
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:EUZANIA ALVES DIAS
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: DEBORAH ALVES RAMOS - TO7360-A, FRANCIELITON RIBEIRO DOS SANTOS DE ALBERNAZ - TO2607-A e WATISON SANTANA BARROS - TO8768
RELATOR(A):EULER DE ALMEIDA SILVA JUNIOR

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1010445-70.2020.4.01.9999
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença que julgou procedente o pedido de benefício por incapacidade ao segurado especial pelo RGPS (ID 52901060 – pág. 6 a 10).
Foi concedida, na sentença, a tutela provisória antecipatória para a implantação do benefício concedido.
O recurso foi recebido e/ou processado em ambos os efeitos (§ 1º do art. 1.012 e conexos do CPC/2015), a exceção da tutela provisória mencionada, que foi executada independentemente da preclusão da decisão que a concedeu.
Nas razões recursais, a parte recorrente pediu a reforma da sentença para denegar o benefício por incapacidade sob a alegação de não haver incapacidade. Aduziu que o laudo médico concluiu pela capacidade laboral da requerente.
Subsidiariamente, pediu a modificação da DIB para coincidir com a data da sentença, momento em que o juízo de origem firmou convicção da incapacidade laboral.
Intimado, o recorrido apresentou contrarrazões e pediu a manutenção da sentença.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1010445-70.2020.4.01.9999
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
O recurso pode ser conhecido, porque presentes os pressupostos recursais (competência do relator e da turma julgadora, tempestividade, adequação e observância das normas pertinentes a eventual preparo recursal).
A concessão benefício previdenciário em face de atividades rurais, exercidas em regime de economia familiar, depende da demonstração, por prova idônea e suficiente (testemunhal com ao menos início de prova material contemporânea à prestação laboral), da condição de segurado especial, observância do prazo de carência e demais requisitos legais da legislação de regência (arts. 11, VII; 39, II; 55; 142 e dispositivos conexos da Lei 8.213/1991).
O entendimento jurisprudencial dominante estabeleceu os seguintes critérios sobre a idoneidade e suficiência probatória do trabalho rural em regime de economia familiar: 1) necessidade de produção de prova documental plena ou início de prova material confirmada e complementada pela prova testemunhal (Súmula 149 do STJ e Súmula 27 do TRF1); 2) mitigação da prova documental legal estabelecida no art. 106 da Lei 8.213/1991; 3) contemporaneidade temporal ampliada da prova documental, nos termos da Súmula 577 do STJ c/c Súmulas 14 e 34 da TNU e Tema 2 da TNU; 4) imediatidade da atividade ao tempo do requerimento, ressalvado o direito adquirido quanto ao cumprimento pretérito de todas as condições (Tese 642 do STJ e Súmula 54 da TNU c/c art. 5º, XXXVI, da CF/88); 5) possibilidade de estabelecimento de residência do grupo familiar do segurado especial em aglomerado urbano, fora do local de exercício das atividades agrárias (inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, redação dada pela Lei 11.718/2008).
Desta forma, para comprovar o trabalho rural em regime de economia familiar, é necessário apresentar documentos ou um começo de evidências materiais, que podem ser complementados pela prova testemunhal. Isso está de acordo com Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Súmula 27 do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1).
Assim, o uso de documentos legais para comprovar o trabalho rural pode ser flexibilizado, de acordo com o artigo 106 da Lei 8.213/1991.
De acordo com o art. 11, VII, a, I da Lei 8.213/1991, é considerado segurado especial o produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade agropecuária.
Importante destacar que o agricultor qualificado como segurado especial é aquele que desempenha suas atividades laborais em regime de economia familiar, com a prática de cultivo da terra, criação de gado, pesca ou outras atividades rurais de subsistência.
Consoante a Lei 8.213/91, a aposentadoria por invalidez ou aposentadoria por incapacidade permanente é devido ao filiado ao RGPS que, mantendo a qualidade de segurado, seja acometido de incapacidade total e definitiva para o trabalho, sem perspectiva de reabilitação profissional. O benefício de auxílio-doença ou auxílio por incapacidade temporária, por sua vez, é devido ao filiado ao RGPS, com qualidade de segurado, que fique incapacitado em caráter provisório para exercer sua atividade laboral. Para ambos os benefícios, o filiado segurado especial deverá comprovar cumprimento de carência de 12 meses, art. 39 da Lei de Benefícios.
