
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
POLO PASSIVO:JORGE AUGUSTO DA COSTA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ANDRE LUIZ PINTO - SC13673-A
RELATOR(A):CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1007629-41.2017.4.01.3300
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: JORGE AUGUSTO DA COSTA
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, em face de sentença que julgou procedente o pedido, nos termos do art. 487, I, do CPC, para condenar o INSS revisar o benefício NB 0846924056, adequando-o aos novos tetos estabelecidos pelas Emendas Constitucionais nº 20/1998 (R$ 1.200,00) e nº 41/2003 (R$ 2.400,00), devendo ser abatidas as parcelas atingidas pela prescrição quinquenal.
Determinou que o INSS deve evoluir a renda mensal limitando ao novo teto e, para fins de pagamento, considerar os valores recebidos a menor a partir de janeiro de 1999 e janeiro de 2004, respectivamente. Em consequência, deverá o INSS pagar à parte autora a diferença advinda com essa adequação no montante de R$ 192.064,64 (cento e noventa e dois mil, sessenta e quatro reais e sessenta e quatro centavos), atualizado até 06/2018, já com a incidência de correção monetária, a partir de quando devidas, pelo INPC e juros de mora na forma estabelecida pela Lei 11.960/2009 a partir da citação. Condenou o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º, I, do CPC, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor da condenação.
Nas razões recursais (ID 4168949), o INSS alega, inicialmente, a decadência do direito à revisão do benefício. No mérito, argumenta, em síntese, que a parte autora recebe complementação de benefício da União, em razão de se tratar de segurado ex-ferroviário, não fazendo jus ao pagamento de eventuais diferenças da renda mensal de seu benefício, pois estas já foram suportadas pela União.
Aduz, ainda, que os cálculos apresentados pela SECAJ apresentam equívocos, ressaltando que não houve observância ao disposto na Lei nº 11.960/2009, de modo que deve ser afastada a aplicação do INPC. Por fim, afirma que os honorários advocatícios devem incidir, nos termos da Súmula 111 do STJ, salientando a impossibilidade de dispensa da remessa necessária.
As contrarrazões foram apresentadas (ID 4168953).
É o relatório.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1007629-41.2017.4.01.3300
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: JORGE AUGUSTO DA COSTA
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Inicialmente, assente-se a dispensa da remessa necessária no presente caso concreto, em face do teor da norma do inciso I do § 3º do art. 496 do Código de Processo Civil, nos termos dos recentes precedentes do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.735.097/RS; REsp 1.844.937/PR).
Consigno, ainda, que a prescrição atinge as prestações vencidas anteriormente ao quinquênio que antecede o ajuizamento da ação, nos termos da Súmula nº 85/STJ.
O pleito da parte recorrente consiste, inicialmente, no reconhecimento da ocorrência da decadência do direito à revisão do benefício. No mérito, argumenta, em síntese, que a parte autora recebe complementação de benefício da União, em razão de se tratar de segurado ex-ferroviário, não fazendo jus ao pagamento de eventuais diferenças da renda mensal de seu benefício, pois estas já foram suportadas pela União. Aduz, ainda, que os cálculos apresentados pela SECAJ apresentam equívocos, ressaltando que não houve observância ao disposto na Lei nº 11.960/2009, de modo que deve ser afastada a aplicação do INPC. Por fim, afirma que os honorários advocatícios devem incidir, nos termos da Súmula 111 do STJ, salientando a impossibilidade de dispensa da remessa necessária.
Quanto à decadência sustentada pelo INSS, anoto que a parte autora não questiona o ato de concessão do benefício, mas sim as disposições legais que autorizam a revisão do benefício anteriormente concedido, não se aplicando na espécie o prazo decadencial previsto no art. 103 da Lei nº 8.213/1991.
Afasto, pois, a prejudicial de decadência.
Mérito:
Inicialmente “Em relação ao suposto fato de a parte autora receber complementação de aposentadoria paga pela União, esclarece-se que a presente ação busca a readequação da renda mensal do benefício previdenciário da parte autora, com o consequente pagamento das diferenças decorrentes dessa readequação. Constitui-se, assim, em relação jurídica que se restringe apenas ao segurado e ao INSS, não se tratando, em momento algum, da complementação de aposentadoria paga pela União aos ex ferroviários.” (TRF1, AC 1002624-38.2017.4.01.3300/BA, Primeira Turma, Rel. Juíza Federal convocada Olívia Merlin Silva, unânime, PJe 29/07/2019), de modo que a parte autora faz jus à revisão de benefício pleiteada.
O salário de benefício reflete o histórico contributivo do segurado, razão pela qual, em princípio, a renda mensal inicial do benefício deveria corresponder ao valor do salário de benefício apurado. Contudo, a legislação previdenciária estabelece tetos que devem ser respeitados, no tocante tanto ao valor máximo da contribuição previdenciária, a qual deve ser recolhida pelo segurado em cada competência (art. 28, § 5º, Lei nº 8.212/1991), como ao valor máximo de benefício a ser pago pela Previdência Social (arts. 29, § 2º, 33 e 41-A, § 1º, da Lei 8.213/1991).
O entendimento manifestado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 564.354/SE, é no sentido de que a restrição existe apenas para fins de pagamento, não havendo redução do salário de benefício, que é a própria média corrigida dos salários de contribuição integrantes do período básico de cálculo, com a incidência do fator previdenciário, quando couber.
No referido julgamento, foi firmada a seguinte tese: “Não ofende o ato jurídico perfeito a aplicação imediata do art. 14 da Emenda Constitucional nº 20/1998 e do art. 5º da Emenda Constitucional 41/2003 aos benefícios previdenciários limitados a teto do regime geral de previdência estabelecido antes da vigência dessas normas, de modo a que passem a observar o novo teto constitucional” (Tema 76, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carmen Lúcia, DJ 05/02/2011).
Nesse rumo, a equação original no momento da concessão fica inalterada: o salário de benefício, expressão do aporte contributivo do segurado, será sempre a base de cálculo da renda mensal a ser percebida em cada competência, respeitado o limite máximo do salário de contribuição então vigente.
Assim, o valor apurado para o salário de benefício integra-se ao patrimônio jurídico do segurado, de modo que todo o excesso não aproveitado, em razão da restrição, poderá ser utilizado sempre que alterado o teto, adequando-se ao novo limite.
O STF, no julgamento do RE 937.595/SP, em sede de repercussão geral, firmou entendimento no sentido de que "Os benefícios concedidos entre 05.10.1988 e 05.04.1991 (período do buraco negro) não estão, em tese, excluídos da possibilidade de readequação segundo os tetos instituídos pelas EC´s nº 20/1998 e 41/2003, a ser aferida caso a caso, conforme os parâmetros definidos no julgamento do RE 564.354, em regime de repercussão geral" (Tema 930, Tribunal Pleno, Rel. Min. Roberto Barroso, DJ 16/05/2017).
Desse modo, o requerimento de revisão em questão não é restrito aos benefícios concedidos somente após 05/04/1991, podendo incluir, em tese, os concedidos em qualquer época, sendo necessária, para tanto, a verificação no caso concreto de que tal benefício foi limitado a teto anterior, conforme se verifica dos julgados desta Corte:
CONSTITUCIONAL. REVIDENCIÁRIO. REVISÃO. RENDA MENSAL INICIAL. DECADÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. ALTERAÇÃO DO TETO DE CONTRIBUIÇÃO. APLICAÇÃO RETROATIVA AOS BENEFÍCIOS CONCEDIDOS ANTES DAS EMENDAS CONSTITUCIONAIS 20/1998 E 41/2003. POSSIBILIDADE. JURISPRUDÊNCIA DO STF EM SEDE DE REPERCUSSÃO GERAL.
1. É pacífico o entendimento no sentido de que o disposto no art. 103 da Lei 8213/91 “não se aplica à revisão de benefício com base nos valores dos tetos estabelecidos pelas EC 20/1998 e 41/2003, que não trata de alteração do ato de concessão do benefício, mas sim de readequação do valor da prestação a partir da entrada em vigor dos novos tetos”. (REsp 144.755-1/PR, Rel. Min. Herman Benjamin), de modo que incide, na espécie, apenas o prazo prescricional e não decadencial.
