
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
POLO PASSIVO:MARIA EUNICE DA SILVA SALES
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: JAMYLLE SHYSLENNY SOARES GOMES - PA29663-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1037627-58.2021.4.01.3900
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: MARIA EUNICE DA SILVA SALES
Advogado do(a) APELADO: JAMYLLE SHYSLENNY SOARES GOMES - PA29663-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação, com pedido de efeito suspensivo, interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face de sentença que concedeu a segurança para determinar que à autoridade coatora conclua o requerimento administrativo objeto da demanda, referente ao pleito de benefício assistencial a pessoa com deficiência, formulado pelo impetrante, no prazo de 30 (trinta) dias úteis.
Em suas razões, a apelante solicita, in verbis:
“a) a imediata concessão do efeito suspensivo, nos termos do artigo 1.019, inciso I, do CPC para o fim de suspender os efeitos da decisão que determinou a análise administrativa do benefício do autor em 30 dias;
b) a intimação da parte recorrida, para, querendo, apresentar contrarrazões à presente medida cautelar;
c) no mérito, pugna a parte ré pelo provimento do presente recurso, para afastar a ordem de conclusão imediata do processo administrativo, em desatenção à ordem dos requerimentos administrativos apresentados pelos segurados. Subsidiariamente, requer a concessão de prazo de 180 dias, ou de 90 dias, conforme a fundamentação.
d) subsidiariamente requer o INSS, caso mantida a multa, que a mesma seja reduzida para valores razoáveis e que a responsabilidade pelo seu pagamento seja transferida para a autarquia."
Em contrarrazões, a parte defende a manutenção da sentença.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1037627-58.2021.4.01.3900
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: MARIA EUNICE DA SILVA SALES
Advogado do(a) APELADO: JAMYLLE SHYSLENNY SOARES GOMES - PA29663-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
Remessa Necessária
Nos termos do artigo 14, §1º, da Lei 12.016/2009, concedida a segurança, a sentença estará sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição.
Efeito suspensivo
Diante do julgamento da apelação nesta oportunidade, resta prejudicado o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso.
Da demora na apreciação do requerimento administrativo de benefício previdenciário.
A Constituição Federal de 1988 assegurou a todos, no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo (CF/88, art. 5º, LXXVIII), motivo pelo qual não pode a Administração Pública retardar, indefinida e injustificadamente, a análise de pedido que lhe seja apresentado, sob pena de violar os princípios que regem a atividade administrativa (razoável duração do processo, eficiência e moralidade, entre outros).
Nessa linha de entendimento, já se pronunciou este Tribunal afirmando que “(...) esta Corte tem entendimento firmado de que a injustificada demora no trâmite e na decisão dos procedimentos administrativos consubstancia lesão a direito subjetivo individual, passível de reparação pelo Poder Judiciário com a determinação de prazo razoável para fazê-lo, em atenção aos princípios que regem a Administração Pública e à luz do disposto no art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal, e na Lei nº 9.784/1999.”.(AG 1036462-36.2021.4.01.0000, DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 02/03/2022 PAG.).
Portanto, indubitável o excesso injustificado cometido pelo INSS, pois é seu dever não apenas decidir (Lei n.º 9.784/1999, art. 48), mas, igualmente, fazê-lo no prazo previsto em lei, qual seja, 30 dias (art. 49 e 59, § 1º, da Lei n.o 9.784/1999).
Além disso, nos termos do art. 41-A, § 5º, da Lei 8.213/1991, o prazo para pagamento dos benefícios previdenciários é de, no máximo, 45 dias, contados da apresentação da documentação necessária para sua concessão. Deve, portanto, a autarquia previdenciária analisá-los dentro desse mesmo prazo. Assim, mesmo tomando-se por base a norma em questão o prazo também estaria extrapolado.
Desse modo, vislumbro direito líquido e certo do Impetrante.
Princípios da separação dos poderes e reserva do possível
Considerando a abusiva mora do Poder Público em analisar os processos administrativos, revela-se necessária a imposição de medida mais rígida, no sentido de condicionar a autoridade competente a analisar os processos formulados, que constituem óbice para o direito do administrado/impetrante.
Seria uma distorção pensar que o princípio da separação dos poderes, originalmente concebido com o escopo de garantia dos direitos fundamentais, pudesse ser utilizado justamente como óbice à realização dos direitos fundamentais.
Ademais, não há falar em ingerência do Poder Judiciário na discricionariedade administrativa, nem afronta ao princípio da separação de poderes, porquanto a atuação discricionária limita-se ao dever da boa gestão administrativa, bem como o cumprimento e garantia de direitos constitucionalmente e legalmente protegidos, sendo passível de controle, pelo Judiciário, quando há risco de violação a direitos fundamentais, como na espécie.
Por fim, em demandas em que o bem maior – benefício assistencial mínimo para uma vida digna - deve ser tutelado, é autorizado ao Poder Judiciário determinar as medidas assecuratórias para o seu cumprimento. Dessa forma, garante-se o mínimo existencial quando confrontado com a reserva do possível.
Do princípio da isonomia e da impessoalidade
Quanto aos princípios da isonomia e da impessoalidade, da mesma forma, compreendo que o presente provimento não revela ofensa, antes, preserva inegavelmente o respectivo núcleo essencial. Com efeito, a busca pelo acesso à justiça no legítimo exercício do direito fundamental à tutela jurisdicional adequada, eficaz e tempestiva (art. 5º, XXXV, da CF), impõe ao Poder Judiciário, como visto acima, importante papel concretizador, principalmente quando se tem em jogo a busca pelo cidadão da fruição de direito social destinado a assegurar meios indispensáveis à sua manutenção (art. 3º, caput, da Lei n. 8.212/91).
Não aplicação do parâmetro temporal adotado pelo STF no Recurso Extraordinário n. 631.240/MG
Quanto ao pedido de aplicação do parâmetro temporal adotado pelo Supremo Tribunal Federal no recurso extraordinário n. 631.240/MG, o prazo de 90 (noventa) dias definido por ocasião da modulação dos efeitos do julgamento apenas se aplica quando há a presença cumulativa dos seguintes requisitos: a) a ação foi ajuizada sem prévio requerimento administrativo; b) não se trata de juizado itinerante; e c) o INSS não apresentou contestação de mérito.
Além disso, destaca-se que transcorreram mais de 180 dias entre o requerimento administrativo e a impetração do mandado de segurança, o que torna também desarrazoado o pleito de prorrogação de prazo.
Aplicação da multa diária contra a fazenda pública
No que toca à multa diária fixada na sentença recorrida, a jurisprudência do STJ, no que é seguida por esta Corte, é firme no sentido de ser “(...) possível a cominação de multa diária ao INSS por descumprimento de obrigação de fazer. Precedentes: AgRg no REsp 1457413/SE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 19/8/2014, DJe 25/8/2014; AREsp 99.865/MT, Segunda Turma, Relator Ministro Cesar Asfor Rocha, DJe 15/3/2012; AREsp 134.571/MT, Segunda Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 12/3/2012. (...).” (AgInt no REsp 1614984/PI, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/08/2018, DJe 15/08/2018).
Quanto ao ponto, conforme orientação perfilhada por esta Turma, “(...) a multa diária deve ser fixada segundo juízo de razoabilidade e proporcionalidade, de modo a funcionar como meio coercitivo a evitar a inércia por parte da Autarquia Previdenciária, sem, contudo, importar obtenção de vantagem injustificada pela parte (...).” (AMS 1000689-38.2019.4.01.3802, DESEMBARGADOR FEDERAL JAMIL ROSA DE JESUS OLIVEIRA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 09/07/2020 PAG.).
No entanto, considerando que não ficou demonstrada a recalcitrância da Autarquia, tendo inclusive analisado o requerimento administrativo antes mesmo da prolação da sentença, é inadequada a fixação de multa.
Honorários advocatícios
Os honorários advocatícios são incabíveis, nos termos do art. 25 da Lei nº 12.1016/09, fruto do entendimento veiculado no enunciado 105 do da Súmula do STJ, assim como no verbete 512 da Súmula do STF.
Multa pessoal ao agente publico
A jurisprudência desta Corte se posicionou pelo “não cabimento da multa pessoal ao servidor público, visto que não é parte no processo e a obrigação é do próprio ente público. Dessa forma, deve ser afastada a multa pessoal fixada em desfavor dos servidores públicos envolvidos no cumprimento da tutela de urgência deferida" (AI n. 1008565-72.2017.4.01.0000 Relator: Desembargador Federal Carlos Augusto Pires Brandão; Data do Julgamento: 06/05/2020)” (AG 0040325-56.2017.4.01.0000, relatora Desembargadora Federal Daniele Maranhão Costa, 5T, PJe 14/10/2021).
