
POLO ATIVO: WELTON MATIAS DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: MARIA CRISTINA ANTONIA DA SILVA OLIVEIRA - GO41376
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):ANTONIO OSWALDO SCARPA

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1031039-37.2022.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: WELTON MATIAS DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora de sentença em que foi julgado extinto o processo sem resolução do mérito, relativo ao pedido de benefício de amparo assistencial previsto na Lei nº 8.742/93, por ausência de interesse processual, tendo em vista que na esfera administrativa pleiteou benefício diverso, qual seja, o auxílio-doença.
A parte autora pleiteia a reforma da sentença para que seja julgado o mérito da causa, ao argumento de que preenche os requisitos para a obtenção do benefício de prestação continuada, por ser pessoa com deficiência e vulnerável social. Subsidiariamente, pugna para que os autos retornem à primeira instância para realização da perícia médica e posterior decisão final.
Não foram apresentadas as contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1031039-37.2022.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: WELTON MATIAS DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Do interesse de agir.
O douto juízo julgou extinto o processo sem resolução do mérito, por ausência de interesse de agir, tendo em vista que na esfera administrativa pleiteou benefício diverso, o auxílio-doença.
Todavia, esta eg. Corte tem o entendimento de que a ausência de requerimento específico de benefício assistencial não afasta o interesse processual.
Assim, o requerimento administrativo do auxílio-doença é suficiente para que seja configurado o interesse de agir da parte autora. Veja-se:
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE AMPARO ASSISTENCIAL – LOAS E AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. AFASTADA. DIB NA DER. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. TEMA 810/STF E TEMA 905/STJ. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. RECURSO ADESIVO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O cerne das questões recursais repousa sobre o interesse de agir da parte autora, na concessão do LOAS, e sobre a alteração da fixação da DIB para a data do requerimento administrativo. 2. A jurisprudência do e. STJ tem adotado a aplicação do princípio da fungibilidade no âmbito do direito previdenciário, mediante flexibilização dos princípios dispositivo e da adstrição para permitir a concessão de benefício diverso do postulado nos autos. Nesse sentido, entre outros: AgRg no REsp n. 1.385.134/RN, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 19/3/2015, DJe de 31/3/2015. Assim, a ausência de requerimento específico de benefício assistencial não enseja em falta de interesse de agir. O requerimento administrativo de auxílio-doença é suficiente para que seja configurado o interesse de agir da parte autora. Ademais, o INSS apresentou contestação, visto que houve a resistência ao pedido. 3. No que tange ao apelo adesivo, na parte que em pleiteia a concessão do LOAS, entendo que não lhe assiste razão. Primeiro, porque foi a própria parte autora quem solicitou a conversão do LOAS em auxílio-doença. Segundo, porque ficou constatado mediante laudo pericial que a autora encontra-se apta para fazer as atividades do cotidiano. O perito concluiu que a autora "é portadora de lesão iatrogênica", mas tal diagnóstico não a torna incapacitada para o trabalho habitual. Logo, a autora não faz jus à concessão de benefício assistencial. 4. Conforme consta do laudo, o início da incapacidade ocorreu em 04/03/2015, portanto a autora faz jus à concessão do benefício desde a DER, observada a prescrição das parcelas pretéritas ao quinquênio anterior à propositura da ação. 5. As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE em sede de repercussão geral (Tema 810) e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905). 6. Apelação do INSS desprovida. Recurso adesivo da autora parcialmente provido. (AC 1004423-30.2019.4.01.9999, TRF 1 PRIMEIRA TURMA, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ, PJe 17/08/2023 PAG)(grifos nossos)
Preliminar rejeitada.
Do mérito
Para fins da concessão do benefício em comento, a pessoa portadora de deficiência é aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (§2º, art. 20, da Lei nº 8.742/93).
Essa redação foi dada em razão do advento do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146, de 2015), que passou a adotar um conceito mais amplo do que é deficiência.
A Súmula do 48 da TNU, em consonância com a nova redação da Lei 8.742/93, estabelece o seguinte: “Para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a data prevista para a sua cessação.”
No que tange ao critério da incapacidade, o art. 20, § 2º da LOAS não apresenta qualquer restrição quanto ao tipo, se é parcial, total, absoluta, temporária ou definitiva. Esse é o entendimento firmado pelo STJ:
A LOAS, EM SUA REDAÇÃO ORIGINAL, NÃO FEZ DISTINÇÃO QUANTO À NATUREZA DA INCAPACIDADE, SE PERMANENTE OU TEMPORÁRIA, TOTAL OU PARCIAL. ASSIM NÃO É POSSÍVEL AO INTÉRPRETE ACRESCER REQUISITOS NÃO PREVISTOS EM LEI PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. AGRAVO INTERNO DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O STJ tem entendimento consolidado de que a errônea valoração da prova permite a esta Corte Superior a revaloração dos critérios jurídicos utilizados pelo Tribunal de origem na apreciação dos fatos incontroversos. 2. A Constituição Federal/1988 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei. 3. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/1993, em seu art. 20, § 2o., em sua redação original dispunha que a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho. 4. Em sua redação atual, dada pela Lei 13.146/2015, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. 5. Verifica-se que em nenhuma de suas edições a Lei impôs como requisito ao benefício assistencial a incapacidade absoluta. 6. Não cabe ao intérprete a imposição de requisitos mais rígidos do que aqueles previstos na legislação para a concessão do benefício. 7. Agravo Interno do INSS a que se nega provimento.” (STJ - AgInt no AREsp 1263382/SP 2018/0060293-2, Relator: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de julgamento: 06/12/2018, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de publicação: DJe 19/12/2018 RSTP vol. 357 p. 148) (grifos nossos)
O laudo médico oficial confirma que a parte autora é portadora de Doença pulmonar obstrutiva crônica com infecção respiratória aguda do trato respiratório inferior (CID J44.0), apresentando incapacidade permanente total para o labor devido à dispneia intensa aos mínimos esforços. A incapacidade decorre do agravamento da patologia. Atesta, ainda, que não é possível prever data da cessação da incapacidade, em razão da doença ser instável, não se controlando com medicamentos.
Por fim, esclarece que “O periciando é portador de doença pulmonar obstrutiva crônica grau IV ocasionada pelo tabagismo, apresenta caráter progressivo e incurável, as medicações empregadas no tratamento apenas aliviam os sintomas, gerando incapacidade total e permanente para qualquer tipo de atividade laboral.” (id. 276502522)
No que toca à renda familiar per capita, o Plenário do STF, ao julgar a ADIN n. 1.232-1/DF, concluiu que embora a lei tenha estabelecido hipótese objetiva de aferição da miserabilidade, o legislador não excluiu outras formas de verificação de tal condição, ainda que a renda familiar per capita ultrapasse ¼ do salário mínimo, devendo o julgador avaliar a vulnerabilidade social de acordo com o caso concreto.
Logo, a vulnerabilidade social deve ser aferida pelo julgador na análise do caso concreto, de modo que o critério objetivo fixado em lei deve ser considerado como um norte, podendo o julgador considerar outros fatores que viabilizem a constatação da hipossuficiência do requerente.
Importante consignar que fora dos requisitos objetivos previstos em lei, a comprovação da miserabilidade deverá ser viabilizada pela parte requerente, a qual incumbe apresentar meios capazes de incutir no julgador a convicção de sua vulnerabilidade social.
Da perícia social realizada em 08/02/2022, atestou que o grupo familiar é composto pela parte autora, esposa, e dois filhos. A renda familiar é derivada dos "bicos" que a parte autora realiza no ramo da construção civil e ocasionalmente com capina, em trabalhos informais, de doações da igreja que frequentam e do programa Auxílio Brasil, no valor de R$ 400,00. As despesas familiares são em torno de R$ 1.218,00.
Por fim, o parecerista foi favorável à pretensão da parte autora afirmando que “pode-se perceber que trata-se de família em situação de vulnerabilidade social, econômica e financeira em decorrência de saúde fragilizada do mantenedor do grupo, no caso, o Sr Weltom.” (id. 276502522)
Considerando o entendimento jurisprudencial consolidado no sentido de que podem ser utilizados outros elementos probatórios para aferição da capacidade da família de prover suas necessidades básicas e os fatos narrados e comprovados pelos documentos anexados à exordial, resta comprovada a situação de vulnerabilidade social da parte apelante, notadamente quando se verifica que a renda familiar per capita não ultrapassa ½ salário mínimo.
