
POLO ATIVO: ISRAEL FERREIRA NEVES
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: MARIANA BORGES VIEIRA - GO24545-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

PROCESSO: 1000682-74.2022.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 5245411-23.2020.8.09.0049
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: ISRAEL FERREIRA NEVES
REPRESENTANTES POLO ATIVO: MARIANA BORGES VIEIRA - GO24545-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
O Excelentíssimo Desembargador Federal Urbano Leal Berquó Neto (Relator):
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos do autor, negando-lhe a pensão por morte.
Em suas razões recursais, o autor requer a reforma da sentença, alegando o preenchimento de todos os requisitos para a concessão do benefício, em especial a qualidade de segurada especial da de cujus.
Regularmente intimado, o INSS não apresentou contrarrazões.
É o relatório.

PROCESSO: 1000682-74.2022.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 5245411-23.2020.8.09.0049
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: ISRAEL FERREIRA NEVES
REPRESENTANTES POLO ATIVO: MARIANA BORGES VIEIRA - GO24545-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
O Excelentíssimo Desembargador Federal Urbano Leal Berquó Neto (Relator):
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Passo à análise do apelo em que o autor alega ter direito o preenchimento de todos os requisitos necessários à concessão do benefício da pensão por morte.
Não assiste razão à apelante.
Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário da pensão por morte são: a) a qualidade de segurado do falecido por ocasião do óbito; b) a ocorrência do evento morte; c) a condição de dependente de quem objetiva a pensão. Salienta-se que o benefício independe de carência e é regido pela legislação à época do óbito.
O juízo a quo entendeu não comprovada a qualidade de segurada especial da falecida ao tempo do óbito e quando da concessão do benefício assistencial ao portador de deficiência.
O autor sustenta neste recurso que foi desconsiderada a incapacidade laborativa da de cujus, existente desde 2012, quando já deveria estar recebendo benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, na qualidade de segurada especial, tendo-lhe sido concedido erroneamente o benefício assistencial em 2017.
Pois bem! Nada obstante o ditame do art. 38-B, § 1º, da Lei nº 8.213/1991 rezar que “a partir de 1º de janeiro de 2023, a comprovação da condição e do exercício da atividade rural do segurado especial ocorrerá, exclusivamente, pelas informações constantes do cadastro a que se refere o art. 38-A desta Lei” - sendo que o aludido repositório é o Cadastro Nacional de Informações Sociais, CNIS -, admite-se, para momentos anteriores de labor o uso de outras modalidades probatórias (art. cit, § 2º). Tal se mostra compreensível dada à precariedade da inserção efetiva de elementos testificadores de trabalho campesino a quem o desenvolve, sobretudo quando se tratar de exercício da atividade em localidades afastadas, insertas a grandes distâncias dos centros urbanos.
Consignada dita premissa, convém destacar que os documentos apresentados pelo recorrente não configuram sequer início de prova material contemporânea da qualidade de segurada da de cujus. O passamento ocorreu em 6/4/2018, segundo a certidão de óbito, onde a de cujus foi qualificada como “do lar” (f. 18). O autor não comprovou que, ao tempo da concessão do benefício assistencial à pessoa com deficiência, em 2/6/2017 (fl. 122), a falecida faria jus a algum benefício previdenciário, como, por exemplo, a aposentadoria por invalidez. Com a inicial foram juntados aos autos os seguintes documentos: (i) carteira do sindicato dos trabalhadores rurais de Conceição do Araguaia emitida 29/1/1986, em nome do autor, acompanhada de comprovantes de pagamento datados de 1992, 1998, 1999, 2001 (fls. 13 e 20); (ii) CTPS do autor com uma única anotação de vínculo de trabalho, no período de 1982 a 1984 (fls. 14/15); (iii) certidão de casamento, realizado em 12/12/1986, na qual o autor foi qualificado como lavrador e a de cujus, como “do lar” (fl. 17); (iv) histórico escolar de filho do casal, emitido em 14/8/2012 por estabelecimento de ensino localizado na zona rural (fl. 21); (v) comprovantes de compras de produtos diversos feitas pelo autor, datados de 2000, 2002, 2005 e 2004 (fls. 20, 22 e 23); (vi) contrato de adesão a plano de assistência familiar em nome do autor, celebrado em 19/6/2018 (fl. 24); (vii) declaração de filho nascido vivo da de cujus, na qual foi qualificada como lavradora, datada de 2000 (fl. 25); (viii) declaração expedida pelo INCRA, em 28/7/1998, na qual restou consignado que o autor era ocupante de imóvel rural (fl. 27); (ix) declaração do ITR relativas aos exercícios 1997 a 2004 (fls. 28/39); (x) declaração firmada pelo INCRA, na qual restou declarado que o autor, qualificado como lavrador, era assentado do PA Joncon Três Irmãos, situado no município do Araraguaia/PA, onde via com a de cujus em regime de economia familiar, datada de 2000 (fl. 44); (xi) espelho da unidade familiar que informa que, em 2013, o autor e sua esposa já não mais ostentavam a condição de assentados (fl 45); e (xii) prontuários, exames, receitas e documentos médicos diversos, em nome da de cujus, produzidos unilateralmente, sem informação quanto à data de início de incapacidade laborativa da de cujus (fl. 46/94).
Em que pese à inexistência de carência para a concessão da pensão por morte, no que tange à caracterização da condição de segurado especial, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Jurisprudência, firmou o entendimento de que para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalhador rural, apesar de não haver exigência legal de que o documento apresentado como início de prova material abranja todo o período que se busca comprovar, é preciso que tal prova seja contemporânea ao menos por uma fração do lapso de trabalho rural pretendido (Pet 7.475/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 09/11/2016, DJe 29/11/2016).
Assim, sobre os documentos admitidos como prova material, é pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
São idôneos, portanto, dentre outros, a ficha de alistamento militar, o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado (STJ, AgRG no REsp 939191/SC); a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF); certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR 1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR 3202/CE).
Igualmente aceitáveis documentos tais como certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que indiciem a ligação da parte autora com o trabalho e a vida no meio rural, bem como a CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora, que é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (REsp 310.264/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves da Silva, Segunda Turma, e-DJF1 p.33 de 17/07/2008, AC 0004262-35.2004.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal Miguel Ângelo de Alvarenga Lopes, 3ª Turma Suplementar, e-DJF1 p.191 de 02/03/2011).
Por outro lado, são inservíveis como início de prova material do labor rural durante o período da carência os documentos não revestidos das formalidades legais para comprovar a autenticidade, os desprovidos de segurança jurídica e aqueles que tiverem sido confeccionados em momento próximo ao ajuizamento da ação, à data de entrada do requerimento administrativo - DER ou à data do nascimento da criança. Por tal razão, a certidão eleitoral (retificável a qualquer tempo) com anotação indicativa da profissão de rurícola, certidão de nascimento da criança e/ou certidão de casamento sem qualificação profissional, prontuários médicos, cartão da gestante, cartão de vacinas, carteira e ficha de filiação a sindicato de trabalhadores rurais, desacompanhados dos recolhimentos, CTPS sem anotações de vínculos rurais, documentos de terras em nome de terceiros, bem como declaração de terceiros são inservíveis como início de prova material.
Nesta mesma direção são os seguintes precedentes: AC 00052792020184019199, Desembargador Federal João Luiz de Sousa, TRF1 – Segunda Turma, e-DJF1 Data: 08/06/2018 Página; AC 00017872020184019199, Desembargador Federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira, TRF1 - Primeira Turma, e-DJF1 Data: 06/06/2018 Página; AC 1021403-47.2022.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL PEDRO BRAGA FILHO, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 11/06/2023 PAG.
Dessa forma, considerando o conjunto probatório dos autos, verifica-se que o autor não logrou comprovar o efetivo exercício de atividade rural pela falecida ao tempo do óbito, mediante início razoável de prova material, ainda que corroborada com prova testemunhal, sendo inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149 e TRF/1ª Região, Súmula 27), o que impõe o indeferimento do pedido de concessão do benefício da pensão por morte.
Outrossim, não ficou demonstrada a qualidade de segurada da falecida quando da concessão do amparo social a portador de deficiência, tendo em vista que o autor não juntou nenhum documento contemporâneo ao tempo da concessão do benefício assistencial que comprove que o benefício foi concedido erroneamente pela administração pública.
Pelo exposto, à vista dos documentos acostados aos autos durante a instrução probatória, verifica-se a deficiência em relação à prova material capaz de demonstrar a atividade rural em regime de economia familiar ao tempo do óbito e da concessão do benefício de amparo social à de cujus.
Vê-se que, a fim de demonstrar a incapacidade laborativa da de cujus, existente desde 2012, e a alegada concessão errônea de amparo social ao portador de deficiência, o autor juntou à petição deste recurso o laudo de perícia médica (fls. 164/166) produzido nos autos da ação n. 0027265-26.2016.4.01.3500, na qual a de cujus pleiteou a concessão de aposentadoria por invalidez/auxílio-doença na qualidade de trabalhadora rural, que tramitou perante o 14ª Juizado Especial Federal de Goiânia, julgada improcedente, com trânsito em julgado em 12/5/2017.
Embora o autor tenha alegado a incapacidade de sua esposa para o labor e a concessão errônea do benefício assistencial ao portador de deficiência já na petição inicial e o referido laudo, que concluiu pela incapacidade laborativa total e definitiva da de cujus a partir de 26/3/2012, tenha sido produzido anteriormente ao ajuizamento da presente ação, em 19/8/2016, somente na fase recursal foi colacionado aos autos.
Neste ponto, importa ressaltar que o documento novo não pode ser levado em consideração no julgamento do presente recurso, pois, referida informação não foi levada ao conhecimento do Juízo a quo, ou seja, não houve juntada da prova durante a instrução processual, mesmo não se tratando de fato novo. Nos termos do art. 1.014 do CPC, “as questões de fato não propostas no juízo inferior poderão ser suscitadas na apelação, se a parte provar que deixou de fazê-lo por motivo de força maior”.
A inovação em sede recursal caracteriza-se, portanto, como supressão de instância, motivo pelo qual a matéria, que não foi submetida ao crivo do juízo a quo, não tendo sido decidida na sentença, não pode ser analisada pelo Tribunal, sob pena de ofensa aos princípios constitucionais do devido processo legal, do duplo grau de jurisdição, do contraditório e da ampla defesa.
Por fim, na esteira da orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento submetido à sistemática dos recursos repetitivos, em caso de ausência de prova da condição de trabalhador rural há carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo a ensejar a extinção da ação sem julgamento do mérito, possibilitando que o autor intente nova ação caso reúna os elementos necessários (REsp. n. 1.352-71-SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, julgado em 16/12/2015, DJe 28/4/2016).
De modo geral, a sentença previdenciária é proferida secundum eventus litis ou secundum eventum probationis, de modo que a demonstração pela parte autora, em momento posterior, do atendimento dos requisitos legais, autorizaria nova postulação do benefício, pois a coisa julgada em casos da espécie se opera segundo as circunstâncias da causa.
A orientação fixada no julgado retrocitado agrega a vantagem processual de afastar discussão relativa à ocorrência ou não de coisa julgada material, no caso de nova ação, o que tem sido comum nas ações previdenciárias, e que deve ser evitada.
Desta forma, por se enquadrar o caso em concreto na temática decidida pelo STJ, declaro, de ofício, extinto o processo sem resolução do mérito.
Apelação prejudicada.
Fixo os honorários em 10% do valor da causa. A exigibilidade fica suspensa em razão de ser o apelante beneficiário da assistência judiciária.
É como voto.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator

PROCESSO: 1000682-74.2022.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 5245411-23.2020.8.09.0049
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: ISRAEL FERREIRA NEVES
REPRESENTANTES POLO ATIVO: MARIANA BORGES VIEIRA - GO24545-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. TRABALHADORA RURAL. FALTA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONTEMPORÂNEA AO TEMPO DO ÓBITO E DA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. AUSÊNCIA DE JUNTADA DURANTE A INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. NÃO COMPROVADA A CONCESSÃO ERRÔNEA DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. QUALIDADE DE SEGURADA NÃO COMPROVADA. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RECURSO PREJUDICADO.
1. Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos do autor, negando-lhe o benefício previdenciário da pensão por morte.
2. Em que pese a inexistência de carência para a concessão da pensão por morte, no que tange à caracterização da condição de segurado especial, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Jurisprudência, firmou o entendimento de que para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalhador rural, apesar de não haver exigência legal de que o documento apresentado como início de prova material abranja todo o período que se busca comprovar, é preciso que tal prova seja contemporânea ao menos por uma fração do lapso de trabalho rural pretendido.
3. No que diz respeito ao presente caso, em exame dos autos, verifica-se que o autor não juntou documentos servíveis como início de prova material da alegada condição de trabalhadora rural da falecida ao tempo do óbito. In casu, o óbito ocorreu em 6/4/2018. Também durante a instrução probatória não comprovou o autor que, ao tempo da concessão do benefício assistencial à pessoa com deficiência, em 2/6/2017, a falecida faria jus a algum benefício previdenciário, como, por exemplo, a aposentadoria por invalidez.
4. Ressalte-se que, conforme Súmula 149 do STJ “A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”. Logo, ausente início de prova material do labor campesino realizado pela falecida, não seria possível a comprovação exclusivamente pela prova testemunhal. No mesmo sentido, Súmula 27 desta Corte Regional.
5. A juntada à apelação de documento não anexado na fase de conhecimento – laudo de perícia médica produzido em 19/8/2016 nos autos de ação que tramitou perante a Justiça Federal, que concluiu pela incapacidade laborativa total e definitiva da de cujus a partir de 26/3/2012 (fls. 164/1666) - infringe diretamente o disposto no art. 1.014 do CPC, já que não levado a conhecimento do magistrado a quo, tampouco se tratando de fato superveniente à sentença.
6. Apelação prejudicada.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, declarar EXTINTO O PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, em razão da ausência de conteúdo probatório suficiente a servir como início de prova material, julgando PREJUDICADA à apelação interposta, nos termos do voto do Relator.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator
