
POLO ATIVO: MARIA ROSA DO NASCIMENTO
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: WILSON MOLINA PORTO - TO3546-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):EULER DE ALMEIDA SILVA JUNIOR

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1019795-82.2020.4.01.9999
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por Maria Rosa do Nascimento em face da sentença (ID 71593027, pag. 32 a 34), proferida pelo Juiz de Direito da 2ª Vara da Comarca de Manacapuru/AM, que não concedeu aposentadoria por idade rural pelo RGPS.
Não foi concedida tutela provisória.
O recurso foi recebido e processado em ambos os efeitos.
Nas razões recursais, a parte recorrente pediu a reforma da sentença para a obtenção do benefício negado pela sentença recorrida, sob a alegação de comprovação do direito ao benefício previdenciário por prova idônea e suficiente, na forma da legislação de regência e do entendimento jurisprudencial.
Intimada, a parte recorrida não apresentou contrarrazões.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1019795-82.2020.4.01.9999
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
O recurso pode ser conhecido, porque presentes os pressupostos recursais (competência do relator e da turma julgadora, tempestividade, adequação e observância das normas pertinentes a eventual preparo recursal).
A concessão benefício previdenciário com base em atividades rurais, exercidas em regime de economia familiar, depende da demonstração, por prova idônea e suficiente (documental e testemunhal), da condição de segurado especial, observância do prazo de carência e demais requisitos legais da legislação de regência (arts. 11, VII; 39, II; 55; 142 e dispositivos conexos da Lei 8.213/1991).
O entendimento jurisprudencial dominante estabeleceu os seguintes critérios sobre a idoneidade e suficiência probatória do trabalho rural em regime de economia familiar: 1) necessidade de produção de prova documental plena ou início de prova material confirmada e complementada pela prova testemunhal (Súmula 149 do STJ e Súmula 27 do TRF1); 2) mitigação da prova documental legal estabelecida no art. 106 da Lei 8.213/1991(STJ AgRG no REsp 1073730/CE); 3) utilização de CTPS como prova plena, quando seus dados forem inseridos no CNIS ou demonstrado o recolhimento de contribuições no período, ou como prova relativa, na forma da Súmula 75 da TNU; 4) contemporaneidade temporal ampliada da prova documental, nos termos da Súmula 577 do STJ c/c Súmulas 14 e 34 da TNU e Tema 2 da TNU; 5) mitigação da dimensão da propriedade em que se deu a atividade (Tema 1115 do STJ e Súmula 30 da TNU); 6) imediatidade da atividade ao tempo do requerimento, ressalvado o direito adquirido quanto ao cumprimento pretérito de todas as condições (Tese 642 do STJ e Súmula 54 da TNU c/c art. 5º, XXXVI, da CF/88); 7) extensão da prova material da condição de rurícula em nome de membros do grupo familiar convivente, principalmente cônjuge, companheiros e filhos, assim como pai e mãe antes do casamento ou união estável (Súmula 06 da TNU c/c §4º do art. 16 da Lei 8.213/1991), possibilitada a desconsideração da atividade urbana de membro do grupo familiar convivente quando o trabalho rural se apresentar indispensável para a sobrevivência desse grupo familiar (Temas 532 e 533 do STJ e Súmula 41 do TNU); 8) na situação de atividade intercalada, a relativização de concorrência de trabalho urbano breve e descontinuado do próprio beneficiário ou de membros do grupo familiar convivente (Tema 37 da TNU, Tema 301 da TNU e Súmula 46 da TNU); 9) resguardo da atividade especial própria da mulher casada com marido trabalhador urbano ou mantida por pensão alimentícia deste (Tema 23 da TNU); 10) qualificação da atividade conforme a atividade do empregado e não de acordo com o ramo de atividade do empregador (Tese 115 da TNU), o que possibilita a utilização de vínculos formais de trabalho, com exercício de atividades agrárias, no prazo de carência do segurado especial.
Os critérios jurisprudenciais que implicam interpretação extensiva à legislação de regência deverão ser aplicados com razoável parcimônia, pois o conjunto de situações excepcionais em dado caso concreto pode descaracterizar a situação de segurado especial em regime de economia familiar e, consequentemente, permitir a exclusão dos períodos descaracterizados do prazo de carência do benefício rural.
A concessão do benefício previdenciário ou o reconhecimento de tempo de serviço em face de atividades rurais, exercidas em regime de economia familiar, depende da demonstração, por prova idônea e suficiente (testemunhal com ao menos início de prova material contemporânea à prestação laboral), da condição de segurado especial, observância do prazo de carência e demais requisitos legais da legislação de regência (arts. 11, VII;39, II; 55; 142 e dispositivos conexos da Lei 8.213/1991).
Consoante jurisprudência do colendo Superior Tribunal de Justiça: “os documentos trazidos aos autos pelo autor, caracterizados como início de prova material, podem ser corroborados por prova testemunhal firme e coesa, e estender sua eficácia tanto para períodos anteriores como posteriores aos das provas apresentadas.” (REsp 1.642.731/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 30/06/2017).
É prescindível que o início de prova material abranja todo o período de carência exigido para a concessão do benefício previdenciário, desde que a prova testemunhal lhe amplie a eficácia probatória referente ao lapso temporal que se quer ver comprovado.
Ademais, é pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo (STJ AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
Assim, são dotados de idoneidade para a comprovação do início de prova material do exercício de atividade rural, dentre outros documentos, as certidões de nascimento, casamento e óbito, bem como certidão da Justiça Eleitoral, carteira de associação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais, ficha de inscrição em Sindicato Rural, contratos de parceria agrícola, nos casos em que a profissão de rurícola estiver expressamente mencionada, desde que amparados por convincente prova testemunhal (STJ, REsp 1.650.326/MT).
E, ainda, a ficha de alistamento militar, certificado de dispensa de incorporação (CDI), título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado (STJ, AgRG no REsp 939191/SC), certidão de casamento, carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ, AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR 1223/MS).
De igual forma, são aceitos: certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que estabeleçam, indiquem ou apenas indiciem a ligação da parte autora com o trabalho no meio rural, bem como CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora, que é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (REsp 310.264/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves da Silva, Segunda Turma, e-DJF1 p.33 de 17/07/2008, AC 0004262-35.2004.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal Miguel Ângelo de Alvarenga Lopes, 3ª Turma Suplementar, e-DJF1 p.191 de 02/03/2011).
A sentença recorrida deve ser reformada, porque os dispositivos constitucionais e legais referidos na fase recursal devem ser interpretados conforme o entendimento jurisprudencial dominante.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 05/01/1957, preencheu o requisito etário em 2012 ( 55 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade na qualidade de segurado especial em 17/08/2018.
Foram apresentados os seguintes documentos (ID 71593045 - Pág. 18 e seguintes): certidão de casamento da autora com o Sr. Carlito Trindade Pacheco (casaram-se em 27/07/2012); carteira do Sindicato; carteira de produtor primário fornecido pelo IDAM, início de atividade em 2016; cadastro de agricultor no PRONAF (2018); declaração sobre o domicílio da autora na comunidade Bom Jardim (2018); contrato de compra e venda do imóvel rural por instrumento particular, datado em 30/01/2013 e com reconhecimento de firma em 2013; formulário de requerimento de regularização fundiária, datada em 19/04/2013; protocolo regularização fundiária; CTPS; CNIS (ID 71593045, pag. 53 a 79).
Como demonstrado pelos entendimentos jurisprudenciais acima, tais documentos servem como prova material e foram ratificados pela prova testemunhal, coesa e harmônica, segundo reconhecido, inclusive, em sentença (ID 71593027, pag. 34).
Portanto, houve comprovação de atividade rural, em regime de economia familiar, por prova idônea e suficiente, pelo prazo necessário à aquisição do direito referido na pretensão recursal.
Honorários recursais, quando devidos, na forma da legislação de regência (§11 do art. 85, do CPC c/c 5º, XXXVI, da CF/88 e Súmula 26-TRF da 1ª Região), observada eventual inexigibilidade (§3º do art. 98 do CPC/2015).
Ante o exposto, conheço do recurso para, no mérito, dar-lhe provimento com a finalidade de reformar a sentença e condenar o INSS a conceder aposentadoria por idade ao segurado especial, a partir da data do requerimento administrativo, 17/08/2018, e a pagar as parcelas vencidas acrescidas de correção monetária e juros de mora, nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, na versão vigente ao tempo da execução do julgado, observada a prescrição quinquenal.
Inverto a sucumbência e arbitro os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data do acórdão, nos termos da Súmula nº 111 do STJ.
Correção monetária e juros de mora conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal, na versão vigente ao tempo da execução.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
PROCESSO: 1019795-82.2020.4.01.9999
PROCESSO DE REFERÊNCIA: 0002172-59.2019.8.04.5401
RECORRENTE: MARIA ROSA DO NASCIMENTO
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. RGPS. RURAL. APOSENTADORIA POR IDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL . SENTENÇA REFORMADA.
1. A concessão benefício previdenciário com base em atividades rurais, exercidas em regime de economia familiar, depende da demonstração, por prova idônea e suficiente (documental e testemunhal), da condição de segurado especial, observância do prazo de carência e demais requisitos legais da legislação de regência (arts. 11, VII; 39, II; 55; 142 e dispositivos conexos da Lei 8.213/1991).
2. Em análise dos autos, verifica-se que, no período de carência a parte autora exerceu atividades rurais em regime de economia familiar. A parte autora, nascida em 05/01/1957, preencheu o requisito etário em 2012 ( 55 anos) e requereu administrativamente o benefício de aposentadoria por idade na qualidade de segurado especial em 17/08/2018. Foram apresentados os seguintes documentos (ID 71593045 - Pág. 18 e seguintes): certidão de casamento da autora com o Sr. Carlito Trindade Pacheco (casaram-se em 27/07/2012); carteira do Sindicato; carteira de produtor primário fornecido pelo IDAM, início de atividade em 2016; cadastro de agricultor no PRONAF (2018); declaração sobre o domicílio da autora na comunidade Bom Jardim (2018); contrato de compra e venda do imóvel rural por instrumento particular, datado em 30/01/2013 e com reconhecimento de firma em 2013; formulário de requerimento de regularização fundiária, datada em 19/04/2013; protocolo regularização fundiária; CTPS; CNIS (ID 71593045, pag. 53 a 79).
3. Documentos juntados configuram início de prova material que foi complementada por prova testemunhal.
4. Concedida aposentadoria rural por idade pelo RGPS em razão da satisfação dos requisitos legais.
5. Apelação da parte autora provida.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar provimento à apelação cível, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data e assinatura eletrônicas.
Desembargador Federal EULER DE ALMEIDA
