
POLO ATIVO: JOSE LAFAIETE DE MORAES
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: GUSTAVO BORGES DE ABREU - TO4805-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por José Lafaiete de Moraes em face de sentença que julgou improcedente seu pedido de pagamento de parcelas pretéritas relativas a auxílio-doença, tendo em vista a ausência de prova de incapacidade.
O apelante alega que esteve incapaz no período de 03/2017 a 04/2019, conforme relatórios médicos juntados aos autos. Sustenta que tem visão monocular e tem direito ao benefício pretendido, nos termos na Lei 14.126/2021. Requer, assim, a reforma da sentença para que sejam pagos os períodos de incapacidade alegados na inicial.
É o relatório.

Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
O autor ajuizou esta ação pretendendo o recebimento de benefício por incapacidade temporária relativamente a períodos intercalados entre 03/2017 a 04/2019, tendo em vista apresentar incapacidade laboral decorrente de diversas cirurgias oftalmológicas nesse período e que ocasionaram a perda parcial de sua visão.
Concessão de benefício por incapacidade
Conforme disposto no art. 59 e 60, § 1º, da Lei 8.213/91, o auxílio-doença será devido ao segurado que ficar incapacitado temporariamente para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos. Será devido ao segurado empregado desde o início da incapacidade e, ao segurado que estiver afastado da atividade por mais de trinta dias, a partir da entrada do requerimento.
A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que estiver ou não em gozo de auxílio-doença e comprovar, por exame médico-pericial, a incapacidade total e definitiva para o trabalho e for considerado insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo devida a partir do dia imediato ao da cessação do auxílio-doença, nos termos do art. 42 e 43 da Lei 8.213/91.
Requisitos
A concessão de benefício por incapacidade laboral requer o preenchimento dos requisitos: qualidade de segurado, cumprimento de carência (segurado urbano) e incapacidade para o trabalho ou para a atividade habitual por mais de quinze dias.
A qualidade de segurado é a condição atribuída aos filiados do INSS que contribuem para a Previdência Social na forma de empregado, trabalhador avulso, contribuinte individual ou facultativo, empregado doméstico e segurado especial.
Visão monocular
A Lei 14.126/2021 classificou a visão monocular como deficiência sensorial do tipo visual. Porém, deficiência não se confunde com incapacidade.
Consoante dispõe o art. 2º da Lei 13.146/2015, “considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”.
Enquanto a incapacidade laboral é a impossibilidade de o segurado desempenhar as atribuições da função que exerce, em decorrência de doenças incapacitantes, agravamento de patologias, lesões ou acidente que o impeçam de continuar suas atividades habituais.
Assim, o fato de o segurado apresentar deficiência visual, por si só, não lhe garante o benefício previdenciário. Para isso, requer-se a prova de inaptidão laboral, que é impossibilidade de exercer suas atividades habituais e de reabilitar-se para outra profissão.
Caso dos autos
A concessão de benefício previdenciário requer o cumprimento de ambos os requisitos, qualidade de segurado, carência e incapacidade laboral. A ausência de um deles prejudica a análise do outro.
O autor (61 anos, “auxiliar administrativo”) submeteu-se à perícia médica judicial, cujo laudo é contraditório. Observa-se incoerência nas respostas da médica, pois a perita responde alguns quesitos registrando “não ter sido constatada incapacidade laboral”, mas na conclusão afirma que o autor teve deslocamento de retina, e “está incapacitado para seu trabalho” (fls. 122-127-rolagem única-PJe/TRF1).
Ocorre que o pedido do autor não é de concessão de benefício, mas refere-se a períodos em que alega ter se afastado do trabalho em decorrência dos problemas de visão que teve nos períodos elencados na inicial.
Em consulta realizada por este gabinete ao Conselho Regional de Medicina do Estado de Tocantins, verifica-se que a perita não possui nenhuma especialidade médica registrada e a conclusão do laudo é contraditória com as demais respostas, principalmente, sobre a existência de incapacidade laboral. Também é inconclusivo sobre a existência de incapacidade no período relacionado pelo autor, objeto da lide.
Não obstante o recurso tenha insistido em seu direito ao pagamento das parcelas pretéritas e haver nos autos diversos relatórios emitidos por médicos do SUS afirmando que o autor foi submetido a quatro cirurgias, que o segurado encontra-se em acompanhamento e teve perda da visão de um dos olhos, os relatórios não atestam incapacidade nos períodos alegados.
Desse modo, não é possível o julgamento antecipado, neste momento processual, porque não há provas suficientes nos autos acerca da incapacidade no período alegado pelo autor, apenas indícios.
Todavia, o laudo pericial se mostrou contraditório e não respondeu à questão fundamental, objeto da ação (incapacidade durante o período alegado).
