
POLO ATIVO: KETULY RAFAELA COSTA DE MATES
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: YDIARA GONCALVES DAS NEVES - MT19021-A e EMERSON MARQUES TOMAZ - GO54450-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):EDUARDO MORAIS DA ROCHA

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1008808-45.2024.4.01.9999
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA (RELATOR):
A parte autora propôs ação ordinária contra o INSS, a fim de obter salário-maternidade como rurícola.
Sentença prolatada pelo MM. Juiz a quo julgando improcedente o pedido inicial, ao fundamento de que, a despeito da prova material, a prova testemunhal, indispensável para a comprovação da qualidade de segurado e a carência, não foi produzida em razão da ausência da parte autora e das testemunhas..
Apelou a parte autora sustentando cerceamento de defesa pela não produção de prova oral, uma vez que foi requerida, na audiência de instrução, a redesignação da audiência, o que lhe foi indeferido.
É o relatório.
Desembargador Federal MORAIS DA ROCHA
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1008808-45.2024.4.01.9999
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA (RELATOR):
Sentença proferida na vigência do CPC/2015.
Segundo os termos do Enunciado Administrativo n. 3/STJ, aprovado pelo Plenário da Corte na sessão de 9/3/2016: “Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.”
Requerimento administrativo
Nos termos do entendimento firmado pelo e. STF no RE 631240, em sede de repercussão geral, exige-se o prévio requerimento administrativo para a propositura de ação judicial em que se pretende a concessão de benefício previdenciário. Entretanto, para as ações ajuizadas até a data daquele julgamento, a insurgência de mérito do INSS caracteriza o interesse de agir da parte autora, porque estaria configurada a resistência ao pedido, sendo prescindível, nesse caso, a provocação administrativa.
Mérito
O salário-maternidade é devido às seguradas, desde que comprovem o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 10 (dez) meses imediatamente anteriores à data do parto ou do requerimento do benefício, quando requerido antes do parto, mesmo que de forma descontínua (art. 93,§2º, do Decreto 3.048/99).
O reconhecimento da qualidade de segurada especial, trabalhadora rural, desafia o preenchimento dos seguintes requisitos fundamentais: a existência de início de prova material da atividade rural exercida e a corroboração dessa prova indiciária por robusta prova testemunhal.
Com efeito, a jurisprudência do STJ admite que essa comprovação seja feita com base em quaisquer documentos que contenham fé pública, sendo que a qualificação constante dos dados do registro civil, como certidão de casamento, de nascimento e de óbito, é extensível ao cônjuge e aos filhos, sendo certo que o art. 106 da Lei 8.213/91 contém rol meramente exemplificativo, e não taxativo (REsp 1081919/PB, rel. Ministro Jorge Mussi, DJ 03.8.2009).
Segundo jurisprudência pacificada dos Tribunais pátrios, a qualificação profissional de lavrador ou agricultor, constante dos assentamentos de registro civil, constitui indício aceitável de prova material do exercício da atividade rural, nos termos do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, podendo projetar efeitos para período de tempo anterior e posterior ao nele retratado, desde que corroborado por segura prova testemunhal.
É prescindível que o início de prova material abranja todo o período de carência exigido para a concessão do benefício previdenciário - no caso, 10 meses -, desde que a prova testemunhal lhe amplie a eficácia probatória referente ao lapso temporal que se quer ver comprovado.
Entretanto, documentos confeccionados em momento próximo ou mesmo posterior ao parto não possuem a idoneidade probante para serem considerados como início de prova material do labor rural, para o fim específico de obtenção do benefício de salário-maternidade. Assim, a certidão de nascimento da criança na qual conste a profissão dos pais como trabalhadores rurais não é servil à instrução probatória, como também não são outros documentos desprovidos da necessária antecedência ou contemporaneidade do trabalho rural em relação ao fato ensejador da prestação.
Na mesma linha, as simples declarações unilaterais do desempenho de trabalho rural, porquanto equivalentes a prova testemunhal reduzida a termo, também não servem para o referido fim.
Caso dos autos
No caso dos autos, a autora postula a concessão do benefício de salário-maternidade em decorrência do nascimento do seu filho ocorrido em 17/07/2015.
Com o propósito de apresentar o início razoável de prova material da atividade rural, foram juntados aos autos os seguintes documentos: Certidão do INCRA, constando o genitor da criança como beneficiário de lote rural em Assentamento, desde 2007.
A despeito do início razoável de prova material da atividade rural, a prova oral não foi produzida porque a parte autora e as testemunhas não compareceram à audiência virtual. Entretanto, foi requerida, naquela oportunidade, a redesignação da audiência, o que foi indeferido de pronto pelo magistrado de origem.
Não houve comprovação nos autos de que tenha havido desídia ou desinteresse da parte autora na realização da prova testemunhal, mesmo porque foi solicitada a designação de outra data para a sua realização. Ademais, em se tratando de prova indispensável para o julgamento da lide, não poderia o magistrado ter indeferido tal pedido, sob pena cercear o direito da parte autora, pois somente com a completa instrução do processo é que se pode realizar a análise da comprovação da qualidade de segurada especial.
Conclusão
Em face do exposto, dou provimento à apelação para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem para regular instrução e julgamento do feito, com a oitiva de testemunhas.
É como voto.
Desembargador Federal MORAIS DA ROCHA
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1008808-45.2024.4.01.9999
RELATOR: Des. MORAIS DA ROCHA
APELANTE: KETULY RAFAELA COSTA DE MATES
Advogados do(a) APELANTE: EMERSON MARQUES TOMAZ - GO54450-A, YDIARA GONCALVES DAS NEVES - MT19021-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. SENTENÇA ANULADA.
1. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade, conforme estabelecido pelo art. 71 da Lei 8.213/91.
2. A concessão do benefício pleiteado pela parte autora exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena.
3. Na esteira do julgamento proferido no REsp n. 1.348.633/SP (Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima), em sede de recurso representativo da controvérsia, a Primeira Seção do e. STJ concluiu que, para efeito de reconhecimento do labor agrícola, mostra-se desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exigido, desde que a eficácia daquele seja ampliada por prova testemunhal idônea. (AgInt no AREsp n. 852.494/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 9/12/2021; AREsp n. 1.550.603/PR, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 11/10/2019, entre outros.).
4. Os documentos trazidos aos autos pela parte autora configuram o início razoável de prova material da atividade campesina, em atenção à solução pro misero adotada no âmbito do Colendo STJ e pelos Tribunais Regionais Federais..
5. A despeito do início razoável de prova material da atividade rural, a prova oral não foi produzida porque a parte autora e as testemunhas não compareceram à audiência virtual. Entretanto, foi requerida, naquela oportunidade, a redesignação da audiência, o que foi indeferido de pronto pelo magistrado de origem.
6. Não houve comprovação nos autos de que tenha havido desídia ou desinteresse da parte autora na realização da prova testemunhal, mesmo porque foi solicitada a designação de outra data para a sua realização. Ademais, em se tratando de prova indispensável para o julgamento da lide, não poderia o magistrado ter indeferido tal pedido, sob pena cercear o direito da parte autora, pois somente com a completa instrução do processo é que se pode realizar a análise da comprovação da qualidade de segurada especial.
7. Apelação provida. Sentença anulada.
A C Ó R D Ã O
Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto do Relator
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Desembargador Federal MORAIS DA ROCHA