No tocante à incapacidade, deverá ser comprovada por laudo pericial produzido em juízo, submetidos à impugnação das partes e a esclarecimentos quando necessários, com descrição do tempo de duração e grau de acometimento da doença.
No caso concreto, não há controvérsia quanto a qualidade de segurado do requerente, uma vez que recebeu auxílio-doença de 26/09/2017 a 29/11/2017 (ID 52901033 – pág. 17).
Quanto à incapacidade, o laudo médico produzido atestou a existência de doença incapacitante (espondilose – CID 10: M49.0), sem comprometer a capacidade laboral. Relatou a ocorrência de processo degenerativo na coluna, sem sinais de compressões de raiz nervosa (ID 52901048 - Pág. 10):
“Esclarecimento finais do perito: Periciada, 43 anos apresenta leve processo degenerativo na coluna compatível com a idade e não é incapacitante para o seu labor.
Conclusão do perito: Periciada não se encontra incapaz.”
Contudo, o juízo de origem julgou procedente o pedido de restabelecimento de auxílio-doença, desde a cessação do benefício anterior até realização de nova perícia médica oficial a ser realizada no prazo de 2 anos (ID 52901060 – pág. 6 a 10).
Merecem transcrição os seguintes fundamentos da sentença:
“No que concerne, à incapacidade laboral do postulante, não obstante o laudo médico realizado pela JUNTA MÉDICA OFICIAL DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA, tenha sido pela não reconhecimento da incapacidade, nesta audiência, foi verificado que, de fato, o estado clínico da autora não permite que este exerça as atividades necessárias para sua subsistência, vez que é lavradora. A calosidade em suas nãos existe, mas é que a fome não pode esperar, e como dito pelo requerente “Deus dá força” para ele segurar a enxada, apoiando a mão “fraca” e puxar a enxada com a mão forte, para plantar a mandioca, o arroz... no entanto, conforme corroborado pelas testemunhas, esse trabalho é de poucas horas, já que as fortes dores na coluna se iniciam.
Inclusive, em audiência, a coordenadora da Feira do produtor rural desta cidade, disse que presencia as vezes em que a autora passa mal com fortes dores nas costas.
(...)
Forçoso, assim, reconhecer que a autora possui incapacidade para exercer qualquer atividade laboral, notadamente, às ligadas ao campo que exigem grande esforço físico, pelo que exsurge cristalino seu direito à concessão do benefício de auxílio doença”.
Entendimento consolidado pelo STJ estabelece que ao analisar as provas apresentadas, o magistrado poderá discordar das conclusões expostas pelo perito desde que de forma fundamentada.
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO PELA INCAPACIDADE PARCIAL DO SEGURADO. NÃO VINCULAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA SÓCIO-ECONÔMICA, PROFISSIONAL E CULTURAL FAVORÁVEL À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO DO INSS DESPROVIDO. 1. Os pleitos previdenciários possuem relevante valor social de proteção ao Trabalhador Segurado da Previdência Social, devendo ser, portanto, julgados sob tal orientação exegética. 2. Para a concessão de aposentadoria por invalidez devem ser considerados outros aspectos relevantes, além dos elencados no art. 42 da Lei 8.213/91, tais como, a condição sócio-econômica, profissional e cultural do segurado. 3. Embora tenha o laudo pericial concluído pela incapacidade parcial do segurado, o Magistrado não fica vinculado à prova pericial, podendo decidir contrário a ela quando houver nos autos outros elementos que assim o convençam, como no presente caso. 4. Em face das limitações impostas pela moléstia incapacitante, avançada idade e baixo grau de escolaridade, seria utopia defender a inserção do segurado no concorrido mercado de trabalho, para iniciar uma nova atividade profissional, motivo pelo qual faz jus à concessão de aposentadoria por invalidez. 5. Agravo Regimental do INSS desprovido. (AgRg no AREsp n. 136.474/MG, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 5/6/2012, DJe de 29/6/2012).
Ao questionar o requerente e as testemunhas durante a audiência sobre a incapacidade laboral, o juízo de origem permitiu contraditório e formou convicção do preenchimento do requisito para concessão do benefício por incapacidade.
Contudo, em que pese a comprovação da incapacidade na data da audiência de instrução e julgamento, deve-se acolher a data de início do benefício coincidente com o ato.
A jurisprudência dominante firmou-se no sentido de que "A DIB será a data do requerimento administrativo ou o dia imediato ao da cessação do benefício de auxílio por incapacidade temporária. Não havendo requerimento, será a data da citação ou a data do laudo médico pericial, observando-se, em todos os casos, os limites do pedido autoral e da pretensão recursal" (AC 1020977-40.2019.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL JOAO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 19/04/2023 PAG).
Assim, a sentença recorrida deve ser reformada em parte, porque os dispositivos constitucionais e legais referidos na fase recursal devem ser interpretados conforme o entendimento jurisprudencial dominante a seguir transcritos.
Nestes termos, a data de início do benefício de auxílio-doença, deferido na sentença deverá coincidir com a audiência realizada, em 05/02/2020.
A determinação, ainda que de ofício, de aplicabilidade do Manual de Cálculos da Justiça Federal implica perda de objeto das questões pertinentes à correção monetária e juros de mora, na medida em que a referida obra institucional incorpora, progressivamente, o entendimento jurisprudencial que se tornou vinculante ou dominante relativamente aos referidos institutos jurídicos.
Honorários recursais, quando devidos, na forma da legislação de regência (§11 do art. 85, do CPC/2015, c/c art. 5º, XXXVI, da CF/88 e Súmula 26-TRF da 1ª Região), observada eventual inexigibilidade (§3º do art. 98 do CPC/2015).
Ante o exposto, conheço do recurso para, no mérito, dar provimento à apelação interposta e reformar em parte a sentença para, tão somente, modificar a data de início do benefício (DIB) para coincidir com a data da sentença proferida em audiência, em 05/02/2020.
Sem honorários na fase recursal, nos termos da Tese 1.059 do STJ.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
PROCESSO: 1010445-70.2020.4.01.9999
PROCESSO DE REFERÊNCIA: 0001117-30.2018.8.27.2730
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: EUZANIA ALVES DIAS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. RGPS. RURAL. AUXÍLIO-DOENÇA. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO. DIVERGE DO LAUDO PEDICIAL. INCAPACIDADE LABORAL COMPROVADA POR TESTEMUNHAS. BENEFÍCIO CONCEDIDO. DIB COINCIDENTE COM DATA DA SENTENÇA. REFORMADA EM PARTE. APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE.
1. Consoante a Lei 8.213/91, a aposentadoria por invalidez ou aposentadoria por incapacidade permanente é devido ao filiado ao RGPS que, mantendo a qualidade de segurado, seja acometido de incapacidade total e definitiva para o trabalho, sem perspectiva de reabilitação profissional. O benefício de auxílio-doença ou auxílio por incapacidade temporária, por sua vez, é devido ao filiado ao RGPS, com qualidade de segurado, que fique incapacitado em caráter provisório para exercer sua atividade laboral. Para ambos os benefícios, o filiado segurado especial deverá comprovar cumprimento de carência de 12 meses, art. 39 da Lei de Benefícios.
2. No tocante à incapacidade, deverá ser comprovada por laudo pericial produzido em juízo, submetidos à impugnação das partes e a esclarecimentos quando necessários, com descrição do tempo de duração e grau de acometimento da doença.
3. A cessação de benefício por incapacidade ao segurado especial, em período inferior a 12 meses do ajuizamento da ação – período de carência, dispensa a apresentação do início de prova material e a realização de audiência para comprovação da qualidade de segurado especial.
4. Entendimento consolidado pelo STJ estabelece que ao analisar as provas apresentadas, o magistrado poderá discordar das conclusões expostas pelo perito desde que de forma fundamentada (AgRg no AREsp n. 136.474/MG, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 5/6/2012, DJe de 29/6/2012).
5. Ao questionar o requerente e as testemunhas durante a audiência sobre a incapacidade laboral, o juízo de origem permitiu contraditório e formou convicção do preenchimento do requisito para concessão do benefício por incapacidade.
6. A jurisprudência dominante firmou-se no sentido de que "A DIB será a data do requerimento administrativo ou o dia imediato ao da cessação do benefício de auxílio por incapacidade temporária. Não havendo requerimento, será a data da citação ou a data do laudo médico pericial, observando-se, em todos os casos, os limites do pedido autoral e da pretensão recursal" (AC 1020977-40.2019.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL JOAO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 19/04/2023 PAG).
7. Em que pese a comprovação da incapacidade na data da audiência de instrução e julgamento, deve-se acolher a data de início do benefício coincidente com o ato.
8. Sentença reformada em parte para, tão somente, modificar a data de início do benefício (DIB) para coincidir com a data da sentença proferida em audiência, em 05/02/2020.
9. Apelação provida em parte.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar provimento parcial à apelação cível, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data e assinatura eletrônicas.
Desembargador Federal EULER DE ALMEIDA
