
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
POLO PASSIVO:JONAS DE SOUZA FERNANDES
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ANTONIO EDUARDO ALVES FEITOSA - TO2896-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1002383-63.2020.4.01.4301
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: JONAS DE SOUZA FERNANDES
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO EDUARDO ALVES FEITOSA - TO2896-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
A parte autora propôs uma ação de procedimento comum contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), visando obter a declaração da inexistência da dívida alegada pela Autarquia Previdenciária, no valor de R$ 86.182,02 (oitenta e seis mil, cento e oitenta e dois reais e dois centavos), referente ao recebimento do benefício de auxílio-acidente após a concessão do benefício de aposentadoria por idade.
O juízo a quo proferiu sentença julgando procedente o pedido inicial, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para declarar a inexigibilidade das parcelas recebidas pela parte autora em relação ao benefício de auxílio-acidente NB 010.954.942-2.
Nas suas razões de apelação, o INSS, resumidamente, sustenta a obrigatoriedade da devolução dos valores indevidamente recebidos.
Foram apresentadas contrarrazões defendendo a manutenção da sentença.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1002383-63.2020.4.01.4301
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: JONAS DE SOUZA FERNANDES
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO EDUARDO ALVES FEITOSA - TO2896-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DO MÉRITO
A matéria controvertida versa sobre a inexigibilidade de reposição ao erário de valores pagos, em razão do recebimento indevido de benefícios previdenciários.
A parte autora percebia o benefício de auxílio-acidente e, após regular procedimento administrativo, passou a também perceber aposentadoria por idade. Posteriormente, foi suspenso o auxílio-acidente, tendo sido determinada a devolução de valores já percebidos, sob o fundamento de cumulação indevida.
Ressalta-se que a boa-fé é presumida, enquanto a má-fé necessita de comprovação. Em outras palavras, é essencial demonstrar a má-fé do beneficiário ou, inversamente, refutar a boa-fé da pessoa que alegadamente recebeu de forma indevida determinado benefício previdenciário.
A jurisprudência tem manifestado a orientação de que seria preciso avaliar a aptidão do segurado "para compreender, de forma inequívoca, a irregularidade do pagamento", tal como decidiu o Ministro Benedito Gonçalves, no julgamento do REsp 1381734/RN, Rel. Primeira Seção, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021.
Além disso, a continuidade do recebimento do benefício, concedido licitamente, sem prova de afirmação de fato inverídico pelo beneficiário destinada a evitar sua revogação, não afasta a boa-fé no caso concreto. Afinal, para o cidadão comum, é razoável acreditar que a continuidade do pagamento de um benefício concedido licitamente, sem revogação pelo INSS, indica a licitude dos pagamentos.
Sobre a matéria, o Superior Tribunal de Justiça, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema n. 979 - REsp 1.381.734), decidiu que, nos casos de valores pagos indevidamente pela Previdência Social em decorrência de erro administrativo (material ou operacional), sem que a hipótese seja de interpretação errônea ou equivocada de lei pela Administração, é devido o ressarcimento ao erário de tais verbas percebidas pelo segurado/beneficiário, salvo quando comprovada a sua boa-fé com a demonstração de que não lhe era possível constatar que o pagamento era indevido.
No julgamento do REsp n. 1.381.734 (Tema 979/STJ) foi firmada a seguinte tese:
"Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido." (Sem grifos no original).
No mesmo julgamento foi decidida a modulação dos efeitos da decisão, nos seguintes termos:
Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão.
Ante a modulação dos efeitos, apenas os processos distribuídos na primeira instância, a partir da data da publicação do acórdão, estarão sujeitos à devolução em caso de erro da administração (material ou operacional), ressalvada a comprovação de boa-fé do beneficiário. Tal não é a situação dos autos, uma vez que a ação foi proposta antes da publicação do acórdão em referência (acórdão publicado no DJe de 23/4/2021).
Considerando a restrição de eficácia temporal estabelecida pelo Superior Tribunal de Justiça, não se mostra relevante a discussão sobre a ausência, ou não, de boa-fé da parte segurada na percepção das verbas tidas por indevidas.
Por fim, acrescento que o INSS não demonstrou de forma inequívoca a má-fé do beneficiário. Deveria ter feito isso na esfera administrativa, inclusive para possibilitar a aplicação da teoria dos motivos determinantes
Portanto, tendo em vista a modulação dos efeitos aplicada pelo STJ no Tema n. 979 e ante a ausência de comprovação de má-fé, verifica-se que, no caso dos autos, é indevida a cobrança dos valores pagos como auxílio-acidente irregularmente concedido.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, nego provimento à apelação, nos termos acima explicitados.
Honorários advocatícios majorados na fase recursal em R$2.000,00 (dois mil reais), além do montante já fixado pelo Juízo de origem (art. 85, §11, CPC).
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1002383-63.2020.4.01.4301
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: JONAS DE SOUZA FERNANDES
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO EDUARDO ALVES FEITOSA - TO2896-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. CUMULAÇÃO INDEVIDA DO AUXÍLIO-ACIDENTE COM APOSENTADORIA POR IDADE. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO DE VALORES. INDEVIDA. MÁ-FÉ NÃO COMPROVADA. TEMA 979. MODULAÇÃO DOS EFEITOS. APELAÇÃO DO INSS NÃO PROVIDA.
1. A matéria controvertida versa sobre a inexigibilidade de reposição ao erário de valores pagos, em razão do recebimento indevido de benefícios previdenciários.
2. Na hipótese, nota-se que a parte autora percebia o benefício de auxílio-acidente e, após regular procedimento administrativo, passou a também perceber aposentadoria por idade. Posteriormente, foi suspenso o auxílio-acidente, tendo sido determinada a devolução de valores já percebidos, sob o fundamento de cumulação indevida.
3. A jurisprudência tem manifestado a orientação de que seria preciso avaliar a aptidão do segurado "para compreender, de forma inequívoca, a irregularidade do pagamento", tal como decidiu o Ministro Benedito Gonçalves, no julgamento do REsp 1381734/RN, Rel. Primeira Seção, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021.
5. A continuidade do recebimento do benefício, concedido licitamente, sem prova de afirmação de fato inverídico pelo beneficiário destinada a evitar sua revogação, não afasta a boa-fé no caso concreto. Para o cidadão comum, é razoável acreditar que a continuidade do pagamento de um benefício concedido licitamente, sem revogação pelo INSS, indica a licitude dos pagamentos.
6. Tendo em vista a modulação dos efeitos aplicada pelo STJ no Tema n. 979 e ante a ausência de comprovação de má-fé, verifica-se que, no caso dos autos, é indevida a cobrança dos valores pagos como auxílio-acidente irregularmente concedido.
7. Apelação do INSS não provida.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
