
POLO ATIVO: SANDRA MARIA FERREIRA FREITAS
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: BROOKLIN PASSOS BENTES - AM12050-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):EDUARDO MORAIS DA ROCHA

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1010018-34.2024.4.01.9999
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA (RELATOR):
A parte autora propôs ação ordinária contra o INSS, a fim de obter salário-maternidade como rurícola.
Sentença prolatada pelo MM. Juiz a quo julgando extinto o processo, sem resolução de mérito, nos termos do art. 487, II, do CPC, em razão da prescrição.
Apelou a parte autora, sustentando não ter ocorrido a prescrição e, no mérito, alega o cumprimento dos requisitos exigidos para a concessão do benefício postulado.
É o relatório.
Desembargador Federal MORAIS DA ROCHA
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1010018-34.2024.4.01.9999
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA (RELATOR):
Sentença proferida na vigência do CPC/2015.
Segundo os termos do Enunciado Administrativo n. 3/STJ, aprovado pelo Plenário da Corte na sessão de 9/3/2016: “Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.”
Prescrição
O MM juízo a quo entendeu pela extinção do processo, sem julgamento do mérito, em razão da prescrição, a teor do art. 332, §1º, do CPC/2015.
A prescrição do direito ao salário-maternidade é contada do vencimento de cada parcela em relação à data do requerimento ou do ajuizamento da ação e o seu curso fica suspenso quando pendente análise de requerimento administrativo, nos termos do parágrafo único do artigo 4º do Decreto nº 20.910/32.
Compulsando os autos, verifica-se que o filho da autora nasceu em 28/06/2017 e, assim, as prestações do benefício de salário-maternidade seriam devidas no períodos de julho a outubro/2017. Como o requerimento administrativo se deu em 14/06/2022, ou seja, antes de transcorrido o prazo de 05 (cinco) anos até mesmo em relação ao nascimento da criança, não há que se falar em prescrição.
Estando o feito devidamente instruído, pode o tribunal enfrentar diretamente o mérito da lide, nos termos do artigo 1.013, § 4º, do CPC.
Requerimento administrativo
Nos termos do entendimento firmado pelo e. STF no RE 631240, em sede de repercussão geral, exige-se o prévio requerimento administrativo para a propositura de ação judicial em que se pretende a concessão de benefício previdenciário. Entretanto, para as ações ajuizadas até a data daquele julgamento, a insurgência de mérito do INSS caracteriza o interesse de agir da parte autora, porque estaria configurada a resistência ao pedido, sendo prescindível, nesse caso, a provocação administrativa.
Mérito
O salário-maternidade é devido às seguradas, desde que comprovem o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 10 (dez) meses imediatamente anteriores à data do parto ou do requerimento do benefício, quando requerido antes do parto, mesmo que de forma descontínua (art. 93,§2º, do Decreto 3.048/99).
O reconhecimento da qualidade de segurada especial, trabalhadora rural, desafia o preenchimento dos seguintes requisitos fundamentais: a existência de início de prova material da atividade rural exercida e a corroboração dessa prova indiciária por robusta prova testemunhal.
Com efeito, a jurisprudência do STJ admite que essa comprovação seja feita com base em quaisquer documentos que contenham fé pública, sendo que a qualificação constante dos dados do registro civil, como certidão de casamento, de nascimento e de óbito, é extensível ao cônjuge e aos filhos, sendo certo que o art. 106 da Lei 8.213/91 contém rol meramente exemplificativo, e não taxativo (REsp 1081919/PB, rel. Ministro Jorge Mussi, DJ 03.8.2009).
Segundo jurisprudência pacificada dos Tribunais pátrios, a qualificação profissional de lavrador ou agricultor, constante dos assentamentos de registro civil, constitui indício aceitável de prova material do exercício da atividade rural, nos termos do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, podendo projetar efeitos para período de tempo anterior e posterior ao nele retratado, desde que corroborado por segura prova testemunhal.
É prescindível que o início de prova material abranja todo o período de carência exigido para a concessão do benefício previdenciário - no caso, 10 meses -, desde que a prova testemunhal lhe amplie a eficácia probatória referente ao lapso temporal que se quer ver comprovado.
Entretanto, documentos confeccionados em momento próximo ou mesmo posterior ao parto não possuem a idoneidade probante para serem considerados como início de prova material do labor rural, para o fim específico de obtenção do benefício de salário-maternidade. Assim, a certidão de nascimento da criança na qual conste a profissão dos pais como trabalhadores rurais não é servil à instrução probatória, como também não são outros documentos desprovidos da necessária antecedência ou contemporaneidade do trabalho rural em relação ao fato ensejador da prestação.
Na mesma linha, as simples declarações unilaterais do desempenho de trabalho rural, porquanto equivalentes a prova testemunhal reduzida a termo, também não servem para o referido fim.
Caso dos autos
No caso dos autos, a autora postula a concessão do benefício de salário-maternidade em decorrência do nascimento do seu filho ocorrido em 28/06/2017.
Com o propósito de apresentar o início razoável de prova material da atividade rural, foram juntados aos autos os seguintes documentos: certidão de nascimento própria e certidão de nascimento do filho, registrado em 2017, constando a indicação da profissão da autora como "auxiliar de serviços gerais", e do genitor como "fiscal ambiental"; certidão da Justiça Eleitoral, emitida em 2023, Declaração de Associação de Moradores Agroextrativistas de Democracia-AMOAD, emitida em 2023; Certidão de Exercício de Atividade Rural, emitida em 2022.
Entretanto, os documentos trazidos aos autos não caracterizam o início razoável de prova material para a comprovação da atividade rural, conforme entendimento já demonstrado na fundamentação.
De consequência, não assiste à parte autora o direito ao benefício postulado, ante a impossibilidade de sua concessão fundada apenas na prova testemunhal.
Ausente o início de prova material, torna-se desnecessária a realização de produção de prova testemunhal, pois insuficiente, por si só, para a comprovação do exercício de atividade rural.
Em julgamento submetido à sistemática dos recursos repetitivos para aplicação restrita às ações previdenciárias, o e. STJ decidiu que "a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV, do CPC), e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa" (REsp n. 1.352.721-SP, Rel. MIN. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, j. 16/12/2015, DJe 28/4/2016).
Conclusão
Em face do exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora, apenas para afastar a prescrição, e prosseguindo no exame da lide, julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, IV, do CPC.
Condeno a parte autora ao pagamento dos honorários de advogado, fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, cuja exigibilidade ficará suspensa em razão da gratuidade de justiça.
Custas ex lege.
É como voto.
Desembargador Federal MORAIS DA ROCHA
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1010018-34.2024.4.01.9999
RELATOR: Des. MORAIS DA ROCHA
APELANTE: SANDRA MARIA FERREIRA FREITAS
Advogado do(a) APELANTE: BROOKLIN PASSOS BENTES - AM12050-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. APLICABILIDADE DO ARTIGO 1.013, § 4º, DO CPC. AUSÊNCIA DE INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. INADMISSIBILIDADE DA PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. PROCESSO EXTINTO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.
1. Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora contra sentença que julgou extinto o processo em razão da prescrição.
2. A prescrição do direito ao salário-maternidade é contada do vencimento de cada parcela em relação à data do requerimento ou do ajuizamento da ação e o seu curso fica suspenso quando pendente análise de requerimento administrativo, nos termos do parágrafo único do artigo 4º do Decreto nº 20.910/32.
3. Compulsando os autos, verifica-se que o filho da autora nasceu em 28/06/2017 e, assim, as prestações do benefício de salário-maternidade seriam devidas no períodos de julho a outubro/2017. Como o requerimento administrativo se deu em 14/06/2022, ou seja, antes de transcorrido o prazo de 05 (cinco) anos até mesmo em relação ao nascimento da criança, não há que se falar em prescrição.
4. Afastada a prescrição, o tribunal pode conhecer diretamente do mérito da lide, com base no art. 1.013, §4º, do CPC.
5. A concessão do benefício pleiteado pela parte autora exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena.
6. Na esteira do julgamento proferido no REsp n. 1.348.633/SP (Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima), em sede de recurso representativo da controvérsia, a Primeira Seção do e. STJ concluiu que, para efeito de reconhecimento do labor agrícola, mostra-se desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exigido, desde que a eficácia daquele seja ampliada por prova testemunhal idônea. (AgInt no AREsp n. 852.494/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 9/12/2021; AREsp n. 1.550.603/PR, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 11/10/2019, entre outros.).
7. Os documentos trazidos aos autos não caracterizam o início razoável de prova material para a comprovação da atividade rural. De consequência, não assiste à parte autora o direito ao benefício postulado, ante a impossibilidade de sua concessão fundada apenas na prova testemunhal.
8. Ausente o início de prova material, torna-se desnecessária a realização de prova testemunhal, pois insuficiente, por si só, para comprovar o exercício de atividade rural.
9. Em julgamento submetido à sistemática dos recursos repetitivos para aplicação restrita às ações previdenciárias, o e. STJ decidiu que "a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV, do CPC), e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa" (REsp n. 1.352.721-SP, Rel. MIN. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, j. 16/12/2015, DJe 28/4/2016).
10. Honorários de advogado devidos pela parte autora e fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, cuja exigibilidade ficará suspensa em razão da gratuidade de justiça.
11.Apelação da parte autora parcialmente provida para afastar a prescrição. Prosseguindo no exame da lide, processo extinto, sem resolução do mérito (art. 1.013, §3º, do CPC).
A C Ó R D Ã O
Decide a Turma, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação para afastar a prescrição e julgar extinto o processo, sem resolução do mérito, nos termos do voto do Relator
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Desembargador Federal MORAIS DA ROCHA
