
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:TALITA CARVALHO BEZERRA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: FRANCISCO UBIRATA SANTOS MOREIRA - AM3176-A
RELATOR(A):JOAO LUIZ DE SOUSA

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 6 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1000027-10.2019.4.01.9999
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA (RELATOR):
Trata-se de ação ajuizada em desfavor do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, para fins de obtenção do benefício de salário-maternidade.
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado na inicial.
Nas razões de recurso o INSS alegou, em síntese, que a parte autora não teria preenchido os requisitos necessários para a concessão do benefício, eis que não teria apresentado início razoável de prova material do labor rural.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 6 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1000027-10.2019.4.01.9999
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA (RELATOR):
O benefício de salário maternidade, no valor de 1 (um) salário mínimo mensal, é devido às seguradas especiais que comprovarem o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 10 (dez) meses imediatamente anteriores ao início do benefício.
O benefício em referência será devido durante 120 (cento e vinte) dias, com início 28 (vinte e oito dias) antes e término 91 (noventa e um dias) depois do parto, conforme inteligência do art. 93, caput e §2º do Decreto 3.048/99 (com a redação dada pelo Decreto n.º 4.862/2003) e art. 71 da Lei 8.213/91, com a redação alterada pela Lei 10.710, de 05/08/2003, que assim dispõe:
Art. 93. O salário-maternidade é devido à segurada da previdência social, durante cento e vinte dias, com início vinte e oito dias antes e término noventa e um dias depois do parto, podendo ser prorrogado na forma prevista no §3º
(...)
§ 2o Será devido o salário-maternidade à segurada especial, desde que comprove o exercício de atividade rural nos últimos dez meses imediatamente anteriores à data do parto ou do requerimento do benefício, quando requerido antes do parto, mesmo que de forma descontínua, aplicando-se, quando for o caso, o disposto no parágrafo único do art. 29.
Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade.
No tocante à prova do labor rural, tendo em vista a dificuldade dos trabalhadores rurais comprovarem todo o período de atividade no campo, o eg. Superior Tribunal de Justiça adotou, em matéria previdenciária, a solução pro misero, devendo a apreciação da prova material se dar em conjunto com a prova testemunhal produzida, sendo, por ela corroborado.
Inexistente, pois, rol taxativo dos documentos (STJ AgRG no REsp 1073730/CE), são aceitáveis, como início razoável de prova material documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, a ficha de alistamento militar, o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado (STJ, AgRG no REsp 939191/SC), carteira de sindicato rural e boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento, certidão de óbito do cônjuge, certidão de nascimento de filhos, carteira de trabalho e previdência social (CTPS), certificado de reservista, declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, ficha/carteira de filiação em sindicato de trabalhadores rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola, entre outros registros públicos contemporâneos ao período em que se quer comprovar, nos quais esteja especificada a profissão da parte autora ou de seu cônjuge como trabalhador rural.
Cumpre frisar, ainda, que o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento, no sentido de que é perfeitamente aceitável a utilização de documentos de terceiros como início de prova material para comprovação do tempo de atividade rural, não sendo necessário que o início de prova documental abranja todo o período de carência, sobretudo quando a prova testemunhal é suficiente para corroborar o deferimento da aposentadoria.
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. CERTIDÃO DE NASCIMENTO. PROVA MATERIAL. INÍCIO.
1. Segundo compreensão firmada por este Superior Tribunal de Justiça, não se faz necessário que a prova material diga respeito a todo o período de carência estabelecido pelo art. 143 da Lei n.8.213/91, desde que a via testemunhal se preste a ampliar sua eficácia probatória.
2. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1264248/RS, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 25/06/2013, DJe 05/08/2013).
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. DOCUMENTAÇÃO EM NOME DOS PAIS. VALIDADE. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.
1. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido da admissibilidade de documentos em nome de terceiros como início de prova material para comprovação da atividade rural. Isso em razão das dificuldades encontradas pelos trabalhadores do campo para comprovar o seu efetivo exercício no meio agrícola.
2. Recurso especial conhecido e improvido.
(REsp 501.009/SC, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 20/11/2006, DJ 11/12/2006, p. 407).”
Ressalte-se o entendimento manifestado no julgamento REsp 267.355/MS, relatado pelo Ministro Jorge Scartezzini, publicado no DJ 20.11.2000: “A qualificação profissional de lavrador ou agricultor do marido, constante dos assentamentos de registro civil, é extensível à esposa, e constitui indício aceitável de prova material do exercício da atividade rural...”.
Ressalto, por oportuno, que a existência de eventuais registros no CNIS de vínculos de natureza urbana esparsos e de curta duração não afastam a condição de segurado especial, comprovada pelo acervo probatório constante dos autos.
No mesmo sentido, também não desconfigura a qualidade de rurícola a simples filiação da parte autora à Previdência Social como contribuinte individual autônomo, com indicação de ocupação diversa, sem vínculos comprovados ou existência de vínculos na carteira de trabalho da parte autora como diarista, bóia-fria ou safrista.
“APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. EMPREGADO PRESTADOR DE SERVIÇO DE NATUREZA RURAL. LEI. 8.213/91. ART. 143. ART. 11, V, 'G'. PROVA DOCUMENTAL CORROBORADA POR TESTEMUNHAS. CNIS. TERMO INICIAL. REQUISITOS LEGAIS. JUROS DE MORA. VERBA HONORÁRIA. CONCESSÃO DEVIDA. PRELIMINAR REJEITADA.
[...] III. O CNIS do Autor, onde constam registros de atividades urbanas por períodos exíguos, não se presta a alterar a sua condição de trabalhador rural. Ademais, a atividade rurícola restou devidamente comprovada por outros documentos e pela prova testemunhal. [...]
AC 200901990671616; AC - APELAÇÃO CIVEL – 200901990671616; Relator(a) JUIZ MARCOS AUGUSTO DE SOUSA (CONV.); TRF1; Órgão julgador PRIMEIRA TURMA; Fonte e-DJF1 DATA:13/07/2010 PAGINA:96; Data da Decisão 16/06/2010; Data da Publicação 13/07/2010.”
Muito embora a jurisprudência tenha flexibilizado o posicionamento no tocante aos documentos que podem servir como início de prova documental, a jurisprudência já firmou entendimento de que não possuem integridade probante documentos confeccionados em momento próprio ao ajuizamento da ação ou ao implemento do requisito etário, produzidos tão somente com o intuito de servir como meio de prova em ações de índole previdenciária. Não são aceitos como início de prova material, assim, certidões de cartório eleitoral com anotação da profissão da parte autora, prontuários médicos, certidões relativas à filiação à sindicatos de trabalhadores rurais etc contemporâneos ao ajuizamento da ação.
Saliente-se, ainda, que documentos que, em regra são aceitos como início de prova documental, como certidões de casamento com anotação da profissão da parte autora ou de seu cônjuge, podem ter sua eficácia afastada pelo conjunto probatório dos autos como na hipótese em que comprovada a existência de vínculos urbanos de longa duração da parte ou de seu cônjuge, o que ilide a condição de trabalhador rural em regime de economia familiar ou quando demonstrada a condição de produtor rural de relevante quilate, que não se coaduna com a pretensa vulnerabilidade social do trabalhador nas lides campesinas.
É exatamente o caso dos autos, no qual a documentação acostada não ostenta suficiente densidade probatória para a comprovação da qualidade de segurado da parte autora e a consequente concessão do almejado benefício previdenciário, razão pela qual deve ser reformada a sentença de procedência do pedido.
Na hipótese, a parte autora não logrou êxito em comprovar a sua condição de segurada especial durante o período de carência (10 meses anteriores aos partos, ocorridos em 21.11.2008 e 20.03.2010), eis que trouxe aos autos, como prova documental, apenas os seguintes documentos, que são meramente declaratórios: certidões de nascimento da autora e dos filhos, todas sem registro de profissão; fichas de saúde, com indicação de endereço na zona rural; declaração de assistente comunitário de saúde, com informação de que a autora reside na zona rural; carteira de identificação da Associação dos Produtores Agroextrativistas da RDS do Rio Madeira, com data de admissão em 16.04.2010.
Ademais, o simples fato de a autora residir em área rural se afigura inservível ao fim pretendido, tendo em conta sua natureza probatória demasiadamente frágil. De igual modo, a mera juntada de documentos particulares, desprovidos de fé pública, não se mostra suficiente para o fim pretendido.
Saliente-se, por oportuno, que uma vez verificada a imprestabilidade da prova material, não se pode conceder o benefício com base apenas nas provas testemunhais, como já sedimentou este Tribunal em reiterados julgados, o que culminou na edição da Súmula 27, verbis: “Não é admissível prova exclusivamente testemunhal para reconhecimento de tempo de exercício de atividade urbana e rural (Lei 8.213/91, art.55,§ 3º)”.
No mesmo sentido o enunciado da Súmula n. 149 do Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõe: “A prova exclusivamente e testemunhal não basta à comprovação de atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.”
Aplica-se, ao presente caso, o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, sob a sistemática dos recursos repetitivos (tema 629): "A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa" (REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).
Posto isso, dou parcial provimento à apelação do INSS, para julgar extinto o processo, sem julgamento do mérito, condenando a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, suspensa a execução desse comando por força da assistência judiciária gratuita, nos termos do artigo 98, §3º, do CPC.
É como voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 6 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1000027-10.2019.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: TALITA CARVALHO BEZERRA
Advogado do(a) APELADO: FRANCISCO UBIRATA SANTOS MOREIRA - AM3176-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. RURÍCOLA. INEXISTÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL DA ATIVIDADE CAMPESINA. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO E REGULAR DO PROCESSO. EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. TESE FIRMADA EM SEDE DE JULGAMENTO DE RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. TEMA 629. APELO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. O salário-maternidade é devido à segurada especial, no valor de 01 (um) salário mínimo mensal, durante 120 dias, a contar da data do parto ou dos 28 (vinte e oito) dias que o antecederam, desde que comprovado o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos dez meses imediatamente anteriores ao início do benefício (arts. 39, parágrafo único, e 71 c/c 25, da Lei nº 8.213/91).
2. No tocante à prova do labor rural, tendo em vista a dificuldade dos trabalhadores rurais comprovarem todo o período de atividade no campo, o eg. Superior Tribunal de Justiça adotou, em matéria previdenciária, a solução pro misero, devendo a apreciação da prova material se dar em conjunto com a prova testemunhal produzida, sendo, por ela corroborado.
3. Na hipótese, a parte autora não logrou êxito em comprovar a sua condição de segurada especial durante o período de carência (10 meses anteriores aos partos, ocorridos em 21.11.2008 e 20.03.2010), eis que trouxe aos autos, como prova documental, apenas os seguintes documentos, que são meramente declaratórios: certidões de nascimento da autora e dos filhos, todas sem registro de profissão; fichas de saúde, com indicação de endereço na zona rural; declaração de assistente comunitário de saúde, com informação de que a autora reside na zona rural; carteira de identificação da Associação dos Produtores Agroextrativistas da RDS do Rio Madeira, com data de admissão em 16.04.2010. Ademais, o simples fato de a autora residir em área rural se afigura inservível ao fim pretendido, tendo em conta sua natureza probatória demasiadamente frágil. De igual modo, a mera juntada de documentos particulares, desprovidos de fé pública, não se mostra suficiente para o fim almejado.
4. Verificada a imprestabilidade da prova material, não se pode conceder o benefício com base apenas nas provas testemunhais, consoante disposto na Súmula 149 do STJ.
5. O Superior Tribunal de Justiça, sob a sistemática dos recursos repetitivos (tema 629), firmou a seguinte tese jurídica, que se aplica ao caso: "A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa" (REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).
6. Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, a serem pagos pela parte autora ao INSS, ficando suspensa a execução desse comando por força da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 98, § 3º do CPC.
7. Apelação do INSS parcialmente provida para reformar a sentença e julgar extinto o processo sem julgamento do mérito, nos termos do item 5.
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do TRF da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do voto do relator.
Brasília - DF.
ASSINADO DIGITALMENTE
Desembargador Federal João Luiz de Sousa
Relator
