
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
POLO PASSIVO:VERA LUCIA PERUZO TRINDADE
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ANA PAULA CARVALHO MARTINS E SILVA MORENO - MT11206-A
RELATOR(A):EDUARDO MORAIS DA ROCHA

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1011487-18.2024.4.01.9999
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA (RELATOR CONVOCADO):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença que julgou procedente o pedido inicial, condenando-o a conceder aposentadoria por invalidez em favor de VERA LÚCIA PERUZO TRINDADE, no valor de 100% (cem por cento) do salário-de-benefício (art. 44 da Lei 8.213/91), com todos os seus acréscimos legais, inclusive abono anual, nunca inferior a um salário-mínimo (art. 33 da Lei 8.213/91), assegurando-lhe o pagamento das eventuais parcelas vencidas e devidas, isso desde 21/06/2022 (DER).
O apelante requer a anulação da sentença, uma vez que a perícia foi realizada por médica que já atendeu a autora, ou a suspensão dos autos, pois foi afastada a sistemática de cálculo da RMI prevista pela EC 103/2019, muito embora o fato gerador de tal benefício seja posterior à entrada em vigência do referido diploma, matéria que está sendo discutida pelo Supremo Tribunal Federal, em diversas ADI’s que versam sobre a interpretação dos dispositivos da emenda citada. Requer, ainda, a reforma da sentença para determinar que a renda mensal do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente concedido seja apurada de acordo com as regras previstas na Emenda Constitucional nº 103/2019, condenando a parte autora no pagamento das custas do processo e da verba honorária, com fulcro no art. 85, §§ 2º e 6º, do CPC.
Houve apresentação de contrarrazões.
É o breve relatório.
Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA
Relator convocado

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1011487-18.2024.4.01.9999
V O T O
O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA (RELATOR CONVOCADO):
A sentença proferida na vigência do CPC/2015 não está sujeita à remessa necessária, pois a condenação nela imposta não tem o potencial de ultrapassar o limite previsto no art. 496, § 3º, do novo CPC.
A matéria remanescente nos autos, portanto, fica limitada à controvérsia objeto da apelação.
Segundo os termos do Enunciado Administrativo n. 3/STJ, aprovado pelo Plenário da Corte na sessão de 9/3/2016: “Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.”
Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez são: a) a qualidade de segurado; b) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo nas hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei n. 8.213/91; c) a incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou permanente e total (aposentadoria por invalidez) para atividade laboral.
Insurge-se a autarquia federal quanto à nulidade do laudo judicial, alegando que a requerente já foi paciente da perita do juízo, razão pela qual a expert estaria impedida de atuar no feito.
Apesar de, em regra, ser nula a perícia judicial realizada por médico particular da parte autora, haja vista a evidente ausência de isenção e equidistância que esse profissional tem das partes, o simples fato de a parte autora já ter sido paciente do médico não gera, por si só, a suspeição deste. Necessário se faz provar de que a relação paciente/médico foi próxima, inocorrentes no caso. Isto porque a perita foi apenas a médica que realizou um ultrassom para a autora, serviço prestado pelo município, relação essa advinda do sistema público de saúde.
A jurisprudência majoritária desta Corte é no sentido de que laudo pericial elaborado por médico que atende a parte pelo SUS, eventualmente, não é seu médico particular, não configurando hipótese de suspeição prevista no art. 148, II, do CPC/2015. (Precedentes desta Corte: AP 0019339-03.2015.4.01.9199 e AC 1028098-17.2022.4.01.9999). Preliminar rejeitada.
Quanto à controvérsia relativa à sistemática de cálculo da RMI do benefício, conforme dispôs o artigo 26 da EC 103/2019, as aposentadorias por incapacidade permanente serão fixadas no valor correspondente a 60% (sessenta por cento) da média aritmética simples dos salários de contribuição devidos ao Regime Geral de Previdência Social, atualizados monetariamente, correspondentes a 100% (cem por cento) do período contributivo desde a competência julho de 1994, ou desde o início da contribuição, se posterior àquela competência, com acréscimo de 2 (dois) pontos percentuais para cada ano de contribuição que exceder o tempo de 20 (vinte) anos de contribuição, no caso dos homens. Vejamos:
Art. 26. Até que lei discipline o cálculo dos benefícios do regime próprio de previdência social da União e do Regime Geral de Previdência Social, será utilizada a média aritmética simples dos salários de contribuição e das remunerações adotados como base para contribuições a regime próprio de previdência social e ao Regime Geral de Previdência Social, ou como base para contribuições decorrentes das atividades militares de que tratam os arts. 42 e 142 da Constituição Federal, atualizados monetariamente, correspondentes a 100% (cem por cento) do período contributivo desde a competência julho de 1994 ou desde o início da contribuição, se posterior àquela competência.
(...)
§ 2º O valor do benefício de aposentadoria corresponderá a 60% (sessenta por cento) da média aritmética definida na forma prevista no caput e no § 1º, com acréscimo de 2 (dois) pontos percentuais para cada ano de contribuição que exceder o tempo de 20 (vinte) anos de contribuição nos casos:
I - do inciso II do § 6º do art. 4º, do § 4º do art. 15, do § 3º do art. 16 e do § 2º do art. 18;
II - do § 4º do art. 10, ressalvado o disposto no inciso II do § 3º e no § 4º deste artigo;
III - de aposentadoria por incapacidade permanente aos segurados do Regime Geral de Previdência Social, ressalvado o disposto no inciso II do § 3º deste artigo; e
IV - do § 2º do art. 19 e do § 2º do art. 21, ressalvado o disposto no § 5º deste artigo.
(...)
§ 5º O acréscimo a que se refere o caput do § 2º será aplicado para cada ano que exceder 15 (quinze) anos de tempo de contribuição para os segurados de que tratam a alínea "a" do inciso I do § 1º do art. 19 e o inciso I do art. 21 e para as mulheres filiadas ao Regime Geral de Previdência Social.
A controvérsia dos autos consiste em definir se os benefícios de aposentadoria por incapacidade permanente, concedidos sob a vigência da EC nº 103/2019, devem ser calculados segundo a forma de cálculo prevista no seu art. 26, §2º, III.
No caso dos autos, observa-se que a aposentadoria por invalidez da parte autora foi concedida a partir de 21/06/2022, tendo sido fixada a DII (data de início da incapacidade - 2021) em momento posterior à vigência da EC 103/2019 (novembro/2019), assim, no cálculo da RMI do benefício devem ser observadas as regras então vigentes, entre as quais as disposições previstas no art. 26, §2º, III, da referida emenda constitucional.
Sobre a matéria, reporto-me ao seguinte precedente da Primeira Seção desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA (ART. 966, V, DO CPC). APOSENTADORIA POR INVALIDEZ PERMANENTE. DIB FIXADA APÓS A VIGÊNCIA DA EC 103/2019. CÁLCULO DA RMI. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DA NORMA CONSTITUCIONAL EM VIGOR. VIOLAÇÃO MANIFESTA À NORMA JURÍDICA. AÇÃO RESCISÓRIA PROCEDENTE. 1. Trata-se de ação rescisória ajuizada pelo INSS contra sentença transitada em julgado proferida pelo MM. Juízo da Vara Única da Comarca de São Miguel do Guaporé/RO, que condenou a autarquia à concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, desde a data do laudo pericial produzido em juízo, já na vigência da EC n. 103/2019, fixando a RMI no percentual de 100% (cem por cento) do salário-de-benefício. 2. A controvérsia dos autos consiste em definir se os benefícios de aposentadoria por incapacidade permanente, concedidos sob a vigência da EC nº 103/2019, devem ser calculados segundo a forma de cálculo prevista no seu art. 26, §2º, III. 3. O artigo 26, §2º, III, da EC 103/2019 estabeleceu que a RMI das aposentadorias por incapacidade permanente seria fixada no percentual de 60% (sessenta por cento) da média aritmética simples dos salários de contribuição, atualizados monetariamente, correspondentes a 100% (cem por cento) do período contributivo desde a competência julho de 1994, ou desde o início da contribuição se posterior àquela competência, com acréscimo de 2 (dois) pontos percentuais para cada ano de contribuição que exceder o tempo de 15 (quinze) ou 20 (vinte) anos de contribuição, respectivamente, se mulher ou homem. 4. No caso dos autos, a sentença rescindenda reconheceu o início da incapacidade da segurada na data da elaboração do laudo pericial, já na vigência da EC n. 103/2019, e fixou o cálculo da RMI do benefício adotando parâmetros de cálculo diversos daqueles previstos na norma constitucional. 5. Honorários de advogado fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, cuja exigibilidade ficará suspensa em razão da gratuidade de justiça. 6. Ação rescisória julgada procedente, com fundamento no art. 966, V, do CPC, para, em sede de juízo rescindendo, desconstituir parcialmente a sentença proferida na Ação Ordinária n. 7001051-08.2019.8.22.0022 e, em juízo rescisório, determinar o cálculo da Renda Mensal Inicial do benefício de aposentadoria por invalidez com observância das disposições estabelecidas na EC n. 103/2019, correspondendo ao percentual de 60% (sessenta por cento) da média aritmética simples dos salários de contribuição, atualizados monetariamente, integrantes do período básico de cálculo a partir de julho/94, ou a partir do início das contribuições se posterior àquela data, com acréscimo de 2 (dois) pontos percentuais para cada ano de contribuição que exceder o tempo de 15 (quinze) anos de contribuição. (AR 1015190-49.2022.4.01.0000, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA SEÇÃO)
Em face do exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS, somente quanto à adequação do cálculo da RMI às regras estabelecidas na EC n. 103/2019.
É o voto.
Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA
Relator convocado

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1011487-18.2024.4.01.9999
RELATOR: Des. MORAIS DA ROCHA
RELATOR CONVOCADO: JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: VERA LUCIA PERUZO TRINDADE
Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA CARVALHO MARTINS E SILVA MORENO - MT11206-A
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PRELIMINAR. NULIDADE PERÍCIA MÉDICA. SUSPEIÇÃO/IMPEDIMENTO DO PERITO. MÉDICO PÚBLICO. INOCORRÊNCIA. PRELIMINAR REJEITADA. RMI. DATA DE INÍCIO DA INCAPACIDADE FIXADA APÓS A VIGÊNCIA DA EC 103/2019. CÁLCULO DA RMI. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DA NORMA CONSTITUCIONAL EM VIGOR. APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE.
1. A sentença proferida na vigência do CPC/2015 não está sujeita à remessa necessária, pois a condenação nela imposta não tem o potencial de ultrapassar o limite previsto no art. 496, § 3º, do novo CPC. A matéria remanescente nos autos, portanto, fica limitada à controvérsia objeto da apelação.
2. Insurge-se a autarquia federal quanto à nulidade do laudo judicial, alegando que a requerente já foi paciente da perita do juízo, razão pela qual a expert estaria impedida de atuar no feito.
3. O simples fato de a parte autora já ter sido paciente do médico que realizou a perícia não gera, por si só, nulidade do exame técnico. Necessário se faz provar de que a relação paciente/médico foi próxima, inocorrentes no caso. Como se pode observar, a perita foi apenas a médica responsável por um único exame (ultrassom) a que se submeteu a autora, no âmbito do serviços prestados pelo município, relação essa advinda do sistema público de saúde, sem qualquer proximidade ensejadora de suspeição.
4. A jurisprudência majoritária desta Corte é no sentido de que laudo pericial elaborado por médico que atende a parte pelo SUS, eventualmente, não é seu médico particular, não configurando hipótese de suspeição prevista no art. 148, II, do CPC/2015. (Precedentes desta Corte: AP0019339-03.2015.4.01.9199 e AC1028098-17.2022.4.01.9999). Preliminar rejeitada.
5. Quanto à controvérsia relativa à sistemática de cálculo da RMI do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente, concedidos sob a vigência da EC nº 103/2019, devem ser calculados segundo a forma de cálculo prevista no seu art. 26, §2º, III.
6. O artigo 26, §2º, III, da EC 103/2019 estabeleceu que a RMI das aposentadorias por incapacidade permanente seria fixada no percentual de 60% (sessenta por cento) da média aritmética simples dos salários de contribuição, atualizados monetariamente, correspondentes a 100% (cem por cento) do período contributivo desde a competência julho de 1994, ou desde o início da contribuição se posterior àquela competência, com acréscimo de 2 (dois) pontos percentuais para cada ano de contribuição que exceder o tempo de 15 (quinze) ou 20 (vinte) anos de contribuição, respectivamente, se mulher ou homem.
7. No caso dos autos, observa-se que a aposentadoria por invalidez da parte autora foi concedida a partir de 21/06/2022, tendo sido fixada a DII (data de início da incapacidade - 2021) em momento posterior à vigência da EC 103/2019 (novembro/2019), assim, no cálculo da RMI do benefício devem ser observadas as regras então vigentes, entre as quais as disposições previstas no art. 26, §2º, III, da referida emenda constitucional.
8. Correção monetária e os juros moratórios conforme Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, em sua versão mais atualizada, vigente à época da liquidação, o qual incorpora as alterações na legislação e as orientações jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça aplicáveis.
9. Apelação do INSS parcialmente provida (item 5).
A C Ó R D Ã O
Decide a Primeira Turma, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA
