
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:VALDECY DA SILVA MAZUTTI
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: FERNANDO DO NASCIMENTO MELO - MT9110/O e TOBIAS PIVA - MT20730-A
RELATOR(A):CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1005784-77.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VALDECY DA SILVA MAZUTTI
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DE SEGURIDADE SOCIAL em face da sentença que julgou procedente pedido de aposentadoria por idade rural à parte autora. Houve a antecipação dos efeitos da tutela.
Nas razões recursais (ID 194472520, fls. 24 a 30), o recorrente pretende a reforma da sentença, sustentando ter a parte autora vínculos urbanos no CNIS de longa duração e seu cônjuge ser proprietário de bens móveis que seriam incompatíveis com a qualidade de segurada especial.
As contrarrazões foram apresentadas (ID 194472520, fls. 34 a 41).
É o relatório.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1005784-77.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VALDECY DA SILVA MAZUTTI
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Inicialmente, assente-se a dispensa de remessa necessária no presente caso concreto, em face do teor da norma do inciso I do § 3º do art. 496 do Código de Processo Civil, nos termos dos recentes precedentes do Superior Tribunal de Justiça (a propósito: REsp. 1735097/RS; REsp. 1844937/PR).
O pleito do recorrente consiste na improcedência do pedido em face da presença de vínculos urbanos de longa duração no CNIS da parte autora, o que descaracterizaria a qualidade de segurada especial.
Da aposentadoria por idade rural
São requisitos para aposentadoria de trabalhador rural: ter 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
Para a comprovação do tempo de serviço na qualidade de rurícola, o exercício de atividade rural alegado deve estar alicerçado em produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea, quando se fizer necessária ao preenchimento de eventuais lacunas.
Quanto aos documentos que fazem início de prova material, a jurisprudência pátria, considerando a situação peculiar do trabalhador rural e a dificuldade encontrada para se comprovar a atividade rural, em qualquer das suas formas, permite que documentos, mesmo que não dotados de fé pública e não especificados no art. 106 da Lei n. 8.213/91, sejam considerados para fins de concessão do benefício previdenciário, desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais como: a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), a certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS), a declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), contanto que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, conforme disposto na Súmula 14 da TNU, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91).
Além disso, a Súmula 34 da TNU dispõe que, para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar e a Súmula 149 do STJ disciplina que a prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.
Esse é o entendimento do STJ pacificado quanto à necessidade de se estar atuando como rurícola ao tempo do requerimento administrativo:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmenteprevistos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil. (STJ - REsp: 1354908 SP 2012/0247219-3, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 09/09/2015, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 10/02/2016 RT vol. 967 p. 584)
Impende então averiguar se há substrato probatório idôneo a ensejar o reconhecimento do exercício de atividade rural pelo tempo minimamente necessário ao gozo do benefício em questão, que, no caso, corresponde a 180 (cento e oitenta) meses, nos termos do art. 25, II, da Lei 8.213/1991.
Houve o implemento do requisito etário em 2015 e apresentou o requerimento administrativo em 2019, portanto, a parte autora deveria provar o período de 180 meses de atividade rural, conforme tabela progressiva do INSS, ou seja, de 2000 a 2015 ou de 2004 a 2019.
Com vistas a constituir início de prova material da qualidade de segurada e carência, a parte autora anexou aos autos: a) Certidão de casamento com o senhor Geraldo Luiz Mazuti em que ele é qualificado como lavrador de 1979; b) Ficha do sindicato rural em nome do sogro da parte autora; b) Certidão de documentos de terras em nome do sogro da parte autora; c) Cédula rural hipotecária em nome do sogro da parte autora de 1976 e outros documentos em nome do sogro da parte autora; d) Declaração do cunhado da parte autora, senhor José Carlos Mazuti de que a parte autora e seu esposo trabalhavam em regime de parceria com o seu pai no sítio Santo Antônio no período de 1979 a 1984 de 2016; e) Contrato de mútuo em nome co cônjuge da parte autora referente ao Sítio Santo Antônio de 1992; f) Contrato particular de compra e venda de parte de terras rurais em nome do cônjuge da parte autora de 1997; g) Contrato de arrendamento para exploração agrícola em nome do cônjuge da parte autora de 2013; h) Notas fiscais de compra de produtos agrícolas em nome da parte autora de diversos anos; i) Contrato de Comodato com o cônjuge da parte autora de 2014; j) Nota fiscal de produtor rural em nome do cônjuge da parte autora de 2017 a 2020; l) Cadastro do PRONAF em nome do cônjuge da parte autora e da parte autora de 2017; m) Contrato Particular de arrendamento de seringal em nome do cônjuge da parte autora de 2017; n) Autodeclarações de trabalhadora rural nos períodos de 01/02/1979 a 01/02/1984, de 01/02/1984 a 30/08/1997, de 05/10/2000 a 30/06/2004, de 20/10/2017 a 07/03/2019 e o) Cadastro de micro produtor rural em nome do cônjuge da parte autora de 2017.
Portanto, considero que foi comprovada a atividade rural nos períodos de 1992 a 2003, de 2013 a 2014, de 2017 a 2019.
Embora o autor alegue viver somente da atividade campesina, em análise ao CNIS, verificam-se diversos vínculos urbanos de longa duração durante o período da carência.
Nesse contexto, a parte autora não faz jus ao benefício de aposentadoria por idade rural.
Da aposentadoria por idade híbrida
Em que pese a parte autora não preencher os requisitos para a aposentadoria por idade rural, na petição inicial, segundo a doutrina e a jurisprudência, é aplicável o princípio da fungibilidade entre os benefícios previdenciários e, assim como o INSS deve conceder o benefício da melhor opção para o segurado, também é possível ao Judiciário conceder, de ofício, por fundamento diverso, a prestação devida ao segurado. É esse também o entendimento desta Turma:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA. IDADE E ATIVIDADE RURAL COMPROVADAS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. FUNGIBILIDADE DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. 1. Comprovada a qualidade de trabalhador rural mediante início de prova material devidamente corroborado pela prova testemunhal produzida em juízo e a implementação do requisito etário exigido, deve ser reconhecido o direito do segurado à percepção do benefício 2. Na hipótese, constata-se que a parte-autora atingiu a idade mínima e cumpriu o período equivalente ao prazo de carência exigidos em lei. O início razoável de prova material restou comprovado ante a apresentação dos seguintes documentos: declaração de ITR do imóvel rural do autor, referente ao ano de 2015 (ID: 26621360 p. 2); nota fiscal de compra de produtos agrícolas; ; notas fiscais de venda de animais (ID: 26621362 p. 5/7 e ID: 26621362 p. 12); outras notas de venda de animais dos anos de 2003 e 2007 (ID: 26621364 p. 10 de 20). 3. O início de prova material da atividade campesina foi corroborado pela oitiva das testemunhas que, de forma harmônica e consistente, disseram que a parte autora sempre exerceu o labor rural, estendendo a eficácia das provas documentais para o lapso equivalente à carência e confirmando a atividade rurícola da parte-autora. 4. Em homenagem ao princípio da fungibilidade dos benefícios previdenciários e tendo em conta que o INSS tem o dever de conceder ao beneficiário a melhor opção que lhe cabe, não é defeso ao magistrado conceder, de ofício, ou por fundamento diverso, em ação previdenciária, a prestação pecuniária que é devida ao jurisdicionado. Precedentes. 5. Juros de mora e correção monetária nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal. 6. Honorários recursais arbitrados em 20% (vinte por cento) sobre o valor/percentual a ser fixado pelo juízo a quo em liquidação de sentença e sem prejuízo deste, a serem pagos em favor da parte autora, observados os limites mínimo e máximo estabelecidos nos incisos do § 3º do art. 85 do CPC. 7. Apelação do INSS desprovida. (TRF-1 - AC: 10273647120194019999, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA, Data de Julgamento: 29/07/2022, 2ª Turma, Data de Publicação: PJe 29/07/2022 PAG PJe 29/07/2022 PAG) Grifei
Conforme documento apresentado pela parte autora, constata-se que o requisito de idade mínima para a concessão da aposentadoria por idade híbrida foi atendido em 2020. Portanto, a carência a ser cumprida é a de 180 meses no período de (2005 a 2020).
Demais disso, o CNIS da parte autora revela várias contribuições mensais como contribuinte empregado nos períodos de 01/10/2004 a 26/06/2006 e de 02/06/2014 a 12/01/2017, que totalizam 4 anos, 4 meses e 7 dias.
Assim, o conjunto probatório revela o exercício do labor rural e urbano, bem como o cumprimento da carência prevista no art. 142 da Lei n. 8.213/91. Atendidos, assim, os requisitos indispensáveis à concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida.
Considerando que a parte autora implementou o requisito etário no curso da ação, a DER deverá ser fixada no momento que implementou os requisitos, qual seja, 09/12/2020. Deve ser reconhecido, dessa forma, o direito ao benefício com termo inicial nessa data.
Quanto aos bens móveis em nome do cônjuge da parte autora, não considero que descaracterizou a condição de segurada especial da parte autora, uma vez que não são de grande vulto.
Diante da linha de intelecção adotada pelo STJ, nos casos de reafirmação da DER para a data do cumprimento dos requisitos, não haverá incidência de juros sobre as parcelas vencidas a partir de então, caso o INSS implante o benefício no prazo de 45 dias a contar da intimação do julgado. Vejamos:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO ESPECIAL. REAFIRMAÇÃO DA DER. POSSIBILIDADE. JUROS DE MORA. NÃO INCIDÊNCIA. OMISSÃO SUPRIDA. EFEITOS MODIFICATIVOS. RECURSO PROVIDO. 1. Nos termos do art. 1.022, e seus incisos/CPC/2015, os embargos de declaração se destinam a desfazer uma obscuridade, afastar contradição ou suprimir omissão. 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e a dos Tribunais Regionais Federais vem se orientando no sentido de ser possível a reafirmação da DER, com o cômputo de período de serviço/contribuição posterior à data de entrada do requerimento administrativo e mesmo após o ajuizamento da ação. 3. No caso concreto, apesar de haver divergência entre os PPPs apresentados às fls. 60/61 e 410/411 em relação ao período de 1º.10.2001 a 27.01.2010, o período posterior a essa data consta apenas do formulário mais recente, de forma que pode ser analisado e enquadrado pela exposição a ruído superior a 85 dB até a data da reafirmação da DER (28.01.2010 a 22.02.2014). 4. O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) confirma que o segurado esteve submetido a ruído acima do permitido pela legislação, observada a cronologia pertinente, para a contagem de tempo especial (limite mínimo de 80 decibéis até 05/03/1997, de 90 decibéis no período de 06/03/1997 a 18/11/2003 e de 85 decibéis, a partir de 19/11/2003). 5. A comprovação de que a exposição ao ruído ocorria de forma habitual e permanente decorre da própria dosimetria, já que os níveis médios de ruído são apurados por meio de método que avalia doses de ruído recebidas por trabalhadores itinerantes ou em postos fixos de trabalho cujos níveis variam aleatoriamente no decorrer do tempo. 6. Com a inclusão do período de 28.01.2010 a 22.02.2014 como especial e sua conversão em tempo comum pelo fator 1.4, o autor passa a contar com mais de 35 anos de atividade em 22.02.2014, fazendo jus à aposentadoria por tempo de contribuição nessa data. 7. Conforme precedentes do STJ (REsp 1.727.069/SP), sendo a data reafirmada para o início do benefício posterior ao ajuizamento da ação, não incidem juros de mora, exceto no caso de o INSS não efetivar a implantação do benefício, primeira obrigação oriunda de sua condenação, no prazo razoável de até quarenta e cinco dias. 8. Embargos providos para enquadrar o período de 28.01.2010 a 22.02.2014 como tempo especial e conceder ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral a partir de 22.02.2014, data em que implantados os requisitos para sua concessão. Os valores em atraso são devidos a partir da referida data, corrigidos monetariamente e sem incidência de juros de mora, na forma do acórdão embargado. Acórdão mantido também quanto aos demais fundamentos e análise dos períodos comuns e especiais, bem como no que tange à sucumbência. 9. Deferida tutela de urgência da obrigação de fazer para implantação imediata do benefício, com fundamento no art. 300 do CPC/2015.
(EDAC 0062344-49.2010.4.01.3800, JUIZ FEDERAL MURILO FERNANDES DE ALMEIDA, TRF1 - 1ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DE MINAS GERAIS, e-DJF1 21/01/2022 PAG.) Grifei
Assim, considerando que houve a antecipação da tutela e o INSS já vem pagando o benefício desde 07/03/2019, não deve haver a incidência de juros sobre as parcelas vencidas.
Ante o exposto, CONHEÇO do recurso e, no mérito, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INSS para reformar a sentença e deferir em favor da parte autora o benefício de aposentadoria por idade híbrida, com a data inicial do benefício em 09/12/2020 (reafirmação da DER). Não haverá incidência de juros sobre as parcelas vencidas a partir de então.
É como voto.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1005784-77.2022.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VALDECY DA SILVA MAZUTTI
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO PELA PROVA TESTEMUNHAL. VÍNCULOS URBANOS NO CNIS POR PERÍODO SUPERIOR A 120 DIAS. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA.
1. O pleito do recorrente consiste na improcedência do pedido em face da presença de vínculos urbanos de longa duração no CNIS da parte autora, o que descaracterizaria a qualidade de segurada especial.
2. São requisitos para aposentadoria de trabalhador rural: ter 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
3. Houve o implemento do requisito etário em 2015, portanto, a parte autora deveria provar o período de 180 meses de atividade rural, conforme tabela progressiva do INSS.
4. Com vistas a constituir início de prova material da qualidade de segurada e carência, a parte autora anexou aos autos: a) Certidão de casamento com o senhor Geraldo Luiz Mazuti em que ele é qualificado como lavrador de 1979; b) Ficha do sindicato rural em nome do sogro da parte autora; b) Certidão de documentos de terras em nome do sogro da parte autora; c) Cédula rural hipotecária em nome do sogro da parte autora de 1976 e outros documentos em nome do sogro da parte autora; d) Declaração do cunhado da parte autora, senhor José Carlos Mazuti de que a parte autora e seu esposo trabalhavam em regime de parceria com o seu pai no sítio Santo Antônio no período de 1979 a 1984 de 2016; e) Contrato de mútuo em nome co cônjuge da parte autora referente ao Sítio Santo Antônio de 1992; f) Contrato particular de compra e venda de parte de terras rurais em nome do cônjuge da parte autora de 1997; g) Contrato de arrendamento para exploração agrícola em nome do cônjuge da parte autora de 2013; h) Notas fiscais de compra de produtos agrícolas em nome da parte autora de diversos anos; i) Contrato de Comodato com o cônjuge da parte autora de 2014; j) Nota fiscal de produtor rural em nome do cônjuge da parte autora de 2017 a 2020; l) Cadastro do PRONAF em nome do cônjuge da parte autora e da parte autora de 2017; m) Contrato Particular de arrendamento de seringal em nome do cônjuge da parte autora de 2017; n) Autodeclarações de trabalhadora rural nos períodos de 01/02/1979 a 01/02/1984, de 01/02/1984 a 30/08/1997, de 05/10/2000 a 30/06/2004, de 20/10/2017 a 07/03/2019 e o) Cadastro de micro produtor rural em nome do cônjuge da parte autora de 2017.
5. Portanto, foi comprovada a atividade rural nos períodos de 1992 a 2003, de 2013 a 2014, de 2017 a 2019.
6. Embora o autor alegue viver somente da atividade campesina, em análise ao CNIS, verificam-se diversos vínculos urbanos de longa duração durante o período da carência.
7. Nesse contexto, a parte autora não faz jus ao benefício de aposentadoria por idade rural.
8. Em que pese a parte autora não preencher os requisitos para a aposentadoria por idade rural, na petição inicial, segundo a doutrina e a jurisprudência, é aplicável o princípio da fungibilidade entre os benefícios previdenciários e, assim como o INSS deve conceder o benefício da melhor opção para o segurado, também é possível ao Judiciário conceder, de ofício, por fundamento diverso, a prestação devida ao segurado. É esse também o entendimento desta Turma. Precedentes.
9. Conforme documento apresentado pela parte autora, constata-se que o requisito de idade mínima para a concessão da aposentadoria por idade híbrida foi atendido em 2020. Portanto, a carência a ser cumprida é a de 180 meses no período de (2005 a 2020).
10. Demais disso, o CNIS da parte autora revela várias contribuições mensais como contribuinte empregado nos períodos de 01/10/2004 a 26/06/2006 e de 02/06/2014 a 12/01/2017, que totalizam 4 anos, 4 meses e 7 dias.
11. Assim, o conjunto probatório revela o exercício do labor rural e urbano, bem como o cumprimento da carência prevista no art. 142 da Lei n. 8.213/91. Atendidos, assim, os requisitos indispensáveis à concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida.
12. Considerando que a parte autora implementou o requisito etário no curso da ação, a DER deverá ser fixada no momento que implementou os requisitos, qual seja, 09/12/2020. Deve ser reconhecido, dessa forma, o direito ao benefício com termo inicial nessa data.
13. Quanto aos bens móveis em nome do cônjuge da parte autora, não se considera que descaracterizou a condição de segurada especial da parte autora, uma vez que não são de grande vulto.
14. Diante da linha de intelecção adotada pelo STJ, nos casos de reafirmação da DER para a data do cumprimento dos requisitos, não haverá incidência de juros sobre as parcelas vencidas a partir de então, caso o INSS implante o benefício no prazo de 45 dias a contar da intimação do julgado. Assim, considerando que houve a antecipação da tutela e o INSS já vem pagando o benefício desde 07/03/2019, não deve haver a incidência de juros sobre as parcelas vencidas.
15. Apelação do INSS parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, na data lançada na certidão do julgamento.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora
