
POLO ATIVO: RICARDO CARDOSO ROSA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: HIKSON ILAI DO NASCIMENTO GOMES - PA21989-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1045600-56.2023.4.01.0000
PROCESSO REFERÊNCIA: 1007477-23.2023.4.01.3901
CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202)
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por RICARDO CARDOSO ROSA contra decisão interlocutória proferida nos autos do processo de origem n. 1007477-23.2023.4.01.3901, em trâmite na 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Marabá-PA, que indeferiu pedido de tutela de urgência para implantação de benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
Concedida a tutela recursal (ID 369076668).
Contrarrazões não apresentadas, embora regularmente intimada a parte agravada.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1045600-56.2023.4.01.0000
PROCESSO REFERÊNCIA: 1007477-23.2023.4.01.3901
CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202)
V O T O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
O recurso é tempestivo e a decisão atacada é recorrível via agravo de instrumento (art. 1.015, I, do CPC). Portanto, presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, dele conheço.
O deferimento total ou parcial da pretensão recursal, em antecipação da tutela, por decisão monocrática do relator, é cabível quando estiverem evidenciados, de um lado, a probabilidade do direito (que, no caso, consiste na probabilidade de provimento do recurso), e, de outro, o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (CPC, art. 1.019, I, c/c art. 300).
Não visualizo alteração no panorama fático-jurídico, de modo que adoto como razões de decidir a fundamentação lançada quando do deferimento da tutela recursal, nos seguintes termos:
Na situação retratada nos autos, trata-se de pedido de implantação imediata de benefício de aposentadora por invalidez ou, subsidiariamente, auxílio-doença. A data de entrada do requerimento administrativo (DER) é 28.08.2020. A parte ajuizou a ação na origem em 28.08.2023, ou seja, após três da DER, circunstância que, em tese, configuraria comportamento contraditório ao perigo da demora invocado.
No entanto, consta dos documentos juntados pela agravante (extrato CNIS) que a parte exercia atividade laboral desde Março/1986, possuindo extensos meses de contribuições previdenciárias, mas que se encerrou em Maio/2023 o seu último vínculo, exercido no SERVIÇO AUTÔNOMO DE ÁGUA E ESGOTO DE PARAUAPEBAS, justamente no mesmo mês em que atestada a sua incapacidade (Id. 368711140, pág. 13):

Trata-se de laudo emitido por médico cirurgião vascular do Hospital Geral de Parauapebas, Secretaria Municipal de Saúde, de modo que confiro presunção de legalidade e de veracidade dos aludidos atos administrativos municipais analisados em cotejo (Id. 368711140).
Com efeito, o benefício previdenciário constitui direito fundamental de índole social que privilegia a dignidade da pessoa humana, dada a sua natureza alimentar, bem como, no caso concreto, a vulnerabilidade da parte agravante, em razão do quadro avançado de diabetes mellitus com amputação de parte de seus membros inferiores, além de possuir quadro de deformidade articular e de necessidades especiais de locomoção.
Sobre a possibilidade de recebimento de benefício por incapacidade, concedido judicialmente em período de abrangência concomitante àquele em que o segurado estava trabalhando e aguardava o deferimento administrativo do benefício, o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.013), analisou a questão controvertida nestes termos:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015. TEMA REPETITIVO 1.013/STJ. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA. DEMORA NA IMPLEMENTAÇÃO DO BENEFÍCIO. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE REMUNERADA PELO SEGURADO. NECESSIDADE DE SUBSISTÊNCIA DO SEGURADO. FUNÇÃO SUBSTITUTIVA DA RENDA NÃO CONSUBSTANCIADA. POSSIBILIDADE DE RECEBIMENTO CONJUNTO DA RENDA DO TRABALHO E DAS PARCELAS RETROATIVAS DO BENEFÍCIO ATÉ A EFETIVA IMPLANTAÇÃO. TESE REPETITIVA FIXADA. IDENTIFICAÇÃO E DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA
(...).
13. A presente controvérsia cuida de caso, portanto, em que falhou a função substitutiva da renda, base da cobertura previdenciária dos benefícios auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.
14.O provimento do sustento do segurado não se materializou, no exato momento da incapacidade, por falha administrativa do INSS, que indeferiu incorretamente o benefício, sendo inexigível do segurado que aguarde a efetivação da tutela jurisdicional sem que busque, pelo trabalho, o suprimento da sua subsistência.
15. Por culpa do INSS, resultado do equivocado indeferimento do benefício, o segurado teve de trabalhar, incapacitado, para o provimento de suas necessidades básicas, o que doutrinária e jurisprudencialmente convencionou-se chamar de sobre-esforço. Assim, a remuneração por esse trabalho tem resultado inafastável da justa contraprestação pecuniária.
16. Na hipótese, o princípio da vedação do enriquecimento sem causa atua contra a autarquia previdenciária, pois, por culpa sua - indeferimento equivocado do benefício por incapacidade -, o segurado foi privado da efetivação da função substitutiva da renda laboral, objeto da cobertura previdenciária, inerente aos mencionados benefícios.
17. Como tempero do elemento volitivo do segurado, constata-se objetivamente que, ao trabalhar enquanto espera a concessão de benefício por incapacidade, está ele atuando de boa-fé, cláusula geral hodiernamente fortalecida na regência das relações de direito.
18. Assim, enquanto a função substitutiva da renda do trabalho não for materializada pelo efetivo pagamento do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, é legítimo que o segurado exerça atividade remunerada para sua subsistência, independentemente do exame da compatibilidade dessa atividade com a incapacidade laboral.
19. No mesmo sentido do entendimento aqui defendido: AgInt no AREsp 1.415.347/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, Je de 28.10.2019; REsp 1.745.633/PR, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 18.3.2019; AgInt no REsp 1.669.033/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 30.8.2018; REsp 1.573.146/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 13.11.2017; AgInt no AgInt no AREsp 1.170.040/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 10.10.2018; AgInt no REsp 1.620.697/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe de 2.8.2018; AgInt no AREsp 1.393.909/SP, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 6.6.2019; e REsp 1.724.369/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 25.5.2018.
FIXAÇÃO DA TESE REPETITIVA
20. O Tema Repetitivo 1.013/STJ é assim resolvido: "No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente."
RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO
21. Ao Recurso Especial deve-se negar provimento, pois o Tribunal de origem julgou o presente caso no mesmo sentido do entendimento aqui proposto (fl. 142-143/e-STJ): "A permanência do segurado no exercício das atividades laborativas decorre da necessidade de prover sua subsistência enquanto a administração ou o Judiciário não reconheça sua incapacidade, não obstando a concessão do benefício vindicado durante a incapacidade."
22. Consubstanciado o que previsto no Enunciado Administrativo 7/STJ, o recorrente é condenado ao pagamento de honorários advocatícios de 10% (dez por cento) sobre o valor total da verba sucumbencial fixada nas instâncias ordinárias, com base no § 11 do art. 85 do CPC/2015.
CONCLUSÃO
23. Recurso Especial não provido, sob o rito dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015.
(REsp 1.786.590/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe de 1/7/2020).
O referido precedente do STJ refere-se à situação idêntica a dos autos, afastando-se a tese de inexistência de incapacidade em razão de o segurado permanecer trabalhando mesmo após o requerimento administrativo do benefício por incapacidade.
Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez são: a) a qualidade de segurado; b) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo nas hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei n. 8.213/91; c) a incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou permanente e total (aposentadoria por invalidez) para atividade laboral.
Verifica-se que a qualidade de segurada da parte agravante e o tempo de carência são incontroversos.
O juízo de primeiro grau indeferiu o pedido de tutela sob o argumento de que a data do requerimento administrativo (DER) remete há mais de 3 (três) anos do ajuizamento da petição inicial, o que apontaria "estabilização da questão".
Por outro lado, consta dos documentos juntados (extrato CNIS) que a parte autora exerceu atividade laboral desde Março/1986, possuindo extensos meses de contribuições previdenciárias e continuou laborando até Maio/2023, quando atestada a sua incapacidade permanente para o trabalho (Id. 368711140, pág. 13).
Trata-se de laudo emitido por médico cirurgião vascular do Hospital Geral de Parauapebas/PA, Rede Pública da Secretaria Municipal de Saúde, em que se constata quadro avançado de diabetes mellitus com amputação de parte de seus membros inferiores, além de possuir quadro de deformidade articular e de necessidades especiais de locomoção.
A despeito de a DER ter ocorrido em 28.08.2020, os documentos apontam que a agravante continuou laborando até Maio/2023 para não se encontrar privada da própria subsistência (Tema 1.013 do STJ), e não que se trata de indicativo de estabilização do seu quadro de saúde, tendo vista que o encerramento do seu vínculo laboral ocorreu no mesmo mês que atestado o agravamento de saúde com as amputações sofridas.
Portanto, ainda que se demande dilação probatória com a designação de perícia judicial para eventual confirmação do laudo já emitido pelo Sistema Único de Saúde, entendo, no caso concreto, que deve ser mantida a tutela recursal até que seja finalizado o julgamento de mérito com a prolação da sentença pelo juízo de primeiro grau.
Destaco, por fim, que concessão de provimento jurisdicional para a concessão do benefício previdenciário inaudita altera pars constitui excepcional postergação do princípio do contraditório, somente admitido em caso de perigo de perecimento do direito enquanto se aguarda a formação do contraditório mínimo, o que é o caso dos autos.
Ante o exposto, dou provimento ao agravo de instrumento, confirmando a tutela recursal.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1045600-56.2023.4.01.0000
PROCESSO REFERÊNCIA: 1007477-23.2023.4.01.3901
CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202)
AGRAVANTE: RICARDO CARDOSO ROSA
AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS. RECURSO PROVIDO.
1. Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez são: a) a qualidade de segurado; b) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo nas hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei n. 8.213/91; c) a incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou permanente e total (aposentadoria por invalidez) para atividade laboral.
2. Verifica-se que a qualidade de segurada da parte agravante e o tempo de carência são incontroversos.
3. Na situação retratada nos autos, a decisão agravada merece reforma, ao indeferir o pedido porque a DER remete há mais de 3 (três) anos do ajuizamento da petição inicial, o que apontaria "estabilização da questão".
4. Consta dos documentos juntados (extrato CNIS) que a parte autora exerceu atividade laboral desde Março/1986, possuindo extensos meses de contribuições previdenciárias e continuou laborando até Maio/2023, quando atestada a sua incapacidade permanente para o trabalho (Id. 368711140, pág. 13). Trata-se de laudo emitido por médico cirurgião vascular do Hospital Geral de Parauapebas/PA, Rede Pública da Secretaria Municipal de Saúde, em que se constata quadro avançado de diabetes mellitus com amputação de parte de seus membros inferiores, além de possuir quadro de deformidade articular e de necessidades especiais de locomoção.
5. A despeito de a DER ter ocorrido em 28.08.2020, os documentos apontam que a agravante continuou laborando até Maio/2023 para não se encontrar privada da própria subsistência (Tema 1.013 do STJ), e não que se trata de indicativo de estabilização do seu quadro de saúde, tendo vista que o encerramento do seu vínculo laboral ocorreu no mesmo mês que atestado o agravamento de saúde com as amputações sofridas.
6. Portanto, deve ser mantida a tutela recursal até que seja finalizado o julgamento de mérito com a prolação da sentença pelo juízo de primeiro grau, dada a natureza alimentar do benefício em comento e a vulnerabilidade da parte agravante, bem como, no caso concreto, a confirmação da incapacidade mediante laudo emitido pelo Sistema Único de Saúde.
7. Agravo de instrumento provido, com a confirmação da tutela recursal.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da assinatura eletrônica.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
