
POLO ATIVO: LOURDES AUGUSTA SOUZA DO NASCIMENTO
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: ANDRE GONCALVES MELADO - MT8075-A, ROBERTO ANTONIO FACCHIN FILHO - MT13947-A e MICAEL GALHANO FEIJO - MT5935000A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
1. Trata-se de apelação interposta por Lourdes Augusta Souza do Nascimento contra sentença em que se acolheu a impugnação apresentada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face da execução complementar e se julgou extinta a execução.
2. Em suas razões de apelação alega, em síntese que houve atraso no cumprimento da obrigação de implantação do benefício previdenciário, sendo devido, portanto, o pagamento da multa fixada, independentemente do momento em que cobrada.
3. Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.

Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Pressupostos e recebimento da apelação
Presente os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação em seu duplo efeito, nos termos dos arts. 1.011 e 1.012, ambos do CPC.
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Requisitos jurídicos
Inicialmente, forçoso ressaltar, que não se trata de fracionamento de execução, que encontra óbice no § 8º do art. 100 da CF/88, mas de execuções distintas, uma referente ao benefício de salário-maternidade, outra em relação à multa por descumprimento de obrigação de fazer e ao percentual remanescente supostamente devido a título de atualização monetária.
Cumpre registrar, também, que o fato de a parte exequente não haver, desde logo, pleiteado, nos primeiros cálculos, a execução do julgado em toda sua extensão, não gera qualquer preclusão, pois a legislação processual não estabelece prazo para que o credor promova a execução dos remanescentes do título judicial.
O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 1.474.665/RS, sob o rito dos repetitivos, esclareceu ser possível a imposição de multa à Fazenda Pública nas obrigações de fazer. Assim, esse instituto não é dirigido apenas ao particular, sendo permitida sua fixação também em desfavor da Fazenda Pública.
É indiscutível a legalidade da imposição de multa diária ao INSS, sendo majoritária a jurisprudência neste sentido, conforme se verifica nas linhas que seguem diante de inúmeros julgados, inclusive do STJ — Superior Tribunal de Justiça, senão vejamos:
"PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. INSS. INTIMAÇÃO PARA CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. COMINAÇÃO DE MULTA DIÁRIA. FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ E DESTE TRIBUNAL! - As astreintes fixadas como meio coercitivo para que o devedor cumpra a obrigação de fazer ou não fazer no prazo assinalado, é permitido ao Juízo da execução, ainda que seja contra a Fazenda Pública. II - Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal. III - Agravo de Instrumento a que se nega provimento. (AG 2001.01.00.009533-8/DF, Rel. Juíza Federal Daniele Maranhão Costa Calixto (conv), Segunda Turma, DJ de 25/09/2003, p49)". "PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. MULTA DIÁRIA. FIXAÇÃO DE OFICIO. 1. A aplicação de multa é para fazer com que o INSS respeite as decisões judiciais, cumprindo-as. 2. As astreintes podem ser fixadas de ofício, conforme já decidiu o Superior Tribunal de Justiça.(REsp 267.4461SP, acórdão publicado no DJU 23/10/00). (AG 2002.01.00.001006-8/MG, Rel. Desembargador Federal Tourinho Neto, Segunda Turma, DJ de 17/10/2003, p.11)". "PROCESSO CIVIL. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. ALEGAÇÃO DE INFRINGÊNCIA AO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO OBRIGATÓRIO. SATISFATIVIDADE DA MEDIDA. POSSIBILIDADE. MULTA DIÁRIA. 1. O entendimento de que não pode haver antecipação de tutela contra a Fazenda Pública está ultrapassado, pois fere os comezinhos princípios de direito, o direito que todos têm de um tratamento igualitário. Inclusive o Supremo Tribunal Federal entende que, em questões previdenciárias, não se aplica o que foi decidido na ADC 4, (cf. Reclamações ns. 1.157, 1.022 e 1.104 ajuizadas pelo INSS). Ainda que a decisão esteja sujeita a remessa, uma excrescência processual, diga-se de passagem, não impossibilita a antecipação da tutela. À tutela antecipada e às liminares, não se aplica o art. 475 do CPC. 2. À mingua à míngua de argumentação a desafiar os fundamentos da decisão Impugnada, e dos documentos nos quais a Magistrada a quo fundamentou sua decisão, Inclusive, para apreciar a presença de dano irreparável ou de difícil reparação, não há como dar provimento ao agravo de instrumento. 