Com isso, deve ser anulada a sentença para que, em razão da especificidade do caso, determinar que nova perícia médica seja realizada com profissional especialista na área de oftalmologia, tendo em vista o objeto desta ação. Precedente desta Turma:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. RURAL. NOVA PERÍCIA COM ESPECIALISTA EM OFTALMOLOGIA. NECESSIDADE DE UTILIZAÇÃO DE APARELHOS MÉDICOS ESPECÍFICOS PARA AFERIÇÃO DE SEQUELAS OFTALMOLÓGICAS. SENTENÇA ANULADA PARA REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA. 1. Os requisitos para a concessão da aposentadoria por incapacidade permanente estão dispostos no art. 42, caput e § 2º, da Lei 8.213/91, quais sejam: 1) qualidade de segurado; 2) cumprimento do período de carência (12 contribuições), quando exigida; 3) incapacidade insuscetível de recuperação ou de reabilitação para o exercício de atividade que garanta a subsistência (incapacidade total e permanente para o trabalho) e 4) não ser a doença ou lesão preexistente à filiação do segurado ao Regime Geral da Previdência Social. 2. Nos termos do art. 15, II, da Lei 8.213/91, mantém a qualidade de segurado até 12 meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social, podendo ser prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado (§ 1º), somando-se, ainda, mais 12 (doze) meses para o segurado desempregado (§ 2º). 3. O art. 59 da Lei n. 8.213/91 dispõe que não é devido benefício de auxílio por incapacidade temporária/aposentadoria por incapacidade permanente ao segurado cuja doença que motiva o pedido seja preexistente à sua filiação ao Regime Geral da Previdência Social ou à recuperação de sua qualidade de segurado, exceto se a incapacidade decorrer do agravamento ou de progressão da doença ou lesão. 4. A autarquia apelante se insurge com relação à qualidade de segurada da parte autora, e sustenta a sua capacidade laboral, de acordo com o disposto no laudo pericial. 5. A qualidade de segurada da parte autora, bem assim o cumprimento do período de carência, restaram devidamente comprovados por meio da produção de suficiente prova material e testemunhal. 6. De acordo com o laudo pericial não obstante cegueira em um olho e glaucoma no outro, a autora permanece capaz para o exercício de suas atividades laborais. Assim dispôs o expert no laudo: “No caso em tela a periciada permanece com visão monocular, apresentando como principais alterações a limitação da sensação tridimensional, paralaxe (diferença na posição aparente de um objeto visto por observadores em locais distintos), noção de tamanho relativa e tons de sombreamento da imagem vista, não essenciais para prática laborativa referida”. Diametralmente em oposição ao laudo particular juntado aos autos, prescrito por médicos oftalmologista, a autora apresenta pressão intraocular na vista, necessitando de cirurgia, sob pena de perda da visão remanescente. 7. O Juízo a quo concluiu que “o perito constatou a mesma doença que o médico especialista, qual seja, CID H54.4 e CID H40. Somente há divergência quanto ao fato de esta doença ser incapacitante para as atividades rurais. Considero que seja incapacitante, total e permanentemente, com base no grande número de decisões judiciais por todo o país, no mesmo sentido e também pelas condições pessoais da autora”. 8. A avaliação médica acerca da acuidade visual imprescinde de avaliação por especialista na área de oftalmologia, mormente pela necessária utilização de aparelhagens específicas, indispensáveis ao diagnóstico. Diante de tal constatação, imprescindível a realização de nova perícia, a ser realizada por médico especialista em oftalmologia. 9. Apelação do INSS parcialmente provida para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao juízo de origem para realização de segunda perícia com médico especialista em oftalmologia. Mantida a antecipação de tutela concedida, eis que não infirmados, até o presente, os pressupostos para a sua concessão.
(AC 1008534-23.2020.4.01.9999, Des. Fed. JOÃO LUIZ DE SOUSA, Segunda Turma, PJe 10/08/2023).
Assim, tendo em vista a sentença de improcedência com base em laudo contraditório e inexistindo elementos de provas suficientes nos autos para provimento do recurso, verifica-se a necessidade de produção de nova prova.
Conclusão
Ante o exposto, anulo, de ofício, a sentença, para determinar o retorno dos autos à origem e realização de nova perícia médica, prejudicada a apelação do autor.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1005674-78.2022.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 0001320-24.2019.8.27.2708
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: JOSE LAFAIETE DE MORAES
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO, PROCESSUAL CIVIL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. PARCELAS PRETÉRITAS. PERÍCIA CONTRADITÓRIA E INCONCLUSIVA. SENTENÇA ANULADA DE OFÍCIO.
1. A concessão de benefício previdenciário requer o cumprimento de ambos os requisitos, qualidade de segurado, carência e incapacidade laboral. A ausência de um deles prejudica a análise do outro.
2. O autor ajuizou esta ação pretendendo o recebimento de benefício previdenciário por incapacidade temporária relativamente aos períodos indicados na inicial, intercalados entre 03/2017 a 04/2019, tendo em vista apresentar incapacidade laboral decorrente de diversas cirurgias oftalmológicas no período e que ocasionaram a visão monocular.
3. Não obstante o recurso reafirmar o direito ao pagamento das parcelas pretéritas e haver nos autos diversos laudos emitidos por médicos do SUS afirmando que o autor foi submetido a quatro cirurgias por deslocamento de retina, os relatórios não atestam a incapacidade nos períodos indicados na inicial.
4. De outro lado, a perícia judicial mostrou-se contraditória, pois atestou que o autor (61 anos, “auxiliar administrativo”) é portador de patologia incapacitante (CID H33.0, “deslocamento e defeitos da retina”), respondeu aos quesitos no sentido de “não haver incapacidade laboral”, porém, na conclusão, atesta que “o autor está incapacitado para seu trabalho”.
5. Diante da inexistência de elementos de prova suficientes nos autos que evidenciem a situação alegada pelo autor e tendo em vista a contradição verificada no laudo pericial judicial, verifica-se, a necessidade de realização de nova perícia para fins de comprovação da existência de incapacidade laboral no período indicado na inicial, pois esse é o objeto da ação.
6. Sentença anulada, de ofício, para determinar o retorno dos autos à origem e realização de nova perícia com médico especialista em oftalmologia, prejudicada a apelação do autor.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, anular, de ofício, a sentença e julgar prejudicada a apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
