
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:DORACINDO SOARES GOMES
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

PROCESSO: 1023919-64.2022.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000089-93.2018.8.04.6601
CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:DORACINDO SOARES GOMES
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A
R E L A T Ó R I O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO (Relator):
Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo INSS em face de decisão interlocutória proferida pelo Juízo monocrático que, após pagamento das parcelas retroativas de benefício previdenciário, homologou cálculos referentes às astreintes.
Em suas razões, requer a reforma da decisão agravada, alegando a impossibilidade de fixação de multa prévia ao ente previdenciário. Afirma a ausência de recalcitrância, pugnando pela exclusão total da multa. Aduz a ausência de intimação pessoal da parte responsável pelo cumprimento da obrigação de fazer.
Intimado, o lado agravado não apresentou contrarrazões.
A tutela recursal foi deferida, vindo os autos conclusos para decisão colegiada.
É o relatório.

PROCESSO: 1023919-64.2022.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000089-93.2018.8.04.6601
CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:DORACINDO SOARES GOMES
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A
V O T O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO (Relator):
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Diante da inexistência de preliminares ou/e defesa indireta de mérito, mister a depuração, de pronto, do cerne da pretensão, ora vertida em base recursal, lembrando que se trata de conflito de interesses condizente ao acerto ou não da decisão que determinou o pagamento de multa imposta por descumprimento da decisão judicial.
Segundo o agravante, não houve recalcitrância por parte do INSS. Aduz que a intimação do INSS na pessoa de seu procurador é inválida para implantação do benefício, posto que imprescindível a intimação pessoal do setor competente para cumprimento da decisão judicial.
Por ocasião da análise da tutela recursal, foi proferida decisão nos seguintes termos:
A burocracia interna do órgão recorrente no que tange a existência de setor apropriado para o cumprimento das decisões judiciais que ordenam a implantação de benefício não serve de escusa a lentidão na consecução da ordem judicial. Em verdade, trata-se, o benefício, de direito alimentar, que permite ao hipossuficiente a sua subsistência, razão pela qual deve preponderar sobre as nuances internas do órgão previdenciário.
Porém, de outro turno, não se pode olvidar que o ganho em excesso pela mora da autarquia também caracteriza prejuízo, desta feita ao erário, conforme se constata com a estipulação, já em somatória, do valor da conta do dia-multa.
Daí, sopesando as duas diretrizes acima, mister tornar palatável ambos os interesses/direitos em disputa, evitando-se que haja preponderância de um sob o outro.
Por conseguinte, firme no poder geral de cautela dos artigos 297 e 301, combinado com o artigo 932, inciso II, todos do CPC, erige-se o teto limitante do quantitativo da astreinte no patamar máximo de R$ 5.000,00.
Intime-se o órgão prolator da decisão monocrática para ciência.
Em tempo, intime-se a parte agravada para apresentar resposta no prazo legal (CPC/2015, art. 1.019, inciso II, eventualmente c/c art. 183, art. 186 ou art. 229).
Desde a prolação da decisão monocrática o contexto fático probatório inalterou, devendo ser mantida em seus precisos termos.
Isso porque, da análise dos documentos acostados pelo INSS, verifica-se que a autarquia previdenciária foi intimada para implantar o benefício deferido em sentença em prazo razoável, de 30 (trinta) dias. Ainda assim, deixou transcorrer outros 51 (cinqüenta e um) dias até o efetivo cumprimento da ordem.
Ressalte-se que, a despeito da prerrogativa dos procuradores contida no art. 17 da Lei n. 10.910/2004, a intimação pessoal dos Procuradores deve ser compatibilizada com os entendimentos firmados por esta Corte e pelo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que não pode servir de salvo-conduto para premiar a falta de zelo do causídico que, embora regularmente intimado, não comunica ao setor responsável pelo cumprimento da ordem, devendo arcar com o ônus de sua desídia.
Quanto às astreintes, a jurisprudência majoritária desta Corte é contrária à aplicação de multa diária contra a Fazenda Pública, a não ser que comprovada a recalcitrância do ente público no cumprimento de decisão judicial. No entanto, o entendimento jurisprudencial firmado é no sentido de que a determinação de imediata implantação do benefício no prazo fixado atrai a previsão de incidência de multa diária a ser suportada pela Fazenda Pública quando não cumprido o comando no prazo deferido, já que se trata de obrigação de fazer e, ao teor do art. 497 do Código de Processo Civil, procedente o pedido que tenha por objeto obrigação de fazer, o juiz determinará providências que assegurem a obtenção da tutela específica.
Por outro lado, o objetivo da multa diária é inibitório, sua cominação visa fazer com que o réu desista do descumprimento da obrigação a que fora condenado. Trata-se de faculdade do juiz arbitrar a incidência de multa diária, sendo-lhe resguardada, também, a possibilidade de optar pela revogação da penalidade imposta, caso entenda relevantes as eventuais justificativas da referida mora, na forma do art. 537, §1º, do CPC.
Nesse sentido são os seguintes precedentes do STJ, in verbis:
"em atendimento ao princípio da proporcionalidade e para se evitar o enriquecimento ilícito, é possível a redução do valor da multa cominatória sem que se incorra em violação à coisa julgada, podendo ser alterada, inclusive, na fase de execução" (AgRg no AREsp 309.958/RS, Rel. Ministro Luís Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 10/12/2013).
"A decisão que arbitra a astreinte não faz coisa julgada material, pois ao juiz é facultado impor essa coerção, de ofício ou a requerimento da parte, cabendo a ele, da mesma forma, a sua revogação nos casos em que a multa se tornar desnecessária pelo cumprimento da obrigação de fazer" (REsp 1376871/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/05/2014, DJe 19/05/2014).
"A multa cominatória constitui instrumento de direito processual criado para a efetivação da tutela específica perseguida, ou para a obtenção de resultado prático equivalente, nas ações de obrigação de fazer ou não fazer, constituindo medida de execução indireta. 4. A decisão que arbitra astreintes não faz coisa julgada material, podendo, por isso mesmo, ser modificada, a requerimento da parte ou de ofício, seja para aumentar ou diminuir o valor da multa ou, ainda, para suprimi-la. (...)" (STJ, Terceira Turma, REsp nº 1.367.212, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, publicação: DJe 01.08.2017) Grifos acrescentados
De outro lado, a multa no montante requerido pelo lado agravado não se mostra razoável ou proporcional, sendo exorbitante o valor alcançado. Dessa forma, considerando o valor da obrigação principal, fixada na sentença recorrida a título de aposentadoria por idade rural, não se mostra proporcional ou razoável a fixação de multa no valor de R$ 51.000,00, cabendo sua redução por esta Corte Regional, conforme os precedentes abaixo, in verbis:
“PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. REMESSA OFICIAL. DESCABIMENTO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. DEMORA NO CUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. APLICAÇÃO DE MULTA. CABIMENTO. REDUÇÃO. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. CUSTAS PROCESSUAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Consoante jurisprudência harmônica desta Corte, é incabível remessa oficial contra sentença que julga embargos à execução de título judicial. Precedentes (AC 2002.01.00.009356-4/BA; AC 2000.38.00.038660-3/MG). 2. "A remessa ex officio, prevista no art. 475, II, do Código de Processo Civil, providência imperativa na fase de conhecimento, sem a qual não ocorre o trânsito em julgado da sentença, é descabida em fase de execução de sentença." (STJ, ROMS 11028/SP, DJ 4.6.2001). 3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça orientou-se no sentido de que é permitido ao Juízo da execução a imposição de multa em desfavor da Fazenda Pública, de ofício ou a requerimento da parte, pelo descumprimento de obrigação de fazer. (STJ - REsp 504321/RS; 5ª Turma; Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA; DJ 11.12.2006 p. 407). 4. Quanto ao prazo estabelecido na sentença exequenda para cumprimento da obrigação, entende-se não ser o momento oportuno para discussão, em face do trânsito em julgado do decisum. 5. A multa diária pode ser reduzida de ofício pelo juiz para impedir o enriquecimento ilícito da parte e em observância ao princípio da razoabilidade e da proporcionalidade. 6. Levando-se em conta o valor da obrigação principal (R$5.591,00), verifica-se que a multa no montante de R$19.380,00 é excessiva. Assim, afigura-se razoável e compatível com o caráter coercitivo da cominação, a redução da multa aplicada para o valor total de R$ 1.000,00 (mil reais). 7. Honorários advocatícios em compensação, face à sucumbência recíproca (art. 21 do CPC). 8. Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, o que ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia e Mato Grosso. Em se tratando de causas ajuizadas perante a Justiça Federal, o INSS está isento de custas por força do art. 4º, inc. I, da Lei n. 9.289/96, abrangendo, inclusive, as despesas com oficial de justiça. 9. Apelação parcialmente provida. Remessa oficial não conhecida”. (AC 0013410-96.2009.4.01.9199/RO, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Rel. Conv. Juiz Federal Cleberson José Rocha (conv.), Segunda Turma, e-DJF1 p. 2875 de 02/10/2015)