3. A aplicação de multa é para fazer com que o INSS respeite as decisões judiciais, cumprindo-as. Se com a decisão não se conforma deve recorrer, pedindo a suspensão, mas enquanto a decisão não for suspensa há o INSS de cumpri-la. Tenha-se, por fim, que as astreintes podem ser fixadas de ofício, conforme já decidiu o Superior Tribunal de Justiça (cf. REsp 267.4461SP, acórdão publicado no DJU de 23.10.2000). (AG 2002.01.00.011128-1/MG, Rel. Desembargador Federal Tourinho Neto, Segunda Turma, DJ de 13/0212003, p.71)". "PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. IMPLANTAÇÃO DE BENEFÍCIO. MULTA. POSSIBILIDADE. Encontra-se pacificado nesta Corte que é possível a fixação de multa diária quando o INSS, descumprindo decisão judicial, não procede à correta implantação do benefício previden iário, a qual caracteriza-se como obrigação de fazer. Agravo re ntal a que se Ir 755" LS á s 1 ,a' ta-J,4 nega provimento.(AgRg no Ag 570.3971RS, Rel. MinistroFkUT--07§1t) -- MEDINA, SEXTA TURMA, julgado em 22.06.2004, DJ 23.08.2004 p. 27r.ez "PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. FIXAÇÃO DE MULTA DIÁRIA (ASTREINTES). POSSIBILIDADE. 1. É possível a fixação de multa diária por atraso na implantação de benefício previdenciário, em razão de tratar-se de obrigação de fazer. 2. Precedente. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 374.5021SP, Rel. Ministro PAULO GALLOTTI, SEXTA TURMA, julgado em 15.08.2002, DJ 19.12.2002 p. 472)". "RECURSO ESPECIAL. AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. MULTA DIÁRIA. É possível a cominação de multa (astreintes) quando, condenado a proceder à correta implantação de benefício previdenciário, permanece inerte o INSS, ainda que devidamente Intimado para tanto. Agravo desprovido. (AgRg no REsp 316.368/SP, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 06.12.2001, DJ 04.03.2002 p. 288)". "PROCESSUAL CIVIL. RENDA MENSAL INICIAL. EXECUÇÃO. INSS. MULTA. POSSIBILIDADE. OBRIGAÇÃO DE FAZER. RECURSO ESPECIAL. 1. É possível a cominação de multa (astreintes) quando, condenado a proceder à correta implantação de benefício previdenciário, permanece inerte o INSS, ainda que devidamente intimado para tanto. 2. Recurso Especial não provido. (REsp 252.796/MG, Rel. Ministro EDSON VIDIGAL, QUINTA TURMA, julgado em 13.09.2000, DJ 09.10.2000 p. 188)". "AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. IMPLEMENTAÇÃO DO BENEFÍCIO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. MULTA DIÁRIA. POSSIBILIDADE. PROVIMENTO NEGADO. 1. O cadastramento e manutenção do benefício previdenciário constitui-se em obrigação de fazer, cujo devedor é o ente previdenciário. 2. É cabível a cominação de astreintes contra a Fazenda Pública, com o fito de compeli-Ia à realização do mencionado encargo. 3. Decisão monocrática confirmada, agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no Ag 523.840/SP, Rel. Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, SEXTA TURMA, julgado em 29.11.2005, DJ 19.12.2005 p. 484)".
Ademais, o artigo 461, do CPC/1973, autoriza a fixação das astreintes como meio coercitivo de cumprimento das prestações de obrigações de fazer. Tal possibilidade também tem esteio em expressa previsão do art. 139, inciso IV, do CPC. Assim, entendo perfeitamente cabível a aplicação da referida multa à Fazenda Pública, por descumprimento de obrigação de fazer, como na hipótese dos autos, inexistindo qualquer vedação legal a tal prática, que objetiva o efetivo cumprimento das ordens judiciais, visando, em último turno, a prestação jurisdicional eficaz.
Ora, a Fazenda Pública também é obrigada a dar cumprimento às ordens judiciais, dentro do prazo que lhe é assinalado, visto que ao integrar a lide, o faz na qualidade de jurisdicionado, não podendo se furtar às regras a todos aplicáveis, sob pena de ferir-se o princípio constitucional da igualdade. Ademais, a lei já prevê prerrogativas suficientes em favor dos entes públicos, propiciando-lhes melhores condições no embate judicial, motivo pelo qual não se mostra necessário relevar a multa imposta.
Na espécie, a recalcitrância do INSS em cumprir a obrigação ficou comprovada nos autos, posto que, devidamente intimado da sentença, em 04/04/2011 (fl. 20 de id 24605463), para cumprir a determinação em 30 (trinta) dias, apenas implantou o benefício em 26/07/2011 (fl. 87 de id 24605463).
Quanto ao valor da multa, se apresenta excessivo, visto que não guarda relação de proporcionalidade com o valor da condenação nos autos principais. De fato, o fim colimado pelas astreintes foi plenamente alcançado, com a devida implantação do benefício previdenciário, ainda que com atraso. O valor total da multa, do modo como foi fixado, sem limitação de teto, ultrapassa em muito o valor do benefício que seria devido enquanto perdurou a mora do INSS em cumprir a obrigação de fazer.
Além do mais, quanto ao valor arbitrado, ressalte-se que deve o juiz levar em consideração as contingências factuais da lide, pois tal fixação não pode causar o enriquecimento sem causa e não assume outro caráter senão o de constranger o réu a cumprir a obrigação estabelecida pelo julgador. Noutros termos, a multa não existe para fazer com que o devedor a pague, mas sim para que se sinta constrangido e coagido a cumprir com zelo e diligência o mandamento constante da decisão judicial. Com efeito, apesar da mora do executado em cumprir a obrigação de fazer, tal obrigação fora devidamente cumprida.
Com efeito, essa é a disciplina estabelecida pelo §6º do art. 461, do CPC/1973 (aplicável ao caso em comento), verbis:
§ 6º O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva.
Assim, deve o valor da multa ser fixado em patamares nos quais o ente público prefira proceder ao cumprimento da obrigação do que deixar de fazê-lo. Lado outro, não deve representar motivo de enriquecimento sem causa pela parte contrária, mormente pelo fato de que sua execução atinge diretamente o erário, e indiretamente toda a coletividade.
Sobre o tema, vale destacar que prevalece, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, orientação jurisprudencial segundo o qual a multa cominatória deve ser fixada em valor razoável e proporcional, de modo a evitar o enriquecimento sem causa de uma das partes, podendo ser revista a qualquer tempo, já que não faz coisa julgada material, hipótese, portanto, em que não se opera a preclusão. Nesse sentido:
AGRAVO INTERNO EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO.AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. REDUÇÃO DO VALOR DAS ASTREINTES. ART. 537,§1º, I, DO CPC/2015. FINALIDADE DA MULTA COMINATÓRIA. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. ACÓRDÃO EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 83 DO STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
1. Inexiste afronta aos arts. 489 do CPC/2015 quando a decisão recorrida pronuncia-se, de forma clara e suficiente, acerca das questões suscitadas nos autos, manifestando-se sobre todos os argumentos que, em tese, poderiam infirmar a conclusão adotada pelo Juízo.
2. A jurisprudência do STJ firmou o entendimento de que o artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973 (correspondente ao art. 537 do NCPC) permite ao magistrado, de ofício ou a requerimento da parte, afastar ou alterar o valor da multa quando este se tornar insuficiente ou excessivo, mesmo depois de transitada em julgado a sentença, não havendo espaço para falar em preclusão ou em ofensa à coisa julgada. Precedentes.
3. A alteração das astreintes, após o redimensionamento efetuado pela Corte a quo, com base nas peculiaridades do caso, encontra óbice no enunciado n. 7 da Súmula desta Corte.
4. Agravo interno não provido.
(AgInt no AREsp n. 1.784.618/MT, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 21/3/2022, DJe de 24/3/2022.)
Portanto, consideradas tais premissas, tenho por bem reduzir o valor da multa apurado em R$ 384.750,00, consolidando no patamar final de R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais), correspondente a algo próximo a 100% do valor do benefício concedido, e a cerca de 1% do valor ora executado complementarmente, tendo em vista que a condenação total nestes autos foi no montante de R$ 3.528,38 (três mil, quinhentos e vinte e oito reais e trinta e oito centavos).
Por todo o exposto, dou parcial provimento à apelação da parte exequente, para, reformando a sentença recorrida (pág. 144), reconhecer a legitimidade da multa imposta.
Consideradas as disposições do art. 85, §§11 e 12 c/c art. 86, ambos do CPC, fica condenado o INSS a suportar os honorários de sucumbência ora fixados em 10% do valor acima arbitrado à título de multa, ao passo que fica a recorrente condenada a pagar as despesas processuais e ainda os honorários sucumbenciais ora fixados em 12% do valor da multa arbitrada, ficando, quanto à recorrente, suspensa a exigibilidade da dívida pelo lustro prescricional de 05 (cinco) anos, diante da concessão a ela dos benefícios decorrentes da gratuidade da justiça, na forma do art. 98, incisos I e VI c/c §3º, do CPC.
É o voto.

Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1018135-87.2019.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0002039-03.2009.8.11.0024
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: LOURDES AUGUSTA SOUZA DO NASCIMENTO
REPRESENTANTES POLO ATIVO: ANDRE GONCALVES MELADO - MT8075-A, ROBERTO ANTONIO FACCHIN FILHO - MT13947-A e MICAEL GALHANO FEIJO - MT5935000A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
E M E N T A
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, a dar parcial provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da assinatura eletrônica.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
