
POLO ATIVO: MARIA JOELMA GARCIA RAMOS
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: FLAVIO SAMUEL SANTOS PINTO - MA8497-A e ANA CAROLINA AGUIAR COSTA DA FONSECA - MA8899-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1011425-75.2024.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora, de sentença na qual foi julgado improcedente o seu pedido de concessão de salário-maternidade, em razão da ausência de comprovação da sua qualidade de trabalhadora rural.
Também houve condenação no pagamento das custas e honorários advocatícios, ficando suspensa a exigibilidade destas verbas, uma vez que a autora, ora apelante, litiga sob o pálio da assistência judiciária gratuita (art. 98, §3º, do Código de Processo Civil).
Em suas razões, a parte autora sustenta a nulidade da sentença, em razão de cerceamento de defesa, pedindo a sua anulação, com o retorno dos autos à origem para que seja realizada a reabertura da instrução probatória, a fim de que possa produzir a prova testemunhal (fls. 71/78).
Sem contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Na sentença, o pedido foi julgado antecipadamente, nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, sob fundamento de que a parte autora não apresentou um início de prova documental do exercício da sua atividade rural, no período de carência.
Preliminar: cerceamento de defesa
A parte apelante suscita a nulidade processual, em razão de cerceamento de defesa, considerando que a sentença julgou antecipadamente a lide, sem que lhe fosse ofertada a oportunidade de produzir a prova testemunhal.
Todavia, tal preliminar se confunde com o mérito e juntamente com ele será analisada.
Da questão de fundo
Do salário-maternidade
A Constituição Federal, no artigo 7º, inciso XVIII, garante a licença à gestante, com a duração de 120 (cento e vinte) dias, sem prejuízo do emprego e do salário.
O benefício de salário-maternidade está regulamentado no art. 71 da Lei n. 8.213/91, que assim dispõe:
"Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade."
Em relação à segurada especial, o art. 39, parágrafo único, do mesmo diploma legal, assim estabelece:
"Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
(...)
Parágrafo único. Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício."
Dessa forma, para a concessão do benefício, sem que haja a necessidade de recolhimento de contribuições previdenciárias, é indispensável a comprovação de efetivo exercício de atividade atribuída legalmente ao segurado especial, assim definida na Lei n. 8.213/91:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(...)
VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
(...)
§ 1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes."
A par disso, o aludido dispositivo legal exige a comprovação do efetivo desempenho da atividade em regime de economia familiar, nos moldes nele referidos, o que reivindica a existência de prova material passível de ser confirmada através de robusta prova testemunhal.
No caso do salário-maternidade, o exercício de atividade rural deve ser devidamente comprovado durante o período de carência legalmente indicado para a concessão do benefício.
Das provas – qualidade de segurado
Registre-se que “A jurisprudência pátria, considerando a situação peculiar do trabalhador rural e a dificuldade encontrada por esses trabalhadores em comprovar a atividade rural, em qualquer de suas formas, permite que outros documentos (dotados de fé pública) não especificados em lei, sejam considerados para fins de concessão do benefício previdenciário” (AC 0031039-78.2012.4.01.9199, DESEMBARGADOR FEDERAL PEDRO BRAGA FILHO, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 20/03/2023 PAG.).
Ademais, é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o rol do art. 106 da Lei n. 8.213/91 tem natureza meramente exemplificativa (AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além daqueles nele indicados.
Do caso concreto.
Conforme se observa dos autos, a parte autora ajuizou a presente ação em 18/12/2015, após o indeferimento do seu requerimento administrativo do benefício, apresentando os seguintes documentos: cópia da certidão de nascimento do filho, Enderson Joelson Ramos, ocorrido em 07/08/2013, sem indicar a profissão dos genitores; b) certidão eleitoral emitida em 12/01/2015; c) ficha de atendimento hospitalar; d) carteira sindical da autora, com data do cadastro em 12/04/2013.
Examinando esses documentos, constato que nenhum deles tem idoneidade para consubstanciar o exigido início de prova material dos fatos que servem de respaldo ao direito sustentado na peça inicial.
De fato, a certidão de nascimento do filho não faz qualquer menção ao exercício da atividade rural dos seus genitores, enquanto os demais demais documentos são meramente declaratórios, sendo induvidoso que os seus dados resultaram de declaração prestada pela própria interessada.
O titulo eleitora também não serve para demonstrar o exercício da atividade campesina, visando apercepção de benefício previdenciário.
Registra-se, ainda, que está Corte tem decidido que não servem como início de prova material do trabalho rural documentos que não se revestem das formalidades legais, tais como carteiras, comprovantes e declarações de sindicatos sem a devida homologação pelo INSS e pelo Ministério Público (AC 1004870-47.2021.4.01.9999, Rel. Des. Rafael Paulo, Segunda Turma, pub 06/04/2022
Não tendo sido apresentado ao menos um início de prova material da condição de segurado especial, não se mostra necessária a produção de prova testemunhal, pois o tempo de exercício da atividade rural não pode ser comprovado exclusivamente através de prova testemunhal, nos termos do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91 e Súmula nº 149 do Superior Tribunal de Justiça.
Sendo assim, a preliminar suscitada pela parte autora não encontra fundamento legal, uma vez não tendo trazido aos autos ao menos um início de prova material do exercício do seu labor rural, a prova testemunhal não tem qualquer relevância, não havendo respaldo, portanto, para a sua alegação de cerceamento de defesa.
Por outro lado, devo registrar que no julgamento do REsp 1352721/SP, em sede de recurso repetitivo, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que “A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa” (REsp n. 1.352.721/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, julgado em 16/12/2015, DJe de 28/4/2016).
Nesse contexto, inexistindo o atendimento de um dos requisitos necessários ao reconhecimento da qualidade de segurada especial, qual seja, o início de prova material da atividade rural exercida, carece a autora de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo.
Com esses fundamentos, julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil, e declaro prejudicada a apelação interposta pela parte autora.
É como voto.
Brasília, 24 de julho de 2024.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1011425-75.2024.4.01.9999
MARIA JOELMA GARCIA RAMOS
Advogados do(a) APELANTE: ANA CAROLINA AGUIAR COSTA DA FONSECA - MA8899-A, FLAVIO SAMUEL SANTOS PINTO - MA8497-A
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. JULGAMENTO ANTECIPADO.AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL DA ATIVIDADE RURAL. DESCESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL.CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM EXAME DO MÉRITO. APELAÇÃO PREJUDICADA.
1. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção a maternidade, conforme estabelecido pelo art.71da Lei 8.213/91.
2. Alegação de cerceamento de defesa que se afasta, por não ser necessária a produção de prova testemunhal para exame do pedido, em vista a ausência de início de prova material do exercício efetivo do labor campesino (Súmula nº 149 do Superior Tribunal de Justiça).
3. No julgamento do REsp 1352721/SP, em sede de recurso repetitivo, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que, nas ações previdenciárias, em vista da natureza das normas de proteção social, a ausência de prova a instruir a inicial implica no reconhecimento de ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem apreciação do mérito, podendo o autor ajuizar novamente a ação desde que reunidos novos elementos probatórios.
4.Processo julgado extinto, de ofício, sem julgamento do mérito. Exame da apelação da parte autora prejudicada.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, extinguir o processo, de ofício, sem apreciação do mérito, e declarar prejudicado o exame da apelação interposta pela autora, nos termos do voto da relatora.
Brasília, 24 de julho de 2024.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