Dessa forma, estando comprovados os requisitos legais para a concessão do benefício de prestação continuada, a reforma da sentença é medida que se impõe.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo e, na sua ausência, a partir da data do ajuizamento da ação, conforme definição a respeito do tema em decisão proferida pelo e. STJ, em sede de recurso representativo da controvérsia (REsp 1369165/SP).
Cabe ressaltar que há possibilidade de revisão administrativa do benefício assistencial a cada 02 (dois) anos, a fim de avaliar a continuidade das condições que ensejaram a concessão do benefício, conforme preceitua o artigo 21, da Lei 8.742/1993.
Diante do exposto, DOU PROVIMENTO à apelação interposta pela parte autora para, reformando a sentença, julgar procedente o pedido, condenando o INSS a pagar-lhe o benefício requerido, desde a data do requerimento administrativo (14/12/2020).
Juros e correção monetária conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros se harmonizam com a orientação que se extrai do julgamento do TEMA 905 STJ e 810 (STF). Incidência da SELIC após a entrada em vigor da EC 113/2021.
Condeno, ainda, o INSS a pagar honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação do acórdão (Súmula 111/STJ).
Concedo antecipação de tutela, determinando a implantação do benefício de prestação continuada, no prazo de 30 (trinta) dias, nos termos do art. 497 do CPC.
É o voto.
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
Relator

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1031039-37.2022.4.01.9999
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: WELTON MATIAS DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. LOAS. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR AFASTADA. DIB NA DER. VERIFICAÇÃO DA CONDIÇÃO DE DEFICIÊNCIA E VULNERABILIDADE SOCIAL. ELEMENTOS COMPROBATÓRIOS APELAÇÃO PROVIDA.
1. O Juízo a quo julgou extinto o processo sem resolução do mérito, por ausência de interesse de agir, sob o fundamento de que na esfera administrativa pleiteou benefício diverso, a saber, auxílio-doença. Todavia, esta eg. Corte tem o entendimento de que a ausência de requerimento específico de benefício assistencial não enseja falta de interesse de agir. Preliminar afastada.
2. O benefício de prestação continuada está previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, que garante o pagamento de um salário mínimo à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, nos termos da lei.
3. A Lei 8.742/1993, em seu art. 20, § 2º, na redação original dispunha que a pessoa com deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
4. No entanto, mencionado dispositivo, em sua redação atual, dada pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), define, de forma mais ampla, pessoa com deficiência como aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
5. O laudo médico oficial confirma que a parte autora é portadora de doença pulmonar obstrutiva crônica com infecção respiratória aguda do trato respiratório inferior (CID J44.0), apresentando incapacidade permanente total para o labor devido à dispneia intensa aos mínimos esforços.
6. No que toca a renda familiar per capita, o Plenário do STF, ao julgar a ADIN n. 1.232-1/DF, concluiu que embora a lei tenha estabelecido hipótese objetiva de aferição da miserabilidade, o legislador não excluiu outras formas de verificação de tal condição, ainda que a renda familiar per capita ultrapasse ¼ do salário mínimo, devendo o julgador avaliar a vulnerabilidade social de acordo com o caso concreto.
8. O laudo social atesta a condição de miserabilidade social da parte autora. Considerando o entendimento jurisprudencial consolidado no sentido de que podem ser utilizados outros elementos probatórios para aferição da capacidade da família de prover suas necessidades básicas e os fatos narrados e comprovados pelos documentos anexados à exordial, restou comprovada a situação de vulnerabilidade social.
9. Comprovados os requisitos legais para a concessão do benefício de prestação continuada, a reforma da sentença é medida que se impõe.
10. O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo e, na sua ausência, a partir da data do ajuizamento da ação, conforme definição a respeito do tema em decisão proferida pelo e. STJ, em sede de recurso representativo da controvérsia (REsp 1369165/SP).
11. Apelação da parte autora provida para, reformando a sentença, conceder o benefício de prestação continuada com termo inicial a contar da data do requerimento administrativo (14/12/2020).
12. Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação do acórdão (Súmula 111/STJ).
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília (DF), (data da Sessão).
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
