
POLO ATIVO: ALBERTINA MENDES DE ALCANTARA e outros
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: DAYANE CARLETTO ZANETTE LUCION - MT16974-A
POLO PASSIVO:ALBERTINA MENDES DE ALCANTARA
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1003012-10.2023.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 1001537-32.2019.8.11.0045
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de recurso de apelação interposto por ambas as partes da sentença (292469061 - Pág. 212-222) que concedeu benefício de aposentadoria por invalidez à parte autora a contar da citação da parte ré.
A parte autora, ALBERTINA MENDES DE ALCANTARA, sustenta que a data de início do benefício deve ser a partir da data do início da incapacidade da autora em 2007. Subsidiariamente, requer que a data de início de pagamento do benefício seja a partir do último requerimento administrativo em 02.08.2018. (Id 292469061 - Pág. 228-239).
O INSS em suas razões de apelação (Id 292469061 - Pág. 240-243) alega ausência da qualidade de segurado da parte autora, visto que a documentação apresentada pela parte é insuficiente para comprovação da qualidade de segurado especial, pois está em nome de terceiros (genro e filha). Alega, também, que a documentação constante dos autos indica que a autora possui residência em zona urbana, ademais, a autora figura como eliminada do Programa Nacional de Reforma Agrária, o que reforça seu afastamento do meio rural.
O INSS não apresentou contrarrazões, a parte autora apresentou contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1003012-10.2023.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 1001537-32.2019.8.11.0045
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
V O T O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Concessão de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez
Conforme disposto nos arts. 59 e 60, § 1º, da Lei 8.213/91, o auxílio-doença será devido ao segurado que ficar incapacitado temporariamente para o trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos. Será devido ao segurado empregado desde o início da incapacidade e, ao segurado que estiver afastado da atividade por mais de trinta dias, a partir da entrada do requerimento.
A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que estiver ou não em gozo de auxílio-doença e comprovar, por exame médico-pericial, a incapacidade total e definitiva para o trabalho e for considerado insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência. Será devida a partir do dia imediato ao da cessação do auxílio-doença, nos termos do art. 42 e 43 da Lei de Regência.
Requisitos – trabalhador rural
A concessão de benefício previdenciário por invalidez requer o preenchimento dos requisitos: qualidade de segurado e incapacidade para o trabalho ou para a atividade habitual por mais de quinze dias.
A qualidade de segurado é a condição atribuída aos filiados do INSS que contribuem para a Previdência Social na forma de empregado, trabalhador avulso, contribuinte individual ou facultativo, empregado doméstico e segurado especial.
Consoante disposto no art. 26, III, da Lei 8.213/91, a concessão auxílio-doença e aposentadoria por invalidez ao segurado especial não dependem do cumprimento de carência. Porém, quando a qualidade de segurado não for demonstrada por prova plena (arts. 26, III; 39, inc. I c/c art. 55, § 3º da Lei 8.213/91), exige-se início de prova material corroborada por prova testemunhal idônea.
Conquanto inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34).
É pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ e este Tribunal no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo (STJ AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
São idôneos, portanto, dentre outros, a ficha de alistamento militar; o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR 1223/MS) e declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público/INSS.
Igualmente aceitáveis documentos como, certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que indiciem a ligação da parte autora com o trabalho e a vida no meio rural.
A CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (REsp 310.264/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves da Silva, Segunda Turma, e-DJF1 p.33 de 17/07/2008; AC 0004262-35.2004.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal Miguel Ângelo de Alvarenga Lopes, 3ª Turma Suplementar, e-DJF1 p.191 de 02/03/2011).
A declaração de exercício de atividade, desprovida de homologação pelo órgão competente, equipara-se apenas a prova testemunhal. Também não configuram início de prova material os documentos confeccionados em momento próximo ao ajuizamento da ação ou ao implemento do requisito etário, a certidão eleitoral, carteira de sindicato e demais provas que não trazem a segurança jurídica necessária à concessão do benefício.
Situação apresentada
Como prova material da condição de trabalhador rural, a autora juntou aos autos os documentos: certidão de casamento em nome da autora a qual não informa sua profissão (Id 292469061 - Pág. 87); declaração da Empresa Mato-Grossense de Pesquisa, Assistência e Extensão Rural- Empaer-, assinado em 29.08.2014, atestando que a autora e seu esposo são agricultores do sistema familiar, sendo que entre os anos de 1990 até 2005 tiveram atendimento através da Empaer (Id 292469061 - Pág. 88); contrato de compra de imóvel rural em nome da filha e do genro (Id 292469061 - Pág. 92-93).
O INSS alega que a parte autora possui residência em zona urbana e que figura como eliminada do Programa Nacional de Reforma Agrária, sendo assim, não restou configurada a qualidade de segurada especial da requerente.
Dessa forma, assiste razão o INSS em sua apelação, pois os documentos colacionados não são suficientes para comprovar o exercício da atividade rural.
O endereço residencial urbano não descaracteriza a condição de segurado especial, porquanto o que define tal condição é o efetivo exercício da atividade rural. Porém, no caso dos autos, o conjunto probatório não foi suficiente para comprovar o exercício de labor rural da requerente, pois as provas apresentadas demonstram o efetivo exercício de atividade rural da filha e do genro, contudo, a parte autora não apresentou provas em seu nome suficientes para comprovar o exercício de atividade rural sob regime de economia familiar.
Logo, as únicas provas existentes nos autos que comprova a qualidade de segurado especial são as provas testemunhais, dessa forma, prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola para efeito da obtenção de benefício previdenciário, nos termos das Súmulas 149/STJ e 27/TRF1.
Assim, não tendo sido demonstrado nos autos o efetivo trabalho rural, o requisito legal da qualidade de segurada da parte autora não foi comprovado, o que impossibilita a concessão do benefício previdenciário pleiteado. Precedente deste Tribunal no mesmo sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADO ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL INSUFICIENTE. PROVA TESTEMUNHAL FRÁGIL. DEPOIMENTO PESSOAL CONTRADITÓRIO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 149 STJ. SENTENÇA REFORMADA. INVERTIDA SUCUMBÊNCIA. PAGAMENTO SUSPENSO. ART. 98, §§ 2º e 3º, DO CPC.
1. São requisitos para aposentadoria do trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
2. Prova material insuficiente.
3. A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário (Súmula 149 do STJ). Ademais, a prova oral mostrou-se frágil e o depoimento pessoal em contradição.
4. Apelação do INSS provida. 5. Sentença reformada, com inversão do pagamento da sucumbência, suspendendo-se obrigação de pagar (art. 98, §§ 2º e 3º, do CPC).
(AC 1008843-10.2021.4.01.9999, Des. Fed. URBANO LEAL BERQUÓ NETO, Nona Turma, PJe 25/07/2023).
Segundo a orientação do e. Superior Tribunal de Justiça, em julgamento sob a sistemática dos recursos repetitivos, “a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa" (REsp 1.352.721, Tema 629).
Diante da ausência do requisito legal da prova da qualidade de segurada da parte autora, não é possível a concessão do benefício por invalidez pleiteado. Portanto, deve ser reformada a sentença que julgou procedente o pedido, para extinguir o processo, sem resolução de mérito, conforme entendimento do STJ no precedente citado.
Conclusão
Ante o exposto, de ofício, extingo o processo, sem resolução do mérito, e julgo prejudicada a apelação do INSS e da parte autora.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1003012-10.2023.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 1001537-32.2019.8.11.0045
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE/APELADO: ALBERTINA MENDES DE ALCANTARA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE/APELADO: ALBERTINA MENDES DE ALCANTARA
E M E N T A
RECURSO DE APELAÇÃO. REVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ RURAL. QUALIDADE DE SEGURADO. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. IMPOSSIBILIDADE. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. SENTENÇA REFORMADA. EXTINÇÃO DO PROCESSO DE OFÍCIO. RECURSO DE AMBAS AS PARTES PREJUDICADO.
1. A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que estiver ou não em gozo de auxílio-doença e comprovar, por exame médico-pericial, a incapacidade total e definitiva para o trabalho e for considerado insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência. Será devida a partir do dia imediato ao da cessação do auxílio-doença, nos termos do art. 42 e 43 da Lei de Regência.
2. Consoante disposto no art. 26, III, da Lei 8.213/91, a concessão auxílio-doença e aposentadoria por invalidez ao segurado especial não dependem do cumprimento de carência. Porém, quando a qualidade de segurado não for demonstrada por prova plena (arts. 26, III; 39, inc. I c/c art. 55, § 3º da Lei 8.213/91), exige-se início de prova material corroborada por prova testemunhal idônea.
3. Como prova material da condição de trabalhador rural, a autora juntou aos autos os documentos: certidão de casamento em nome da autora a qual não informa sua profissão; declaração da Empresa Mato-Grossense de Pesquisa, Assistência e Extensão Rural- Empaer-, assinada em 29.08.2014, atestando que a autora e seu esposo são agricultores do sistema familiar, sendo que entre os anos de 1990 até 2005 tiveram atendimento através da Empaer; contrato de compra de imóvel rural em nome da filha e do genro.
4. Assiste razão o INSS em sua apelação, pois os documentos colacionados não são suficientes para comprovar o exercício da atividade rural. O endereço residencial urbano não descaracteriza a condição de segurado especial, porquanto o que define tal condição é o efetivo exercício da atividade rural. Porém, no caso dos autos o conjunto probatório não foi suficiente para comprovar o exercício de labor rural da requerente, pois as provas apresentadas demonstram o efetivo exercício de atividade rural da filha e do genro, contudo, a parte autora não apresentou provas em seu nome suficientes para comprovar o exercício de atividade rural sob regime de economia familiar.
5. As únicas provas existentes nos autos que comprova a qualidade de segurado especial são as provas testemunhais, dessa forma, prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola para efeito da obtenção de benefício previdenciário, nos termos das Súmulas 149/STJ e 27/TRF1.
6. Ante a ausência do requisito legal da prova da qualidade de segurada da parte autora, não é possível a concessão do benefício por invalidez pleiteado. Portanto, deve ser reformada a sentença que julgou procedente o pedido, para extinguir o processo, sem resolução de mérito, conforme entendimento do STJ Tema 629.
7. Processo extinto, de ofício, sem resolução do mérito, em razão da ausência de início de prova material suficiente para o reconhecimento da qualidade de segurada; apelação do INSS e da parte autora prejudicada.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, extinguir o processo, de ofício, sem resolução de mérito e julgar prejudicada a apelação de ambas as partes, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da assinatura eletrônica.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