2. O Pleno do Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, quando do julgamento do RE nº 564.354, reconheceu que “não ofende o ato jurídico perfeito a aplicação imediata do art. 14 da Emenda Constitucional n. 20/1998 e do art. 5º da Emenda Constitucional n. 41/2003 aos benefícios previdenciários limitados a teto do regime geral de previdência estabelecido antes da vigência dessas normas, de modo a que passem a observar o novo teto constitucional". (RE 564354, Relatora Ministra Carmen Lúcia)
3. A readequação e/ou recomposição dos tetos instituídos pelas ECs 20/1998 e 41/2003, deve ser realizada de acordo com o caso concreto, de modo a não excluir benefícios concedidos entre 05.10.1988 e 05.04.1991 (período do buraco negro). (RE 937595 RG, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 02/02/2017, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-101 DIVULG 15-05-2017 PUBLIC 16-05-2017)
4. De acordo com os cálculos apresentados pela Contadoria, anexados aos autos, (ID. 255822049), concluiu-se que houve limitação do valor benefício ao teto das Emendas constitucionais e consequentemente, existência de atrasados em prol da parte postulante, fazendo jus o Autor às diferenças do pagamento a menor de seus proventos.
5. A parte autora faz jus à aplicação ao seu benefício dos novos tetos estabelecidos pelas ECs 20/1998 e 41/2003, na esteira da jurisprudência do STF, conforme os cálculos apresentados pela Contadoria Judicial, homologados na sentença.
6. Correção monetária e juros de mora segundo o Manual de Cálculos da Justiça Federal.
7. Os honorários advocatícios majorados em 2% (dois por cento), a teor do disposto no art. 85, 11, do CPC.
8. Apelação do INSS não provida.
(AC 1011035-20.2019.4.01.3100/AP, Segunda Turma, Rel. Des. Fed. Rui Gonçalves, unânime, PJe 25/07/2023).
PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. REVISÃO DE BENEFÍCIO. ALTERAÇÃO DO TETO DE CONTRIBUIÇÃO. APLICAÇÃO RETROATIVA AOS BENEFÍCIOS CONCEDIDOS ANTES DAS EMENDAS CONSTITUCIONAIS 20/98 E 41/03. POSSIBILIDADE. JURISPRUDÊNCIA DO STF EM SEDE DE REPERCUSSÃO GERAL. BENEFÍCIO NÃO LIMITADO AO TETO.
1. Não se discutindo o critério de cálculo ou de revisão do ato concessório do benefício, mas sim o limitador a incidir sobre o cálculo incontroverso, a natureza da causa é meramente declaratória e condenatória, e não (des)constitutiva, de modo que incide, na espécie, apenas o prazo prescricional e não decadencial.
2. A prescrição atinge as prestações anteriores ao quinquênio que antecedeu o ajuizamento da ação, nos termos do enunciado da Súmula 85 do Superior Tribunal de Justiça. Decidiu o STJ, no julgamento do tema 1005, que a interrupção da prescrição quinquenal ocorre na data de ajuizamento da lide individual e não do ajuizamento da Ação Civil Pública.
3. A pretensão de se obter o reajuste do benefício concedido antes da EC 20/98 e da EC 41/03, de acordo com os novos tetos nelas estabelecidos, encontra-se em perfeita sintonia com a jurisprudência dos Tribunais e do colendo Supremo Tribunal Federal.
4. O Pleno do Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, quando do julgamento do RE nº 564.354, reconheceu que “não ofende o ato jurídico perfeito a aplicação imediata do art. 14 da Emenda Constitucional n. 20/1998 e do art. 5º da Emenda Constitucional n. 41/2003 aos benefícios previdenciários limitados a teto do regime geral de previdência estabelecido antes da vigência dessas normas, de modo a que passem a observar o novo teto constitucional" (RE nº 564354, Relatora Ministra Carmen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe 15/02/2011).
5. Apreciando novamente a matéria, no julgamento do RE n. 937.595/RG (Tema 930 da repercussão geral), o STF fixou a seguinte tese: os benefícios concedidos entre 05.10.1988 e 05.04.1991 (período do buraco negro) não estão, em tese, excluídos da possibilidade de readequação segundo os tetos instituídos pelas ECs nº 20/1998 e 41/2003, a ser aferida caso a caso, conforme os parâmetros definidos no julgamento do RE 564.354, em regime de repercussão geral.”
6. A prova dos autos não demonstra que o benefício da parte autora (ou o benefício que o precedeu), por ocasião do cálculo original de sua renda mensal inicial ou em virtude de revisão da RMI implementada pelo INSS na via administrativa, sofreu limitação em razão da incidência do limitador previdenciário. Assim, não lhe assiste o direito à revisão vindicada, uma vez que a sua RMI não sofreu nenhuma redução em razão da imposição de limite máximo ao valor do benefício.
7. Honorários de advogado majorados em um ponto percentual sobre o valor arbitrado na origem, conforme previsão do art. 85, §11, do CPC.
8. Apelação desprovida.
(AC 0019809-39.2013.4.01.3400/DF, Primeira Turma, Rel. Des. Fed. Morais da Rocha, unânime, PJe 20/06/2023).
Portanto, elevado o teto do salário de contribuição (como no caso das Emendas Constitucionais nº 20/1998 e nº 41/2003), os benefícios que tiveram a incidência do limitador (teto) sobre o salário de benefício, para apuração da renda mensal, devem ser revistos com utilização do excesso não aproveitado em razão da restrição, adequando-se ao novo limite.
Na hipótese vertente, os documentos juntados evidenciam que o benefício concedido à parte autora foi limitado ao teto do salário de benefício no momento de sua concessão (1º/11/1990 – ID 4168927), razão pela qual a parte requerente, de fato, faz jus à revisão de seus proventos mensais para se adequar ao novo teto previsto pelas respectivas Emendas Constitucionais nº 20/1998 e nº 41/2003, bem como ao pagamento das diferenças em atraso, observada a prescrição quinquenal das parcelas devidas há mais de 05 (cinco) anos do ajuizamento da ação.
Ressalte-se que esta Segunda Turma reconhece a possibilidade de uma execução vazia se o valor do benefício apurado à época da edição das EC nº 20/1998 e EC nº 41/2003 for superior ao valor dos tetos fixados nas respectivas Emendas Constitucionais (AC 1048819-33.2021.4.01.3400/DF, Rel. Des. Fed. Pedro Braga Filho, unânime, PJe 27/05/2023).
Quanto aos consectários o Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, no julgamento do RE 870.947/SE (Tema 810), entendeu pela inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com redação dada pela Lei 11.960/2009, afastando a incidência da TR como índice de correção monetária. Eis o teor da tese aprovada:
II - O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina.(grifei)
Confira-se ainda a ementa do referido julgado:
DIREITO CONSTITUCIONAL. REGIME DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS INCIDENTE SOBRE CONDENAÇÕES JUDICIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. ART. 1º-F DA LEI Nº 9.494/97 COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 11.960/09. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DA UTILIZAÇÃO DO ÍNDICE DE REMUNERAÇÃO DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO CRITÉRIO DE CORREÇÃO MONETÁRIA. VIOLAÇÃO AO DIREITO FUNDAMENTAL DE PROPRIEDADE (CRFB, ART. 5º, XXII). INADEQUAÇÃO MANIFESTA ENTRE MEIOS E FINS. INCONSTITUCIONALIDADE DA UTILIZAÇÃO DO RENDIMENTO DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO ÍNDICE DEFINIDOR DOS JUROS MORATÓRIOS DE CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA, QUANDO ORIUNDAS DE RELAÇÕES JURÍDICO-TRIBUTÁRIAS. DISCRIMINAÇÃO ARBITRÁRIA E VIOLAÇÃO À ISONOMIA ENTRE DEVEDOR PÚBLICO E DEVEDOR PRIVADO (CRFB, ART. 5º, CAPUT). RECURSO EXTRAORDINÁRIO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. O princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput), no seu núcleo essencial, revela que o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, os quais devem observar os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito; nas hipóteses de relação jurídica diversa da tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto legal supramencionado.
2. O direito fundamental de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII) repugna o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, porquanto a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina. 3. A correção monetária tem como escopo preservar o poder aquisitivo da moeda diante da sua desvalorização nominal provocada pela inflação. É que a moeda fiduciária, enquanto instrumento de troca, só tem valor na medida em que capaz de ser transformada em bens e serviços. A inflação, por representar o aumento persistente e generalizado do nível de preços, distorce, no tempo, a correspondência entre valores real e nominal (cf. MANKIW, N.G. Macroeconomia. Rio de Janeiro, LTC 2010, p. 94; DORNBUSH, R.; FISCHER, S. e STARTZ, R. Macroeconomia. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 2009, p. 10; BLANCHARD, O. Macroeconomia. São Paulo: Prentice Hall, 2006, p. 29).
4. A correção monetária e a inflação, posto fenômenos econômicos conexos, exigem, por imperativo de adequação lógica, que os instrumentos destinados a realizar a primeira sejam capazes de capturar a segunda, razão pela qual os índices de correção monetária devem consubstanciar autênticos índices de preços.
5. Recurso extraordinário parcialmente provido.
(RE 870.947/SE, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, unânime, DJe 20/11/2017 - Grifei).
Opostos embargos de declaração visando à modulação de efeitos da referida decisão, a Suprema Corte, em 03/10/2019, veio a rejeitar todos os aclaratórios por maioria de votos e não modulou os efeitos da tese então aprovada no RE 870.947/SE, conforme voto proferido pelo Ministro Alexandre de Moraes, Redator para o acórdão. Os novos embargos de declaração opostos em face dos primeiros foram julgados prejudicados em 24/03/2020 e o processo transitou em julgado em 31/03/2020.
Recorrendo-se ainda à jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça a respeito da controvérsia em debate, verifica-se que a Corte Superior, em julgamento na sistemática de recursos repetitivos (Tema 905), também decidiu no mesmo sentido:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SUBMISSÃO À REGRA PREVISTA NO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 02/STJ. DISCUSSÃO SOBRE A APLICAÇÃO DO ART. 1º-F DA LEI 9.494/97 (COM REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.960/2009) ÀS CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA. CASO CONCRETO QUE É RELATIVO A CONDENAÇÃO JUDICIAL DE NATUREZA ADMINISTRATIVA EM GERAL (RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO). TESES JURÍDICAS FIXADAS.
1. Correção monetária: o art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009), para fins de correção monetária, não é aplicável nas condenações judiciais impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza. 1.1 Impossibilidade de fixação apriorística da taxa de correção monetária. No presente julgamento, o estabelecimento de índices que devem ser aplicados a título de correção monetária não implica pré-fixação (ou fixação apriorística) de taxa de atualização monetária. Do contrário, a decisão baseia-se em índices que, atualmente, refletem a correção monetária ocorrida no período correspondente. Nesse contexto, em relação às situações futuras, a aplicação dos índices em comento, sobretudo o INPC e o IPCA-E, é legítima enquanto tais índices sejam capazes de captar o fenômeno inflacionário. 1.2 Não cabimento de modulação dos efeitos da decisão. A modulação dos efeitos da decisão que declarou inconstitucional a atualização monetária dos débitos da Fazenda Pública com base no índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, objetivou reconhecer a validade dos precatórios expedidos ou pagos até 25 de março de 2015, impedindo, desse modo, a rediscussão do débito baseada na aplicação de índices diversos. Assim, mostra-se descabida a modulação em relação aos casos em que não ocorreu expedição ou pagamento de precatório.
2. Juros de mora: o art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009), na parte em que estabelece a incidência de juros de mora nos débitos da Fazenda Pública com base no índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, aplica-se às condenações impostas à Fazenda Pública, excepcionadas as condenações oriundas de relação jurídico-tributária.
3. Índices aplicáveis a depender da natureza da condenação. 3. Índices aplicáveis a depender da natureza da condenação.3.1 Condenações judiciais de natureza administrativa em geral. As condenações judiciais de natureza administrativa em geral, sujeitam-se aos seguintes encargos: (a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E. 3.1.1 Condenações judiciais referentes a servidores e empregados públicos. As condenações judiciais referentes a servidores e empregados públicos, sujeitam-se aos seguintes encargos: (a) até julho/2001: juros de mora: 1% ao mês (capitalização simples); correção monetária: índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) agosto/2001 a junho/2009: juros de mora: 0,5% ao mês; correção monetária: IPCA-E; (c) a partir de julho/2009: juros de mora: remuneração oficial da caderneta de poupança; correção monetária: IPCA-E. 3.1.2 Condenações judiciais referentes a desapropriações diretas e indiretas. No âmbito das condenações judiciais referentes a desapropriações diretas e indiretas existem regras específicas, no que concerne aos juros moratórios e compensatórios, razão pela qual não se justifica a incidência do art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009), nem para compensação da mora nem para remuneração do capital. 3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária. As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009). 3.3 Condenações judiciais de natureza tributária. A correção monetária e a taxa de juros de mora incidentes na repetição de indébitos tributários devem corresponder às utilizadas na cobrança de tributo pago em atraso. Não havendo disposição legal específica, os juros de mora são calculados à taxa de 1% ao mês (art. 161, § 1º, do CTN). Observada a regra isonômica e havendo previsão na legislação da entidade tributante, é legítima a utilização da taxa Selic, sendo vedada sua cumulação com quaisquer outros índices.
