
POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria)
POLO PASSIVO:HELIO FREITAS
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MAURICIO BAPTISTA LINS - BA18411-A e SEBASTIAN BORGES DE ALBUQUERQUE MELLO - BA14471-A
RELATOR(A):WILSON ALVES DE SOUZA

Gab. 07 - DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA
Processo Judicial Eletrônico
R E L A T Ó R I O
Trata-se de Apelação interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO em face da sentença (id. 63254265) que absolveu sumariamente o Acusado HÉLIO FREITAS da imputação que lhe é atribuída na denúncia, - qual seja, da prática do delito previsto no art. 168-A, caput, c/c art. 71, ambos do Código Penal – com base no art. 397, II, do CPP, julgando, por conseguinte, improcedente a pretensão punitiva estatal.
Em suas razões recursais (id. 63255518), o Ministério Público Federal expõe que denunciou HÉLIO FREITAS, na condição de gestor da empresa INSBOT – INSTITUTO BAHIANO DE ORTOPEDIA E TRAUMATOLOGIA, pela prática do delito tipificado no art. 168-A do Código Penal, porquanto, conforme narrado na Nota DIFIS 44/2018 (fls. 17/19), reteve contribuições previdenciárias descontadas dos empregados da referida pessoa jurídica e não repassou os valores à Receita Federal, relativamente às competências de dezembro de 2013 a setembro de 2018.
Segundo a acusação, mediante a aludida conduta, o Denunciado deixou de recolher aos cofres públicos a quantia total de R$ 3.665.228,15 (três milhões, seiscentos e sessenta e cinco mil, duzentos e vinte e oito reais e quinze centavos), a título de contribuição previdenciária.
Menciona o Parquet Federal que o Juízo a quo absolveu sumariamente HÉLIO FREITAS sob o argumento de que, no curso do inquérito policial, restou demonstrada a situação de fragilidade financeira pela qual passou o INSTITUTO BAHIANO DE ORTOPEDIA E TRAUMATOLOGIA no período referido na denúncia, razão pela qual entendeu configurada a hipótese de inexigibilidade de conduta diversa, todavia, segundo alega a acusação, a sentença deveria ser reformada.
Para tanto, sustenta o Ministério Público Federal, em síntese, que a simples afirmação do Réu a respeito da crise financeira enfrentada pela empresa não é motivação suficiente para a caracterização da inexigibilidade da conduta diversa, mas sim demonstrar o comprometimento patrimonial pessoal de seus gestores – ato supostamente não apresentado pelo Réu.
Assevera o Apelante que, em relação ao comprometimento do patrimônio pessoal do Apelado, o MM. Juízo limita-se a aduzir que “não só a pessoa jurídica, mas também o próprio acusado foi afetado por diversos bloqueios decorrentes de ordens judiciais expedidas pela Justiça do Trabalho”. Todavia, como narrado na denúncia, o bloqueio, pela Justiça do Trabalho, de valores custodiados em contas-correntes de titularidade do recorrido não é indicativo de perda patrimonial, visto que a mera ordem de bloqueio não importa em perda de toda a quantia embaraçada.
Consigna a acusação que, ratificando a ausência de demonstração de redução do patrimônio pessoal de HÉLIO FREITAS, verifica-se, em seu termo de interrogatório (fl. 60) e no mandado de citação (fl. 370), que o Apelado reside na rua Waldemar Falcão, nº 999, apto. 2002, edifício Rosa Fingegurt, Brotas, localidade sabidamente nobre na cidade do Salvador, com imóveis de alto padrão e apartamentos que, via de regra, são avaliados em cifras milionárias.
Dessa forma, segundo o Ministério Público Federal, não há como admitir, ao menos nessa fase procedimental, a absolvição sumária do Recorrido com fulcro na inexigibilidade de conduta diversa, razão pela qual pugna pela reforma da sentença para que seja retomado o curso da ação penal em desfavor do Acusado.
O Réu apresentou contrarrazões à apelação (id. 63255522).
A Procuradoria Regional da República apresentou parecer ministerial pelo desprovimento da apelação (id. 66422560).
É o Relatório.
Ao Revisor.

Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 07 - DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA
V O T O
No caso em tela, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL interpôs Apelação em face da sentença que absolveu sumariamente o Acusado HÉLIO FREITAS da imputação que lhe é atribuída na denúncia, - qual seja, da prática do delito previsto no art. 168-A, caput, c/c art. 71, ambos do Código Penal – com base no art. 397, II, do CPP, julgando, por conseguinte, improcedente a pretensão punitiva estatal.
A materialidade do crime não resta suficientemente demonstrada, porquanto não houve a juntada aos autos das GFIP’s transmitidas pelo sujeito passivo da obrigação a cada competência tributária, nos termos do § 2º do art. 32 da Lei nº 8.212/91.
Há nos autos tão somente uma Nota da Receita Federal denominada NOTA DIFIS 44/2018, expedida em 08/11/2018, atestando a ausência de recolhimentos de contribuições previdenciárias para as competências relativas aos anos de 2013 a 2018 por parte da empresa INSBOT – INSTITUTO BAHIANO DE ORTOPEDIA E TRAUMATOLOGIA – CNPJ: 15.234.123/0001-64.
Observe-se que, apesar de a maioria dos créditos já se encontrar inscrita em dívida ativa, consoante informou o Auditor Fiscal da Receita Federal Alyrio Athayde Andrade Neto (fls. 11 – id. 63254254) não foi juntado aos autos sequer a certidão de dívida ativa em relação a tais débitos previdenciários.
Nesse contexto, verifica-se que embora o Apelado não se insurja em relação ao débito previdenciário em questão, reputa-se não demonstrado suficientemente a materialidade delitiva ante a ausência da juntada das pertinentes GFIP’s alusivas aos débitos previdenciários imputados ao Réu e, ainda, em face da ausência das certidões de dívida ativa de tais débitos.
No que tange à autoria delitiva, constata-se, outrossim, que o Ministério Público Federal sequer juntou aos autos a cópia dos atos constitutivos da empresa contribuinte, de modo a se aferir a quem competia a administração da sociedade, contentando-se somente com a extração de mero cadastro da empresa (fl. 07 – id. 63254253), extraído da base de dados da Receita Federal, quando é cediço que, em se tratando de direito penal, a responsabilização não é objetiva, mas subjetiva, ou seja, deve ser provada em relação à pessoa acusada e não presumida.
Dessa forma, a denúncia não deveria ter sido sequer recebida em face da ausência de elementos probatórios mínimos para a comprovação da materialidade e autoria delitivas, atribuídas ao Réu.
Mesmo que assim não fosse, há que se analisar se está comprovado, ou não, a causa supralegal de exclusão de culpabilidade consubstanciada na inexigibilidade de conduta diversa em face das alegadas sérias dificuldades financeiras sofridas pela empresa do Acusado à época dos fatos investigados.
Como é cediço, a culpabilidade normativa engloba, além da imputabilidade, a potencial consciência da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa. Neste sentido, embora não prevista em lei, a inexigibilidade de outra conduta exclui a culpabilidade, pela falta do elemento estrutural da reprovabilidade penal.
Neste sentido, a melhor doutrina:
"Enfim, após constatada a tipicidade e antijuridicidade da conduta, passar-se-á à análise da culpabilidade, que, contudo, poderá, eventualmente, caracterizar inexigibilidade de conduta diversa, elemento sem o qual não haverá culpabilidade. Exemplo típico dessa situação poderá ocorrer na chamada colisão de deveres, onde o agente deve optar por uma alternativa, isto é, pelo cumprimento de um dever em detrimento de outro, e a sua escolha pode não recair exatamente naquela mais adequada aos fins do Direito, mas, nas circunstâncias, por razões pessoais de tal significação, ser-lhe-ia impossível exigir um comportamento diverso, a não ser que se lhe exija um ato de heroísmo. (...)Exigibilidade de obediência ao Direito Seguindo o magistério de Welzel, uma vez configuradas a imputabilidade e a possibilidade de conhecimento do injusto, fica caracterizada materialmente a culpabilidade, o que não quer dizer, no entanto, que o ordenamento jurídico-penal tenha de fazer a reprovação de culpabilidade. Em determinadas circunstâncias, poderá renunciar a dita reprovação e, por conseguinte, exculpar e absolver o agente343. Efetivamente, o conhecimento do injusto, por si só, não é fundamento suficiente para reprovar a resolução de vontade. Isto somente poderá ocorrer quando o autor, numa situação concreta, puder adotar sua decisão de acordo com esse conhecimento. “Não se trata aqui — afirmava Welzel — da capacidade geral de decisão conforme o sentido, por conseguinte, da imputabilidade, que existe independentemente da situação dada, mas de possibilidade concreta do autor, capaz de culpabilidade, de poder adotar sua decisão de acordo com o conhecimento do injusto”344. Um dos elementos mais importantes da reprovabilidade vem a ser exatamente essa possibilidade concreta que tem o autor de determinar-se conforme o sentido em favor da norma jurídica. O conteúdo da reprovabilidade, como afirma Manuel Vidaurri, consiste em o autor dever e poder adotar uma resolução de vontade de acordo com o ordenamento jurídico e não a resolução de vontade antijurídica345. O Direito exige, geralmente, do sujeito imputável, isto é, daquele que pode conhecer a antijuridicidade do seu ato, que tome sua resolução de vontade conforme com esse conhecimento possível. Porém, reconhecia Welzel, existem situações extraordinárias que diminuem drasticamente a motivação para atuar conforme a norma, de tal forma que não é exigida uma conduta adequada ao Direito, ainda que se trate de sujeito imputável e que realize dita conduta com conhecimento da antijuridicidade que lhe é própria346. Nessas circunstâncias, ocorre o que se chama de inexigibilidade de outra conduta, que afasta o terceiro elemento da culpabilidade, eliminando-a, consequentemente. Como podemos observar, com essa configuração, não existe espaço para a ponderação de necessidades preventivas no âmbito da culpabilidade. De modo que a capacidade individual de atuar de outro modo e o consequente juízo de reprovação esgotariam o conteúdo da culpabilidade. Nesses termos, a culpabilidade é fundamento e limite da pena, cumprindo sua função garantista de limite do ius puniendi estatal, e sendo a pena concebida como retribuição da culpabilidade." (grifamos, BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: Parte geral – art.s 1º a 120. São Paulo: Saraiva-Jur, 2022).
“5.3.3. Inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal de exclusão da culpabilidade
Causas supralegais de exclusão da culpabilidade são aquelas que, embora não estejam previstas expressamente em algum texto legal, são aplicadas em virtude dos princípios informadores do ordenamento jurídico.
Nossa legislação penal, ao contrário da legislação alemã, não proíbe a utilização do argumento da inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal de exclusão da culpabilidade.” (Greco, Rogério. Curso de Direito Penal. – 17. Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2015, pág. 472).
Importante consignar que o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da AP 516, firmou compreensão no sentido de que “No âmbito dos crimes contra a ordem tributária, tem-se admitido, tanto em sede doutrinária quanto jurisprudencial, como causa supralegal de exclusão de culpabilidade a precária condição financeira da empresa, extrema ao ponto de não restar alternativa socialmente menos danosa que não a falta do não-recolhimento do tributo devido. Configuração a ser aferida pelo julgador, conforme um critério valorativo de razoabilidade, de acordo com os fatos concretos revelados nos autos, cabendo a quem alega tal condição o ônus da prova, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal.”
