fixação da pena-base deve a sentença aferir o grau de censurabilidade da conduta do agente – maior ou menor reprovabilidade – em razão das suas condições pessoais e da situação de fato em que ocorreu a conduta criminosa. A culpabilidade, ao lado da tipicidade e da ilicitude, constitui requisito do conceito analítico do crime, sem as quais não haveria juízo condenatório. (ACR 0001291-85.2011.4.01.4300/TO, Rel. Desembargadora Federal Monica Sifuentes, Rel. Conv. Juiz Federal Alexandre Buck Medrado Sampaio, 3ª Turma/TRF-1ª Região, unânime, e-DJF1 de 26/07/2013, p. 507). Aqui, a culpabilidade deve ser aferida no grau normal à espécie delitiva, na medida em que o menosprezo ao erário e à correta destinação dos recursos previdenciários, consubstancia a própria conduta criminosa da ré, de modo que não pode ser aferida de forma negativa a dar ensejo a majoração da pena-base.
Certo é que “não se pode considerar na dosimetria da pena, para efeito de elevar a pena-base, circunstâncias judiciais desfavoráveis ao acusado, dados ou fatos que já integram a descrição do tipo, sob pena de estar incorrendo em bis in idem.
Por outro lado, as consequências são graves, porque a concessão indevida do benefício causou prejuízo de R$ 42.523,73 (quarenta e dois mil quinhentos e vinte e três reais e setenta e três centavos), aos já sacrificados cofres públicos, em detrimento dos mais necessitados, estes que, efetivamente, fariam jus à assistência do INSS.
Desse modo, reduzo a pena-base para 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão e 14 (quatorze) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.
Correta a incidência da atenuante de confissão espontânea (art. 65, III, d, do Código Penal), conforme reconhecido pelo magistrado de primeiro grau, no que a pena fica reduzida para 01 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.
Sem circunstâncias agravantes, como considerado na sentença.
Correto o aumento de pena em 1/3 (um terço), como feito na sentença, nos termos do parágrafo 3º do art. 171 do Código Penal, pois o delito foi praticado contra o INSS, no que resulta uma pena de 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.
Correta, também, a incidência da causa de aumento, prevista no art. 71 do CP – crime continuado, uma vez que o delito foi praticado de forma continuada. Aqui, em que pese a argumentação da defesa, não há desacerto no reconhecimento de crime continuado, pois sua conduta criminosa se perpetrou de forma continuada, ao longo de 04 (quatro) anos.
Quanto à fração de aumento, procede a irresignação do Ministério Público Federal.
Com efeito, o aumento da pena pela continuidade delitiva, nos termos da jurisprudência do STJ, deve se dar no intervalo de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços), adotando-se o critério da quantidade de infrações praticadas.
É pacífico na jurisprudência do STJ o entendimento de que o aumento da pena pela continuidade delitiva, dentro do intervalo de 1/6 a 2/3, previsto no art. 71 do CPB, deve adotar o critério da quantidade de infrações praticadas. Assim, aplica-se o aumento de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações; 1/4, para 4 infrações; 1/3, para 5 infrações; 1/2, para 6 infrações; e 2/3, para 7 ou mais infrações – vejam-se, a propósito: AgRg no REsp 1169484/RS, Relator Ministro Jorge Mussi, 5ª Turma, DJe 16/11/2012; e AgRg no Ag no REsp 1367472/SC, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJe 29/08/2014.
No caso, em que foram 48 (quarenta e oito) saques de parcelas de benefício previdenciário, o aumento deve se dá na fração de 2/3 (dois terços), como requerido nas razões de apelo do MPF.
Assim, fazendo incidir o aumento pela continuidade delitiva em 2/3 (dois terços), a pena resulta em 02 (dois) anos e 02 (dois) meses de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, tornada definitiva.
Diante das condições dos artigos 33, §2º, c, e 44, ambos do CP, mantenho o regime aberto para o cumprimento inicial da pena, bem como a substituição da pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritivas de direitos, consubstanciadas em prestação pecuniária e prestação de serviços à comunidade, nos exatos termos da sentença. No ponto, consigno que o pedido da ré, de redução da pena substitutiva de prestação pecuniária, não merece acolhida. Isso porque, o magistrado a quo, fixou-a em doação de 9 (nove) cestas básicas, no valor de R$ 100,00 (cem reais) cada uma, o que resulta numa quantia inferior ao salário-mínimo atual.
Por fim, rejeito o pedido da defesa, no sentido de afastar a condenação no pagamento de indenização a título de reparação do dano causado pela infração, nos termos do art. 387, IV, do CPP, com a redação da Lei 11.719, de 20/06/2008. Primeiro porque os fatos delitivos se deram entre os anos de 2012 a 2016, ou seja, depois da edição da referida Lei, daí o acerto da condenação a esse título. Segundo porque, o pedido de indenização foi requerido pelo órgão acusatório na denúncia e durante a instrução processual, de modo que houve submissão da matéria ao crivo do contraditório e da ampla defesa.
Mantido o regime aberto para cumprimento da pena, na hipótese de execução (art. 33, § 2º, c, do Código Penal).
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação da ré, apenas para revisar a dosimetria e afastar a aferição negativa relativa à culpabilidade e dou provimento ao recurso do Ministério Público Federal para majorar a fração de aumento de pena em decorrência da continuidade delitiva.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 08 - DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO
PROCESSO: 0006840-29.2017.4.01.3504
voto revisor
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO (REVISORA):
Após a análise dos autos, nada tenho a acrescentar ao relatório.
