
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:FRANCISCO DA CONCEICAO SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MATEUS BEZERRA ATTA - MA13752-A
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1016068-03.2024.4.01.0000
PROCESSO REFERÊNCIA: 0800919-86.2019.8.10.0146
CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202)
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo INSS, com pedido de efeito suspensivo, contra decisão proferida nos autos do Cumprimento de Sentença n. 0800919-86.2019.8.10.0146, Vara Única de Joselândia/MA, no exercício da competência constitucional delegada (art. 109, § 3º, CRFB/1988), que manteve a determinação de expedição de ofício requisitório de precatório em favor da parte autora, no valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), em decorrência de multa por descumprimento de decisão judicial.
Decisão concessiva do pedido de tutela recursal para suspender para determinar a imediata suspenção da requisição de precatório em favor da parte autora (ID 418382801).
Parte agravada devidamente intimada para as contrarrazões (ID 418523586).
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1016068-03.2024.4.01.0000
PROCESSO REFERÊNCIA: 0800919-86.2019.8.10.0146
CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202)
V O T O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Admissibilidade
O recurso é tempestivo e a decisão atacada é recorrível via agravo de instrumento (art. 1.015, parágrafo único, CPC). Portanto, presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, dele conheço.
Mérito
Verifica-se que o cerne da questão cinge-se a aplicação da multa cominatória ou astreintes.
A medida não é um fim em si mesmo, motivo pelo qual o seu valor não pode ser mais interessante do que a própria obrigação principal, nem irrisório ao ponto de não coagir o réu no cumprimento da determinação judicial.
Abordando o referido instrumento legal, julgando caso ocorrido na vigência do CPC de 1973, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do EAREsp nº 650.536/RJ, decidiu pela possibilidade de revisão do valor das astreintes a qualquer tempo, "até mesmo de oficio, adequando-o a patamar condizente com a finalidade da medida no caso concreto, ainda que sobre a quantia estabelecida já tenha havido explicita manifestação, mesmo que o feito esteja em fase de execução ou cumprimento de sentença" (STJ, EAREsp nº 650.536/RJ, Corte Especial, Rel.: ministro Raul Araújo, J.: 7/4/2021, DJe 3/8/2021).
Consta da ementa do julgado o seguinte:
"Processual civil. Embargos de divergência em agravo em recurso especial. Cabimento. Mérito analisado. Valor acumulado das astreintes. Revisão a qualquer tempo. Possibilidade. Cláusula rebus sic stantibus. Ausência de preclusão ou formação de coisa julgada. Exorbitância configurada. Revisão. Embargos de divergência conhecidos e providos.
1. É dispensável a exata similitude fática entre os acórdãos paragonados, em se tratando de embargos de divergência que tragam debate acerca de interpretação de regra de direito processual, bastando o indispensável dissenso a respeito da solução da mesma questão de mérito de natureza processual controvertida.
2. O valor das astreintes, previstas no artigo 461, caput e §§ 1º a 6º, do Código de Processo Civil de 1973, correspondente aos arts. 497, caput, 499, 500, 536, caput e § 1º, e 537, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015, pode ser revisto a qualquer tempo (CPC/1973, artigo 461, § 6º; CPC/2015, artigo 537, § 1º), pois é estabelecido sob a cláusula rebus sic stantibus, e não enseja preclusão ou formação de coisa julgada.
3. Assim, sempre que o valor acumulado da multa devida à parte destinatária tornar-se irrisório ou exorbitante ou desnecessário, poderá o órgão julgador modificá-lo, até mesmo de ofício, adequando-o a patamar condizente com a finalidade da medida no caso concreto, ainda que sobre a quantia estabelecida já tenha havido explícita manifestação, mesmo que o feito esteja em fase de execução ou cumprimento de sentença.
4. Embargos de divergência conhecidos e providos, para reduzir o valor total das astreintes, restabelecendo-o conforme fixado pelo d. Juízo singular"
(STJ, EAREsp nº 650.536/RJ, Corte Especial, relator: ministro Raul Araújo, j. 7/4/2021, DJe 3/8/2021)
(original sem destaques)
Esse caráter está bem evidenciado na regra do artigo 537 do CPC/2015, onde o poder-dever do Magistrado de aplicar a astreinte está expressamente previsto como exercitável independentemente de requerimento da parte; regra que se completa com a do § 1º do mesmo dispositivo, que, mesmo depois da respectiva fixação, prevê a possibilidade, de ofício inclusive, para "modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda", sempre que verificar "que se tornou insuficiente ou excessiva".
Desse modo, não visualizo alteração no panorama fático-jurídico, de modo que adiro à fundamentação lançada quando da análise do pedido urgente (ID 418382801), nos seguintes termos:
"Na origem, a parte agravada requereu o cumprimento de sentença, transitada em julgado em 16/06/2021, consistente na implantação do benefício de auxílio doença, execução no valor de R$ 52.778,27 (cinquenta e dois mil, setecentos e setenta e oito reais e vinte e sete centavos), acrescidos de R$ 5.267,73 (cinco mil, duzentos e sessenta e sete reais e setenta e três centavos) a título de honorários para o Advogado, além da cobrança de multa no valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) determinada na sentença (id. 43313722) pelo atraso no implantação do benefício.
O Magistrado homologou os cálculos nos termos propostos mediante despacho datado de 16.01.2023, vez que o INSS, regularmente intimado, nada disse, limitando-se a comunicar, na data de 24.11.2022, sobre a implantação do benefício.
Com efeito, considerando a natureza alimentar da obrigação, o tempo de descumprimento da decisão, a natureza autárquica da parte impugnante, bem como as demais nuances que envolvem o caso concreto, entendo que a multa aplicada tornou-se exorbitante e excessiva, em observância aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade."
No mesmo sentido é o posicionamento da 2ª Turma deste TRF da 1ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MULTA. FAZENDA PÚBLICA. RECALCITRÂNCIA NO CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. IMPLANTAÇÃO DE BENEFÍCIO. OCORRÊNCIA. REDUÇÃO DO VALOR. POSSIBILIDADE.
1.A orientação jurisprudencial do STJ firmou-se no sentido de que não há impedimento para a aplicação de multa diária em desfavor da Fazenda Pública nas hipóteses de descumprimento das obrigações de fazer fixadas em decisão judicial, tal como aquela decorrente da implantação de benefício previdenciário. Ao juiz cabe, a requerimento da parte ou ex officio, reduzi-la ou até mesmo suprimi-la, caso a sua imposição não se mostrar mais necessária. Precedente.
2.Hipótese em que foi determinado a obrigação de implantação do benefício da parte ora agravada no prazo de 05 dias, a contar da data de 17/02/2020; não tendo sido comprovado o cumprimento da determinação judicial (cf. ID 219759563). Requer o INSS a exclusão ou redução da multa imposta.
3.Considerando as peculiaridades do caso concreto e, a despeito da efetiva recalcitrância da Administração Pública no cumprimento da determinação judicial, impõe-se a limitação da multa imposta no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), para um total de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), em observância à razoabilidade e proporcionalidade que deve nortear a fixação da multa.
4.Agravo de instrumento provido para reduzir a multa imposta ao patamar de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
(AG 1018752-66.2022.4.01.0000, DESEMBARGADOR FEDERAL JOAO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 09/08/2023 PAG.)
Nessa perspectiva, a multa não é direito da parte. Trata-se de medida judicial coercitiva, utilizada para assegurar efetividade à execução. Interessa muito mais ao órgão judicial do que ao credor, o que lhe assegura o caráter de providência de ordem pública, uma vez que o ganho em excesso pela mora da Autarquia também caracteriza prejuízo, desta feita, ao Erário.
Conclusão
Ante o exposto, conheço do recurso de Agravo de Instrumento interposto para, no mérito, dar-lhe provimento, nos termos da fundamentação acima exposta, para reduzir a multa devida pelo INSS ao valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), decorrente de atraso no cumprimento de decisão judicial.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1016068-03.2024.4.01.0000
PROCESSO REFERÊNCIA: 0800919-86.2019.8.10.0146
CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202)
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: FRANCISCO DA CONCEICAO SILVA
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MULTA. FAZENDA PÚBLICA. RECALCITRÂNCIA NO CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. OCORRÊNCIA. REDUÇÃO DO VALOR DA MULTA. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO.
1. Verifica-se que o cerne da questão cinge-se a aplicação da multa cominatória ou astreintes. A medida não é um fim em si mesmo, motivo pelo qual o seu valor não pode ser mais interessante do que a própria obrigação principal, nem irrisório ao ponto de não coagir o réu no cumprimento da determinação judicial.
2. Esse caráter está bem evidenciado na regra do artigo 537 do CPC/2015, onde o poder-dever do Magistrado de aplicar a astreinte está expressamente previsto como exercitável independentemente de requerimento da parte; regra que se completa com a do § 1º do mesmo dispositivo, que, mesmo depois da respectiva fixação, prevê a possibilidade, de ofício inclusive, para "modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda", sempre que verificar "que se tornou insuficiente ou excessiva".
3. Na origem, a parte agravada requereu o cumprimento de sentença, transitada em julgado em 16/06/2021, consistente na implantação do benefício de auxílio doença, execução no valor de R$ 52.778,27 (cinquenta e dois mil, setecentos e setenta e oito reais e vinte e sete centavos), acrescidos de R$ 5.267,73 (cinco mil, duzentos e sessenta e sete reais e setenta e três centavos) a título de honorários para o Advogado, além da cobrança de multa no valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) determinada na sentença pelo atraso no implantação do benefício. O Magistrado homologou os cálculos nos termos propostos mediante despacho datado de 16.01.2023, vez que o INSS, regularmente intimado, nada disse, limitando-se a comunicar, na data de 24.11.2022, sobre a implantação do benefício.
4. Nessa perspectiva, a multa não é direito da parte. Trata-se de medida judicial coercitiva, utilizada para assegurar efetividade à execução. Interessa muito mais ao órgão judicial do que ao credor, o que lhe assegura o caráter de providência de ordem pública, uma vez que o ganho em excesso pela mora da Autarquia também caracteriza prejuízo, desta feita, ao Erário.
5. Agravo de instrumento provido para reduzir a multa devida pelo INSS ao valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), decorrente de atraso no cumprimento de decisão judicial.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