Por ocasião do mesmo julgamento, concluiu, ainda, o Supremo Tribunal Federal que “Não é possível a aplicação da referida excludente de culpabilidade ao delito do art. 337-A do Código Penal, porque a supressão ou redução da contribuição social e quaisquer acessórios são implementadas por meio de condutas fraudulentas – incompatíveis com a boa-fé – instrumentais à evasão, descritas nos incisos do caput da norma incriminadora”. (AP 516, Relator(a): AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 27/09/2010, DJe-235 DIVULG 03-12-2010 PUBLIC 06-12-2010 REPUBLICAÇÃO: DJe-180 DIVULG 19-09-2011 PUBLIC 20-09-2011 EMENT VOL-02590-01 PP-00001).
Tal entendimento vem sendo replicado em diversos julgados no sentido de vedar a possibilidade de incidência da causa supralegal de excludente de culpabilidade – inexigibilidade de conduta diversa – aos delitos previstos no art. 1° da Lei 8.137/90, bem como no art. 337-A do Código Penal na medida em que a supressão ou redução de tributos ocorre mediante a utilização de “comportamentos ardilosos ou fraudulentos” (exemplificando: HC 163497, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 17/03/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-095 DIVULG 20-04-2020 PUBLIC 22-04-2020 e TRF4, ACR 5008487-40.2020.4.04.7107, SÉTIMA TURMA, Relator LUIZ CARLOS CANALLI, juntado aos autos em 15/03/2022).
No caso em tela, o delito imputado ao Réu é aquele descrito no art. 168-A, caput, c/c art. 71, tratando-se, pois, de tipo penal que visa tutelar as fontes de custeio da previdência social e, por conseguinte, os benefícios a que fazem jus os cidadãos garantidos pelo sistema da seguridade social.
O objeto material do crime é a contribuição social que já foi recolhida, mas não foi repassada ao sistema previdenciário dentro do prazo legal ou convencional.
Dessa forma, embora o delito previsto no art. 168-A do CP não esteja incluso dentre os crimes contra a ordem tributária, previstos na Lei nº 8.137/90, verifica-se que tanto aquele quanto esses buscam a proteção das fontes de custeio do Estado Brasileiro, de forma que é nítida a semelhança entre os mesmos, não havendo, pois, óbice para a aplicação da analogia, no caso, para o fim de estender o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal de que é possível aplicar-se “como causa supralegal de exclusão de culpabilidade a precária condição financeira da empresa, extrema ao ponto de não restar alternativa socialmente menos danosa que não a falta do não-recolhimento do tributo devido”, desde que não seja utilizado para tanto “comportamentos ardilosos ou fraudulentos”.
Assim, a configuração da inexigibilidade de conduta diversa, nos crimes dessa natureza, está sujeita à comprovação de dois requisitos.
O primeiro deles diz respeito à condição financeira precária da empresa que, evidentemente, não pode ser confundida com simples dificuldade financeira. Cuida-se de circunstância imprevisível e invencível, extrema, em que não se verifica a existência de alternativa menos danosa, valendo o apontamento de que o bem jurídico sacrificado deve ter menor relevância do que aquele garantido (para exemplificar, destaque-se o caso em que o valor evadido é usado para pagamento de salários dos empregados na falta de outros recursos disponíveis). Por outro modo de dizer, a destinação do produto do crime deve estar vinculada a uma finalidade socialmente mais relevante.
Ademais, deve estar presente também o comportamento eticamente adequado, vale dizer, a boa-fé do agente. É dizer: a ausência de pagamento do tributo não pode se dar mediante a utilização de “comportamentos ardilosos ou fraudulentos”.
No caso em tela, consoante a própria denúncia esclarece, a própria empresa contribuinte entregou à Receita Federal as Guias de Recolhimento do FGTS e de Informações à Previdência Social (GFIP’s), informando o débito previdenciário.