Considero que os fundamentos lançados no voto do relator exaurem a análise das questões versadas na apelação, dirimindo-as adequadamente, razão pela qual devem ser acolhidos.
Ante o exposto, acompanho o voto do relator.
É como voto.
Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso
Revisora

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NEY BELLO
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CRIMINAL (417)0006840-29.2017.4.01.3504
Processo referência: 0006840-29.2017.4.01.3504
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA), KARLA ETERNA MARTINS SILVA
APELADO: KARLA ETERNA MARTINS SILVA, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA)
EMENTA
PENAL. PROCESSUAL PENAL. ARTIGO 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL. RECEBIMENTO INDEVIDO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SAQUE DE PARCELAS DO BENEFÍCIO APÓS ÓBITO DA SEGURADA. ESTELIONATO MAJORADO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOLO CONFIGURADO. PROVAS SUFICIENTES NOS AUTOS. DOSIMETRIA DA PENA REVISADA.
1. No estelionato é necessário que esteja presente o elemento subjetivo do tipo, consistente na vontade do agente de se apropriar de vantagem ilícita pertencente a outrem, causando prejuízo, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento. Aplica-se a causa de aumento do parágrafo 3º quando o crime é cometido contra entidade de direito público.
2. Crime de estelionato previdenciário, previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, suficientemente provado nos autos. Provas documentais e testemunhais quanto à prática delitiva. Dolo específico caracterizado pela intenção de obter vantagem ilícita.
3. Na apropriação de coisa havida por erro, nos termos do art. 169 do CP, a posse é transferida ao agente sem que tenha havido uma prévia intenção maliciosa, ou seja, não deve ocorrer a menor participação dolosa de quem recebe a coisa. Diversamente, é a hipótese do estelionato em que a obtenção da vantagem ilícita ocorre mediante uma conduta dolosa antecedente, onde o agente provoca ou concorre para manter a vítima em erro, mediante ardil.
4. Contexto dos autos que aponta pela ausência dos componentes estruturais do delito previsto no artigo 169 do CP, pois houve fraude no recebimento do benefício, sendo que a ré, voluntária e conscientemente, obteve para si vantagem indevida, consistente no saque indevido de parcela de benefício previdenciário após o falecimento da segurada. Impossibilidade de desclassificação da conduta para o crime de apropriação de coisa havida por erro, caso fortuito ou força da natureza (art. 169, caput, do Código Penal).
5. Contexto probatório firme quanto à materialidade e autoria delitivas.
6. Para que fique configurado o erro de proibição sobre a ilicitude do fato é necessário que seja demonstrado que o acusado não tinha, de forma alguma, conhecimento ou noção de sua conduta ilícita, proibida pelo Direito Penal. Erra-se quanto ao caráter proibido da conduta ao se acreditar, fundamentadamente, lícita uma ação ilícita. O agente carece do conhecimento potencial da proibição que recai sobre um fato típico e ilícito. Não configurado o erro de proibição no presente caso, não há que se falar em causa de exclusão da culpabilidade.
7. Não demonstrado o alegado estado de necessidade, ou inexigibilidade de conduta diversa. Dificuldades financeiras que supostamente estariam sendo enfrentadas pelo acusado, não justificam a prática do crime de estelionato previdenciário.
8. Dosimetria da pena revisada para se ajustar aos ditames do art. 59 e 68 do Código Penal, atendendo-se ao binômio necessidade-suficiência. Afastada a avaliação negativa relativa à culpabilidade da ré.
9. É pacífico na jurisprudência do STJ o entendimento de que o aumento da pena pela continuidade delitiva, dentro do intervalo de 1/6 a 2/3, previsto no art. 71 do CPB, deve adotar o critério da quantidade de infrações praticadas. Assim, aplica-se o aumento de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações; 1/4, para 4 infrações; 1/3, para 5 infrações; 1/2, para 6 infrações; e 2/3, para 7 ou mais infrações – vejam-se, a propósito: AgRg no REsp 1169484/RS, Relator Ministro Jorge Mussi, 5ª Turma, DJe 16/11/2012; e AgRg no Ag no REsp 1367472/SC, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJe 29/08/2014. No caso, em que foram 48 (quarenta e oito) saques de parcelas de benefício previdenciário, o aumento deve se dá na fração de 2/3 (dois terços), como requerido pelo do MPF.
10. Correta a condenação no pagamento de indenização a título de reparação do dano causado pela infração, nos termos do art. 387, IV, do CPP, com a redação da Lei 11.719, de 20/06/2008. Os fatos delitivos se deram entre os anos de 2012 a 2016, ou seja, depois da edição da referida Lei, e, ainda, o pedido de indenização foi requerido pelo órgão acusatório na denúncia e durante a instrução processual, de modo que houve submissão da matéria ao crivo do contraditório e da ampla defesa.
11. Apelação da ré parcialmente provida, apenas para revisar a dosimetria e afastar a aferição negativa relativa à culpabilidade. Apelação do Ministério Público Federal provida, para majorar a fração de aumento de pena em decorrência da continuidade delitiva.
ACÓRDÃO
Decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, dar parcial provimento à apelação da ré e dar provimento à apelação do MPF.
Terceira Turma do TRF da 1ª Região – Sessão Virtual de 20 de fevereiro a 04 de março de 2024
Desembargador Federal NEY BELLO
Relator
