
POLO ATIVO: ANTONIA IARA ANCHIETA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: GUSTAVO MOTA ANDRADE - MA17915-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra sentença que julgou improcedente seu pedido de concessão do benefício de salário-maternidade na condição de segurada especial. Em suas razões alegou apresentar os requisitos legais para concessão do benefício e requereu a procedência do pedido.
Sem contrarrazões do INSS, embora devidamente intimado.
É o relatório.

Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Pressupostos e recebimento da apelação
Presente os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação em seu duplo efeito, nos termos dos arts. 1.011 e 1.012, ambos do CPC.
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Requisitos jurídicos
O objeto da presente demanda é o instituto do salário-maternidade, previsto no artigo 7º da Constituição Federal, que, em seu inciso XVIII, aduz que é devido “licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias”.
O Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento das ADIs 2.110 e 2.111 declarou a inconstitucionalidade da exigência de carência para a fruição de salário-maternidade, prevista no art. 25, inc. III, da Lei nº 8.213/1991, na redação dada pelo art. 2º da Lei nº 9.876/1999. A exigência de cumprimento de carência apenas para algumas categorias de trabalhadoras, como era o caso das trabalhadoras rurais (seguradas especiais) e das seguradas contribuintes individuais e facultativas, violava o princípio da isonomia, de modo que se estabeleceu critérios de interpretação judicial mais benéfico quanto aos meses necessários à implementação da carência.
Assim, no julgamento da ADI 2.110, o STF, por maioria, com base no voto do ministro Edson Fachin, declarou a inconstitucionalidade da norma que passou a exigir carência de 10 meses de contribuição para a concessão do salário-maternidade para as trabalhadoras autônomas (contribuintes individuais), para as trabalhadoras rurais (seguradas especiais) e para as contribuintes facultativas. Para os ministros que acompanharam o voto vencedor em comento, a exigência de cumprimento de carência apenas para algumas categorias de trabalhadoras viola o princípio da isonomia. Consta da certidão do julgamento da ADI 2.110, no que se refere ao salário-maternidade, o seguinte (original sem destaque): "Decisão: O Tribunal, por maioria, conheceu parcialmente das ADIs 2.110 e 2.111 e, na parte conhecida, (a) julgou parcialmente procedente o pedido constante da ADI 2.110, para declarar a inconstitucionalidade da exigência de carência para a fruição de salário-maternidade, prevista no art. 25, inc. III, da Lei nº 8.213/1991, na redação dada pelo art. 2º da Lei nº 9.876/1999, vencidos, nesse ponto, os Ministros Nunes Marques (Relator), Alexandre de Moraes, André Mendonça, Cristiano Zanin e Gilmar Mendes; e (b) julgou (...)".
Portanto, a concessão do benefício previdenciário intitulado salário-maternidade depende tão somente da comprovação da qualidade de segurado(a) do(a) requerente e observância dos demais requisitos legais da legislação de regência (arts. 71 e conexos da Lei 8.213/1991 e § 2º do art. 93 do Regulamento aprovado pelo Decreto 3.048/1999).
Situação tratada
Houve requerimento administrativo em 26/09/2020 (rolagem única PJe/TRF-1, p. 60).
A autora postula o benefício de salário-maternidade em decorrência do nascimento de seu filho, ocorrido em 24/8/2019, conforme certidão de nascimento anexada (rolagem única PJe/TRF-1, p. 19 - não consta no referido documento o registro da qualificação profissional dos pais da criança).
A parte autora anexou aos autos, entre outros documentos, declaração de exercício de atividade rural emitida por sindicato de trabalhadores rurais atestando que a autora laborou em atividades campesinas, em regime de economia familiar, durante o período compreendido entre março de 2009 e abril de 2018. O e. STJ - possui o entendimento de que tal documento consubstancia início de prova material de atividade campesina, independentemente de homologação de órgão diverso. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DECLARAÇÃO DO SINDICATO RURAL. HOMOLOGAÇÃO PELO INSS. DESNECESSIDADE. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. INOVAÇÃO RECURSAL. EXAME. IMPOSSIBILIDADE.
1. Esta Corte possui entendimento no sentido de que, para fins de obtenção de aposentadoria por idade em juízo, não se mostra razoável exigir do trabalhador rural que faça prova material plena e cabal do exercício de sua atividade campesina, bastando, para tanto, que produza ao menos um início de prova material.
2. A título de início de prova material, a declaração do sindicato de trabalhadores rurais, ou mesmo a carteira de filiação, erige-se em documento hábil a sinalizar a condição de rurícola de seu titular, prestando-se a prova testemunhal para complementar e ampliar a força probante do referido documento.
3. Não se mostra possível discutir em agravo regimental matéria que não foi objeto das razões do recurso especial, tampouco decidida pelo Tribunal de origem, por se tratar de inovação recursal.
4. Agravo regimental improvido.
(AgRg no AREsp n. 577.360/MS, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 7/6/2016, DJe de 22/6/2016.)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DECLARAÇÃO DO SINDICATO RURAL. HOMOLOGAÇÃO PELO INSS. DESNECESSIDADE. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO POSSIBILIDADE. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ AFASTADO.
1. Esta Corte possui entendimento no sentido de que, para fins de obtenção de aposentadoria por idade em juízo, não se mostra razoável exigir do trabalhador rural que faça prova material plena e cabal do exercício de sua atividade campesina, bastando, para tanto, que produza ao menos um início de prova material.
2. A título de início de prova material, a declaração do sindicato de trabalhadores rurais, ou mesmo a carteira de filiação, erige-se em documento hábil a sinalizar a condição de rurícola de seu titular, prestando-se a prova testemunhal para complementar e ampliar a força probante do referido documento.
3. O juízo acerca da validade e eficácia dos documentos apresentados como o início de prova material do labor campesino não enseja reexame de prova, vedado pela Súmula 7/STJ, mas sim valoração do conjunto probatório existente (AgRg no REsp 1.309.942/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/03/2014, DJe 11/04/2014).
4. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no AREsp n. 652.962/SP, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/8/2015, DJe de 3/9/2015.)
Ainda, verifica-se que as demais provas anexadas estão em harmonia com o início de prova material apresentado.
A prova testemunhal corrobora os documentos acostados aos autos e atesta a atividade rural desempenhada pela parte autora no período de carência exigido (conforme termo de audiência - rolagem única PJe/TRF-1, p. 167/168). .
Assim, verifica-se que a parte autora logrou êxito em comprovas o preenchimento os requisitos necessários para concessão do benefício almejado.
Da situação tratada
Em análise a documentação anexada, constata-se que a autora logrou êxito em comprovar o preenchimento dos requisitos necessários para obtenção do benefício, nos termos do art. 373, I do CPC. A ocorrência do fato gerador se deu em 12/4/2020 (conforme certidão anexada pela autora - rolagem única PJe/TRF-1, p. 14). Houve requerimento administrativo em 19/3/2020 (rolagem única PJe/TRF-1, p. 18). Por fim, a qualidade de segurada restou comprovada, pois, no momento do parto, a autora exercia labor urbano na qualidade de segurada empregada, conforme consta em seu CNIS (rolagem única PJe/TRF-1, p. 39).
Data inicial do benefício
Nos termos da Lei 8.213/91, art. 49, I, “b”, o benefício previdenciário vindicado é devido a partir da data do requerimento administrativo, observada a prescrição quinquenal. Em caso de ausência de tal requerimento, o benefício será devido a contar da citação. No caso, a DIB é a data do requerimento administrativo (Recurso Especial Representativo de Controvérsia. Art. 543-C do CPC. REsp 1369165/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 26/02/2014, DJe 07/03/2014).
Consectários
A correção monetária pela TR, na forma do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, nas condenações impostas à Fazenda Pública, foi considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, oportunidade em que a Corte Constitucional entendeu ser legítima a atualização monetária pelo IPCA-E (Repercussão Geral no RE nº 870.947/SE).
Os juros de mora, nas condenações oriundas de relação jurídica não tributária, devem ser fixados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009) (Repercussão Geral no RE n. 870.947/SE).
Dessa forma, a correção monetária e os juros de mora, a incidir sobre as parcelas vencidas, devem ocorrer de acordo com o Manual de Cálculo da Justiça Federal, atendendo aos parâmetros estabelecidos no julgamento do RE-RG nº 870.947/SE (Tema 810) e do REsp nº 1.495.146/MG (Tema 905).
Dos honorários sucumbenciais
Inverto os honorários sucumbenciais arbitrados pelo juízo a quo, sem majoração ante a ausência de contrarrazões, a teor do disposto no art. 85, §§ 2º, 3º e 11º do CPC, devendo-se observar teor da súmula 111, do STJ.
Honorários recursais
Nos termos do julgamento do REsp 1.864.633/RS, que tramitou sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.059 do STJ), a majoração dos honorários de sucumbência pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, desse modo, não se aplica o art. 85, § 11, do CPC ao caso dos autos.
Conclusão
Ante o exposto, dou provimento à apelação da autora.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1005484-81.2023.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 0802476-43.2020.8.10.0027
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: ANTONIA IARA ANCHIETA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. QUALIDADE DE SEGURADA E FATO GERADOR DEMONSTRADOS. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. ADI N. 2.110 E N. 2.111. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÃO DA AUTORA PROVIDA
1. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte dias), com início no período entre vinte e oito dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade.
2. O Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento das ADIs 2.110 e 2.111 declarou a inconstitucionalidade da exigência de carência para a fruição de salário-maternidade, prevista no art. 25, inc. III, da Lei nº 8.213/1991, na redação dada pelo art. 2º da Lei nº 9.876/1999. A exigência de cumprimento de carência apenas para algumas categorias de trabalhadoras (contribuintes individuais, seguradas especiais e contribuintes facultativas), violava o princípio da isonomia, de modo que se estabeleceu critérios de interpretação judicial mais benéfico quanto aos meses necessários à implementação da carência.
4. Demonstradas a maternidade e a qualidade de segurada anterior ao parto, tem direito a parte autora ao benefício de salário-maternidade.
5. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC ao caso dos autos, tendo em vista o que foi decidido no Tema 1.059/STJ.
6. Apelação da autora provida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