Dessa forma, constata-se que não houve a utilização de qualquer meio ardiloso ou fraudulento por parte da empresa contribuinte, restando, pois, caracterizada a sua boa-fé ao declarar e confessar perante a Receita Federal os débitos previdenciários que tinha, evidenciando, dessa forma, que o não recolhimento dos tributos se dava, de fato, por dificuldades financeiras da empresa e não pela existência de dolo em não recolhê-los.
A par disso, verifica-se que o Réu trouxe ao inquérito policial inúmeros documentos (fls. 19/151 – id. 63254253) que comprovam a extrema dificuldade vivenciada pela empresa contribuinte à época dos fatos investigados, consoante bem pontuou o Juízo a quo in verbis:
“Com efeito, a farta documentação encartada no Anexo I dos autos confirma as alegações do acusado.
Dentre os documentos apresentados, verificam-se balanços patrimoniais da empresa, dos anos de 2015 a 2018 - com resultados financeiros negativos -, certidões expedidas pelas Justiças Federal, Estadual e do Trabalho, evidenciando a existência de 270 reclamações trabalhistas, 43 execuções fiscais e 75 ações judiciais (em sua maioria de execução e cobrança, movidas por credores) e 291 títulos protestados.
Além disso, os referidos documentos demonstram bloqueios de créditos destinados ao INSBOT, oriundos de operadoras de saúde, referentes à contraprestação pelos atendimentos efetuados, e as diversas tentativas de parcelamento realizadas pela empresa. Revelam, ainda, que não só a pessoa jurídica, mas também o próprio acusado foi afetado por diversos bloqueios decorrentes de ordens judiciais expedidas pela Justiça do Trabalho.”
Ademais, as declarações dos sócios da empresa contribuinte, colhidas na fase pré-processual são harmônicos entre si e bastante esclarecedores quanto à demonstração das graves dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa, administrada pelo Acusado à época dos fatos investigados, corroborando a versão apresentada pelo Réu em idêntica linha de intelecção.
Acrescente-se, ainda, que há nos autos a notícia de que a empresa encerrou suas atividades em junho de 2019 (declarações do Réu perante a Polícia Federal – fl. 52 – id. 63254254), informação essa não desconstituída pela acusação.
Dessa forma, ao contrário do sustentado pelo Ministério Público Federal, não há de se falar em ausência de provas quanto à alegada excludente supralegal de culpabilidade.
A inexigibilidade de conduta diversa restou plenamente comprovada pela farta documentação juntada aos autos e pelas declarações dos sócios e do Réu, os quais se encontram em total harmonia e comprovam suficientemente as sérias dificuldades econômicas sofridas pela empresa do Acusado, que, de tão extremas, culminaram na sua falência.
No que diz respeito à alegação do Apelante de que a simples afirmação do Réu a respeito da crise financeira enfrentada pela empresa não é motivação suficiente para a caracterização da inexigibilidade da conduta diversa, mas sim demonstrar o comprometimento patrimonial pessoal de seus gestores – ato supostamente não apresentado pelo Réu, verifica-se que não merece prosperar.
Note-se que até mesmo a conta bancária titularizada pelo Apelado, na qualidade de pessoa física, foi alvo de bloqueios determinados pela Justiça do Trabalho (fls. 9/31 – id. 63254252), dada a incapacidade do INSBOT de adimplir suas obrigações trabalhistas.
Ademais, consoante bem pontuou a Procuradoria Regional da República em seu parecer, “O fato de o apelado residir em localidade nobre da cidade de Salvador/BA não é suficiente para descaracterizar a inexigibilidade de conduta diversa, pois não foram coligidas informações de que o imóvel mencionado pertenceria a Hélio ou, ainda, de que ele tivesse outros bens que deveria ter utilizado para garantir o recolhimento das contribuições previdenciárias dos empregados do INSBOT”.
No sentido da admissão da causa supralegal de exclusão da culpabilidade consubstanciada na inexigibilidade de conduta diversa no delito constante do art. 168-A do Código Penal em face da comprovação das graves dificuldades econômicas sofridas pela empresa do acusado à época dos fatos típicos, confira-se os seguintes precedentes:
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. PREFEITO MUNICIPAL. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. DIFICULDADE FINANCEIRA. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA DEMONSTRADA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. No caso em comento, ficou comprovada, nos autos, a presença da excludente de culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa, em face das dificuldades financeiras enfrentadas pela Prefeitura Municipal de Jânio Quadros, com grande oscilação das receitas municipais, o que descaracteriza até mesmo o dolo. 2. Apelação criminal desprovida.
(ACR 0001182-19.2006.4.01.3307, JUÍZA FEDERAL ROSIMAYRE GONÇALVES DE CARVALHO (CONV.), TRF1 - QUARTA TURMA, e-DJF1 14/09/2015 PAG 9.)
PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ALEGAÇÕES DE DIFICULDADES FINANCEIRAS. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. - Extrema dificuldade financeira enfrentada ao tempo dos fatos pela pessoa jurídica, que inclusive faliu. - Situação dos autos em que evidenciada a causa supralegal de exclusão da culpabilidade de inexigibilidade de conduta diversa. Precedente da Corte. - Recurso desprovido
(APELAÇÃO CRIMINAL - 52516 ..SIGLA_CLASSE: ApCrim 0007110-68.2008.4.03.6105 ..PROCESSO_ANTIGO: 200861050071105 ..PROCESSO_ANTIGO_FORMATADO: 2008.61.05.007110-5, JUIZ CONVOCADO ROBERTO LEMOS, TRF3 - SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:01/10/2015 ..FONTE_PUBLICACAO1: ..FONTE_PUBLICACAO2: ..FONTE_PUBLICACAO3:.)
Ante o exposto, nega-se provimento à apelação do Ministério Público Federal.
É o voto.
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Gab. 07 - DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CRIMINAL (417)1018905-98.2019.4.01.3300
Processo referência: 1018905-98.2019.4.01.3300
VOTO
Acompanho o voto do eminente Relator, que analisou criteriosamente o(s) recurso(s) de apelação.
É o voto revisor.

Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 07 - DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1018905-98.2019.4.01.3300 PROCESSO REFERÊNCIA: 1018905-98.2019.4.01.3300
CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417)
POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria)
POLO PASSIVO:HELIO FREITAS
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MAURICIO BAPTISTA LINS - BA18411-A e SEBASTIAN BORGES DE ALBUQUERQUE MELLO - BA14471-A
E M E N T A
PROCESSO PENAL. PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS NÃO COMPROVADAS.
1. Trata-se de apelação interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face da sentença que absolveu sumariamente o Acusado da imputação que lhe é atribuída na denúncia, - qual seja, da prática do delito previsto no art. 168-A, caput, c/c art. 71, ambos do Código Penal – com base no art. 397, II, do CPP, julgando, por conseguinte, improcedente a pretensão punitiva estatal.
2. A materialidade e autoria do crime não restaram suficientemente demonstradas. Verifica-se a ausência da juntada das pertinentes GFIP’s alusivas aos débitos previdenciários imputados ao Réu e, ainda, das certidões de dívida ativa de tais débitos. Há nos autos tão somente uma Nota da Receita Federal denominada NOTA DIFIS 44/2018, expedida em 08/11/2018, atestando a ausência de recolhimentos de contribuições previdenciárias para as competências relativas aos anos de 2013 a 2018 por parte da empresa do Acusado. No que tange à autoria delitiva, não houve a juntada da cópia dos atos constitutivos da empresa contribuinte, de modo a se aferir a quem competia a administração da sociedade, contentando-se o órgão ministerial somente com a extração de mero cadastro da empresa, extraído da base de dados da Receita Federal, quando é cediço que, em se tratando de direito penal, a responsabilização não é objetiva, mas subjetiva, ou seja, deve ser provada em relação à pessoa acusada e não presumida.
3. Apelação desprovida.