[...]
8. Recurso especial não provido. Acórdão sujeito ao regime previsto no art. 1.036 e seguintes do CPC/2015, c/c o art. 256-N e seguintes do RISTJ.
(REsp 1.495.144/RS, Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, unânime, DJe 20/03/2018 - Grifei).
Anoto que a correção monetária e os juros de mora, como consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados de ofício pelos magistrados, conforme entendimento do STJ (AGInT no REsp 1.663.981/RJ, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 17/10/2019).
Dessa forma, sobre o montante da condenação incidirão correção monetária e juros de mora nos termos estabelecidos pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal atualizado, observados os parâmetros estabelecidos no RE 870.947/SE (Tema 810/STF) e no REsp 1.495.144/RS (Tema 905/STJ), respeitada a prescrição quinquenal.
Majoro os honorários de sucumbência em 2% (dois por cento) ante o oferecimento de contrarrazões, nos termos do § 11 do art. 85 do CPC e determino a sua incidência com base na Súmula 111 do STJ.
Ante o exposto, CONHEÇO do recurso, AFASTO a prejudicial de decadência, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS e ALTERO, de ofício, a sentença, para determinar que a atualização monetária das parcelas atrasadas observe os termos estabelecidos pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal atualizado, obedecendo os parâmetros estabelecidos no RE 870.947/SE (Tema 810/STF) e no REsp 1.495.144/RS (Tema 905/STJ), respeitada a prescrição quinquenal
É como voto.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1007629-41.2017.4.01.3300
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: JORGE AUGUSTO DA COSTA
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO ORDINÁRIA. PREJUDICIAL DE DECADÊNCIA AFASTADA. APOSENTADORIA. EX-FERROVIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20/1998 E Nº 41/2003. LIMITAÇÃO AO TETO. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. ÍNDICES DE CORREÇÃO MONETÁRIA E DOS JUROS DE MORA ALTERADOS DE OFÍCIO.
1. O pleito da parte recorrente consiste, inicialmente, no reconhecimento da ocorrência da decadência do direito à revisão do benefício. No mérito, argumenta, em síntese, que a parte autora recebe complementação de benefício da União, em razão de se tratar de segurado ex-ferroviário, não fazendo jus ao pagamento de eventuais diferenças da renda mensal de seu benefício, pois estas já foram suportadas pela União. Aduz, ainda, que os cálculos apresentados pela SECAJ apresentam equívocos, ressaltando que não houve observância ao disposto na Lei nº 11.960/2009, de modo que deve ser afastada a aplicação do INPC. Por fim, afirma que os honorários advocatícios devem incidir, nos termos da Súmula 111 do STJ, salientando a impossibilidade de dispensa da remessa necessária.
2. A prescrição atinge as prestações vencidas anteriormente ao quinquênio que antecede o ajuizamento da ação, nos termos da Súmula nº 85/STJ.
3. Relativamente à decadência sustentada pelo INSS, anoto que a parte autora não questiona o ato de concessão do benefício, mas sim as disposições legais que autorizam a revisão do benefício anteriormente concedido, não se aplicando na espécie o prazo decadencial previsto no art. 103 da Lei nº 8.213/1991. Prejudicial afastada.
4. “Em relação ao suposto fato de a parte autora receber complementação de aposentadoria paga pela União, esclarece-se que a presente ação busca a readequação da renda mensal do benefício previdenciário da parte autora, com o consequente pagamento das diferenças decorrentes dessa readequação. Constitui-se, assim, em relação jurídica que se restringe apenas ao segurado e ao INSS, não se tratando, em momento algum, da complementação de aposentadoria paga pela União aos ex ferroviários.” (TRF1, AC 1002624-38.2017.4.01.3300/BA, Primeira Turma, Rel. Juíza Federal convocada Olívia Merlin Silva, unânime, PJe 29/07/2019), de modo que a parte autora faz jus à revisão de benefício pleiteada.
5. O salário de benefício reflete o histórico contributivo do segurado, razão pela qual, em princípio, a renda mensal inicial do benefício deveria corresponder ao valor do salário de benefício apurado. Contudo, a legislação previdenciária estabelece tetos que devem ser respeitados, no tocante tanto ao valor máximo da contribuição previdenciária, a qual deve ser recolhida pelo segurado em cada competência (art. 28, § 5º, Lei nº 8.212/1991), como ao valor máximo de benefício a ser pago pela Previdência Social (arts. 29, § 2º, 33 e 41-A, § 1º, da Lei 8.213/1991).
6. O entendimento manifestado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 564.354/SE, é no sentido de que a restrição existe apenas para fins de pagamento, não havendo redução do salário de benefício, que é a própria média corrigida dos salários de contribuição integrantes do período básico de cálculo, com a incidência do fator previdenciário, quando couber.
7. No referido julgamento, foi firmada a seguinte tese: “Não ofende o ato jurídico perfeito a aplicação imediata do art. 14 da Emenda Constitucional 20/1998 e do art. 5º da Emenda Constitucional 41/2003 aos benefícios previdenciários limitados a teto do regime geral de previdência estabelecido antes da vigência dessas normas, de modo a que passem a observar o novo teto constitucional” (Tema 76, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carmen Lúcia, DJ 05/02/2011).
8. Nesse rumo, a equação original no momento da concessão fica inalterada: o salário de benefício, expressão do aporte contributivo do segurado, será sempre a base de cálculo da renda mensal a ser percebida em cada competência, respeitado o limite máximo do salário de contribuição então vigente.
9. O valor apurado para o salário de benefício integra-se ao patrimônio jurídico do segurado, de modo que todo o excesso não aproveitado, em razão da restrição, poderá ser utilizado sempre que alterado o teto, adequando-se ao novo limite.
10. O STF, no julgamento do RE 937.595/SP, em sede de repercussão geral, firmou entendimento no sentido de que "Os benefícios concedidos entre 05.10.1988 e 05.04.1991 (período do buraco negro) não estão, em tese, excluídos da possibilidade de readequação segundo os tetos instituídos pelas EC´s nº 20/1998 e 41/2003, a ser aferida caso a caso, conforme os parâmetros definidos no julgamento do RE 564.354, em regime de repercussão geral" (Tema 930, Tribunal Pleno, Rel. Min. Roberto Barroso, DJ 16/05/2017).
11. O requerimento de revisão em questão não é restrito aos benefícios concedidos somente após 05/04/1991, podendo incluir, em tese, os concedidos em qualquer época, sendo necessária, para tanto, a verificação no caso concreto de que tal benefício foi limitado a teto anterior
12. Elevado o teto do salário de contribuição (como no caso das Emendas Constitucionais nº 20/1998 e nº 41/2003), os benefícios que tiveram a incidência do limitador (teto) sobre o salário de benefício para apuração da renda mensal, devem ser revistos com utilização do excesso não aproveitado em razão da restrição, adequando-se ao novo limite.
13. Na hipótese vertente, os documentos juntados evidenciam que o benefício concedido à parte autora foi limitado ao teto do salário de benefício no momento de sua concessão (1º/11/1990), razão pela qual a parte requerente, de fato, faz jus à revisão de seus proventos mensais para se adequar ao novo teto previsto pelas respectivas Emendas Constitucionais nº 20/1998 e nº 41/2003, bem como ao pagamento das diferenças em atraso, observada a prescrição quinquenal das parcelas devidas há mais de 05 (cinco) anos do ajuizamento da ação.
14. Quanto aos consectários legais, sobre o montante da condenação incidirão correção monetária e juros de mora nos termos estabelecidos pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal atualizado, observados os parâmetros estabelecidos no RE 870.974/SE (Tema 810/STF) e no REsp 1.495.144/RS (Tema 905/STJ), respeitada a prescrição quinquenal, de modo que não merece prosperar a pretensão do INSS quanto a aplicação da Lei 11.960/2009 a título de correção monetária.
15. Apelação do INSS a que se nega provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, AFASTAR a prejudicial de decadência, NEGAR PROVIMENTO à apelação do INSS e ALTERAR, DE OFÍCIO, os índices de correção monetária e dos juros de mora, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, na data lançada na certidão de julgamento.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora
