
POLO ATIVO: MARIA SELMA DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: GUIDO ICARO FRITSCH - MT19381/B
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1000166-20.2023.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora de sentença na qual foi julgado improcedente o pedido inicial de concessão do benefício assistencial ao deficiente, em vista de a demandante não ter comparecido para a realização do exame pericial (fls. 178/183).¹
Nas razões do recurso, a autora requer a anulação da sentença com a reabertura da instrução probatória ou, subsidiariamente, a extinção do processo sem resolução do mérito. Alega que existe certidão do oficial de justiça indicando que não conseguiu cumprir o mandado de intimação. Alega que a extinção do processo com resolução do mérito é medida que viola os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. (fls. 188/196).
Sem contrarrazões.
É o relatório.
¹Os números de folhas indicados referem-se à rolagem única. Em ordem crescente.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Mérito
Do benefício assistencial ao deficiente
No termos do art. 203, inciso V, Constituição Federal, e da Lei n. 8.742/93. é assegurado à pessoa com deficiência e ao idoso, que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, o benefício de um salário mínimo mensal, independente de contribuição à seguridade social.
Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei n. 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
Do critério da miserabilidade
Em relação ao critério da miserabilidade, o Plenário do STF, no julgamento dos RE’s n. 567.985 e n. 580.963 e da Reclamação n. 4.374, entendeu que o parâmetro da renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo não é mais adequado para aferir a situação de miserabilidade do idoso ou do deficiente, razão pela qual declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, quando do julgamento de Recurso Especial 1112557/MG, submetido ao rito de Recurso Repetitivo, pronunciou-se da seguinte forma:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. “Recurso Especial provido.”
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)
Ressalta-se, ainda, que se tem utilizado como parâmetro razoável a renda per capita de ½ (meio) salário mínimo, estabelecida em legislações posteriores às LOAS, como a Lei n. 10.689/2003 (PNAA) e o Decreto n. 11.016/2022 referente ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
Nesse sentido, considerando o entendimento jurisprudencial atual, a vulnerabilidade social deve ser avaliada de acordo com o caso concreto, segundo fatores que possibilitem constatar a hipossuficiência do requerente, sendo o critério objetivo legal apenas uma referência.
Da deficiência
Considera-se deficiente a pessoa que apresenta impedimentos de longo prazo (mínimo de 2 anos), de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, inviabilizam sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (§§ 2º e 10 do art. 20 da Lei 8.742/93).
A deficiência e o grau do impedimento devem ser aferidos mediante avaliação médica e avaliação social, realizadas por médicos peritos e assistentes sociais do INSS, nos termos do § 6º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social.
O caso concreto
Argui a parte autora a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, por não ter sido intimada pessoalmente para comparecer à perícia médica.
Como se sabe, a realização de perícia médica é procedimento indispensável para a comprovação da existência ou não da deficiência e do impedimento de longo prazo para a concessão do benefício assistencial. Logo, a sua não realização impossibilita a solução da lide, cabendo ao juiz, mesmo que no silêncio das partes, a sua designação, de ofício, em consonância com o art. 370 do CPC.
Nesse sentido, em face do disposto no art. 474 do Código de Processo Civil, as partes devem ser intimadas da data e do local de realização da prova pericial, sob pena de nulidade.
No caso em análise, por meio do andamento processual, verifica-se que foi expedida intimação eletrônica à parte autora sobre a realização da perícia médica judicial no dia 07/12/2020 (fl. 156), deixando a parte de comparecer para o exame.
A perícia foi reagendada para o dia 19/04/2021, às 19:10 hs, conforme se vê da fl. 158. O perito informou às fls. 161 que a paciente não compareceu para a realização da perícia. Ocorre que, à fl. 175, o oficial de justiça juntou certidão informando que não foi possível proceder à intimação da parte autora, por não ter sido esta encontrada na residência.
Em que pese o pedido de substituição do perito pelo procurador da parte autora, fato é que a demandante não foi devidamente intimada para comparecer à perícia, conforme certificou o oficial de justiça.
O eminente Magistrado de primeiro grau, em razão do não comparecimento da requerente para a produção da prova pericial, entendeu que não houve a comprovação dos requisitos para a concessão do benefício pleiteado e julgou improcedente o pedido, extinguindo o processo com resolução do mérito.
Ocorre, todavia, que nos termos do art. 485, § 1º, do CPC, antes de extinguir o processo por não promover a parte autora as diligências e atos que lhe incumbem, deve ser determinada a sua intimação pessoal para suprir a falta no prazo de 5 (cinco dias), o que não ocorreu no presente caso.
Em caso semelhante, assim já decidiu esta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DA PARTE AUTORA PARA PERÍCIA MÉDICA. SENTENÇA ANULADA. 1. Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez são: a) a qualidade de segurado; b) a carência de 12 (doze) contribuições mensais; c) a incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou total e permanente (aposentadoria por invalidez) para atividade laboral. 2. Conforme o art. 485, § 1º, do CPC, em se tratando de casos em que a parte precise promover diligências (comparecer à perícia), deverá ser intimada pessoalmente para suprir a falta, sob pena de cerceamento de defesa, fato não ocorrido na situação em análise. A inexistência de intimação pessoal da autora é razão suficiente à anulação da sentença de extinção do processo, de acordo com o art. 485, § 1º, do CPC. 3. Apelação provida, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao juízo de origem para regular processamento e julgamento do feito. (AC 1000450-04.2018.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL EDUARDO MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 23/11/2022 PAG.)
Dessa forma, a inexistência de intimação pessoal da parte autora, para suprir a falta após o não comparecimento na perícia médica, importa cerceamento de defesa e, por conseguinte, implica a anulação da sentença recorrida.
Com esses fundamentos, dou parcial provimento à apelação interposta pela parte autora, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao juízo de origem para o regular processamento e julgamento do feito.
É como voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS
RELATORA

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
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APELAÇÃO CÍVEL (198)1000166-20.2023.4.01.9999
MARIA SELMA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: GUIDO ICARO FRITSCH - MT19381/B
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. PROVA PERICIAL NÃO REALIZADA PELO NÃO COMPARECIMENTO DA AUTORA. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DA PARTE AUTORA. SENTENÇA ANULADA.
1. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei n. 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
2. Em face do disposto no art. 485, § 1º, do CPC, a parte autora deverá ser intimada pessoalmente para suprir a falta nos casos em que precise promover diligências, como comparecer à perícia, sob pena de cerceamento de defesa.
3. Apelação da parte autora parcialmente provida, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao juízo de origem para o regular processamento e julgamento do feito.
ACÓRDÃO
Decide a Nona turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
