
POLO ATIVO: KELLY DA COSTA XAVIER
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: ANDRESSA FERNANDES PEREIRA - TO8267-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra sentença que julgou improcedente seu pedido de concessão do benefício de salário-maternidade na condição de segurada especial. Em suas razões alegou apresentar os requisitos jurídicos necessários para obtenção do benefício e requereu a procedência do pedido.
Sem contrarrazões do INSS, embora devidamente intimado.
É o relatório.

Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Pressupostos e recebimento da apelação
Presentes os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação em seu duplo efeito, nos termos dos arts. 1.011 e 1.012, ambos do CPC.
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Requisitos jurídicos
O objeto da presente demanda é o instituto do salário-maternidade, previsto no artigo 7º da Constituição Federal, que, em seu inciso XVIII, aduz que é devido “licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias”.
O Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento das ADIs 2.110 e 2.111 declarou a inconstitucionalidade da exigência de carência para a fruição de salário-maternidade, prevista no art. 25, inc. III, da Lei nº 8.213/1991, na redação dada pelo art. 2º da Lei nº 9.876/1999. A exigência de cumprimento de carência apenas para algumas categorias de trabalhadoras, como era o caso das trabalhadoras rurais (seguradas especiais) e das seguradas contribuintes individuais e facultativas, violava o princípio da isonomia, de modo que se estabeleceu critérios de interpretação judicial mais benéfico quanto aos meses necessários à implementação da carência.
Assim, no julgamento da ADI 2.110, o STF, por maioria, com base no voto do ministro Edson Fachin, declarou a inconstitucionalidade da norma que passou a exigir carência de 10 meses de contribuição para a concessão do salário-maternidade para as trabalhadoras autônomas (contribuintes individuais), para as trabalhadoras rurais (seguradas especiais) e para as contribuintes facultativas. Para os ministros que acompanharam o voto vencedor em comento, a exigência de cumprimento de carência apenas para algumas categorias de trabalhadoras viola o princípio da isonomia. Consta da certidão do julgamento da ADI 2.110, no que se refere ao salário-maternidade, o seguinte (original sem destaque): "Decisão: O Tribunal, por maioria, conheceu parcialmente das ADIs 2.110 e 2.111 e, na parte conhecida, (a) julgou parcialmente procedente o pedido constante da ADI 2.110, para declarar a inconstitucionalidade da exigência de carência para a fruição de salário-maternidade, prevista no art. 25, inc. III, da Lei nº 8.213/1991, na redação dada pelo art. 2º da Lei nº 9.876/1999, vencidos, nesse ponto, os Ministros Nunes Marques (Relator), Alexandre de Moraes, André Mendonça, Cristiano Zanin e Gilmar Mendes; e (b) julgou (...)".
Portanto, a concessão do benefício previdenciário intitulado salário-maternidade depende tão somente da comprovação da qualidade de segurado(a) do(a) requerente e observância dos demais requisitos legais da legislação de regência (arts. 71 e conexos da Lei 8.213/1991 e § 2º do art. 93 do Regulamento aprovado pelo Decreto 3.048/1999).
Situação tratada
Houve prévio requerimento administrativo em 30/3/2020 (rolagem única PJe/TRF-1, p. 31/32).
A autora postula o benefício de salário-maternidade em decorrência do nascimento de seu filho, ocorrido em 22/9/2019, conforme certidão de nascimento anexada (rolagem única PJe/TRF-1, p. 15- sem registro da qualificação profissional dos genitores da criança). Em seu intuito probatório, a autora anexou ainda os seguintes documentos: certidão de nascimento própria, constando o registro de qualificação dos genitores como lavradores; certidão emitida pelo INCRA, atestando que a genitora da autora é assentada no Projeto de Assentamento PA Antonio Moreira; declaração de anuência emitida pela genitora da autora (janeiro de 2020); CTPS do genitor da criança sem anotações; certidão de nascimento do genitor da criança, constando o registro do avô paterno do infante como lavrador; prontuário médico.
O núcleo familiar da autora é formado por ela, a criança (Kennedy Taveira de Sousa) e o genitor do infante (Leandro Taveira de Sousa) (conforme CADUNICO – rolagem única PJE/TRF-1, p. 109). Constam diversos registros de vínculos laborais na qualidade de segurado empregado e contribuinte individual no CNIS do genitor da criança, o que afasta a extensibilidade da prova anexada em nome dele à autora. Ademais, as provas anexadas em nome da genitora da autora não podem ser extensíveis a ela pois integrante de grupo familiar diverso.
Analisando os documentos anexados, constata-se que eles não gozam de formalidades suficientes a ensejar segurança jurídica para os fins probatórios visados pela parte autora pois demonstram tão somente a posse/propriedade/domínio de imóvel rural ou são declarações unilaterais ou possuem tão somente eficácia inter partes. Nesse sentido a Jurisprudência:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL DO PERÍODO DE CARÊNCIA. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. INADMISSIBILIDADE. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. 1. O benefício de salário-maternidade é devido à segurada especial que atender aos requisitos estabelecidos na Lei 8.213/91 (art. 25, III) e no § 2º do art. 93 do Decreto 3.048/99. A demonstração do trabalho rural no prazo mínimo de 10 (dez) meses, ainda que descontínuos, deve ser realizada mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena, inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª Região, Súmula 27). 2. Não servem como início de prova material do labor rural durante o período da carência, pois não revestidos das formalidades legais para comprovar a autenticidade, a segurança jurídica e quando tiverem sido confeccionados em momento próximo ao ajuizamento da ação ou à data do nascimento da criança. A certidão eleitoral (retificável a qualquer tempo) com anotação indicativa da profissão de rurícola, certidão de nascimento da criança e/ou certidão de casamento sem qualificação profissional, prontuários médicos, cartão da gestante, cartão de vacinas, carteira e ficha de filiação a sindicato de trabalhadores rurais, desacompanhado dos recolhimentos, CTPS sem anotações de vínculos rurais, documentos de terras em nome de terceiros, bem como declaração de terceiros. 3. O pleito encontra óbice na ausência de início de prova material, pois não ficou comprovado o exercício de atividade rural no período de carência (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei n. 8.213/91), tendo em vista que os documentos apresentados pela autora não são suficientes para comprovar o efetivo exercício campesino em regime de economia familiar. 4. A autora postula o benefício de salário-maternidade em decorrência do nascimento de seu filho, ocorrido em 11/03/2016 certidão de nascimento de fl. 21, sem qualificação profissão dos genitores, e, com o propósito de comprovar a sua condição de trabalhadora rural, juntou os seguintes documentos: certidão de nascimento de outro filho sem qualificação profissional dos pais; declaração de atividade rural, emitida pelo sindicato, com data de filiação em 26.04.2018, após o parto da criança; Declaração do proprietário, Sr. José Maria de Sousa, em que autora exerce atividade agrícola, em regime de economia familiar, datada após o parto da criança. 5. O Reconhecimento de tempo de serviço rural exige início razoável de prova material corroborada por prova testemunhal robusta, não sendo admissível prova exclusivamente testemunhal. 6. A coisa julgada opera secundum eventum litis ou secundum eventum probationis, permitindo a renovação do pedido ante novas circunstâncias ou novas provas. 7. Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, §§ 2º e 4, III, do CPC, ficando suspensa a execução, enquanto perdurar a situação de pobreza da requerente pelo prazo máximo de cinco anos, quando estará prescrita.. 8. Apelação do INSS provida para julgar improcedente o pedido inicial.
(AC 1002990-83.2022.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 17/08/2022 PAG.)
Ademais, ‘as declarações particulares, ainda que acompanhadas de registros de propriedades rurais em nome de terceiros, constituem única e exclusivamente prova testemunhal instrumentalizada, não suprindo a indispensabilidade de início de prova material’. (AC 0030638-45.2013.4.01.9199 / MG, Rel. JUIZ FEDERAL JAMIL ROSA DE JESUS OLIVEIRA (CONV.),PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 p.138 de 17/12/2014).
Ademais, não é admissível a prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido:
"Súmula n. 27: Não é admissível prova exclusivamente testemunhal para reconhecimento de tempo de exercício de atividade urbana e rural (Lei n. 2 8213/91, art. 55, parágrafo 32)."
"Súmula 149, STJ: A prova exclusivamente testemunhal não basta à com provação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário. "
Ausentes os requisitos jurídicos, a autora não faz jus à obtenção do benefício de salário-maternidade pleiteado.
Segundo a orientação do e. Superior Tribunal de Justiça, em julgamento sob a sistemática dos recursos repetitivos, “a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa" (REsp 1.352.721, Tema 629).
Diante da ausência do requisito legal da prova da qualidade de segurada da parte autora, não é possível a concessão do benefício pleiteado. Portanto, deve ser reformada a sentença que julgou improcedente o pedido, para extinguir o processo, sem resolução de mérito, conforme entendimento do STJ no precedente citado.
Conclusão
Ante o exposto, de ofício, extingo o processo, sem resolução do mérito, e julgo prejudicada a apelação da parte autora.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1014716-20.2023.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 0001213-24.2021.8.27.2703
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: KELLY DA COSTA XAVIER
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. QUALIDADE DE SEGURADA E FATO GERADOR DEMONSTRADOS. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. ADI N. 2.110 E N. 2.111. PROCESSO EXTNTO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. SENTENÇA REFORMADA, DE OFÍCIO. APELAÇÃO DA AUTORA PREJUDICADA.
1. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte dias), com início no período entre vinte e oito dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade.
2. O Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento das ADIs 2.110 e 2.111 declarou a inconstitucionalidade da exigência de carência para a fruição de salário-maternidade, prevista no art. 25, inc. III, da Lei nº 8.213/1991, na redação dada pelo art. 2º da Lei nº 9.876/1999. A exigência de cumprimento de carência apenas para algumas categorias de trabalhadoras (contribuintes individuais, seguradas especiais e contribuintes facultativas), violava o princípio da isonomia, de modo que se estabeleceu critérios de interpretação judicial mais benéfico quanto aos meses necessários à implementação da carência.
3. Ausente a qualidade de segurada, a autora não faz jus ao benefício de salário-maternidade.
4. Processo extinto, sem resolução do mérito, de ofício. Apelação da autora prejudicada.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, extinguir o feito, sem resolução do mérito, e julgar prejudicada a apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
