
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARIA TABORDA RIBEIRO
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ANA PAULA CARVALHO MARTINS E SILVA MORENO - MT11206-A e JOSE RENATO SALICIO FABIANO - SP277787-S
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1003869-56.2023.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 1004468-59.2018.8.11.0007
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de recurso de apelação (Id 295655668 - Pág. 158-162) interposto pelo INSS da sentença (Id 295655668 - Pág. 149-154) que julgou procedente o pedido da inicial de concessão do benefício previdenciário de aposentadoria especial rural por invalidez a partir da data do indeferimento administrativo.
A apelante alega ausência de prova material pelo período de carência, visto que os documentos apresentados são posteriores à data de início da incapacidade, portanto nenhum deles guarda relação de contemporaneidade com o período de carência que se pretende comprovar.
A parte apelada, MARIA TABORDA RIBEIRO, apresentou contrarrazões (Id 295655668 - Pág. 179-183)
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1003869-56.2023.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 1004468-59.2018.8.11.0007
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
V O T O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Concessão de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez
Conforme disposto no art. 59 e 60, § 1º, da Lei 8.213/91, o auxílio-doença será devido ao segurado que ficar incapacitado temporariamente para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos. Será devido ao segurado empregado desde o início da incapacidade e, ao segurado que estiver afastado da atividade por mais de trinta dias, a partir da entrada do requerimento.
A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que estiver ou não em gozo de auxílio-doença e comprovar, por exame médico-pericial, a incapacidade total e definitiva para o trabalho e for considerado insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo devida a partir do dia imediato ao da cessação do auxílio-doença, nos termos do art. 42 e 43 da Lei 8.213/91.
Requisitos – Trabalhador rural
A concessão de benefício previdenciário por invalidez requer o preenchimento dos requisitos: qualidade de segurado e incapacidade para o trabalho ou para a atividade habitual.
A qualidade de segurado é a condição atribuída aos filiados do INSS que contribuem para a Previdência Social na forma de empregado, trabalhador avulso, contribuinte individual ou facultativo, empregado doméstico e segurado especial.
Para fins de reconhecimento de tempo rural, conquanto não se admita a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª. Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, de forma que pode ser estendida para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34.)
No caso de segurado especial, a concessão de benefício por invalidez não depende do cumprimento de carência. Porém, quando a qualidade de segurado não for demonstrada por prova plena (art. 39, inc. I c/c art. 55, § 3º da Lei 8.213/91), exige-se início de prova material corroborada por prova testemunhal idônea produzida em juízo.
Da qualidade de segurado
A questão controversa na lide refere-se à ausência de prova da qualidade de segurada da autora, incapacidade não contestada.
A parte autora apresentou requerimento em 23.03.2017 (Id 295655668 - Pág. 139) o qual foi indeferido em 17.09.2020 (Id 295655668 - Pág. 140).
Como prova material a autora apresentou os seguintes documentos: a) Contrato de comodato de imóvel rural em nome da autora (2018); b) Certidão da associação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alta Floresta (2016); c) Certidão de nascimento dos filhos (1991, 1993, 1995 e 1997); d) Notas fiscais de compra e venda em nome da autora constando o endereço rural (2015 e 2016). (Id 295655668 - Pág. 29-37).
Tais documentos servem de início material da alegada atividade rural, pois foram corroborados por prova testemunhal idônea produzida em juízo. Conforme relatado em sentença, nestes termos:
(...)
A testemunha Sra. MARIA DE FÁTIMA DA SILVA ouvida em juízo, aduziu que conheceu a autora há 11 anos, já residia na zona rural exercendo atividades rurais, sob regime de economia familiar e sempre reclamava das dores nas costas e atualmente a autora anda arrastando a perna.
A testemunha VANILDA BATISTA ouvida em juízo aduziu que conheceu a autora há 20 anos, e apenas por um pequeno período não teve contato com ela, mas alega que sempre viu a autoria residindo na zona rural exercendo atividades rurais, sob regime de economia familiar.
(...)
A alegação do INSS acerca do vínculo urbano do esposo da autora deve ser afastada, pois todas as provas dos autos que servem como início de prova material da condição de segurada especial estão em nome da autora.
Também deve ser afastada a alegação do cumprimento de carência, visto que não tem respaldo legal tampouco na jurisprudência, pois, como anotado acima, a concessão de benefício por invalidez ao segurado especial dispensa a carência (art. 26, III, da Lei 8.213/91). Nesse sentido, é o entendimento do STJ, conforme precedentes:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. ATIVIDADE RURÍCOLA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA N.º 07/STJ. CARÊNCIA. DESNECESSIDADE. RECURSO NÃO CONHECIDO.
1. Com base no conjunto fático-probatório dos autos, o acórdão recorrido reconheceu o tempo de serviço exigido para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez em atividade laborativa rurícola, questão que não pode ser revista em sede de recurso especial por demandar reexame de matéria fática. Incidência da Súmula n.º 7 do STJ.
2. O trabalhador rural, na condição de segurado especial, faz jus não só à aposentadoria por invalidez, como também a auxílio-doença, auxílio-reclusão, pensão e aposentadoria por idade, isentas de carência, no valor equivalente a um salário-mínimo.
3. Recurso especial não conhecido. (REsp 416.658/SP, rel. Min. Laurita Vaz, Quinta Turma DJ de 28/4/2003).
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. AUSÊNCIA. CONCLUSÃO LÓGICO SISTEMÁTICA DO DECISUM. AUXÍLIO-DOENÇA. CONCESSÃO. POSSIBILIDADE. CARÊNCIA. DESNECESSIDADE. ART. 26, II DA LEI 8.213/91. COMPROVAÇÃO DO GRAU DE INCAPACIDADE. EXIGÊNCIA. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. INVIABILIDADE. APLICAÇÃO DA SÚMULA 07/STJ. MULTA. EXCLUSÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I - Descabida a interposição do recurso especial com base no art. 535 do Código de Processo Civil, sob a alegação de pretensa omissão, quando a matéria objeto do recurso restou apreciada à exaustão pela instância a quo. Ademais, compete ao magistrado fundamentar todas as suas decisões, de modo a robustecê-las, bem como afastar qualquer dúvida quanto a motivação tomada, tudo em respeito ao disposto no artigo 93, IX da Carta Magna de 1988. Cumpre destacar que deve ser considerada a conclusão lógico-sistemática adotada pelo decisum, como ocorre in casu. Precedentes.
II - Não há óbice legal à concessão de auxílio-doença a trabalhador rural. À luz da legislação previdenciária vigente, o trabalhador rural, na condição de segurado especial, faz jus à aposentadoria por idade ou invalidez, auxílio-doença, auxílio-reclusão e pensão. No caso do auxílio-doença, é possível sua concessão independente de carência, nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como quando for o segurado acometido de alguma das doenças e afecções especializadas, conforme artigo 26, II da Lei 8.213/91.(...)
(REsp 624.582/SP, rel. Min. Gilson Dipp, Quinta Turma, DJ de 1/7/2004)
Quanto à validade dos documentos apresentados como prova material, o STJ também já se manifestou sobre os documentos emitidos por sindicato rural, no sentido de considerar tais provas hábeis como início de prova material da condição de segurado especial. Precedentes:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. TRABALHADORA RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CONFIGURAÇÃO. NÃO INCIDÊNCIA DA S. 7/STJ. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO. (...)
IV - A 1ª Turma desta Corte, recentemente, firmou entendimento no sentido da aceitação de declaração ou carteira de filiação de sindicato rural como início de prova material do exercício do labor rural desde que sua força probante seja ampliada por prova testemunhal.
(...)
(AgInt no REsp 1.928.406/SP, rel.Min. Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe de 15/9/2021).
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHO RURAL. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. FICHA DE FILIAÇÃO AO SINDICATO DOS TRABALHADORES RURAIS. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. (...)
2. O STJ entende que a declaração do sindicato de trabalhadores rurais, ou mesmo a carteira de filiação, erige-se em documento hábil a sinalizar a condição de rurícola de seu titular, constituindo início de prova material. (...)
(REsp n. 1.650.305/MS, rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 12/5/2017).
Desse modo, comprovada a qualidade de segurado especial do autor, deve ser mantida a sentença que julgou procedente a pretensão autoral de aposentadoria por invalidez.
Honorários recursais
Nos termos do julgamento do REsp n. 1865663/PR, que tramitou sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.059 do STJ), a majoração dos honorários de sucumbência pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido, como no caso dos autos, desse modo honorários de advogado majorados em dois pontos percentuais, conforme disposição o art. 85, § 11, do CPC/2015.
Conclusão
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1003869-56.2023.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 1004468-59.2018.8.11.0007
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA TABORDA RIBEIRO
E M E N T A
RECURSO DE APELAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO DEMONSTRADA. CARÊNCIA. DESNECESSIDADE. APELAÇÃO DO INSS NÃO PROVIDA.
1. A concessão de benefício previdenciário por invalidez requer o preenchimento de dos requisitos: qualidade de segurado e incapacidade para o trabalho ou para a atividade habitual por mais de quinze dias.
2. No caso, a controvérsia refere-se à validade dos documentos apresentados como início de prova material e à necessidade de cumprimento de carência. A incapacidade laboral não é contestada no recurso.
3. Consoante disposto no art. 26, III, da Lei 8.213/91, a concessão auxílio-doença e aposentadoria por invalidez ao segurado especial não dependem do cumprimento de carência.
4. O STJ entende que “a declaração do sindicato de trabalhadores rurais, ou mesmo a carteira de filiação, erige-se em documento hábil a sinalizar a condição de rurícola de seu titular, constituindo início de prova material”. Precedentes: (REsp n. 1.650.305/MS, rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 12/5/2017)
5. Como prova material a autora apresentou os seguintes documentos: a) Contrato de comodato de imóvel rural em nome da autora (2018); b) Certidão da associação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alta Floresta (2016); c) Certidão de nascimento dos filhos (1991, 1993, 1995 e 1997); d) Notas fiscais de compra e venda em nome da autora constando o endereço rural (2015 e 2016). Tais documentos foram confirmados por prova testemunhal produzida na origem.
6. Comprovada a qualidade de segurado especial do autor, deve ser mantida a sentença que julgou procedente a pretensão autoral de concessão da aposentadoria por invalidez.
7. Honorários de advogado majorados em dois pontos percentuais, nos termos do art. 85, §11, do CPC/2015 e da tese fixada no Tema 1.059/STJ.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da assinatura eletrônica.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