“EMBARGOS À EXECUÇÃO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE ASTREINTES. EXORBITÂNCIA. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. MODIFICAÇÃO. POSSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. 1. Em razão do descumprimento da ordem de implantação do benefício previdenciário em 60 dias (sessenta) dias, foi aplicada multa diária de um salário mínimo, conforme cominação do juízo, tendo sido atendida a finalidade das astreintes em constranger o réu a cumprir a obrigação estabelecida, efetivada pela implantação do benefício previdenciário. 2. O magistrado pode alterar, inclusive de ofício, valor da multa quando este se tornar insuficiente ou excessivo, mesmo depois de transitada em julgado a sentença, tendo em vista não se operar os efeitos da coisa julgada material. (...). Ademais, a redução da multa cominatória pode ser realizada a qualquer tempo, vez que não transita em julgado, bastando que se caracterize como excessiva e esteja em desarmonia com o princípio da proporcionalidade. (...) (STJ - Ag: 1337640, Relator: Ministro CASTRO MEIRA, Data de Publicação: DJ 04/11/2010). 3. O valor fixado de 1 (um) salário mínimo por dia, cujo atraso foi de 160 dias/multa e resultou no valor de R$ 64.160,00, é exorbitante e merece redução, devendo ser mantida a sentença que fixou a multa pelo descumprimento no valor de 2 (dois) salários mínimos, de acordo com os parâmetros da razoabilidade e proporcionalidade. 4. Apelações do INSS e da embargada desprovidas”. (AC 0071376-80.2010.4.01.9199 GO, Rel. Juiz Federal Antônio Francisco do Nascimento, Primeira Turma, e-DJF1 de 16/06/2016)
Em resumo, afigura-se razoável e compatível com o caráter coercitivo da cominação, a fim de evitar o enriquecimento sem causa do lado agravado, a redução definitiva da multa para o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com confirmação da tutela recursal deferida, monocraticamente.
Em face do exposto, dou parcial provimento ao agravo de instrumento interposto pelo INSS para, reformando parcialmente a decisão recorrida, reduzir definitivamente a multa para o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
É como voto.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator

PROCESSO: 1023919-64.2022.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000089-93.2018.8.04.6601
CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:DORACINDO SOARES GOMES
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. TUTELA DE URGÊNCIA. PROCURADORIA INTIMADA DA SENTENÇA QUE DETERMINOU A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. MULTA DEVIDA. VALOR EXCESSIVO. REDUÇÃO. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. PARCIAL PROVIMENTO.
1. A despeito da prerrogativa dos procuradores contida no art. 17 da Lei n. 10.910/2004, a intimação pessoal dos Procuradores deve ser compatibilizada com os entendimentos firmados por esta Corte e pelo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que não pode servir de salvo-conduto para premiar a falta de zelo do causídico que, embora regularmente intimado, não comunica ao setor responsável pelo cumprimento da ordem, devendo arcar com o ônus de sua desídia.
2. A jurisprudência majoritária desta Corte é contrária à aplicação de multa diária contra a Fazenda Pública, a não ser que comprovada a recalcitrância do ente público no cumprimento de decisão judicial, admitindo ser possível a redução da multa, de ofício pelo Juiz, a fim de impedir o enriquecimento ilícito, pois o Juiz possui a faculdade de alterar o valor ou a periodicidade da multa ou mesmo excluí-la, já que a decisão que a arbitrou não faz coisa julgada material, na forma do art. 537, § 1º, do CPC. Nesse sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça: STJ, Terceira Turma, REsp nº 1.367.212, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, publicação: DJe 01.08.2017.
3. A multa no montante requerido pelo lado agravado não se mostra razoável ou proporcional, sendo exorbitante o valor alcançado. Dessa forma, considerando o valor da obrigação principal, não se mostra proporcional ou razoável a fixação de multa no valor de R$ 51.000,00, cabendo sua redução por esta Corte Regional.
4. Afigura-se razoável e compatível com o caráter coercitivo da cominação, e a fim de evitar o enriquecimento sem causa da parte agravada, a confirmação da tutela recursal deferida pelo relator, monocraticamente, com a redução definitiva da multa para o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
5. Recurso a que se dá parcial provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO ao agravo de instrumento interposto pelo INSS, nos termos do voto do relator.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator
