
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:RENATO BONFIM DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: CHRISTIANO GOMIDE MARTINS - GO41773-A
RELATOR(A):JOAO LUIZ DE SOUSA

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 6 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1014155-98.2020.4.01.3500
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra a sentença que julgou procedente o pedido do autor, determinando que o INSS computasse como especial o período de labor realizado por Renato Bonfim da Silva nas seguintes empresas e períodos: Thyssen Krupp (TK) de 16/11/1993 a 16/09/2005; Atlas Schindler de 16/11/2006 a 20/11/2008; Otis de 01/12/2008 a 09/07/2012; Life Manutenção de 08/01/2012 a 04/12/2015; e Advance System Elevador de 04/05/2015 a 30/03/2020. Além disso, determinou o uso do fator de conversão 1,4 para a transformação do período de tempo especial em comum.
O INSS, inconformado com a sentença, alega que o juízo de primeiro grau reconheceu tempo de atividade especial em períodos que não foram devidamente comprovados, conforme as razões apresentadas pelo serviço médico federal, que não enquadraram tais períodos como tempo de atividade especial.
Alega-se, especificamente, que as empresas Thyssen Krupp Elevadores S/A e Elevadores Atlas Schindler Ltda não apresentaram laudos técnicos ou documentos que comprovassem a exposição do autor a agentes nocivos durante os períodos requeridos. Além disso, argumenta-se que a exposição ao ruído, em alguns casos, estava abaixo dos limites de tolerância estabelecidos pela legislação pertinente, e que não foram observadas as normas de higiene ocupacional necessárias para o enquadramento do período como atividade especial.
O INSS também questiona a concessão da tutela antecipada, alegando que poderia causar lesão grave e de difícil reparação ao apelante, uma vez que, se revertida, os valores deverão ser integralmente devolvidos ao erário.
No que tange à eventualidade, o INSS requer a fixação da Data de Início do Benefício (DIB) na data da sentença, caso o benefício seja concedido, devido à ausência de documentos comprobatórios da atividade especial na fase administrativa. Argumenta-se também a prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que precede o ajuizamento da ação, e solicita-se a correção monetária dos valores atrasados pelo índice de correção monetária INPC conforme tese firmada no TEMA 905 do STJ.
Assim, requer o INSS que o Tribunal receba o recurso em seu duplo efeito, dando-lhe provimento para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido do autor.
Contrarrazões apresentadas.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 6 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1014155-98.2020.4.01.3500
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA (RELATOR):
Presentes os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação em seu efeito devolutivo (art. 1.011 do CPC).
O cerne da controvérsia trazida à análise concerne à aferição do alegado direito da parte autora ao benefício previdenciário de aposentadoria especial, com efeitos retroativas à data do requerimento administrativo.
Nos termos do art. 57 e 58 da lei n. 8.213/91, a aposentadoria especial é devida ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem sua saúde ou sua integridade física durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.
Neste diapasão, o segurado deverá comprovar o tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais, com exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais.
Cumpre destacar que a consideração do tempo de serviço como especial deve ser feita de acordo com a legislação vigente à época da prestação do serviço, e não da data em que perfeitas todas as condições para a aposentadoria, tal como disposto no § 1º, art. 70, do Decreto nº 3.048/99, com redação do Decreto nº 4.827/03.
Esse é o entendimento consagrado por esta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO LABORADO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. CALOR. POEIRA DE SÍLICA. RUÍDO. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. EPI. CÔMPUTO DO TEMPO EM GOZO DO BENEFÍCIO AUXÍLIO-DOENÇA COMO ESPECIAL. EC 20/98. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA.
1.A questão de atribuição de efeito suspensivo ao recurso resta prejudicada, uma vez que não concedido até esta data, não há utilidade na sua apreciação neste momento processual, uma vez que não cabe recurso com efeito suspensivo a partir deste julgado.
2. O cômputo do tempo de serviço prestado em condições especiais deve observar a legislação vigente à época da prestação laboral, tal como disposto no § 1º do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, com redação dada pelo Decreto nº 4.827/03.
3.O impetrante exercia atividade de operador de lingotamento em indústria metalúrgica, categoria profissional que estava inserida no código 2.5.1 do Quadro Anexo II do Decreto nº 83.080/79, sendo considerada de natureza insalubre por presunção legal até o advento da Lei 9.532/95.
4. Os formulários acostados aos autos comprovaram ainda a exposição do impetrante ao agente agressivo calor em uma intensidade acima dos limites de tolerância estabelecidos no código 1.1.1 do quadro anexo do Decreto n° 53.831/64 e pela NR-15 da Portaria n° 3.214/78, nos termos do código 2.0.4 dos Decretos n° 2.172/97 e n° 3.048/98, além da exposição ao agente poeira de sílica, com enquadramento no código 1.2.10, do Quadro anexo do Decreto 53.831/64 e no código 2.3.1, Anexo II, do Decreto nº 83.080/79.
5.Considera-se especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até 05/03/97 (Súmula nº 29 da AGU), e, a partir de então, acima de 85 decibéis, desde que aferidos esses níveis de pressão sonora por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.
6.Para configuração da especialidade da atividade, não é necessário que o trabalhador permaneça exposto ao nível máximo de ruído aludido na legislação durante toda a sua jornada de trabalho.
7.A utilização de equipamentos de proteção individual não descaracteriza a atividade prestada sob condições especiais, pois seu uso não significa que estejam erradicadas as condições adversas que justificam a contagem de tempo de maneira específica, prestando-se tão somente a amenizar ou reduzir os danos delas decorrentes.
8.O período em gozo do benefício previdenciário de auxílio-doença, deve ser computado como tempo especial, tendo em vista que antes e depois da concessão do benefício, o impetrante laborou em condições especiais.
9.O segurado que implementou o tempo de contribuição necessário para obtenção da aposentadoria integral ou especial não se submete às regras de transição.
10. Apelação desprovida. Remessa oficial, tida por interposta, parcialmente provida.
(Numeração Única: 0004403-44.2006.4.01.3813; AMS 2006.38.13.004409-3 / MG; APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA; Relator JUIZ FEDERAL GUILHERME MENDONÇA DOEHLER; Órgão 3ª TURMA SUPLEMENTAR; Publicação 31/05/2012 e-DJF1 P. 254) Destaquei
Em relação à época em que vigiam os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, para a comprovação do efetivo trabalho em atividade tida como perigosa, insalubre ou penosa, bastava que a categoria profissional a que pertencia o trabalhador se enquadrasse no rol constante nos anexos que integravam referidos diplomas, ressalvada a hipótese referente ao agente insalubre “ruído”, que sempre exigiu laudo pericial.
Na sequência, a Lei n. 9.032/95, publicada em 29.04.1995, passou a exigir a demonstração da especialidade da atividade, através dos formulários SB-40 e DSS 8030, o que persistiu até a edição da Medida Provisória 1.523/96, de 14.10.1996, convertida na Lei n. 9.528/97, de 11.12.1997, a partir de quando começou a ser exigida, obrigatoriamente, a comprovação da condição especial por meio de laudo técnico assinado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
Nesse contexto, nas hipóteses de tempo de serviço prestado após 29/04/95, deve o trabalhador comprovar a exposição permanente, não ocasional e nem intermitente aos agentes prejudiciais à saúde.
Saliente-se que, em razão da sobreposição de leis entre os Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979, quando o primeiro fixou o limite de insalubridade em 80dB (oitenta decibéis) e o último delimitou em 90dB(noventa decibéis), estabeleceu-se que atividade especial é aquela desenvolvida em ambiente com ruído médio superior a 80dB (oitenta decibéis), em razão da vigência simultânea e sem incompatibilidade dos seus anexos.
Com o advento do Decreto n. 2.172, de 05/03/1997, considera-se agente nocivo a exposição a níveis de ruído superior a 90dB; e acima de 85dB (oitenta e cinco decibéis) a partir da edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003. Ou seja, atendidas as demais condições legais, considera-se especial, no âmbito do RGPS, a atividade exercida com exposição a ruído:
I – superior a 80 decibéis até 05/03/1997;
II – superior a 90 decibéis de 06/03/1997 até 18/11/2003 e
III – superior a 85 decibéis a partir de então.
Com relação à conversão tempo de serviço especial em comum, a jurisprudência mais recente do STJ permite tal transmudação, inclusive após 28/05/98 (Resp 956110/SP).
Por outro lado, em se tratando de conversão do tempo de serviço comum em especial, para fins de concessão do benefício de aposentadoria especial, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo do artigo 543-C do CPC/73, então vigente, decidiu que “para que o segurado faça jus à conversão de tempo de serviço comum em especial, é necessário que ele tenha reunido os requisitos para o benefício pretendido antes da Lei n. 9.032/95, de 28/4/95, independentemente do momento em que foi prestado o serviço.” (EDcl no REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/11/2014, DJe 02/02/2015).
Quanto ao uso de equipamento de proteção individual ou coletiva pelo segurado, registre-se que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Agravo em Recurso Extraordinário ARE n. 664.335, com repercussão geral reconhecida, decidiu que a utilização de EPI descaracteriza o labor exercido em condições especiais, desde que comprovada a real eficácia dos equipamentos de proteção, neutralizando a nocividade do agente.
Contudo, em relação ao agente físico ruído, restou definido pelo STF que, ainda que comprovada a utilização de EPI (protetores auriculares), a atividade mantém-se como especial. A Corte Constitucional fixou a tese no sentido de que “na hipótese de exposição do trabalho a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual – EPI, não descarateriza o tempo de serviço especial para aposentadoria”, pois, ainda que os protetores auriculares reduzam o nível de ruído aos limites de tolerância permitidos, a potência do som “causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas”.
Confira-se:
"RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ART. 201, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. REQUISITOS DE CARACTERIZAÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO SOB CONDIÇÕES NOCIVAS. FORNECIMENTO DE EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL - EPI. TEMA COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA PELO PLENÁRIO VIRTUAL. EFETIVA EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS À SAÚDE. NEUTRALIZAÇÃO DA RELAÇÃO NOCIVA ENTRE O AGENTE INSALUBRE E O TRABALHADOR. COMPROVAÇÃO NO PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO PPP OU SIMILAR. NÃO CARACTERIZAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS HÁBEIS À CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL. CASO CONCRETO. AGENTE NOCIVO RUÍDO. UTILIZAÇÃO DE EPI. EFICÁCIA. REDUÇÃO DA NOCIVIDADE. CENÁRIO ATUAL. IMPOSSIBILIDADE DE NEUTRALIZAÇÃO. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES PREJUDICIAIS. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DEVIDO. AGRAVO CONHECIDO PARA NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
1. Conduz à admissibilidade do Recurso Extraordinário a densidade constitucional, no aresto recorrido, do direito fundamental à previdência social (art. 201, CRFB/88), com reflexos mediatos nos cânones constitucionais do direito à vida (art. 5º, caput, CRFB/88), à saúde (arts. 3º, 5º e 196, CRFB/88), à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CRFB/88) e ao meio ambiente de trabalho equilibrado (arts. 193 e 225, CRFB/88).
2. A eliminação das atividades laborais nocivas deve ser a meta maior da Sociedade - Estado, empresariado, trabalhadores e representantes sindicais -, que devem voltar-se incessantemente para com a defesa da saúde dos trabalhadores, como enuncia a Constituição da República, ao erigir como pilares do Estado Democrático de Direito a dignidade humana (art. 1º, III, CRFB/88), a valorização social do trabalho, a preservação da vida e da saúde (art. 3º, 5º, e 196, CRFB/88), e o meio ambiente de trabalho equilibrado (art. 193, e 225, CRFB/88).
3. A aposentadoria especial prevista no artigo 201, § 1º, da Constituição da República, significa que poderão ser adotados, para concessão de aposentadorias aos beneficiários do regime geral de previdência social, requisitos e critérios diferenciados nos "casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar".
4. A aposentadoria especial possui nítido caráter preventivo e impõe-se para aqueles trabalhadores que laboram expostos a agentes prejudiciais à saúde e a fortiori possuem um desgaste naturalmente maior, por que não se lhes pode exigir o cumprimento do mesmo tempo de contribuição que aqueles empregados que não se encontram expostos a nenhum agente nocivo.
5. A norma inscrita no art. 195, § 5º, CRFB/88, veda a criação, majoração ou extensão de benefício sem a correspondente fonte de custeio, disposição dirigida ao legislador ordinário, sendo inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela Constituição. Deveras, o direito à aposentadoria especial foi outorgado aos seus destinatários por norma constitucional (em sua origem o art. 202, e atualmente o art. 201, § 1º, CRFB/88). Precedentes: RE 151.106 AgR/SP, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 28/09/1993, Primeira Turma, DJ de 26/11/93; RE 220.742, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 03/03/98, Segunda Turma, DJ de 04/09/1998.
6. Existência de fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial antes, através dos instrumentos tradicionais de financiamento da previdência social mencionados no art. 195, da CRFB/88, e depois da Medida Provisória nº 1.729/98, posteriormente convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998. Legislação que, ao reformular o seu modelo de financiamento, inseriu os §§ 6º e 7º no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, e estabeleceu que este benefício será financiado com recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212/91, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.
7. Por outro lado, o art. 10 da Lei nº 10.666/2003, ao criar o Fator Acidentário de Prevenção-FAP, concedeu redução de até 50% do valor desta contribuição em favor das empresas que disponibilizem aos seus empregados equipamentos de proteção declarados eficazes nos formulários previstos na legislação, o qual funciona como incentivo para que as empresas continuem a cumprir a sua função social, proporcionando um ambiente de trabalho hígido a seus trabalhadores.
8. O risco social aplicável ao benefício previdenciário da aposentadoria especial é o exercício de atividade em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física (CRFB/88, art. 201, § 1º), de forma que torna indispensável que o indivíduo trabalhe exposto a uma nocividade notadamente capaz de ensejar o referido dano, porquanto a tutela legal considera a exposição do segurado pelo risco presumido presente na relação entre agente nocivo e o trabalhador.
9. A interpretação do instituto da aposentadoria especial mais consentânea com o texto constitucional é aquela que conduz a uma proteção efetiva do trabalhador, considerando o benefício da aposentadoria especial excepcional, destinado ao segurado que efetivamente exerceu suas atividades laborativas em 'condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física'.
10. Consectariamente, a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial.
11. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete.
12. In casu, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em limites acima do limite legal, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas. O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.
13. Ainda que se pudesse aceitar que o problema causado pela exposição ao ruído relacionasse apenas à perda das funções auditivas, o que indubitavelmente não é o caso, é certo que não se pode garantir uma eficácia real na eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído com a simples utilização de EPI, pois são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, dentro dos quais muitos são impassíveis de um controle efetivo, tanto pelas empresas, quanto pelos trabalhadores.
14. Desse modo, a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
15. Agravo conhecido para negar provimento ao Recurso Extraordinário."
(ARE 664335, Rel. Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno – STF, julgado em 04/12/2014, DJe-029 de 12/02/2015) Destaquei
Para comprovar sua exposição às condições especiais de trabalho, o requerente anexou à documentação processual sua Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), o Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) e outros documentos. Além disso, foi solicitada e concedida uma perícia.
O perito, identificado como (Id 1500650872), constatou exposição a agentes químicos, afirmando que o autor laborou nas empresas mencionadas realizando manutenções corretivas e preventivas em elevadores, visitando clientes e avaliando itens de acordo com checklist ou defeitos apresentados em ordens de serviço.
Quanto ao período de exposição aos agentes identificados, o especialista afirmou que o autor estava exposto a eletricidade, óleo e graxa, óleo diesel, óleo queimado e solventes (Thinner), conforme indicado nos itens 7.3.1, 7.3.2 e 7.3.3 do laudo.
O perito observou ainda que a empresa não conseguiu demonstrar o fornecimento regular de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs).
A conclusão é que a perícia realizada é suficiente para avaliar as condições de trabalho em todos os vínculos de emprego que o requerente deseja que sejam reconhecidos como especiais. Em decisão saneadora realizada pelo juízo da causa, o INSS não apontou justificadamente alguma dessemelhança entre as atividades aferíveis na empresa indicada para a perícia por similaridade, ratificada pelo Juízo como uma forma indireta de prova.
De fato, a manipulação de óleos e graxas pode ser considerada uma atividade especial, conforme estabelecido nos Decretos n. 2.171/97 e 3.048/99, os quais estabelecem que o uso de óleos minerais justifica a concessão de aposentadoria especial após 25 anos de serviço.
É importante ressaltar que o óleo lubrificante está incluído na lista de agentes confirmados como carcinogênicos para seres humanos, conforme estabelecido na Portaria Interministerial n° 9 de 07 de outubro de 2014 (Grupo 1). Vários compostos químicos encontrados nos óleos lubrificantes usados, especialmente os metais pesados, têm impacto direto na saúde humana e alguns deles são reconhecidos como cancerígenos.
Quanto à Data de Início do Benefício (DIB), deve ser mantida conforme determinado na respeitável sentença, uma vez que o juízo ordenou o cálculo e a aplicação do fator de conversão 1,4 para a conversão do período de trabalho especial em comum.
Após tais procedimentos, o INSS deverá, administrativamente, incluir o tempo obtido como períodos aptos para a concessão do benefício da aposentadoria especial sob o protocolo 774386282 (ou o benefício mais vantajoso), possibilitando a jubilação caso o requerente atinja a quantidade de anos necessários, devendo o benefício, nessa situação, retroagir à data do requerimento administrativo (DER) em 03/10/2019.
Além disso, a revogação da tutela antecipada com efeitos ex tunc e o ressarcimento nos próprios autos nos termos do parágrafo único do art. 302 do CPC não se aplicam ao caso em questão, tendo em vista que a concessão da aposentadoria especial está devidamente fundamentada na legislação previdenciária e no conjunto probatório constante nos autos.
Considerando as evidências coligidas nos autos, nos termos supra fundamentado, bem como o caráter alimentar e assistencial do benefício, que está relacionado à sobrevivência de quem o pleiteia, deve ser mantida a tutela antecipada concedida pelo Juízo "a quo". Ademais, não há que se falar em efeito suspensivo ao recurso, porquanto não se evidencia os requisitos para seu deferimento.
Por outro lado, não procede a alegação de falta de prova administrativa para o deferimento do período especial, visto que o INSS tinha acesso ao histórico completo do autor, incluindo todos os locais de trabalho por ele frequentados, além de sua ocupação como mecânico de elevadores.
Portanto, a sentença não requer revisão e deve ser mantida com base em seus próprios fundamentos.
A correção monetária deve observar o novo regramento estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, no julgamento do RE 870.947/SE, no qual restou fixado o IPCA-E como índice de atualização monetária a ser aplicado a todas as condenações judiciais impostas à Fazenda Pública. Juros de mora nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal.
Os honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor atribuído à causa devem ser majorados em 2% (dois por cento), a teor do disposto no art. 85, §§ 2º e 3º e 11 do CPC, totalizando o quantum de 12% (doze por cento) calculado sobre as parcelas vencidas até a data da sentença.
Nos feitos processados perante a Justiça Estadual, no exercício de jurisdição federal, o INSS é isento do pagamento de custas (inclusive despesas com oficial de justiça) quando prevista a referida isenção em lei estadual específica, a exemplo do que ocorre nos Estados do Acre, Tocantins, Minas Gerais, Goiás, Rondônia, Mato Grosso e Piauí.
Posto isso, nego provimento à apelação do INSS.
É como voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 6 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1014155-98.2020.4.01.3500
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RENATO BONFIM DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: CHRISTIANO GOMIDE MARTINS - GO41773-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM. AGENTES AGRESSIVOS: RUÍDO E HIDROCARBONETOS. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA.
1. A aposentadoria especial é devida ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem sua saúde ou sua integridade física durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, de modo habitual e permanente, não ocasional, nem intermitente, a teor dos arts. 57 e 58 da Lei n. 8.213/91.
2. Se for comprovado que o segurado exerceu uma atividade especial de acordo com os critérios estabelecidos pela legislação vigente na época do exercício, ele adquire o direito ao cômputo desse período como tempo de serviço especial.
3. Até 28/04/1995, é possível reconhecer a especialidade do trabalho com base na categoria profissional; a partir de 29/04/1995, é necessário demonstrar a exposição efetiva e contínua a agentes prejudiciais à saúde por meio de qualquer forma de prova; e a partir de 06/05/1997, a comprovação deve ser feita por meio de um formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica.
4. A atividade é considerada especial quando há exposição a ruído acima de 80 dB até 05/03/1997, acima de 90 dB entre 06/03/1997 e 18/11/2003 e acima de 85 dB a partir de 19/11/2003 (conforme decisão no REsp 1.398.260). A condição especial do trabalho persiste mesmo se o ruído for reduzido aos limites de tolerância pelo uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI).
5. No presente caso, não há registro do uso de equipamento de proteção individual (EPI) capaz de neutralizar os efeitos prejudiciais dos óleos e graxas no organismo do autor. Portanto, merece acolhida a pretensão de conversão em tempo comum, dos períodos seguintes de labor especial desenvolvido pelo autor: Thyssen Krupp(Tk): de 16/11/1993 à 28/02/2002 (Mec. Eletricista/ Meio Oficial); de 01/03/2002 à 30/04/2003 (Oficial Manutenção); de 01/09/2003 à 31/05/2005 (supervisor manutenção); de 01/06/2005 à 16/09/2005 (Supervisor Instalação); de 01/05/2003 à 31/08/2003 (ajustador manutenção); Atlas Schindler: de 16/11/2006 à 20/11/2008 (Tec. Atendimento Avançado); OTIS: de 01/12/2008 à 31/10/2009 (técnico de reparo); de 01/11/2009 à 09/07/2012 (técnico serviços); Life Manutenção: de 08/01/2012 à 04/12/2015 (técnico); e Advance System Elevador: de 04/5/2015 à 30/03/2020 (supervisor Nível I).
6. Conforme evidenciado pela perícia judicial nos autos, constatou-se que a parte autora foi regularmente exposta a níveis de ruído acima dos limites tolerados, bem como a hidrocarbonetos, substância reconhecida como prejudicial à saúde, caracterizando, assim, períodos de trabalho em condições especiais.
7. A sentença apelada, ao realizar uma análise minuciosa do conjunto probatório presente nos autos, e em consonância com a legislação e jurisprudência desta Corte, agiu de forma correta ao acolher o pedido inicial e reconhecer como especial o tempo mencionado na petição inicial.
8. Atualização monetária e juros de mora de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal, cujos parâmetros harmonizam-se com a orientação que se extrai do julgamento do RE 870.947/SE (Tema 810 da repercussão geral) e do REsp. 1.495.146-MG (Tema 905).
9. Os honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor atribuído à causa devem ser majorados em 2% (dois por cento), a teor do disposto no art. 85, §§ 2º e 3º e 11 do CPC, totalizando o quantum de 12% (doze por cento) calculado sobre as parcelas vencidas até a data da sentença.
10. Apelação do INSS desprovida.
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do relator.
Brasília - DF.
ASSINADO DIGITALMENTE
Desembargador Federal João Luiz de Sousa
Relator
