
POLO ATIVO: DOMINGAS TAVARES GOMES
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: CAMILO DA SILVA COSTA - TO9456-A, HELBA RAYNE CARVALHO DE ARAUJO - TO6219-S e ANDRE FRANCELINO DE MOURA - TO2621-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1008333-89.2024.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora, de sentença na qual foi julgado improcedente o seu pedido de concessão de salário-maternidade, em razão da não comprovação de sua qualidade de trabalhadora rural.
Também houve a sua condenação ao pagamento das custas e honorários advocatícios, ficando suspensa a exigibilidade destas verbas, uma vez que a autora, ora apelante, litiga sob o pálio da assistência judiciária gratuita (art. 98, §3º, do Código de Processo Civil).
Em suas razões, a apelante pede a reforma da sentença, mediante o reconhecimento da procedência do seu pleito, argumentando haver preenchido todos os requisitos legalmente exigidos para a concessão do benefício.
Embora intimado, o INSS não apresentou contrarrazões.
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
O salário-maternidade
A Constituição Federal garante, no artigo 7º, inciso XVIII, a licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de 120 (cento e vinte) dias.
O benefício de salário-maternidade está previsto no art. 71 da Lei n. 8.213/91, que assim dispõe:
"Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade."
Em relação à segurada especial, o art. 39, parágrafo único, do mesmo diploma legal, assim estabelece:
"Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
(...)
Parágrafo único. Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício."
Dessa forma, para a concessão do benefício, sem que haja a necessidade de recolhimento de contribuições previdenciárias, é indispensável a comprovação de efetivo exercício de atividade atribuída legalmente ao segurado especial, assim definida na Lei n. 8.213/91:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(...)
VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
(...)
§ 1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes."
A par disso, o aludido dispositivo legal exige a comprovação do efetivo desempenho da atividade em regime de economia familiar, nos moldes nele referidos, o que reivindica a existência de prova material passível de ser confirmada através de robusta prova testemunhal.
No caso do salário-maternidade, o exercício de atividade rural deve ser devidamente comprovado durante o período de carência legalmente indicado para a concessão do benefício.
Das provas – qualidade de segurado
Registre-se que “A jurisprudência pátria, considerando a situação peculiar do trabalhador rural e a dificuldade encontrada por esses trabalhadores em comprovar a atividade rural, em qualquer de suas formas, permite que outros documentos (dotados de fé pública) não especificados em lei, sejam considerados para fins de concessão do benefício previdenciário” (AC 0031039-78.2012.4.01.9199, DESEMBARGADOR FEDERAL PEDRO BRAGA FILHO, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 20/03/2023 PAG.).
Ademais, é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o rol do art. 106 da Lei n. 8.213/91 tem natureza meramente exemplificativa (AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além daqueles nele indicados.
Do caso concreto
Na hipótese ora submetida a julgamento, constata-se que o pedido inicial foi julgado improcedente porque a parte autora não conseguiu comprovar o atendimento dos requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado.
Para comprovar a carência exigida, a parte apelante apresentou os seguintes documentos: a)Cadastro único para programas sociais do Governo Federal, com data de atualização de 23/05/2022, com indicação de endereço rural fl. 21; b) Certidão de nascimento da filha Allana Tavares Vieira, datada de 17/03/2021, indicando a profissão da parte como lavradora fl. 25; c) Escritura pública de declaração de Direitos possessórios e ocupação em nome de terceiros, datado de 2009 fl. 29; d) Recibo de inscrição de imóvel no CAR, em nome de terceiro fl. 30; e) Formulário de requerimento de regularização fundiária, em nome de terceiro fl. 2010 fl. 31; f) Declaração do proprietário de imóvel rural, indicando que a parte autora reside em seu imóvel na zona rural e que exerceu atividade agrícola no período compreendido entre 03/08/2018 a 16/03/2021 fl. 33; g) Comprovante de endereço rural em nome da parte, datado de 07/2022 fl. 38.
Dos documentos apresentados, verifica-se que a fatura de serviço de energia elétrica, apesar de poder ser considerada indício de residência em zona rural, não é suficiente para configurar início de prova material, ainda mais se não foram apresentados outros documentos a respeito da qualidade se segurado especial, a exemplo do que ocorre no caso concreto.
Ademais, os demais elementos não têm força probatória para configurar um início de prova material do exercício efetivo da atividade campesina, pois são documentos particulares, preenchidos com elementos oriundos de declaração das pessoas interessadas e com data de emissão em momento próximo ao ajuizamento da ação, muitos dos quais estão em nome de terceiros, tornando irrelevante a prova testemunhal.
De fato, resta evidenciado nos autos que os documentos apresentados pela parte autora não podem ser considerados um início razoável de prova material da sua condição de segurada especial, a exigir comprovação do seu efetivo exercício, tornando impossível, como consequência, o reconhecimento dessa qualidade exclusivamente com base em prova testemunhal, conforme dispõe o enunciado da Súmula n. 149 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
“A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”.
Por outro lado, devo registrar que no julgamento do REsp 1352721/SP, em sede de recurso repetitivo, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que “A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa” (REsp n. 1.352.721/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, julgado em 16/12/2015, DJe de 28/4/2016).
Nesse contexto, ausente um dos requisitos necessários ao reconhecimento da qualidade de segurada especial, qual seja, o início de prova material da atividade rural exercida, carece a autora de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo.
Com esses fundamentos, julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil, e declaro prejudicada a apelação interposta pela parte autora.
É como voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
28APELAÇÃO CÍVEL (198)1008333-89.2024.4.01.9999
DOMINGAS TAVARES GOMES
Advogados do(a) APELANTE: ANDRE FRANCELINO DE MOURA - TO2621-A, CAMILO DA SILVA COSTA - TO9456-A, HELBA RAYNE CARVALHO DE ARAUJO - TO6219-S
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. AUSÊNCIA DE UM INÍCIO DE PROVA MATERIAL DO EFETIVO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE CAMPESINA. IRRELEVÂNCIA DA PROVA TESTEMUNHAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. EXAME DA APELAÇÃO PREJUDICADO.
1. A segurada especial definida no art. 39, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91, faz jus ao benefício de salário-maternidade, mediante a comprovação do exercício de atividade rural nos últimos 10 (dez) meses imediatamente anteriores ao parto (art. 71 da Lei 8.213/91 e art. 93, § 2º. do Decreto 3.048/99).
2. Não tendo sido apresentado um início razoável de prova material suficiente para a comprovação do efetivo exercício da atividade rural, pelo período de carência legalmente exigido, o direito ao salário-maternidade não se configura, porque o tempo de labor campesino não pode ser reconhecido apenas e tão-somente com base em prova testemunhal (Súmula nº 149, Superior Tribunal de Justiça).
3. O Superior Tribunal de Justiça decidiu, em sede de recurso repetitivo, que, nas ações previdenciárias, a ausência de prova a instruir a inicial implica o reconhecimento de ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem resolução do mérito, possibilitando à parte autora propor novamente a ação, desde que apresente novos elementos probatórios (Tema 629).
4. Processo julgado extinto, sem resolução do mérito. Exame do recurso de apelação da parte autora prejudicado.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma, por unanimidade, extinguir o processo, sem resolução do mérito, e declarar prejudicado o exame do recurso de apelação interposto pela parte autora, nos termos do voto da relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora
