
POLO ATIVO: GILDOMARA DINIZ MOTA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: WALDINER DOS SANTOS JUNIOR - MA21096-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):EULER DE ALMEIDA SILVA JUNIOR

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1003661-72.2023.4.01.9999
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face de sentença (ID 295121059 - Pág. 11 a 13) que não concedeu salário-maternidade por nascimento de filhos próprios à segurada especial.
Sem tutela provisória.
O recurso foi recebido e processado em ambos os efeitos.
Nas razões recursais (ID 295121059 - Pág. 7 a 9), pediu a reforma da sentença para a concessão do benefício, sob a alegação de apresentação de provas idôneas e suficientes para comprovação da atividade rural exercida em período anterior à data do parto.
Intimado, o recorrido não apresentou contrarrazões.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1003661-72.2023.4.01.9999
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
O recurso pode ser conhecido, porque presentes os pressupostos recursais (competência do relator e da turma julgadora, tempestividade, adequação, congruência, dialeticidade e observância das normas pertinentes a eventual preparo recursal).
A concessão do benefício previdenciário intitulado salário-maternidade à segurado especial, que tenha por base atividades rurais, exercidas em regime de economia familiar ou regime equivalente, depende da demonstração, por prova idônea e suficiente (documental e testemunhal), da qualidade de segurado especial e observância dos demais requisitos legais da legislação de regência (arts. 71 e conexos da Lei 8.213/1991 e § 2º do art. 93 do Regulamento aprovado pelo Decreto 3.048/1999).
O entendimento jurisprudencial dominante estabeleceu os seguintes critérios sobre a idoneidade e suficiência probatória do trabalho rural em regime de economia familiar ou equivalente, aplicáveis subsidiariamente à situação do salário-maternidade, observadas as devidas proporções (comparativamente à aposentadoria por idade e outros benefícios): 1) necessidade de produção de prova documental plena ou início de prova material confirmada e complementada pela prova testemunhal (Súmula 149 do STJ e Súmula 27 do TRF1); 2) mitigação da prova documental legal estabelecida no art. 106 da Lei 8.213/1991; 3) utilização de CTPS como prova plena, quando seus dados forem inseridos no CNIS ou demonstrado o recolhimento de contribuições no período, ou como prova relativa, na forma da Súmula 75 da TNU; 4) contemporaneidade temporal ampliada da prova documental, nos termos da Súmula 577 do STJ c/c Súmulas 14 e 34 da TNU e Tese 2, 11 e 17 da TNU; 5) mitigação da dimensão da propriedade em que se deu a atividade (Tese 1115 do STJ e Súmula 30 da TNU); 6) imediatidade da atividade ao tempo abrangido pelo requerimento, respeitado o direito adquirido quanto ao cumprimento pretérito de todas as condições (Tese 642 do STJ e Súmulas 54 e 11 da TNU c/c art. 5º, XXXVI, da CF/88); 7) extensão da prova material da condição de rurícola em nome de membros do grupo familiar convivente, principalmente cônjuge, companheiros e filhos, assim como pai e mãe antes do casamento ou união estável (Súmula 06 da TNU c/c §4º do art. 16 da Lei 8.213/1991), possibilitada a desconsideração da atividade urbana de membro do grupo familiar convivente quando o trabalho rural se apresentar indispensável para a sobrevivência desse grupo familiar (Teses 532 e 533 do STJ e Súmula 41 do TNU); 8) na situação de atividade intercalada, a relativização de concorrência de trabalho urbano breve e descontinuado do próprio beneficiário ou de membros do grupo familiar convivente (Tese 37 da TNU, Tema 301 da TNU e Súmula 46 da TNU); 9) resguardo da atividade especial própria da mulher casada com marido trabalhador urbano ou mantida por pensão alimentícia deste (Tese 23 da TNU). 10) qualificação da atividade conforme a atividade do empregado e não de acordo com o ramo de atividade do empregador (Tese 115 da TNU), o que possibilita a utilização de vínculos formais de trabalho, com exercício de atividades agrárias, como segurado especial; 11) possibilidade de consideração das atividades rurais exercidas por menor de idade em regime de economia familiar, nos termos da Súmula 5 da TNU e da Tese 219 da TNU (entre 12 e 14 anos até o advento da Lei 8.213/1991, e a partir de 14 anos após a referida data); 12) inclusão da situação do “boia-fria” como segurado especial (Tese 554 do STJ); 13) possibilidade de estabelecimento de residência do grupo familiar do segurado especial em aglomerado urbano, fora do local de exercício das atividades agrárias (inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, redação dada pela Lei 11.718/2008).
