
POLO ATIVO: MARIA GONCALVES DE SOUSA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: DONALTON MENESES DA SILVA - MA9642-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):EULER DE ALMEIDA SILVA JUNIOR

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1015753-82.2023.4.01.9999
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
Trata-se de recurso de apelação, interposto por Maria Gonçalves de Sousa com a finalidade de obter a reforma da sentença, proferida pelo Juiz de Direito da Vara Única de Chapadinha/MA, que não concedeu aposentadoria por idade rural pelo RGPS e julgou extinto o processo sem resolução do mérito, sob o fundamento de falta de esclarecimento do pedido administrativo e existência de pagamento de BPC/LOAS (ID 341019153 - Pág. 289-290).
Não foi concedida tutela provisória.
O recurso foi recebido e/ou processado em ambos os efeitos.
Nas razões recursais, a parte recorrente pediu a reforma da sentença para a obtenção do benefício negado pela sentença recorrida, sob a alegação de comprovação do direito ao benefício previdenciário por prova idônea e suficiente, na forma da legislação de regência e do entendimento jurisprudencial que mencionou.
Intimada, a parte recorrida não apresentou contrarrazões.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1015753-82.2023.4.01.9999
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
O recurso pode ser conhecido, porque presentes os pressupostos recursais (competência do relator e da turma julgadora, tempestividade, adequação e observância das normas pertinentes a eventual preparo recursal).
A concessão do benefício previdenciário ou o reconhecimento de tempo de serviço em face de atividades rurais, exercidas em regime de economia familiar, depende da demonstração, por prova idônea e suficiente (testemunhal com ao menos início de prova material contemporânea à prestação laboral), da condição de segurado especial, observância do prazo de carência e demais requisitos legais da legislação de regência (arts. 11, VII;39, II; 55; 142 e dispositivos conexos da Lei 8.213/1991).
O entendimento jurisprudencial dominante estabeleceu os seguintes critérios sobre a idoneidade e suficiência probatória do trabalho rural em regime de economia familiar: 1) necessidade de produção de prova documental plena ou início de prova material confirmada e complementada pela prova testemunhal (Súmula 149 do STJ e Súmula 27 do TRF1); 2) mitigação da prova documental legal estabelecida no art. 106 da Lei 8.213/1991(STJ AgRG no REsp 1073730/CE); 3) utilização de CTPS como prova plena, quando seus dados forem inseridos no CNIS ou demonstrado o recolhimento de contribuições no período, ou como prova relativa, na forma da Súmula 75 da TNU; 4) contemporaneidade temporal ampliada da prova documental, nos termos da Súmula 577 do STJ c/c Súmulas 14 e 34 da TNU e Tema 2 da TNU; 5) mitigação da dimensão da propriedade em que se deu a atividade (Tema 1115 do STJ e Súmula 30 da TNU); 6) imediatidade da atividade ao tempo do requerimento, ressalvado o direito adquirido quanto ao cumprimento pretérito de todas as condições (Tese 642 do STJ e Súmula 54 da TNU c/c art. 5º, XXXVI, da CF/88); 7) extensão da prova material da condição de rurícula em nome de membros do grupo familiar convivente, principalmente cônjuge, companheiros e filhos, assim como pai e mãe antes do casamento ou união estável (Súmula 06 da TNU c/c §4º do art. 16 da Lei 8.213/1991), possibilitada a desconsideração da atividade urbana de membro do grupo familiar convivente quando o trabalho rural se apresentar indispensável para a sobrevivência desse grupo familiar (Temas 532 e 533 do STJ e Súmula 41 do TNU); 8) na situação de atividade intercalada, a relativização de concorrência de trabalho urbano breve e descontinuado do próprio beneficiário ou de membros do grupo familiar convivente (Tema 37 da TNU, Tema 301 da TNU e Súmula 46 da TNU); 9) resguardo da atividade especial própria da mulher casada com marido trabalhador urbano ou mantida por pensão alimentícia deste (Tema 23 da TNU); 10) qualificação da atividade conforme a atividade do empregado e não de acordo com o ramo de atividade do empregador (Tese 115 da TNU), o que possibilita a utilização de vínculos formais de trabalho, com exercício de atividades agrárias, no prazo de carência do segurado especial.
Os critérios jurisprudenciais que implicam interpretação extensiva à legislação de regência deverão ser aplicados com razoável parcimônia, pois o conjunto de situações excepcionais em dado caso concreto pode descaracterizar a situação de segurado especial em regime de economia familiar e, conseqüentemente, permitir a exclusão dos períodos descaracterizados do prazo de carência do benefício rural.
A sentença recorrida deve ser reformada, porque os dispositivos constitucionais e legais referidos na fase recursal devem ser interpretados conforme o entendimento jurisprudencial dominante.
No caso concreto, a parte autora nasceu em 26/09/1955 (ID 341019153 - Pág. 23) , completando o requisito etário (55 anos) em 2010 e DER em 16/05/2014 (ID341019153 - Pág. 27).
Juntou, para comprovação do seu direito, os seguintes documentos: declaração de sindicato, declaração de atividade rural, ITR, DARF, certidão de casamento e recibos (ID 341019153, pag. 25 a 97).
A controvérsia é sobre a alegada falta de interesse de agir, uma vez que a recorrida seria beneficiário de BCP/LOAS, benefício inacumulável com a aposentadoria rural por idade. Todavia, razão não assiste à recorrente, porque conforme entendimento jurisprudencial dominante, esses institutos têm natureza distinta, de forma que a aposentadoria rural é mais vantajosa, permanecendo sobre ela o interesse processual da recorrida.
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL ADMINISTRATIVAMENTE NO CURSO DA AÇÃO. INTERESSE NA CONCESSÃO DA APOSENTADORIA MANTIDO. DIREITO À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. NECESSIDADE DE APRECIAR A QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL. PRODUÇÃO DE PROVA ORAL. IMPRESCINDIBILIDADE. SENTENÇA ANULADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA DEVIDA INSTRUÇÃO E JULGAMENTO. 1. No caso em análise, conforme acima relatado, o processo foi extinto sem resolução do mérito, por perda superveniente de interesse, em razão da concessão à autora do benefício de amparo social à pessoa portadora de deficiência, que é inacumulável com o benefício previdenciário pretendido. 2. A pretensão da autora, no presente feito, é a concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por idade, tendo comprovado o requerimento administrativo e o respectivo indeferimento (fls. 21/23 -ID 42677035). Não obstante, a demandante requereu administrativamente, no curso desta ação, o benefício de amparo social à pessoa portadora de deficiência, que lhe foi deferido, conforme se verifica à fl. 38 do ID 72677035. 3. Embora se trate de benefícios inacumuláveis (art. 20, §4º, da Lei 8.742/93), verifica-se que possuem naturezas distintas e que a aposentadoria por idade, pleiteada neste feito, por ser mais vantajosa, se preenchidos os requisitos legais, deve ser garantida à parte autora, na esteira do disposto no art. 687 da Instrução Normativa INSS/PRES 77/ 2015. 4. Também vale destacar que, se deferida a aposentadoria por idade, é possível a compensação dos valores já recebidos, na esfera administrativa, a título de amparo social à pessoa com deficiência, não sendo, portanto, a inacumulabilidade um obstáculo ao prosseguimento da ação. 5. Nesse contexto, portanto, tem-se que o deferimento administrativo do benefício assistencial em nada prejudica o interesse processual da autora, razão pela qual a presente ação deve prosseguir, com uma análise de mérito do pleito apresentado. 6. Contudo, compulsando os autos, verifica-se que o feito não se encontra maduro para julgamento, uma vez que não foi realizada a devida instrução probatória para apuração da qualidade de segurada especial, a despeito de a autora ter requerido, no tempo e modo devidos, a produção de prova oral em audiência (fl. 70 ID 42677034). 7. Dessa forma, ante a inexistência de elementos que permitam o imediato julgamento do mérito, anula-se a sentença de fls. 55/56 (ID 42677035), determinando o retorno dos autos ao juízo de origem para que seja reaberta a instrução, com a designação de audiência de instrução. 8. Apelação da autora provida. Sentença anulada (Processo 0052972-10.2012.4.01.9199, julgado pela 2ª Câmara Regional Previdenciária de Minas Gerais, TRF- 1ª Região. Relator: Juiz Federal Guilherme Bacelar Patrício de Assis. Publicação: 16/09/2021)
Também, foi indicado falta de esclarecimento do requerimento administrativo, o que pode ser realizado pelas partes durante a instrução processual.
Não obstante a confirmação do interesse de agir, houve cerceamento ao direito de defesa em detrimento da parte autora pelos seguintes motivos: 1) a ação sugere a necessidade de oitiva de testemunhas em audiência, porque se trata de pedido de aposentadoria por idade rural em face de segurado alegadamente especial por imputado exercício de atividade rural em regime de economia familiar; 2) a petição inicial requereu, expressamente, a produção de prova testemunhal, (ID 341019153 - Pág. 15); o juízo de origem extinguiu prematuramente a causa sem determinar audiência de instrução e julgamento. A sentença foi proferida sem oportunizar a parte autora complementação da prova documental por testemunhas, como lhe faculta a legislação de regência (§ 3º do art. 55 da Lei 8.213/1991 c/c Súmula 149 do STJ e arts. 442 e 442 do CPC/2015).
Em suma, houve violação ao princípio da ampla defesa, o que implica nulidade da sentença, prematuramente proferida.
Assim, a sentença deve ser anulada com reabertura da instrução processual, a fim de que sejam ouvidas as testemunhas a serem apresentadas pela parte autora e demais diligências para esclarecer o conteúdo do pedido administrativo apresentado.
Ante o exposto, conheço do recurso para, no mérito, dar-lhe parcial provimento para anular a sentença recorrida, determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem para a regular instrução, com a oitiva de testemunhas e novo julgamento da causa, em que se faculte às partes também o esclarecimento documental do interesse de agir.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
PROCESSO: 1015753-82.2023.4.01.9999
PROCESSO DE REFERÊNCIA: 0004909-51.2014.8.10.0031
RECORRENTE: MARIA GONCALVES DE SOUSA
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. RGPS. RURAL. APOSENTADORIA POR IDADE. ACUMULAÇÃO BCP/LOAS COM APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. INTERESSE NA CONCESSÃO DA APOSENTADORIA MANTIDO. DIREITO À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. NULIDADE DA SENTENÇA. ENCERRAMENTO PREMATURO DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL SEM OPORTUNIZAR A OITIVA DE TESTEMUNHAS EM AUDIÊNCIA. SENTENÇA ANULADA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL NO JUÍZO DE ORIGEM.
1. A concessão do benefício previdenciário ou o reconhecimento de tempo de serviço, em face de atividades rurais, exercidas em regime de economia familiar, depende da demonstração, por prova idônea e suficiente (testemunhal com ao menos início de prova material contemporânea à prestação laboral), da condição de segurado especial, observância do prazo de carência e demais requisitos legais da legislação de regência (arts.11, VII; 39, II; 55; 142 e dispositivos conexos da Lei 8.213/1991).
2. Não concedida em sentença aposentadoria rural por idade pelo RGPS em razão de a parte autora já ser beneficiária do BCP/LOAS. Todavia, presente o interesse processual na concessão da aposentadoria por ser o benefício mais vantajoso.
3. Todavia, a sentença deve ser anulada, porque houve cerceamento ao direito de defesa em detrimento da parte autora pelos seguintes motivos: 1) a ação sugere a necessidade de oitiva de testemunhas em audiência, porque se trata de pedido de aposentadoria por idade rural em face de segurado alegadamente especial por imputado exercício de atividade rural em regime de economia familiar; 2) a petição inicial requereu, expressamente, a produção de prova testemunhal, (ID 341019153 - Pág. 15); o juízo de origem extinguiu prematuramente a causa sem determinar audiência de instrução e julgamento. A sentença foi proferida sem oportunizar a parte autora complementação da prova documental por testemunhas, como lhe faculta a legislação de regência (§ 3º do art. 55 da Lei 8.213/1991 c/c Súmula 149 do STJ e arts. 442 e 442 do CPC/2015).
3. Apelação provida em parte. Sentença anulada para a reabertura da instrução processual, realização de audiência para a oitiva de testemunhas e novo julgamento da causa, em que se faculte às partes também o esclarecimento documental do interesse de agir.
4. Honorários recursais, quando devidos, na forma da legislação de regência (do CPC/2015 c/c 5º, XXXVI, da CF/88 e Súmula 26-TRF da 1ª Região), observada eventual inexigibilidade (§3º do art. 98 do CPC/2015).
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação cível, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data e assinatura eletrônicas.
Desembargador Federal EULER DE ALMEIDA
