
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:DOMINGOS NOGUEIRA DA GRACA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: JONES WASHINGTON DE SOUZA CRUZ - RO5326-A
RELATOR(A):EDUARDO MORAIS DA ROCHA

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1018697-86.2020.4.01.0000
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença que julgou procedente o pedido inicial, condenando-o a conceder benefício previdenciário de auxílio-doença, com data de início do benefício em 12/09/2015 (data do protocolo judicial), com o pagamento das diferenças consoante o Manual de Cálculos da Justiça Federal.
Sustenta o apelante, em síntese, que a sentença deve ser reformada, pois o autor só juntou documentos que comprovariam sua condição de segurado especial quando intimado pelo juiz sentenciante, não tendo sido observado o contraditório, além de não serem documentos hábeis a demonstrar tal condição. Subsidiariamente, requer que a data do início do benefício seja fixada em 11/04/2017, momento em que o INSS tomou ciência dos documentos juntados no curso da lide pela parte autora, bem como que a correção monetária e os juros sejam aplicados de acordo com o disposto no art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação determinada pela Lei 11.960/2009.
Não houve apresentação de contrarrazões.
É o breve relatório.
Desembargador Federal MORAIS DA ROCHA
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1018697-86.2020.4.01.0000
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA (RELATOR):
A sentença proferida na vigência do CPC/2015 não está sujeita à remessa necessária, pois a condenação nela imposta não tem o potencial de ultrapassar o limite previsto no art. 496, § 3º, do novo CPC.
Segundo os termos do Enunciado Administrativo n. 3/STJ, aprovado pelo Plenário da Corte na sessão de 9/3/2016: “Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.”
Trata-se de ação proposta em Mutirão Previdenciário na comunidade Descanso Rio-Madeira, em 12/09/2015, tendo sido feito protocolo itinerante, o que dispensa o prévio requerimento administrativo, conforme decidido pelo e. STF em repercussão geral no julgamento do RE n. 631.240.
Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez são: a) a qualidade de segurado; b) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo nas hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei n. 8.213/91; c) a incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou permanente e total (aposentadoria por invalidez) para atividade laboral.
O reconhecimento da qualidade de segurado especial desafia o preenchimento dos seguintes requisitos fundamentais: a existência de início de prova material da atividade rural exercida e a corroboração dessa prova indiciária por robusta prova testemunhal.
Com efeito, a jurisprudência do STJ admite que essa comprovação seja feita com base em quaisquer documentos que contenham fé pública, sendo que a qualificação constante dos dados do registro civil, como certidão de casamento, de nascimento e de óbito, é extensível ao cônjuge e aos filhos, sendo certo que o art. 106 da Lei 8.213/91 contém rol meramente exemplificativo, e não taxativo (REsp 1081919/PB, rel. Ministro Jorge Mussi, DJ 03.8.2009).
Segundo jurisprudência pacificada dos Tribunais pátrios, a qualificação profissional de lavrador ou agricultor, constante dos assentamentos de registro civil, constitui indício aceitável de prova material do exercício da atividade rural, nos termos do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, podendo projetar efeitos para período de tempo anterior e posterior ao nele retratado, desde que corroborado por segura prova testemunhal.
É prescindível que o início de prova material abranja todo o período de carência exigido para a concessão do benefício previdenciário - no caso, 12 meses -, desde que a prova testemunhal lhe amplie a eficácia probatória referente ao lapso temporal que se quer ver comprovado.
Em decisão proferida em março/2017, foi designada audiência de instrução e julgamento e determinado que o autor procedesse à juntada dos documentos que comprovassem sua condição de segurado especial. Após ciência de tal decisão, houve manifestação do INSS para que fosse deferida nova vista dos autos, após a juntada dos documentos.
Com o propósito de apresentar o início razoável de prova material de sua condição de segurado especial, o autor juntou aos autos os seguintes documentos: ficha epidemiológica, fazendo menção à condição de rural do autor; certidão de nascimento do autor, datada de 2002, com referência ao registro de nascimento feito em 1993 (o autor nasceu em 1965 e foi o próprio declarante), nascido em Lugar de Boa Vista – Lago do Acará; certidão de nascimento de sua filha, registrada em 1992, nascida em 1990 em Primavera – Lago do Acará. Tais documentos, acrescidos do fato de ter sido o autor ouvido em sua própria comunidade e ter sido proposta a ação em mutirão itinerante, configuram o início de prova material, os quais foram corroborados pela prova testemunhal, comprovando a sua qualidade de segurado especial.
A perícia médica, realizada em novembro/2011, constatou que o autor teve hanseníase no ano de 2000, por 2 anos, ficando com sequela desde então, com neuropatia em membro superior esquerdo que piora com esforço físico. Concluiu pela incapacidade multiprofissional e permanente, desde janeiro/2000, pois paciente ribeirinho está impossibilitado de exercer atividades laborais com exposição solar, desgastantes, exaustivas ou que requer esforço físico, necessitando de acompanhamento e tratamento especializado contínuo.
Diante desse quadro, o autor faz jus ao benefício concedido na sentença recorrida.
No tocante a fixação do termo inicial do benefício por incapacidade, cumpre consignar que o entendimento adotado pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça, em julgamento realizado sob o regime dos recursos especiais repetitivos (Tema 660), é no seguinte sentido:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TERMO INICIAL PARA A IMPLEMENTAÇÃO DO BENEFÍCIO CONCEDIDO NA VIA JUDICIAL. AUSÊNCIA DE PEDIDO ADMINISTRATIVO. ART. 219, CAPUT, DO CPC. CITAÇÃO VÁLIDA DA AUTARQUIA PREVIDENCIÁRIA. 1. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: A citação válida informa o litígio, constitui em mora a autarquia previdenciária federal e deve ser considerada como termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida na via judicial quando ausente a prévia postulação administrativa. 2. Recurso especial do INSS não provido.” (REsp 1369165/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/02/2014, DJe 07/03/2014.)
A decisão proferida pela Corte da Legalidade entendeu que “A constatação da incapacidade gerada pelo infortúnio quando realizada por meio do laudo médico-pericial do perito nomeado pelo Juiz elucida o fato já ocorrido a fim de que venha a ser considerado pelas partes e o julgador. Como prova, pertence ao processo judicial e declara situação fática preexistente, razão por que o momento no qual o aludido documento vem aos autos não deve ser considerado como termo inicial do que é devido pela autarquia previdenciária federal.”
Assim, o termo inicial do benefício deve ser fixado a partir da citação.
Quanto à atualização monetária, registre-se que, no julgamento realizado em 03/10/2019, o Supremo Tribunal Federal rejeitou todos os embargos de declaração e não modulou os efeitos da decisão anteriormente proferida no RE 870.947 (Tema 810), afastando a incidência da TR definitivamente como índice de correção monetária.
Compondo tal panorama, o STJ, no repetitivo REsp. 1.495.146-MG (Tema Repetitivo 905), estabeleceu que as condenações judiciais impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.
Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).
Em face do exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS, apenas para fixar o termo inicial do benefício a partir da citação.
É como voto.
Desembargador Federal MORAIS DA ROCHA
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1018697-86.2020.4.01.0000
RELATOR: Des. MORAIS DA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DOMINGOS NOGUEIRA DA GRACA
Advogado do(a) APELADO: JONES WASHINGTON DE SOUZA CRUZ - RO5326-A
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL, CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. DIB A PARTIR DA CITAÇÃO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. A sentença proferida na vigência do CPC/2015 não está sujeita à remessa necessária, pois a condenação nela imposta não tem o potencial de ultrapassar o limite previsto no art. 496, § 3º, do novo CPC.
2. Trata-se de ação proposta em Mutirão Previdenciário na comunidade Descanso Rio-Madeira, em 12/09/2015, tendo sido feito protocolo itinerante, o que dispensa o prévio requerimento administrativo, conforme decidido pelo e. STF em repercussão geral no julgamento do RE n. 631.240.
3. Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez são: a) a qualidade de segurado; b) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo nas hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei n. 8.213/91; c) a incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou permanente e total (aposentadoria por invalidez) para atividade laboral.
4. O reconhecimento da qualidade de segurado especial desafia o preenchimento dos seguintes requisitos fundamentais: a existência de início de prova material da atividade rural exercida e a corroboração dessa prova indiciária por robusta prova testemunhal.
5. O despacho de designação da audiência de instrução e julgamento determinou, ainda, que o autor procedesse à juntada dos documentos que comprovassem sua condição de segurado especial. Após ciência de tal decisão, houve manifestação do INSS para que fosse deferida nova vista dos autos, após a juntada dos documentos.
6. Com o propósito de apresentar o início razoável de prova material de sua condição de segurado especial, o autor juntou aos autos os seguintes documentos: ficha epidemiológica, fazendo menção à condição de rural do autor; certidão de nascimento do autor, datada de 2002, com referência ao registro de nascimento feito em 1993 (o autor nasceu em 1965 e foi o próprio declarante), nascido em Lugar de Boa Vista – Lago do Acará; certidão de nascimento de sua filha, registrada em 1992, nascida em 1990 em Primavera – Lago do Acará. Tais documentos, acrescidos do fato de ter sido o autor ouvido em sua própria comunidade e ter sido proposta a ação em mutirão itinerante, configuram o início de prova material, os quais foram corroborados pela prova testemunhal, comprovando a sua qualidade de segurado especial.
7. A perícia médica, realizada em novembro/2011, constatou que o autor teve hanseníase no ano de 2000, por 2 anos, ficando com sequela desde então, com neuropatia em membro superior esquerdo que piora com esforço físico. Concluiu pela incapacidade multiprofissional e permanente, desde janeiro/2000, pois paciente ribeirinho está impossibilitado de exercer atividades laborais com exposição solar, desgastantes, exaustivas ou que requer esforço físico, necessitando de acompanhamento e tratamento especializado contínuo.
8. Termo inicial do benefício deve ser fixado a partir da citação, à míngua do prévio requerimento administrativo.
9. Correção monetária e juros de mora nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal.
10. Apelação parcialmente provida (item 8).
A C Ó R D Ã O
Decide a Primeira Turma, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Desembargador Federal MORAIS DA ROCHA
