
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:NICANOR ALVES BORGES
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: LEANDRO BICHOFFE DE OLIVEIRA - GO27505-A
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1009928-60.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NICANOR ALVES BORGES
Advogado do(a) APELADO: LEANDRO BICHOFFE DE OLIVEIRA - GO27505-A
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença na qual foi julgado procedente o pedido de aposentadoria rural por idade, com termo inicial em 01/03/2021, data do requerimento administrativo.
O recorrente sustenta em suas razões que não foi apresentado requerimento específico quanto à aposentadoria rural por idade, razão pela qual não haveria interesse de agir. Alega ainda que os documentos apresentados pela parte autora são insuficientes para provar a sua condição de segurado especial. Assim, requer a reforma da sentença com a improcedência do pedido inicial.
A parte autora apresentou contrarrazões.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1009928-60.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NICANOR ALVES BORGES
Advogado do(a) APELADO: LEANDRO BICHOFFE DE OLIVEIRA - GO27505-A
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
DA PRELIMINAR
Do interesse de agir
O INSS sustenta, em suas razões recursais, a ausência de interesse de agir da parte autora em razão da inexistência de requerimento administrativo específico quanto à aposentadoria rural por idade.
Conforme entendimento majoritário no âmbito do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte Federal, tratando-se de questões previdenciárias, é possível ao magistrado ou ao órgão colegiado conceder benefício diverso daquele pleiteado, sem que isso caracterize um julgamento extra ou ultra petita, uma vez atendidos os requisitos legais, em face da relevância da questão social que envolve a matéria e em tutela aos interesses da parte hipossuficiente.
Da mesma forma, o art. 176-E do Decreto 3048/99, introduzido pelo Decreto 10.410/2020, na linha do já previsto em disposições anteriores, garante ao segurado, no âmbito administrativo, a concessão do benefício mais vantajoso, estabelecendo que caberá ao INSS conceder o benefício mais vantajoso ao requerente ou o benefício diverso do requerido, desde que os elementos constantes do processo administrativo assegurem o reconhecimento desse direito.
Nos termos do entendimento do STJ, ainda que se pudesse imputar à parte autora a escolha no requerimento administrativo pelo benefício de aposentadoria por idade rural, deveria o INSS, ao verificar o cumprimento dos requisitos para benefício diverso mais vantajoso, tê-lo deferido, em respeito ao princípio da fungibilidade.
Assim, não há amparo legal para que um requerimento administrativo diverso, solicitado em 1/3/2021, não seja hábil a amparar ação ajuizada em 31/1/2022.
Preliminar não acolhida.
DO MÉRITO
A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
O efetivo exercício da atividade campesina deve ser demonstrado através do início de prova material.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Registra-se, na oportunidade, não ser necessário que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício, conforme disposto na Súmula 14 da TNU, nem que o exercício de atividade rural seja integral ou contínuo (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91).
Convém registrar, ainda, que documentos tais como declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar não são aptos a demonstrar o início de prova material, na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
Fixadas essas premissas, passo à análise do caso concreto.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 29/12/1960, preencheu o requisito etário em 29/12/2020 (60 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade rural em 1/3/2021, o qual restou indeferido. Ajuizou a presente ação em 31/01/2022, pleiteando a concessão do benefício supracitado a contar do requerimento administrativo.
Para comprovação da qualidade de segurado e carência, a parte autora trouxe aos autos os seguintes documentos: CTPS contendo registro de vínculos e declaração de terceiro quanto ao exercício de atividade rural pelo autor.
Da análise dos documentos apresentados, verifica-se que a CTPS do requerente com registro de vínculos como empregado rural com a Vale Verde Empreendimentos Agrícolas Ltda, de julho/2002 a dezembro/2002, de janeiro/2003 a dezembro/2003, de junho/2006 a novembro/2006, de maio/2008 a outubro/2008, de abril/2009 a dezembro/2009, de abril/2010 a setembro/2010 e de agosto/2011 a dezembro/2020; com Joaquim Elis de Melo, de maio/2004 a maio/2005; e com Agro RUB Agropecuária Ltda, de novembro/2010 a dezembro/2010 e de fevereiro/2011 a julho/2011, constitui início razoável de prova material da sua condição trabalhador rural.
Ressalte-se que, consoante a jurisprudência deste Tribunal, a CTPS com anotações de trabalho rural é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência. Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA. IDADE E ATIVIDADE RURAL COMPROVADAS. PROVA MATERIAL PLENA CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. Comprovada a qualidade de trabalhador rural mediante prova material plena devidamente corroborada pela prova testemunhal produzida em juízo e a implementação do requisito etário exigido, deve ser reconhecido o direito do segurado à percepção do benefício.
2. As anotações contidas na CTPS da parte-autora, constando vínculos rurais, constituem prova plena do período nela registrado e podem projetar efeitos para períodos anteriores ou posteriores para fins de comprovação da atividade rural, não sendo necessário que a prova cubra todo o período de carência, desde que corroborada pela prova testemunhal firme e consistente.
3. Na hipótese, constata-se que a parte-autora atingiu a idade mínima e cumpriu o período equivalente ao prazo de carência exigidos em lei. A prova material plena, representada pelas anotações na CTPS/CNIS e o início razoável de prova material, representado pelos demais documentos catalogados à inaugural, corroborados por prova testemunhal idônea e inequívoca, comprovam a condição de segurada especial da parte-autora.
4. O termo inicial deve ser fixado a partir do requerimento administrativo, e, na sua ausência, a partir da citação, conforme definição a respeito do tema em decisão proferida pelo e.STJ, em sede de recurso representativo de controvérsia, nos termos do art. 1.036, do CPC (REsp 1369165/SP), respeitados os limites do pedido inicial e da pretensão recursal, sob pena de violação ao princípio da non reformatio in pejus.
5. Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% das prestações vencidas até a prolação da sentença de procedência ou do acórdão que reforma o comando de improcedência da pretensão vestibular.
6. Juros de mora e correção monetária nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal.
7. Apelação da parte-autora provida. (AC 1012163-68.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL JOAO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 13/09/2021 PAG.)
Ademais, o início de prova material foi corroborado pela prova testemunhal colhida, que confirmou o exercício da atividade rural pela autora pelo prazo necessário à concessão do benefício. Veja-se teor da sentença:
“A prova oral produzida em audiência corrobora a atividade campesina alegada na peça exordial, porquanto os depoentes afirmaram que a parte autora trabalha na zona rural, onde realiza todo o serviço braçal necessário à consecução das atividades desenvolvidas. Os depoentes ouvidos, em verdade, atestaram que a requerente se dedicou de forma contínua às lides rurais, satisfazendo, assim, o segundo requisito legal exigido para a concessão do benefício previdenciário.”
Assim, tendo em vista que a prova testemunhal colhida nos autos corrobora a pretensão da parte autora e considerando ainda que o INSS não trouxe aos autos outros documentos aptos a desconstituir a qualidade de segurado especial, deve ser mantido o benefício de aposentadoria por idade rural.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária pelo INPC e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral (Tema 810), e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905). “Nos termos do art. 3° da Emenda Constitucional nº113/2021, após 8/12/2021, deverá incidir apenas a taxa SELIC para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação de mora até o efetivo pagamento” (AC 1017905-06.2023.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS, TRF1 - NONA TURMA, PJe 26/03/2024).
DESPESAS PROCESSUAIS
"Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, como ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso, Bahia, Acre, Tocantins e Piauí (AC 0024564-48.2008.4.01.9199, Rel. Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, Segunda Turma, e-DJF1 28/05/2020)" (AC 1026342-07.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 26/07/2023).
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Ressalvando meu ponto de vista pessoal sobre a questão, “é cabível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais (art. 85, § 11, do CPC), impondo-se a majoração do percentual já fixado, relativo aos honorários advocatícios, independentemente de comprovação do efetivo trabalho adicional pelo advogado da parte recorrida, sendo devida mesmo quando não apresentadas contrarrazões” (AgInt nos EDcl nos EDcl no AREsp n. 2.236.428/SP, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 23/10/2023, DJe de 26/10/2023).
Honorários advocatícios majorados na fase recursal em R$2.000,00 (dois mil reais), além do montante já fixado pelo Juízo de origem (art. 85, §11, CPC).
CONCLUSÃO
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação interposta pelo INSS.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1009928-60.2023.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NICANOR ALVES BORGES
Advogado do(a) APELADO: LEANDRO BICHOFFE DE OLIVEIRA - GO27505-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. INTERESSE DE AGIR. CONFIGURADO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Conforme entendimento majoritário no âmbito do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte Federal, tratando-se de questões previdenciárias, é possível ao magistrado ou ao órgão colegiado conceder benefício diverso daquele pleiteado, sem que isso caracterize um julgamento extra ou ultra petita, uma vez atendidos os requisitos legais, em face da relevância da questão social que envolve a matéria e em tutela aos interesses da parte hipossuficiente.
2. Nos termos do entendimento do STJ, ainda que se pudesse imputar à parte autora a escolha no requerimento administrativo pelo benefício de aposentadoria por idade rural, deveria o INSS, ao verificar o cumprimento dos requisitos para benefício diverso mais vantajoso, tê-lo deferido, em respeito ao princípio da fungibilidade. Assim, não há amparo legal para que um requerimento administrativo diverso, solicitado em 1/3/2021, não seja hábil a amparar ação ajuizada em 31/1/2022.
3. A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91).
4. A parte autora, nascida em 29/12/1960, preencheu o requisito etário em 29/12/2020 (60 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade rural em 1/3/2021, o qual restou indeferido. Ajuizou a presente ação em 31/01/2022, pleiteando a concessão do benefício supracitado a contar do requerimento administrativo.
5. Para comprovação da qualidade de segurado e carência, a parte autora trouxe aos autos os seguintes documentos: CTPS contendo registro de vínculos e declaração de terceiro quanto ao exercício de atividade rural pelo autor.
6. Da análise dos documentos apresentados, verifica-se que a CTPS do requerente com registro de vínculos como empregado rural com a Vale Verde Empreendimentos Agrícolas Ltda, de julho/2002 a dezembro/2002, de janeiro/2003 a dezembro/2003, de junho/2006 a novembro/2006, de maio/2008 a outubro/2008, de abril/2009 a dezembro/2009, de abril/2010 a setembro/2010 e de agosto/2011 a dezembro/2020; com Joaquim Elis de Melo, de maio/2004 a maio/2005; e com Agro RUB Agropecuária Ltda, de novembro/2010 a dezembro/2010 e de fevereiro/2011 a julho/2011, constitui início razoável de prova material da sua condição trabalhador rural.
7. Ressalte-se que, consoante a jurisprudência deste Tribunal, a CTPS com anotações de trabalho rural é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência.
8. Ademais, o início de prova material foi corroborado pela prova testemunhal colhida que confirmou o exercício da atividade rural pelo autor, pelo prazo necessário à concessão do benefício.
9. Assim, tendo em vista que a prova testemunhal colhida nos autos corrobora a pretensão da parte autora e considerando ainda que o INSS não trouxe aos autos outros documentos aptos a desconstituir a qualidade de segurado especial, deve ser mantido o benefício de aposentadoria por idade rural.
10. Apelação do INSS desprovida.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