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
Ante o exposto, dou PARCIAL PROVIMENTO à remessa necessária e à apelação do INSS, excluindo tanto a imposição de multa diária fixada na sentença quanto a multa pessoal ao agente público.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1037627-58.2021.4.01.3900
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: MARIA EUNICE DA SILVA SALES
Advogado do(a) APELADO: JAMYLLE SHYSLENNY SOARES GOMES - PA29663-A
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. REQUERIMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. AFRONTA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA EFICIÊNCIA E DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO. ART. 5º, XXXIV, DA CF E ART. 49 DA LEI 9.748/99. NÃO VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA SEPARAÇÃO DOS PODERES, ISONOMIA E IMPESSOALIDADE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 631.240/MG. MULTA DIÁRIA. IMPOSIÇÃO DE MULTA PESSOAL AO SERVIDOR PÚBLICO ENVOLVIDO NO CUMPRIMENTO DA TUTELA DEFERIDA. APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS.
1. A Constituição Federal de 1988 assegurou a todos, no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo (CF/88, art. 5º, LXXVIII), de modo que não pode a Administração Pública protelar, indefinida e injustificadamente, a análise de pedido a ela dirigido sob pena de incorrer em violação aos princípios que regem a atuação administrativa (razoável duração do processo, eficiência, moralidade, entre outros) aos quais se sujeita.
2. Nessa linha de entendimento já se pronunciou esta Corte afirmando que “(...) a demora injustificada no trâmite e decisão dos procedimentos administrativos consubstancia lesão a direito subjetivo individual, passível de reparação pelo Poder Judiciário com a determinação de prazo razoável para fazê-lo, à luz do disposto no artigo 5º, inciso LXXVIII, da Carta Constitucional e na Lei 9.784, de 29 de janeiro de 1999.” (REO 1002446-91.2019.4.01.3600, DESEMBARGADOR FEDERAL JAMIL ROSA DE JESUS OLIVEIRA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 09/01/2020) e (REOMS 1000921-16.2020.4.01.3802, DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 01/10/2020 PAG.).
3. Considerando a abusiva mora do Poder Público em analisar os processos administrativos, revela-se necessária a imposição de medida mais rígida, no sentido de condicionar a autoridade competente a analisar os processos formulados, que constituem óbice para o direito do administrado/impetrante. Seria uma distorção pensar que o princípio da separação dos poderes, originalmente concebido com o escopo de garantia dos direitos fundamentais, pudesse ser utilizado justamente como óbice à realização dos direitos fundamentais.
4. Não se revela ofensa aos princípios da isonomia e da impessoalidade a busca pelo acesso à justiça no legítimo exercício do direito fundamental à tutela jurisdicional adequada, eficaz e tempestiva (art. 5º, XXXV, da CF).
5. Quanto ao pedido de aplicação do parâmetro temporal adotado pelo Supremo Tribunal Federal no recurso extraordinário nº 631.240/MG, o prazo de 90 (noventa) dias definido por ocasião da modulação dos efeitos do julgamento apenas se aplica quando há a presença cumulativa dos seguintes requisitos: a) a ação foi ajuizada sem prévio requerimento administrativo; b) não se trata de juizado itinerante; e c) o INSS não apresentou contestação de mérito. Além disso, destaca-se que transcorreram mais de 180 dias entre o requerimento administrativo e a impetração do mandado de segurança, o que torna também desarrazoado o pleito de prorrogação de prazo.
6. Considerando que não ficou demonstrada a recalcitrância da Autarquia, tendo inclusive analisado o requerimento administrativo antes mesmo da prolação da sentença, é inadequada a fixação de multa.
7. A jurisprudência desta Corte se posicionou pelo “não cabimento da multa pessoal ao servidor público, visto que não é parte no processo e a obrigação é do próprio ente público. Dessa forma, deve ser afastada a multa pessoal fixada em desfavor dos servidores públicos envolvidos no cumprimento da tutela de urgência deferida".
8. Remessa necessária e apelação parcialmente providas para excluir tanto a imposição de multa diária fixada na sentença quanto a multa pessoal ao agente público.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