Os critérios jurisprudenciais que implicam interpretação extensiva à legislação de regência deverão ser aplicados com razoável parcimônia, pois, em dado caso concreto, uma única situação excepcional (quando relevante, intensa e abrangente) ou o conjunto de situações excepcionais (ainda que acessórias e menos abrangentes, quando individualmente consideradas) pode descaracterizar a situação de segurado especial em regime de economia familiar.
Possui especial relevância as Teses 11 e 17 da TNU, nos seguintes termos:
Tema 11 da TNU. A exigência de início de prova material contemporânea para concessão do salário-maternidade à segurada especial pode ser flexibilizada.
Tema 17 da TNU. A exigência de início de prova material para concessão do salário-maternidade à segurada especial pode ser flexibilizada.
As referidas teses foram potencializadas no julgamento da ADI 2.110, no qual o STF, por maioria, com base no voto do ministro Edson Fachin, declarou a inconstitucionalidade da norma que passou a exigir carência de 10 meses de contribuição para a concessão do salário-maternidade para as trabalhadoras autônomas (contribuintes individuais), para as trabalhadoras rurais (seguradas especiais) e para as contribuintes facultativas. Para os ministros que acompanharam o voto vencedor em comento, a exigência de cumprimento de carência apenas para algumas categorias de trabalhadoras viola o princípio da isonomia. Consta da certidão do julgamento da ADI 2.110, no que se refere ao salário-maternidade, o seguinte (original sem destaque): "Decisão: O Tribunal, por maioria, conheceu parcialmente das ADIs 2.110 e 2.111 e, na parte conhecida, (a) julgou parcialmente procedente o pedido constante da ADI 2.110, para declarar a inconstitucionalidade da exigência de carência para a fruição de salário-maternidade, prevista no art. 25, inc. III, da Lei nº 8.213/1991, na redação dada pelo art. 2º da Lei nº 9.876/1999, vencidos, nesse ponto, os Ministros Nunes Marques (Relator), Alexandre de Moraes, André Mendonça, Cristiano Zanin e Gilmar Mendes; e (b) julgou (...)".
Em decorrência do nascimento dos filhos, Paullo Henrique Diniz Mota, ocorrido em 09/12/2015 (ID 295121059 - Pág. 117), e Pedro Henrique Diniz Mota Mendonça, ocorrido em 05/01/2019 (ID 295121059 - Pág. 106), a autora postula o benefício de salário-maternidade, na condição de segurada especial. Apresentou requerimento administrativo com DER em 23/03/2021 (ID 295121059 - Pág. 131).
Foram juntados os seguintes documentos: certidão de inteiro teor do nascimento do filho, em virtude da qual se postula o benefício previdenciário, registrado em 03/03/2016, de onde se extrai a profissão de lavradora da autora (ID 295121059 - Pág. 117); Ficha de inscrição de sindicalização de pescadora em nome da autora, em 15/03/2018 (ID 295121059 - Pág. 114 e 135); ficha de matrícula escolar do filho, na qual a autora está qualificada como pescadora, com endereço residencial no Povoado de Jacaré (ID 295121059 - Pág. 110); CNIS da autora sem registro de vínculo de qualquer natureza (ID 295121059 - Pág. 127); declaração de nascido vivo, na qual consta a ocupação de lavradora da autora, em 10/12/2015 (ID 295121059 - Pág. 98); autodeclaração do segurado especial, na qual a autora informa o período de 15/03/2018 a 30/10/2020 de atividade de pesca (ID 295121059 - Pág. 90).
O conjunto probatório não se assenta em comprovar o início da prova material suficiente a amparar o direito do benefício pleiteado, por tempo suficiente da carência exigida em lei.
O exercício de atividades rurais, para fins previdenciários, pode ser demonstrado através de início razoável de prova material, desde que complementado por prova testemunhal idônea (REsp Repetitivo n. 1.348.633 e Súmula n. 149 do STJ).
Como se vê, no caso, a prova testemunhal não foi designada, exclusivamente, por inércia da própria parte autora, que deixou transcorrer sem manifestação o prazo concedido para especificação das provas que possuía interesse em produzir nos autos (ID 295121059 - Pág. 18).
Assim, tendo a parte autora deixado de produzir prova oral para ampliar a eficácia probatória dos documentos referentes à atividade rural por ela exercida, não há como ser reconhecido o período de trabalho rural para fins previdenciários.
Esse, também, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o início de prova material que não estiver corroborado por prova testemunhal colhida no curso da instrução processual sob o crivo do contraditório, não se mostra hábil ao reconhecimento de tempo de serviço trabalhado como rurícola.
Patente a insuficiência de provas para a demonstração do alegado na inicial, é inconteste o reconhecimento da improcedência do pedido.
A sentença recorrida analisou especificamente a situação da autora, quando concluiu o seguinte (ID 295121059 - Pág. 12 e 13):
“Na hipótese em análise, não reputo presente o início de prova material a fazer prosperar o pedido. Explico.
Os documentos acostados não são aptos a caracterizar indícios de prova material, sendo incabível o deferimento do pedido, vez que insuficientes para comprovar a qualidade de segurada especial da parte autora.
De outra parte, o art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus clausus, já que o sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado, cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e sua aceitação.
Assim, com base em tudo que foi dito acerca da prova documental colacionada, entendo que não possui a Autora o direito à concessão do benefício de salário-maternidade”.
A sentença recorrida encontra-se regular, sob os aspectos formais e materiais, foi proferida após o devido processo legal, quando analisou, fundamentada e adequadamente, os aspectos relevantes da relação jurídica de direito material deduzida em juízo, mediante a aplicação da tutela jurídica cabível, prevista no ordenamento jurídico vigente, conforme a situação fática comprovada na causa.
Portanto, houve falta de comprovação do exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, pelo período equivalente à carência necessária à concessão do benefício.
Honorários recursais, quando devidos, na forma da legislação processual de regência (§11 do art. 85, do CPC do c/c 5º, XXXVI, da CF/88 e Súmula 26-TRF da 1ª Região), observada eventual inexigibilidade (§3º do art. 98 do CPC/2015).
Ante o exposto, conheço do recurso para, no mérito, negar-lhe provimento e manter a sentença recorrida.
Deixo de majorar os honorários sucumbenciais ante a ausência de contrarrazões.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
PROCESSO: 1003661-72.2023.4.01.9999
PROCESSO DE REFERÊNCIA: 0801948-17.2021.8.10.0110
RECORRENTE: GILDOMARA DINIZ MOTA
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. RGPS. SALÁRIO-MATERNIDADE. SEGURADA ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. PRECLUSÃO. ATIVIDADE RURAL NÃO COMPROVADA. REQUISITOS LEGAIS NÃO COMPROVADOS. SENTENÇA MANTIDA.
1. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte dias), com início no período entre vinte e oito dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade.
2. A concessão do respectivo benefício previdenciário, na qualidade de segurado especial, que tenha por base atividades rurais, exercidas em regime de economia familiar ou regime equivalente, depende da demonstração, por prova idônea e suficiente (documental e testemunhal), da condição de segurado especial, e observância dos demais requisitos legais da legislação de regência (art. 71 e conexos da Lei 8.213/1991 e § 2º do art. 93 do Regulamento aprovado pelo Decreto 3.048/1999).
3. Em decorrência do nascimento dos filhos, Paullo Henrique Diniz Mota, ocorrido em 09/12/2015 (ID 295121059 - Pág. 117), e Pedro Henrique Diniz Mota Mendonça, ocorrido em 05/01/2019 (ID 295121059 - Pág. 106), a autora postula o benefício de salário-maternidade, na condição de segurada especial. Apresentou requerimento administrativo com DER em 23/03/2021 (ID 295121059 - Pág. 131).
4. Foram juntados os seguintes documentos: certidão de inteiro teor do nascimento do filho, em virtude da qual se postula o benefício previdenciário, registrado em 03/03/2016, de onde se extrai a profissão de lavradora da autora (ID 295121059 - Pág. 117); Ficha de inscrição de sindicalização de pescadora em nome da autora, em 15/03/2018 (ID 295121059 - Pág. 114 e 135); ficha de matrícula escolar do filho, na qual a autora está qualificada como pescadora, com endereço residencial no Povoado de Jacaré (ID 295121059 - Pág. 110) CNIS da autora sem registro de vínculo de qualquer natureza (ID 295121059 - Pág. 127); declaração de nascido vivo, na qual consta a ocupação de lavradora da autora, em 10/12/2015 (ID 295121059 - Pág. 98); autodeclaração do segurado especial, na qual a autora informa o período de 15/03/2018 a 30/10/2020 de atividade de pesca (ID 295121059 - Pág. 90)
5. A prova testemunhal não foi designada, exclusivamente, por inércia da própria parte autora, que deixou transcorrer sem manifestação o prazo concedido para especificação das provas que possuía interesse em produzir nos autos (ID 295121059 - Pág. 18). Assim, tendo a parte autora deixado de produzir prova oral para ampliar a eficácia probatória dos documentos referentes à atividade rural por ela exercida, não há como ser reconhecido o período de trabalho rural para fins previdenciários.
6. O exercício de atividades rurais, para fins previdenciários, pode ser demonstrado através de início razoável de prova material, desde que complementado por prova testemunhal idônea (REsp Repetitivo n. 1.348.633 e Súmula n. 149 do STJ).
7. Não concedido salário-maternidade em razão da não satisfação dos requisitos legais.
8. Apelação não provida.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, negar provimento à apelação cível, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data e assinatura eletrônicas.
Desembargador Federal EULER DE ALMEIDA
