
POLO ATIVO: CLETO SANTANA ESTRELA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: GUSTAVO CAVALCANTI ZANETTE - RS61746-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO

APELAÇÃO CÍVEL (198)1002298-05.2022.4.01.3300
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
Trata-se de apelação interposta por CLETO SANTANA ESTRELA contra sentença que julgou extinta a execução, sem resolução do mérito, com base no artigo 485, VI, do CPC (fls. 798/800).
Em suas razões de apelação (fls. 804/820), defende a parte autora a sua legitimidade ativa para pleitear a execução do título judicial formado na ACP nº 2003.60.03.000741-0 (0000741-49.2003.4.01.6003), ao fundamento de que o dispositivo da sentença coletiva não limitou a abrangência de seus efeitos aos segurados da Subseção Judiciária de Três Lagoas/MS. Aduz que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE nº 1.101.937/SP (Tema 1075), declarou a inconstitucionalidade da alteração promovida pela Lei nº 9.494/97 no artigo 16 da Lei nº 7.347/85, com efeitos represtinatórios.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.

VOTO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
Presentes os requisitos de admissibilidade, recebo o recurso de apelação.
Trata-se de cumprimento de sentença ajuizado pela parte exequente para execução do título judicial contido na ACP nº 2003.60.03.000741-0 (0000741-49.2003.4.01.6003), processada na Subseção Judiciária de Três Lagoas/MS, com abrangência limitada, por força do pedido constante na própria inicial da daquela ACP, aos benefícios concedidos/mantidos na área territorial dos Municípios sob sua jurisdição.
No ponto, a fim de que não pairem dúvidas, transcreve-se o pedido formulado pelo Ministério Público Federal na referida ACP, assim como os exatos termos do dispositivo da sentença.
O pedido do Ministério Público Federal foi formulado nestes termos:
Seja proferida sentença confirmando-se a liminar expedida, julgando-se procedente o pedido, para o fim de obrigar o INSS — Instituto Nacional do Seguro Social, no prazo de 90 (noventa) dias, fazer a revisão administrativa dos benefícios previdenciários dos segurados da Subseção de Três Lagoas que façam jus à correção dos benefícios, levando em consideração o que se segue: (Grifei.)
A sentença, por sua vez, contou com o seguinte dispositivo:
DISPOSITIVO
Em face do exposto, afastada a legitimidade ad causam do Ministério Público Federal com relação ao pedido de pagamento das diferenças apuradas após a implantação da nova renda, julgo, com resolução de mérito, PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos constantes da inicial para:
DETERMINAR a adoção variação da ORTN/OTN como índice de correção dos salários-de-contribuição aplicável aos benefícios por idade e por tempo de serviço concedidos entre a edição da Lei n° 6423/77, em 17/06/1977, e a promulgação da Constituição Federal de 1988:
DETERMINAR a aplicação do IRSM de fevereiro de 1994, no percentual de 39,67%, para a correção dos salários-de-contribuição considerados para o cálculo da Renda Mensal inicial dos benefícios previdenciários que incluíram este mês no cálculo.
Confirmo os efeitos da tutela concedida de forma antecipada.
O Instituto Nacional de Seguro Social é isento de custas.
Indevida verba honorária advocatícia na espécie.
Sentença sujeita a reexame necessário.
Publique-se. Registre-se. Intime-se.
Assim, embora na sentença não tenham sido replicados os exatos termos do pedido, em razão do princípio da congruência/adstrição, o julgador não poderia decidir além do que lhe foi pedido. Com efeito, o Código de Processo Civil assim dispõe:
Art. 492. É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.
Parágrafo único. A decisão deve ser certa, ainda que resolva relação jurídica condicional.
Art. 493. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão.
Parágrafo único. Se constatar de ofício o fato novo, o juiz ouvirá as partes sobre ele antes de decidir.
Ademais, o fato superveniente de que trata o artigo 493 do CPC deve guardar pertinência com a causa de pedir e pedido constantes na petição inicial, não servindo de fundamento para alterar os limites da demanda.
A propósito, o Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar REsp n.º 1.243.887/PR, firmou as seguintes teses:
Tema 480 - A liquidação e a execução individual de sentença genérica proferida em ação civil coletiva pode ser ajuizada no foro do domicílio do beneficiário, porquanto os efeitos e a eficácia da sentença não estão circunscritos a lindes geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo (arts. 468, 472 e 474, CPC e 93 e 103, CDC).
Tema 481 – A sentença genérica proferida na ação civil coletiva ajuizada pela Apadeco, que condenou o Banestado ao pagamento dos chamados expurgos inflacionários sobre cadernetas de poupança, dispôs que seus efeitos alcançariam todos os poupadores da instituição financeira do Estado do Paraná. Por isso descabe a alteração do seu alcance em sede de liquidação/execução individual, sob pena de vulneração da coisa julgada. Assim, não se aplica ao caso a limitação contida no art. 2º-A, caput, da Lei n. 9.494/97.
Desse modo, a alteração do alcance do provimento em fase de cumprimento de sentença implica violação à coisa julgada.
Assim, concluiu-se que, na ação civil pública em comento, não poderia ser deferida a revisão dos benefícios concedidos/mantidos fora da área territorial da Subseção Judiciária de Três Lagoas/MS.
Nesse sentido, confira-se o seguinte precedente deste e. Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO INDIVIDUAL DE SENTENÇA COLETIVA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REVISÃO DA RMI. IRSM DE FEVEREIRO DE 1994. ABRANGÊNCIA. SUBSEÇÃO DE TRÊS LAGOAS/MS. LIMITES DO PEDIDO. ADSTRIÇÃO. COISA JULGADA. ILEGITIMIDADE ATIVA. TEMA 1075 DO STF. INAPLICABILIDADE. 1. O provimento concedido pelo título judicial deve ser interpretado de acordo com os limites do pedido, em razão do princípio da congruência e da adstrição e sob pena de violação à coisa julgada. 2. Na ação civil pública 2003.60.03.000741-0 (0000741-49.2003.4.03.6003), a pretensão revisional com base no IRSM de fevereiro/1994, foi restrita aos benefícios previdenciários concedidos/mantidos dentro da área territorial de abrangência da Subseção Judiciária de Três Lagoas/MS. 3. Não tem abrangência nacional a ação civil pública que não foi proposta na circunscrição judiciária de capital de Estado ou no Distrito Federal. 4. Inaplicável o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal sob o Tema 1.075 em cumprimento de sentença que transitou em julgado antes da definição da referida tese. 5. Não detém legitimidade ativa para promover a execução individual da ação civil pública n.º 2003.60.03.000741-0 (0000741-49.2003.4.03.6003) o titular de benefício previdenciário concedido/mantido fora da área territorial de abrangência da Subseção Judiciária de Três Lagoas/MS. 6. Sem majoração de honorários recursais haja vista não terem sido fixados na origem. 7. Apelação da parte exequente desprovida.(TRF1, AC 1068079-71.2022.4.01.3300, Rel. Des. Fed. Eduardo Morais da Rocha, Primeira Turma, Pje: 15/12/2023)
Na hipótese, invoca a apelante, como visto, o Tema 1075 do STF, de modo que se passa a analisar a sua pertinência ou não ao presente caso.
O Supremo Tribunal Federal julgou, em 07/04/2021, o RE nº 1101937, com trânsito em julgado em 01/09/2021, firmando a seguinte tese (Tema 1075):
I - É inconstitucional a redação do art. 16 da Lei 7.347/1985, alterada pela Lei 9.494/1997, sendo repristinada sua redação original.
II - Em se tratando de ação civil pública de efeitos nacionais ou regionais, a competência deve observar o art. 93, II, da Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor).
III - Ajuizadas múltiplas ações civis públicas de âmbito nacional ou regional e fixada a competência nos termos do item II, firma-se a prevenção do juízo que primeiro conheceu de uma delas, para o julgamento de todas as demandas conexas.
Esse julgamento considerou inconstitucional a alteração promovida pela Lei nº 9.494/1997 no artigo 16 da Lei nº 7.347/1985 e, ainda, delimitou as regras de competência aplicáveis às ações civis públicas com abrangência nacional ou regional.
Acerca do juízo competente, o Ministro Alexandre de Moraes, o relator, pontuou em seu voto:
(...)
Dessa maneira, deve ser aplicado o art. 93 do CDC, com destaque para o inciso II:
“Art. 93. Ressalvada a competência da Justiça Federal, é competente para a causa a justiça local:
I - no foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, quando de âmbito local;
II - no foro da Capital do Estado ou no do Distrito Federal, para os danos de âmbito nacional ou regional, aplicando-se as regras do Código de Processo Civil aos casos de competência concorrente”.
Portanto, em se tratando de ação civil pública com abrangência nacional ou regional, sua propositura deve ocorrer no foro, ou na circunscrição judiciária, de capital de Estado ou no Distrito Federal. Em se tratando de alcance geograficamente superior a um Estado, a opção por capital de Estado evidentemente deve contemplar uma que esteja situada na região atingida.
(...)
Dessa maneira, o juiz competente – nos termos do artigo 2º da LACP e 93 do CDC –, que primeiro conhecer da matéria ficará prevento para processar e julgar todas as demandas que proponham o mesmo objeto.
A aplicação dessas normas torna possível definir qual o juiz competente, inclusive para ações cuja decisão tenha efeitos regionais ou nacionais. E, uma vez fixada essa competência, o primeiro que conhecer da matéria, entre os competentes, ficará prevento.
(...) (Grifei.)
No presente caso, a ACP nº 2003.60.03.000741-0(0000741-49.2003.4.03.6003) não foi proposta na circunscrição judiciária de capital de Estado ou no Distrito Federal, não podendo assim ter abrangência nacional.
Ainda que assim não fosse, não teria igualmente aplicação ao caso o entendimento firmado sob o Tema 1.075 do STF, já que a ACP n.º 2003.60.03.000741-0 transitou em julgado antes da definição da referida tese. Nesse sentido, o Tema 733 do STF:
A decisão do Supremo Tribunal Federal declarando a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade de preceito normativo não produz a automática reforma ou rescisão das decisões anteriores que tenham adotado entendimento diferente. Para que tal ocorra, será indispensável a interposição de recurso próprio ou, se for o caso, a propositura de ação rescisória própria, nos termos do art. 485 do CPC, observado o respectivo prazo decadencial (art. 495)
Portanto, a parte exequente não possui legitimidade ativa para a execução da ACP n.º 2003.60.03.000741-0(0000741-49.2003.4.03.6003), tendo em vista não se tratar de benefício concedido/mantido dentro da área territorial de abrangência da Subseção Judiciária de Três Lagoas/MS.
Por todo o exposto, nego provimento à apelação da parte exequente.
Sem majoração de honorários recursais haja vista não terem sido fixados na origem.
É o voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada

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APELAÇÃO CÍVEL (198)1002298-05.2022.4.01.3300
CLETO SANTANA ESTRELA
Advogado do(a) APELANTE: GUSTAVO CAVALCANTI ZANETTE - RS61746-A
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO INDIVIDUAL DE SENTENÇA COLETIVA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REVISÃO DA RMI. IRSM DE FEVEREIRO DE 1994. ABRANGÊNCIA. SUBSEÇÃO DE TRÊS LAGOAS/MS. LIMITES DO PEDIDO. ADSTRIÇÃO. COISA JULGADA. ILEGITIMIDADE ATIVA. TEMA 1075 DO STF. INAPLICABILIDADE. SENTENÇA MANTIDA.
1. O provimento concedido pelo título judicial deve ser interpretado de acordo com os limites do pedido, em razão do princípio da congruência e da adstrição e sob pena de violação à coisa julgada.
2. Na ação civil pública 2003.60.03.000741-0 (0000741-49.2003.4.03.6003), a pretensão revisional com base no IRSM de fevereiro/1994, foi restrita aos benefícios previdenciários concedidos/mantidos dentro da área territorial de abrangência da Subseção Judiciária de Três Lagoas/MS.
3. Não tem abrangência nacional a ação civil pública que não foi proposta na circunscrição judiciária de capital de Estado ou no Distrito Federal.
4. Inaplicável o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal sob o Tema 1.075 em cumprimento de sentença que transitou em julgado antes da definição da referida tese.
5. Não detém legitimidade ativa para promover a execução individual da ação civil pública n.º 2003.60.03.000741-0 (0000741-49.2003.4.03.6003) o titular de benefício previdenciário concedido/mantido fora da área territorial de abrangência da Subseção Judiciária de Três Lagoas/MS.
6. Apelação da parte exequente desprovida
ACÓRDÃO
Decide a nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada
