
POLO ATIVO: IVANICE PEREIRA DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: EDER CESAR DE CASTRO MARTINS - GO26375-A e KLAUREN KARYTTA PEREIRA BARBOSA - GO33881
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

Gab. 25 - DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO
PROCESSO: 1013515-61.2021.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0154087-03.2016.8.09.0041
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: IVANICE PEREIRA DA SILVA
REPRESENTANTES POLO ATIVO: EDER CESAR DE CASTRO MARTINS - GO26375-A e KLAUREN KARYTTA PEREIRA BARBOSA - GO33881
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR: URBANO LEAL BERQUO NETO
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pela autora em face de sentença que julgou improcedente a ação para concessão de benefício de salário-maternidade de trabalhadora rural, segurada especial, em decorrência do nascimento da criança Arthur Ariel, ocorrido em 09/02/2015.
Em suas razões, requer a anulação da sentença ao argumento de ocorrência do cerceamento do direito de defesa, posto que declarado precluso o direito de produção da prova oral, indispensável para o deslinde da ação, em razão da não apresentação do rol de testemunha no prazo assinalado, a despeito da apelante ter informado, expressamente, que suas testemunhas compareceriam independente de intimação.
O lado recorrido não apresentou contrarrazões.
Com vistas dos autos, o Ministério Público Federal deixou de se manifestar quanto ao mérito, por não vislumbrar a presença de interesse institucional a justificar a sua intervenção.
É o relatório.

Gab. 25 - DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO
PROCESSO: 1013515-61.2021.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0154087-03.2016.8.09.0041
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: IVANICE PEREIRA DA SILVA
REPRESENTANTES POLO ATIVO: EDER CESAR DE CASTRO MARTINS - GO26375-A e KLAUREN KARYTTA PEREIRA BARBOSA - GO33881
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR: URBANO LEAL BERQUO NETO
V O T O
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Mister a depuração do cerne da pretensão, ora vertida em base recursal, lembrando que se trata de conflito de interesses condizente ao benefício de salário-maternidade de trabalhadora rural, segurada especial, em que a autora sustenta a nulidade do julgado por cerceamento ao direito de defesa.
O benefício de salário-maternidade é devido à segurada especial que atender aos requisitos estabelecidos na Lei 8.213/91 (art. 25, III) e no § 2º do art. 93 do Regulamento aprovado pelo Decreto 3.048/99: exercício de atividade rural nos últimos dez meses imediatamente anteriores à data do parto ou do requerimento do benefício, quando requerido antes do parto, mesmo que de forma descontínua.
A concessão do benefício pleiteado pela parte autora, portanto, exige a demonstração do trabalho rural, em regime de subsistência, no prazo mínimo de 10 (dez) meses, ainda que descontínuos, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena, inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF/1ª Região, Súmula 27).
Dessa forma, antes de analisar eventual nulidade da sentença em razão da não realização de audiência instrutória para colheita de prova material, desvela-se essencial percorrer quanto a presença, ou não, de prova material idônea a servir como início de prova material em favor da autora, diante da vedação de concessão de benefício baseada, unicamente, em prova testemunhal.
E nesse ponto, no que tange à caracterização da condição de segurada especial, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Jurisprudência, firmou o entendimento de que para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalho rural, apesar de não haver exigência legal de que o documento apresentado como início de prova material abranja todo o período que se busca comprovar, é preciso que tal prova seja contemporânea ao menos por uma fração do lapso de trabalho rural pretendido (Pet 7.475/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 09/11/2016, DJe 29/11/2016).
É pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
São idôneos, portanto, dentre outros, a ficha de alistamento militar, o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado (STJ, AgRG no REsp 939191/SC); a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF); certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR 1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR 3202/CE).
Igualmente aceitáveis documentos tais como certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que indiciem a ligação da parte autora com o trabalho e a vida no meio rural, bem como a CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora, que é considerada prova plena (em favor de seu titular) do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (REsp 310.264/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves da Silva, Segunda Turma, e-DJF1 p.33 de 17/07/2008, AC 0004262-35.2004.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal Miguel Ângelo de Alvarenga Lopes, 3ª Turma Suplementar, e-DJF1 p.191 de 02/03/2011).
No caso dos autos, a autora postula o benefício de salário-maternidade rural, segurada especial, em decorrência dos nascimentos de seu filho Arthur Ariel, ocorrido em 09/02/2015.
Com o propósito de comprovar a sua condição de segurada especial juntou aos autos cópia da CTPS e CNIS de seu cônjuge, de onde se extrai a presença de vínculo empregatício de natureza rural durante o período de carência pretendido.
Consoante entendimento jurisprudencial adotado, a CTPS com anotações de trabalho rural de um dos cônjuges é extensível ao outro, sendo o documento apresentado considerado documento idôneo a servir como início de prova material da qualidade de segurada especial da autora.
A atividade rural do cônjuge na condição de empregado não afasta o entendimento sobre a extensibilidade, uma vez que não há necessidade que se reconheça a efetiva condição de segurado especial do titular do documento, mas que apenas exerça atividade rurícola.
Registra-se, por oportuno, que no meio rural é comum a contratação do homem, formalmente, ao passo que a mulher desenvolve trabalho em regime de auxílio ao cônjuge, visando o aumento da renda para obter melhores condições de sobrevivência. Dessa forma, não há que se falar em ausência de início de prova material.
Com efeito, diante das dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores rurais para comprovar o exercício de atividade rurícola, em razão das peculiaridades inerentes ao meio campestre, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem adotado a solução pro mísero, em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de segurada, desde que acompanhada de início de prova material, situação não externada no caso dos autos diante do julgamento precoce da ação.
Conquanto se verifique a presença da prova indiciária, não foi possível a corroboração da prova para efetiva comprovação do labor rural desempenhado pela autora, em regime de subsistência, no período de carência pretendido, em razão do julgamento antecipado.
No caso dos autos, a despeito de ter designado data para a colheita da prova oral, a solenidade inocorreu, pois o Juízo que presidiu a ação, na origem, sob o fundamento de que a autora não depositou o rol de testemunhas, declarou precluso o direito da autora à produção probatória.
Com efeito, muito embora o rol de testemunha não tenha sido apresentado, as testemunhas poderiam ter sido ouvidas, caso tivesse sito mantida a data aprazada e as testemunhas comparecessem espontaneamente à audiência, independente de intimação, de modo que estaria suprida a necessidade de cumprimento do prazo estabelecido no art. 357, §4º, do CPC.
Da análise detida dos autos, verifica-se que por ocasião da oferta de impugnação à contestação a autora requereu a produção da prova oral, informando, expressamente, que suas testemunhas compareceriam à audiência, independente de intimação.
Em razão do caráter social do direito previdenciário, em especial como no caso dos autos que se postula direito de salário-maternidade, cujo alcance da norma alberga, a um só tempo, a proteção à maternidade e aos interesses do nascituro, direitos estes que são resguardados, normativamente, desde a concepção (art. 2º do CC) e, em razão disso, revela interesse social que se sobrepõe aos rigorismos exacerbados.
Dessa forma, não há que se falar em preclusão do direito a produção da prova, independente da apresentação do rol de testemunhas, em especial pelo fato de que, repita-se, a autora requereu o direito de produção da referida prova e se comprometeu, expressamente, a levar as testemunhas à solenidade, independente de intimação.
Trata-se, em verdade, não de afastar norma processual vigente, mas de dar-lhe interpretação de modo a considerar as condições desiguais vivenciadas pelos trabalhadores rurais que, por sua condição de notória hipossuficiência, adotando-se a solução pro misero e ponderando os valores envolvidos, prestigia os princípios constitucionais da efetividade da prestação jurisdicional e da instrumentalidade das formas.
Acrescenta-se que, no caso concreto, não restou demonstrado qualquer indicativo de que a possibilidade de realização do ato sem apresentação prévia do rol de testemunhas ensejaria prejuízo ou dano à autarquia previdenciária, eis que poderia, comparecendo o procurador federal à audiência de instrução e julgamento designada, contraditar as testemunhas levadas pela parte autora.
Dito de outro modo, no caso dos autos a não apresentação do rol de testemunhas, no prazo legal, não implica na preclusão do direito de produção da prova oral, uma vez que as testemunhas compareceriam junto com a parte autora no dia da realização da audiência de instrução e julgamento, conforme informado, expressamente, pela autora.
Posto isto, DOU PROVIMENTO ao recurso interposto pela autora para, anulando a sentença recorrida, determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem para o regular prosseguimento do feito, com reabertura da fase instrutória.
É o voto.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator

Gab. 25 - DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO
PROCESSO: 1013515-61.2021.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0154087-03.2016.8.09.0041
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: IVANICE PEREIRA DA SILVA
REPRESENTANTES POLO ATIVO: EDER CESAR DE CASTRO MARTINS - GO26375-A e KLAUREN KARYTTA PEREIRA BARBOSA - GO33881
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. SEGURADA ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL VÁLIDA. ROL DE TESTEMUNHAS NÃO APRESENTADO. PRECLUSÃO DO DIREITO DE PRODUÇÃO PROBATÓRIA. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. INADMISSIBILIDADE. SENTENÇA ANULADA.
1. O benefício de salário-maternidade é devido à segurada especial que atender aos requisitos estabelecidos na Lei 8.213/91 (art. 25, III) e no § 2º do art. 93 do Decreto 3.048/99. A demonstração do trabalho rural no prazo mínimo de 10 (dez) meses, ainda que descontínuos, deve ser comprovado mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena, inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF/1ª Região, Súmula 27).
2. No caso dos autos, a autora postula o benefício de salário-maternidade rural, segurada especial, em decorrência do nascimento de seu filho Arthur Ariel, ocorrido em 09/02/2015. Com o propósito de comprovar a sua condição de segurada especial juntou aos autos cópia da CTPS e CNIS de seu cônjuge, de onde se extrai a presença de vínculo empregatício de natureza rural durante o período de carência pretendido.
3. Consoante entendimento jurisprudencial adotado, a CTPS com anotações de trabalho rural de um cônjuge é extensível ao outro, sendo o documento apresentado considerado documento idôneo a servir como início de prova material da qualidade de segurada especial em favor da autora. A atividade rural do cônjuge na condição de empregado não afasta o entendimento sobre a extensibilidade da prova, uma vez que não há necessidade que se reconheça a efetiva condição de segurado especial do titular do documento, mas que apenas exerça atividade rurícola. Registra-se, por oportuno, que no meio rural é comum a contratação do homem, formalmente, ao passo que a mulher desenvolve trabalho em regime de auxílio ao cônjuge, visando o aumento da renda para obter melhores condições de sobrevivência. Dessa forma, não há que se falar em ausência de início de prova material.
4. Por outro lado, conquanto se verifique a presença da prova indiciária, não foi possível a corroboração da prova por testemunhas para efetiva comprovação do labor rural desempenhado pela autora, em regime de subsistência, no período de carência pretendido. A despeito de ter designado data para a colheita da prova oral, imprescindível para o caso dos autos, a solenidade não ocorreu, haja vista o julgador monocrático que presidiu a ação, na origem, declarou precluso o direito à produção probatória, sob o fundamento de que a autora não depositou o rol de testemunhas no prazo assinalado.
5. Com efeito, muito embora o rol de testemunhas não tenha sido apresentado, a autora se comprometeu, expressamente, de levar as testemunhas à solenidade, independente de intimação. Desse modo, as testemunhas poderiam ter sido ouvidas, caso tivesse sito mantida a data aprazada e as testemunhas comparecessem espontaneamente à audiência, independente de intimação, de modo que estaria suprida a necessidade de cumprimento do prazo estabelecido no art. 357, §4º, do CPC.
6. O direito previdenciário é revestido de caráter social, em especial como no caso dos autos que se postula direito de salário-maternidade, cujo alcance da norma alberga, a um só tempo, a proteção à maternidade e aos interesses do nascituro, direitos que são resguardados, normativamente, desde a concepção (art. 2º do CC) e, em razão disso, revela interesse social que se sobrepõe aos rigorismos processuais. Dessa forma, não há que se falar em preclusão do direito a produção da prova, independente da apresentação do rol de testemunhas, em especial pelo fato de que a autora, reitere-se, requereu, em sua impugnação à contestação, o direito de produção da referida prova, comprometendo-se, expressamente, a levar as testemunhas à solenidade, independente de intimação.
7. Apelação a que se dá provimento para, anulando a sentença, determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem para o regular prosseguimento do feito.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO a apelação interposta pela autora, nos termos do voto do relator.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator
